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Os petróleos em Portugal: do Estado à privatização 1937-2012

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Academic year: 2021

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(1)Capa Petróleos.qxp_Layout 1 19/01/17 10:30 Page 1. Outros títulos de interesse:. Pedro Velez. O Partido Republicano Nacionalista, 1923-1935 Manuel Baiôa. A Vaga Corporativa Corporativismo e Ditaduras na Europa e na América Latina António Costa Pinto Francisco Palomanes Martinho (organizadores). Sem Fronteiras Os Novos Horizontes da Economia Portuguesa Pedro Lains (organizador). Os Petróleos em Portugal. Das Constituições dos Regimes Nacionalistas do Entre-Guerras. Entre 1992 e 2012, decorreu o processo de privatização da Petrogal/Galp Energia.Tive o privilégio de presidir a essas instituições durante 14 desses anos e tenho o dever de conhecer bem o mesmo processo, incluindo conteúdos e eventos não publicados. Em 2014, desafiei o Prof. Pedro Lains a conceber e coordenar um projeto de investigação sobre o tema. Tinha consciência de que era uma tarefa difícil. O presente livro é o fruto da competência e da perseverança dos seus autores e representa um excelente ponto de partida para se perceber o que se fez de bem e quem o fez; assim como identificar o que se poderia ter feito melhor, ou muito melhor, e porque é que tal não aconteceu. Apesar das limitações impostas pela dificuldade de acesso a toda a informação inerente a um projeto desta natureza, a obra é de leitura obrigatória para os profissionais e investigadores que se interessam pela história das privatizações em Portugal e, em particular, pela história do setor petrolífero nacional. Manuel Ferreira de Oliveira, PetroAtlantic Energy Corporation, S.A. Este livro condensa o que de melhor a história económica e empresarial pode oferecer para o conhecimento da GALP. Nele se conjuga a rigorosa análise da informação e uma profundidade temporal que se projecta para além do horizonte estrito do início da privatização. Acresce a riqueza da trama explicativa, que integra a evolução da GALP nos ritmos das vicissitudes políticas, das fricções pelo controlo accionista e da recomposição do mercado europeu de energia. Álvaro Ferreira da Silva, Nova School of Business and Economics. Os Petróleos em Portugal Do Estado à Privatização 1937-2012 David Castaño Ana Mónica Fonseca Pedro Lains Daniel Marcos. A presente obra fornece-nos um excelente contributo para um conhecimento mais aprofundado da história e dinâmica empresarial dos petróleos e do gás em Portugal ao longo do século XX e inícios do século XXI bem como da sua contextualização, no âmbito da história política e económica do respetivo período. José Amado Mendes, Universidade Autónoma de Lisboa Foto da capa: Torre de cracking da Sacor, Cabo Ruivo, Lisboa UID/SOC/50013/2013. www.ics.ul.pt/imprensa. ICS. ICS. David Castaño, investigador do Instituto Português de Relações Internacionais da Universidade Nova de Lisboa. Ana Mónica Fonseca, investigadora e professora convidada do Centro de Estudos de Internacionais e do Departamento de História do ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa. Pedro Lains, investigador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e professor convidado da Católica-Lisbon School of Business and Economics. Daniel Marcos, investigador e professor convidado do Instituto Português de Relações Internacionais e da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa..

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(5) 00 Petróleos Intro.qxp_Layout 1 20/01/17 10:44 Page 5. David Castaño Ana Mónica Fonseca Pedro Lains Daniel Marcos. Os Petróleos em Portugal Do Estado à Privatização 1937-2012.

(6) 00 Petróleos Intro.qxp_Layout 1 31/01/17 16:29 Page 6. Imprensa de Ciências Sociais. Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa Av. Prof. Aníbal de Bettencourt, 9 1600-189 Lisboa – Portugal Telef. 21 780 47 00 – Fax 21 794 02 74 www.ics.ulisboa.pt/imprensa E-mail: imprensa@ics.ul.pt. Instituto de Ciências Sociais — Catalogação na Publicação CASTAÑO, David, 1979Os petróleos em Portugal : do Estado à privatização 1937-2012 / David Castaño [et al.]. - Lisboa : Imprensa de Ciências Sociais, 2017. ISBN 978-972-671-381-4 CDU 330. © Instituto de Ciências Sociais, 2017 Capa e concepção gráfica: João Segurado Revisão: Marta Castelo Branco Impressão e acabamento: Gráfica Manuel Barbosa & Filhos, Lda. Depósito legal: 421232/17 1.ª edição: Fevereiro de 2017.

