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UM RESGATE SOBRE O SIGNIFICADO DOS PRINCÍPIOS EXPRESSOS NOS CÓDIGOS DE ÉTICA PROFISSIONAL DO SERVIÇO SOCIAL DE 1986 E 1993.

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1 UM RESGATE SOBRE O SIGNIFICADO DOS PRINCÍPIOS EXPRESSOS NOS CÓDIGOS DE ÉTICA PROFISSIONAL DO SERVIÇO SOCIAL DE 1986 E 1993.

Juliana Aparecida Cobuci Pereira1

RESUMO:

O presente artigo tem o objetivo de refletir sobre os aspectos mais fundamentais do projeto Ético-político do Serviço Social, os princípios que orientam o comprometimento da categoria, expressos nos códigos de ética profissional de 1986 e 1993, afim de que, seja possível a elaboração de estratégias de trabalho afirmadoras do direcionamento assumido nos marcos do movimento de ruptura com o conservadorismo. Tal projeto determinou a eleição de novos valores e consequentemente deu novo caráter às ações profissionais e legitimidade à categoria dos Assistentes Sociais. Contudo a complexidade dos fenômenos com os quais os profissionais lidam, nos diferentes espaços de trabalho demonstra que o debate a cerca da intervenção no Serviço Social ainda suscita inúmeros questionamentos e desafios aos profissionais. Cabe, portanto aprofundamento reflexivo sobre o processo protagonizado pela categoria, no trânsito dos anos 1980 para 1990, especialmente no que se refere ao arcabouço teórico e valorativo assumido.

Palavras-chaves: Serviço Social; Princípios, Projeto ético-político; intervenção, código de

ética.

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Graduada em Serviço Social pela UFJF; Mestranda em Serviço Social pelo PPG/FSS (UFJF) e Membro da Equipe de Coordenação Pesquisa “Referências teóricas críticas e o posicionamento ético-político dos Assistentes Sociais na década de 1980” da FSS/UFJF.

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2 Introdução

O presente artigo visa contribuir quanto às possibilidades da intervenção profissional orientada pelo Projeto Ético-Político do Serviço Social. Para tanto apresentamos parte das reflexões elaboradas para o Trabalho de Conclusão de Curso “A intervenção profissional no processo de consolidação da perspectiva crítica do serviço social: o código de ética como referência para o exercício profissional dos assistentes sociais.” apresentado na Faculdade de Serviço Social da Universidade Federal de Juiz de Fora em dezembro de 2014. Adotamos como parâmetros os Códigos de Ética Profissional de 1986 e de 1993 como referências das alterações/superações que se processaram na intervenção concreta dos assistentes sociais, mediadas por sua inserção nos espaços sócio ocupacionais.

O intenso e rico processo histórico e de reflexão teórico-metodológico ocorrido no Serviço Social sobre a ética profissional contou com a incorporação do materialismo histórico dialético como base teórica para o novo posicionamento dos assistentes sociais. Este processo ocorreu a partir de configurações de um cenário latino-americano, que passava por governos ditatoriais, as chamadas autocracias burguesas (Netto, 1991).

O regime ditatorial forçou a realização de uma reforma universitária que, propiciou a inserção dos cursos de Serviço Social nas universidades, bem como a criação dos primeiros cursos de pós-graduação na área de Serviço Social favorecendo a produção e o acúmulo de conhecimentos, o que Netto (1999) chamou de formação de “massa crítica” 1

. A incorporação de uma teoria crítica e a interlocução com outras áreas de conhecimento como as ciências sociais tornou o meio acadêmico um importante espaço de construção do projeto da categoria. As novas bases teóricas e a eleição de novos valores e princípios, agora alinhados aos interesses da classe trabalhadora tornou possível aos profissionais a formulação de instrumentos para uma observação crítica da realidade social, possibilitando o rompimento com práticas conservadoras e culpabilizadoras dos sujeitos atendidos.