(7) 00 Petróleos Intro.qxp_Layout 1 20/01/17 10:44 Page 7. Índice Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 11. Capítulo 1 Estado e privados, 1937-1992 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . Grupos económicos, nacionalizações e integração . . . . . . . . . .. 19 29. Capítulo 2 O tempo da Petrogal, 1992-1999 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . A Petrocontrol . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . A saída da Total . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .. 39 43 57. Capítulo 3 O tempo da Galp Energia, 1999-2012 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69 A entrada da Eni . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71 Problemas de estratégia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 83 A entrada da Amorim Energia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101 Conclusão . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 123 Apêndices . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 127 Fontes, créditos fotográficos e bibliografia . . . . . . . . . . . . . . . . . 133.

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(9) 00 Petróleos Intro.qxp_Layout 1 20/01/17 10:44 Page 9. Agradecimentos Este trabalho partiu de um convite do Eng.º Ferreira de Oliveira, então presidente da Galp Energia, que desde cedo se associou à pertinência de um estudo de carácter científico sobre as mudanças de propriedade no sector dos petróleos em Portugal. Gostaríamos de agradecer o apoio da Galp Energia e da Fundação Galp Energia e, em particular, de Manuel Aguiar, Suzana Barreto, Rita Macedo, Ana Moreira, Rui Oliveira Neves e Manuel Ramalhete. Os nossos agradecimentos estendem-se aos valiosos comentários de um referee anónimo da Imprensa de Ciências Sociais, assim como a Marta Castelo Branco, pela ajuda na preparação final do manuscrito.. 9.

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(11) 00 Petróleos Intro.qxp_Layout 1 20/01/17 10:44 Page 11. Introdução A vida empresarial depende em grande medida do contexto económico, social ou institucional dos países ou das áreas geográficas em que estes se inserem. Assim, as empresas portuguesas são marcadas, desde há longas décadas, pelo enquadramento de uma economia menos desenvolvida, situada na periferia europeia. Com uma história política conturbada, fracas dotações de capital físico e humano, Portugal foi um dos últimos países da Europa ocidental a entrar no clube de crescimento e a industrializar-se. Para compreender a história da indústria em Portugal no período contemporâneo será necessário remontar à fundação das companhias pombalinas de agricultura e comércio, que exploravam monopólios sob proteção do Estado. No século XIX, criaram-se empresas ligadas à exploração de concessões públicas, incluindo o Banco de Lisboa, fundado em 1821, e as companhias de tabacos e de obras públicas, constituídas no fim das guerras liberais, nas décadas de 1830 e 1840. À medida que o século XIX foi avançando, Portugal entrou numa fase de industrialização mais intensa, com a criação de empresas associadas à produção de bens de consumo, como os têxteis, de bens de uso industrial, como a metalurgia, os adubos e os cimentos, ou de bens alimentares, como a farinha de trigo ou as conservas de peixe, ou de tabacos. Nos serviços e nos transportes, as empresas de maior importância eram a banca, os caminhos de ferro e outras infraestruturas, sectores em que conviviam capitais privados, em alguns casos sob concessão, e investimento público.1 A industrialização no século XIX foi ainda marcada pela fundação de algumas unidades que atingiriam uma dimensão relevante à escala nacional, embora não necessariamente à escala internacional. A Primeira Guerra Mundial alterou o quadro das relações económicas internacionais, afetando por essa via os equilíbrios económicos e financeiros do país, os quais foram ainda agravados pela instabilidade do novo. 1 Ver Brito (1989), Madureira (1998), Confraria (1999 e 2005), Rosas (2000), Lains (2003, cap. 6) e Silva, Amaral e Neves (2016).. 11.