No âmbito da intervenção profissional, através da participação política de uma vanguarda profissional, que se aproximou do marxismo pela militância política, e de um conjunto de profissionais que estava inserido entre os católicos progressistas, orientados pela Teologia da Libertação2, iniciaram-se experiências que buscavam explicitar o compromisso com as classes populares. As atividades buscavam mobilizar e organizar a população na direção de conquistas coletivas, incorporando estratégias de identificação de lideranças populares.

O Serviço Social elegeu um novo posicionamento político, acompanhando os processos sociais progressistas em luta pela democratização, buscou uma nova legitimidade,

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agora junto às classes subalternas. Para ratificar o direcionamento da categoria ocorre em 1986 a aprovação do primeiro Código de Ética Profissional signatário do novo posicionamento assumido, no qual se explicita seu vínculo político com as classes trabalhadoras, rompendo com a neutralidade profissional dos códigos anteriores. Ao longo das décadas de 1980 e 1990 se intensifica o processo de reflexão teórica sobre a ética profissional e em 1993 ocorre a revisão do Código de Ética Profissional que ganha a versão atual, buscando conservar as conquistas do código anterior e aglutinando os avanços do processo de reflexão ética da categoria.

Ao tratar-se de uma legislação (Resolução CFESS 273, de 13 de março de 1993) o Código de ética profissional determina a conduta esperada dos profissionais do Serviço Social no exercício de sua função. O documento tem como função precípua normatizar e disciplinar o exercício profissional, dos Assistentes Sociais. O disciplinamento previsto, no entanto, não se dá de maneira aleatória, mas fundamentada por uma teoria e partir dos princípios e valores sobre os quais a categoria profissional estabelece sua ética profissional. Neste sentido apresentamos a seguir o esforço de analisar cada princípio dos códigos de ética profissional de 1986 e 1993, com vistas a estabelecer uma comparação entre os dois documentos.

Os códigos de ética de 1986 e 1993 – Referências do posicionamento crítico dos Assistentes Sociais.

O Código de 1986 foi gestado a partir de condições sócio-históricas que explicitaram a proposta de ruptura com o conservadorismo no Serviço Social. O documento, embasado pelo materialismo histórico dialético, buscou exprimir o novo conjunto valorativo eleito pelos Assistentes Sociais (BARROCO, 2012). O texto apresenta como destaque a explicitação dos vínculos ético-políticos e o rompimento com a neutralidade através do claro comprometimento com a classe trabalhadora. Ganhou evidência a ação enquanto compromisso político, orientada pela dinâmica da realidade e tendo como horizonte a emancipação dos sujeitos.

O primeiro princípio correspondeu ao compromisso com a devolução das informações

colhidas nos estudos e pesquisas aos sujeitos sociais envolvidos. Entendeu-se que a

socialização das informações e resultados poderia contribuir com os interesses dos usuários, favorecendo entre outras possibilidades, sua organização, reivindicação e a formulação de estratégias com vistas ao avanço de direitos. Além de exprimir o comprometimento com os usuários assumido pelos profissionais.

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O segundo princípio estabeleceu o acesso às informações no espaço institucional e o

incentivo ao processo de democratização das mesmas. O acesso à informação foi

considerado um instrumento fundamental para o exercício profissional para a elaboração de estratégias e projetos mais eficazes e eficientes. Além disso, o texto prevê relações democráticas nos espaços de trabalho e demonstra a possibilidade de tensionar em favor da população usuária que ganha um importante instrumento favorecedor do questionamento, controle e reivindicação de seus interesses.

O terceiro princípio firmou a contribuição na alteração da correlação de forças no espaço institucional e o fortalecimento de novas demandas de interesse dos usuários. Aqui é

explícito o novo posicionamento político dos Assistentes Sociais. As ações profissionais deveriam deste modo, buscar favorecer os interesses daqueles com os quais a categoria passa a se comprometer.

O quarto princípio previu a denúncia das falhas nos regulamentos, normas e

programas da instituição e o não acatamento de determinação patronal que fira os princípios e diretrizes deste Código. A denúncia torna-se uma estratégia de defesa do posicionamento

político assumido (PAIVA; SALES 2012). Além de respaldar os profissionais que apresentem condutas contrárias à realização de tarefas e/ou ações que vão de encontro aos valores da categoria.

O quinto princípio estabeleceu o respeito à tomada de decisão dos usuários, ao saber

popular e à autonomia dos movimentos e organizações da classe trabalhadora. Este princípio

considerou os usuários enquanto sujeitos, capazes de decidir sobre as ações de seu interesse, demostrando sintonia com os processos de luta da sociedade brasileira e legitimou instâncias coletivas de organização. A utilização da categoria classe trabalhadora explicita, mais uma vez, o posicionamento político dos Assistentes Sociais.

O sexto princípio determinava o privilégio ao desenvolvimento de práticas coletivas e

o incentivo à participação dos usuários no processo de decisão e gestão institucional. Este

princípio envolveu a busca pela construção de uma nova cultura de participação. Muitos profissionais passaram a se dedicar ao apoio aos movimentos sociais e a participar de espaços novos à exemplo dos fóruns coletivos de trabalhadores e usuários da saúde; do movimento pró-meninos e meninas de rua; entre outros que pós Constituição Federal de 1988 foram institucionalizados como Conselhos de Direitos.

O sétimo princípio colocou em vigor a discussão com os usuários sobre seus direitos e

os mecanismos a serem adotados na luta por sua efetivação e por novas conquistas; e a reflexão sobre a necessidade de seu engajamento em movimentos populares e/ou órgãos

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representativos da classe trabalhadora. Novamente observamos a busca pela construção de

um modelo democrático de organização e o comprometimento dos profissionais em contribuir no processo reflexivo dos usuários com vistas ao fortalecimento da participação dos mesmos nos espaços de organização, com destaque para os movimentos sociais e entidades de classe.

O oitavo princípio determinava o apoio às iniciativas e aos movimentos de defesa dos

interesses da categoria e à divulgação no espaço institucional das informações e de suas organizações. Aqui a categoria demarcou seu posicionamento democrático, demostrando a

necessidade de articulação dos profissionais e da socialização de informações entre os mesmos.

O nono princípio ordenou a denúncia de agressão e abuso de autoridade às organizações da categoria e aos órgãos competentes. O objetivo aqui era defesa da profissão,

bem como de sua autonomia, legitimando a nova organização política e sindical da categoria. Finalmente o décimo princípio firmava o apoio e/ou a participação nos movimentos

sociais e organizações da classe trabalhadora. A participação do profissional nos espaços de

organização mais coletivos foi considerada direito democrático, a fim de fortalecer determinada classe. No entanto julgou-se deste modo, que todos os Assistentes Sociais pertencem também, à mesma classe com a qual a categoria se comprometeu. Este ponto demostrou carência de reflexão a ser foi revisto em 1993.

Destacamos a seguir os onze princípios fundamentais do Código de 1993, que devem ser analisados sempre de maneira articulada, uma vez que foram elaborados a partir de sua apreensão na complexidade da realidade social. Se considerados isoladamente perder-se-ia a riqueza das possibilidades dessa proposição (PAIVA; SALES, 2012).

Em alguns princípios destacamos ações do CFESS inspiradas pelos mesmos que materializam a luta geral da categoria tornando inteligível a possibilidade de elaboração de estratégias para a intervenção alinhadas ao projeto do Serviço Social.

Iniciemos a reflexão sobre o primeiro princípio, a Liberdade. Trata-se de seu reconhecimento como valor ético central, a partir da construção de possibilidades pelos homens, através da atividade fundamental do trabalho. Os homens (seres sociais) escolhendo dentre as possibilidades postas vão construindo outras novas possibilidades que os levarão à libertação das necessidades (PAIVA; SALES, 2012).

O conceito de liberdade defendido neste código corresponde a um conceito histórico, fruto das relações sociais, nas quais os homens são sujeitos e sobre as quais perpassam complexas mediações determinadas pelas classes e com recortes (dentre outros) de gênero,

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etnia e orientação sexual. A liberdade aqui, objetiva a emancipação dos sujeitos mediante a construção de novas relações sem exploração, a partir de uma ética constituída na autonomia do ser social (BONETTI, 2012, p.15-21). Este conceito de liberdade supera ainda o sentido liberal, que privilegia o aspecto individualista, por considerar que a criação de novas estruturas, que permitam a superação das variadas limitações, será possível através da participação dos indivíduos sociais não cabendo experiências que limitem o desenvolvimento dos sujeitos sociais. Por isso também o código privilegia exclusivamente o respeito a todas as correntes democráticas e não quaisquer outras correntes, pois somente a partir de tal pluralismo é possível avançar para a superação das limitações da sociedade burguesa (NETTO, 2013, p.25).

O entendimento sobre a liberdade compreende que para sua efetiva realização, como elemento potencializador da emancipação humana, é necessário o acesso aos direitos humanos, civis, sociais, políticos e culturais. Logo, considerando que o Assistente Social lida com violações de direitos nos mais diversos espaços de inserção profissional, se faz fundamental que este tema seja objeto de reflexão pela categoria.

A campanha do conjunto CFESS/CRESS (Conselho Federal de Serviço Social e Conselhos Regionais de Serviço Social) “Sem movimento não há liberdade”, que denunciou a desigualdade social e o conjunto de violações de direitos ocorridas cotidianamente na sociedade, inviabilizando o exercício pleno da cidadania de milhares de pessoas é um exemplo de ação inspirada pelo princípio de liberdade contido no código de ética.

O segundo princípio é a Defesa intransigente dos direitos humanos e recusa do

arbítrio e do autoritarismo. O acirramento das desigualdades sociais e os processos de

desumanização e violência cada vez mais presentes na sociedade. Os Assistentes Sociais construíram ao longo do processo de ruptura com o conservadorismo uma postura de recusa e enfrentamento a todas às formas de violência e humilhações. Pautado em uma nova cultura democrática que, buscou através do código garantir respaldo à intervenção profissional, tal princípio ético exprime a necessária articulação entre os demais princípios do código determinando uma postura contrária a qualquer tipo de opressão (PAIVA; SALES, 2012).

Recordemos do passado recente onde prisões arbitrárias e torturas ocorreram por agentes do Estado, especialmente militares, ou na atualidade, a instauração de unidades de polícia pacificadora nas favelas cariocas que registrou inúmeros casos de abuso. Estes exemplos permitem compreender, segundo Ruiz (2013), porque a defesa deve ser

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intransigente, severa. A concepção de direitos humanos presente no código tem como

horizonte a construção de outra sociabilidade que não é possível nos marcos das relações capitalistas que reproduzem necessariamente a cada dia a banalização da vida e naturalização da violência especialmente contra grupos e populações pobres e marginalizados.

O terceiro princípio refere-se à ampliação e consolidação da cidadania, considerada

tarefa primordial de toda a sociedade, com vistas à garantia dos direitos civis, políticos e sociais das classes trabalhadoras. Consideramos os espaços de inserção dos Assistentes

Sociais como sendo propícios à realização de estratégias viabilizadoras de direitos e de acesso às políticas sociais. A atuação dos profissionais pode se efetivar a partir de ações nas quais a cidadania não fique restrita aos atendimentos imediatos e emergenciais, mas promova o acesso integral aos direitos sociais (PAIVA; SALES, 2012).

O quarto princípio é a defesa do aprofundamento da democracia, enquanto

socialização da participação política e da riqueza socialmente produzida. Este princípio

supera o conceito liberal de democracia, restrita à participação política, compreendendo ainda a participação de todos nos espaços de deliberação sobre o processo produtivo e usufruto da riqueza socialmente produzida. Nos marcos da sociedade burguesa torna-se impossível sua efetivação plena, posto que a organização capitalista traz em si a exigência estrutural da apropriação privada da riqueza. Torna-se fundamental, portanto, que os Assistentes Sociais favoreçam a participação dos usuários nos espaços de discussão e deliberação a partir da socialização de informações nas diversas áreas onde se faz presente o profissional (PAIVA; SALES, 2012).

Segundo Teixeira (2013, p.61-62) o crescente processo de desigualdade atualmente alcança níveis nunca vistos, concomitante ao aumento expressivo da violência. A luta pela socialização da riqueza, como dimensão da democracia se faz cada dia mais urgente e atual. O aumento da violência entre jovens no espaço urbano comprova esta afirmação. A juventude é submetida à constante estímulo ao consumo de bens, contudo a população jovem e pobre enfrenta a impossibilidade concreta de objetivar tal desejo e em muitos casos acaba vislumbrando a conquista por meio de formas ilícitas, conferindo a criminalidade entre os jovens uma origem social, estreitamente ligada à desigualdade, fruto da apropriação privada da riqueza. Porém quando ocorre um delito envolvendo jovens, sobretudo pobres, a atribuição do fato ocorre considerando-se somente o indivíduo. O surgimento de propostas como a PEC 33/2012, a respeito da redução da maioridade penal e aumento do tempo de internação dos adolescentes, atesta nossa afirmação. Neste episódio a categoria dos Assistentes Sociais compareceu a seção de votação da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do

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Senado, manifestando posicionamento contrário à proposta e buscando chamar à atenção para o fato de que a criminalidade corresponde a um fenômeno com origens sociais, e não apenas individuais determinados pela apropriação da riqueza.

No quinto princípio temos o posicionamento em favor da equidade e justiça social, de

modo a assegurar a universalidade de acesso aos bens e serviços relativos aos programas e políticas sociais, bem como sua gestão democrática. Os homens no processo de relações

sociais acessam a riqueza produzida de modo desigual, deste modo esse princípio visa à igualdade de acesso, a universalização das políticas sociais e pela realização plena da democracia (PAIVA; SALES, 2012). Deve ser compreendido em união com os outros princípios do código que primam pela democracia, tendo como horizonte o fim da sociedade baseada na desigualdade (BOSCHETTI, 2013, p.67).

O sexto princípio estabelece o empenho na eliminação de todas as formas de

preconceito incentivando o respeito à diversidade, à participação de grupos socialmente discriminados e à discussão das diferenças. O preconceito é um fenômeno oriundo da

concepção ou opinião antecipada ou mesmo pouco refletida sobre determinados temas mesmo após ponderação que conteste tais concepções, levando a julgamentos e comportamentos prejudiciais a determinados grupos e/ou indivíduos. Nos diferentes espaços de trabalho o Assistente Social trabalha com elementos presentes nas práticas culturais que tornam possível o fortalecimento de práticas que favoreçam a reflexão frente a processos discriminatórios visando sua superação.

Como exemplos de ações que buscaram ampliar a discussão sobre os preconceitos destacamos as campanhas, realizadas pelo CFESS “O amor fala todas as línguas” e “No mundo de desigualdade toda violação de direitos é violência”, abordando a opressão sofrida por dois segmentos tradicionalmente vítimas de discriminação, os homossexuais e as mulheres. Podemos ainda citar as Resoluções CFESS 489/2006 e 615/2011 que proibiram condutas discriminatórias por orientação sexual e de identidade de gênero (ALMEIDA, 2013, p.80).

No sétimo princípio encontramos a busca pela garantia do pluralismo, por meio do

respeito às correntes profissionais democráticas existentes e suas expressões teóricas, e do compromisso com o constante aprimoramento intelectual. A possibilidade de reflexão e

crítica sobre as diferentes concepções teóricas é própria das sociedades democráticas que respeitam posicionamentos divergentes. A busca por hegemonia se dá aqui através da adesão refletida e não por processos de imposição, fortalecendo a opção pelas corretes democráticas (PAIVA; SALES, 2012).

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Diversas alterações teórica e metodológica marcam a trajetória do Serviço Social brasileiro, propiciando também a modificação do fazer profissional. A partir da ruptura com o conservadorismo este processo teve a contribuição de variadas correntes democráticas de pensamento que, permitiram a elaboração de um modo de agir que considerasse a inserção objetiva dos sujeitos na realidade e buscasse a participação ativa de tais sujeitos na sociedade. Tal elaboração somente foi possível pela diversidade de ideias produzidas que traduziram uma experiência de pluralidade, que não se confunde com ecletismo. As correntes incorporadas pelo movimento de renovação, em sua vertente crítica, primaram por aquelas que comungavam com o ideal de emancipação humana, somente possível quando a democracia é elemento fundamental (FORTI, 2013, p.93).

O oitavo princípio diz respeito à opção por um projeto profissional vinculado ao

processo de construção de uma nova ordem societária, sem dominação – exploração de classe, etnia e gênero. Fruto do adensamento teórico processado sobre o posicionamento

político demarcado no código de 1986, este princípio demostra uma análise da sociedade a partir não só das contradições de classe, mas ainda dos processos de exploração oriundos das determinações de gênero e etnia, característicos também do modelo burguês de organização social.

Os Assistentes Sociais fizeram a opção por um projeto profissional pautado no fortalecimento dos interesses das classes subalternas, com vistas a uma sociedade sem exploração tornando fundamental a elaboração de estratégias que contribuam na eliminação das estruturas reprodutoras da lógica perversa de exploração. O alinhamento da categoria às forças progressistas da sociedade tem nas ações de fortalecimento das políticas públicas e na busca pela efetivação dos direitos sociais estratégias de efetivação do seu projeto profissional ao mesmo tempo em que contribui na construção de uma nova sociabilidade (PAIVA; SALES, 2012).

O nono princípio prevê a articulação com os movimentos de outras categorias

profissionais que partilhem os princípios deste Código e com a luta geral dos trabalhadores. O aprofundamento do debate da ética no Serviço Social e, sobretudo o

comprometimento com a luta geral dos trabalhadores permitiu a categoria ultrapassar os limites do código e perceber a necessidade de alinhamento e participação junto aos espaços que se coloquem em favor da construção de uma nova sociedade (PAIVA; SALES, 2012).

O código de ética é uma das expressões do Projeto Ético-político do Serviço Social e como tal contém a projeção não só de um projeto profissional, mas, de um projeto de sociedade. Assim apresenta a necessidade de estabelecer alianças com outras categorias que

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comunguem de tal horizonte, porque a tarefa de construção de outro modelo de sociedade só é possível coletivamente.

A defesa de direitos na sociedade burguesa se torna mais eloquente quando incorporada por variados segmentos sociais (SILVA, 2008, p. 49), tendo as profissões forte legitimidade neste processo, conforme ocorreu recentemente para a aprovação do projeto de lei 3688/2000, pela Comissão de Educação da Câmara dos Deputados, que institui a presença de profissionais do Serviço Social e Psicologia nas escolas públicas de educação básica. A aprovação só foi possível mediante o envolvimento dos respectivos conselhos profissionais e entidades da esfera da educação, como sindicatos de professores.

O décimo princípio firma o compromisso com a qualidade dos serviços à população e

com o aprimoramento intelectual, na perspectiva da competência profissional. A

competência profissional constitui um processo constante de aprimoramento técnico, determinado pelas condições na qual se processa a atividade profissional, de maneira tal que a intervenção esteja sintonizada com as principais demandas da população usuária e com a produção teórica da categoria (PAIVA; SALES, 2012). Além disso, a realidade complexa que se altera constantemente dentro do movimento dinâmico e contraditório da sociedade capitalista faz do aprimoramento intelectual um importante meio de alargamento de possibilidades de ação profissional (GUERRA, 2013, p.134).

Por fim o décimo primeiro princípio firma o exercício do Serviço Social sem ser

discriminado nem discriminar por questões de inserção de classe social, gênero, etnia, religião, nacionalidade, opção sexual, idade e condição física. Este princípio garante aos

profissionais do Serviço Social, aos seus usuários e aos outros profissionais com os quais o/a Assistente Social esteja relacionado no seu cotidiano profissional o direito ao respeito às suas particularidades, considerando as reflexões éticas presentes no conjunto valorativo que o código busca explicitar (PAIVA; SALES, 2012).

No seu cotidiano profissional o Assistente Social atende a inúmeros grupos sociais marginalizados e vítimas de preconceitos como mulheres, homossexuais, negros, idosos, indígenas, entre outros. Almeida (2013, p. 141) destaca a necessidade de uma formação de qualidade. Pois os profissionais estão sujeitos à incorporação e/ou fortalecimento da cultura conservadora que desvaloriza a diversidade humana e leva à manifestação de preconceitos reforçando a opressão e discriminação de grupos que deveriam contar com a defesa do Serviço Social no que tange aos direitos e a liberdade.

Pelo exposto afirmamos que os códigos, além de fornecerem respaldo legal à intervenção profissional, exprimem a proposta da categoria e concordamos que os avanços

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contidos no Código de 1986 são aprimorados no documento de 1993 que, promulga em seu texto a participação do Serviço Social em um movimento coletivo do qual não é protagonista, mas um sujeito capaz de contribuir.

Conclusões

Buscamos neste trabalho refletir sobre o processo de eleição de valores no Serviço Social. Para tanto consideramos a busca por uma nova legitimidade para o Serviço Social a partir da substituição das referencias teóricas e valorativas tradicionais que determinavam ações de controle sobre os sujeitos atendidos. O processo protagonizado pela categoria dos assistentes sociais compreendeu um movimento que acompanhou as mudanças ocorridas na sociedade brasileira e que exigiu dos profissionais respostas capazes de atender às necessidades postas. Tal processo se configurou por um processo dinâmico, não restrito aos determinantes endógenos da profissão, mas que envolveu os assistentes sociais na efervescência política e social do país no período em questão.

A reflexão sobre o conteúdo dos Códigos de Ética Profissional de 1986 e 1993 permitiu a compreensão sobre o aprofundamento teórico e, sobretudo ético da categoria, que fizeram de tais documentos referências para práticas emancipatórias. A eleição de valores alterou a postura e a intervenção dos profissionais junto aos usuários, além de favorecer a construção de um projeto profissional que se articula a um projeto de sociedade.

O acúmulo processado afirmou o compromisso com os usuários e com as lutas mais gerais da sociedade. Os profissionais, a partir de uma teoria social crítica e do envolvimento na realidade social posta, passaram a elaborar respostas não restritas ao atendimento das demandas institucionais, mas que tinham como horizonte a transformação da realidade social. A intervenção passou então a tensionar a favor do avanço de direitos e do incentivo ao questionamento e organização dos seus usuários buscando a emancipação humana. Por tudo isso, podemos afirmar que as novas referências do Serviço Social são frutos do envolvimento dos profissionais com movimentos sociais populares e órgãos da categoria e que a principal alteração processada dentro do movimento de ruptura diz respeito à postura dos profissionais frente aos usuários, buscando fortalecer o avanço de direitos sociais universais.

O Serviço Social segue avançando e buscando formas de exprimir no seu cotidiano profissional a opção ética e política que, passou a orientar os profissionais e estabeleceu a construção de um projeto profissional crítico e progressista. Tal projeto vem sendo desafiado cotidianamente pela configuração atual do capitalismo que ataca os direitos e criminaliza a organização dos trabalhadores exigindo dos profissionais, cada vez mais, competência para a

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leitura da realidade e criatividade na elaboração de estratégias que tenham como horizonte o projeto construído pela categoria.

1 Segundo NETTO (1999) “massa crítica” refere-se ao conjunto de conhecimentos produzidos e acumulados por

determinada ciência, disciplina ou área do saber.

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Segundo Löwy (1989, p.15)a Teologia da Libertação consistiu em “uma corrente cristã solidária dos pobres, com uma prática conscientizadora e emancipadora, [...]. A ideia fundamental, que começa a germinar no bojo desta práxis, [...], é a de que só uma mudança radical das estruturas sociais - protagonizada pelos próprios pobres - pode acabar com a pobreza”.

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Referências

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