(12) 00 Petróleos Intro.qxp_Layout 1 20/01/17 10:44 Page 12. Os Petróleos em Portugal. regime republicano. Apesar das perturbações, a nível nacional e internacional, a economia portuguesa manteve um aceitável ritmo de crescimento, que se traduziu também numa crescente atividade industrial. Assim, nos anos de entre as guerras, as empresas de maior dimensão que haviam sido criadas nas últimas décadas do século XIX prosseguiram geralmente o seu caminho de expansão, juntamente com outras que entretanto surgiram, e as áreas industriais de Lisboa, Setúbal e Porto conheceram alguma prosperidade industrial e empresarial. Esses anos marcaram o início da época das grandes empresas nacionais. Dos sete maiores grupos empresariais consolidados ao longo do século XX, dois deles tiveram origem ainda no século XIX, e antecedem o advento do Estado Novo, mostrando alguma continuidade empresarial ao longo de diferentes regimes políticos.2 O domínio das grandes empresas portuguesas era também caracterizado, desde o seu início, por uma forte dependência em relação ao Estado, do ponto de vista da proteção e regulação do mercado interno, da legislação laboral e assistencial, ou ainda no que tocava às formas de financiamento do investimento, quer por via da regulação das taxas de juro, quer por via das despesas do Orçamento do Estado.3 Essa dependência encontra-se muito associada ao Estado Novo e por vezes é confundida com a ideologia definida pelo próprio regime. De facto, ao anunciar-se como um regime corporativo, o Estado Novo de Salazar apresentava-se também como defensor de um sistema económico de forte regulação das relações entre empresários e os investidores, por um lado, os trabalhadores, por outro, e ainda o Estado. A política económica do Estado Novo não era totalmente alheia ao que se passava no resto da Europa, uma vez que também democracias como a França ou a Áustria, esta sobretudo a seguir à Segunda Guerra Mundial, embarcaram igualmente em experiências de elevado grau de intervenção estatal na economia.4 Em Portugal, a intervenção do Estado junto das empresas era diversificada, já que o regime tinha alguma capacidade de adaptar as suas intervenções políticas às características de cada sector, facto que, aliás, pode ser considerado como uma das traves mestras da sua longa sobrevivência. Para além disso, a intervenção não implicava necessariamente uma maior rentabilidade para as empresas, uma vez que a regulação não anulava por. 2. Ver Silva, Amaral e Neves (2016, 52). Ver, quanto a estes temas, Madureira (1998) e Lains (2003). Ver também Silva, Amaral e Neves (2016). 4 Ver, por exemplo, Foreman-Peck e Federico (1999, 436) e Toninelli (2000). 3. 12.

(13) 00 Petróleos Intro.qxp_Layout 1 20/01/17 10:44 Page 13. Introdução. completo a concorrência. Para além disso, a intervenção do Estado podia não ser totalmente favorável a determinadas empresas, particularmente nos períodos em que estas tinham um maior desenvolvimento.5 Este livro estuda uma dessas intervenções públicas, num sector emergente e que viria a assumir grande peso na economia nacional. Trata-se de um sector que implica avultados investimentos em capital fixo, em que existem fortes economias de escala e em que o número de empresas concorrentes tenderá a ser pequeno.6 A criação de grupos de maior dimensão podia estar associada à necessidade de diversificação de produção por haver deficiências nos mercados, às dificuldades de acesso aos mercados financeiros menos desenvolvidos, ou mesmo à necessidade de se obter uma determinada dimensão de modo a possibilitar a formação de técnicos especializados, então em escasso número por causa do fraco desenvolvimento do ensino.7 Muitas das medidas tomadas em Portugal na década de 1930 apoiaram-se em reformas que foram tomadas ainda no fim da monarquia parlamentar, mas também durante o período da República, quando, em plena década de 1920, se produziram diversas alterações legislativas que levaram ao aumento das receitas fiscais, à estabilização do sistema financeiro e, inclusivamente, da inflação e dos câmbios. Esse lento desenvolvimento institucional seria até temporariamente interrompido pelo golpe de 1926 que foi mais desestabilizador do que algumas convulsões republicanas, embora no seu conjunto estas tenham tido maiores consequências. O caminho atribulado de avanços e recuos, relativamente ao papel do Estado e dos empresários na atividade económica nacional, teve algumas particularidades comparativamente aos restantes países da Europa ocidental, mas também seguiu de perto algumas das transformações que aí ocorreram. Politicamente, o caso português foi raro no século XX quanto ao governo de ditadura, aos golpes de Estado, ao período revolucionário, e à consolidação democrática, mas já foi menos raro quanto às nacionalizações e às privatizações, pois esses dois fenómenos foram comuns na Europa. A tardia industrialização portuguesa coincidiu com o período de consolidação do Estado, que ocorreu fundamentalmente nas décadas de transição entre o fim da monarquia, passando pelo período da República e entrando na longa ditadura do Estado Novo. Essa coincidência temporal abriu caminho a uma maior ligação entre o desenvolvimento. 5. Ver Amaral (2015b). Ver Madureira (1998, 778). 7 Ver, quanto a isto, Silva, Amaral e Neves (2016, 50-51). 6. 13.

(14) 00 Petróleos Intro.qxp_Layout 1 20/01/17 10:44 Page 14. Os Petróleos em Portugal. industrial e a intervenção do Estado, que encontrou um largo espaço para a sua actuação na esfera económica. Relativamente ao sector que nos preocupa neste volume, o país tinha um dos mais baixos consumos de energia por habitante ou por unidade de produto nacional, sendo que a esmagadora maioria desse consumo era ainda de carvão, uma forma de energia ligada à primeira revolução industrial, que correspondia a 80% de toda a energia consumida pelo país, em 1930-1935, sendo o restante consumo de petróleo e eletricidade.8 O Estado Novo coincidiu com o período de maior crescimento da economia portuguesa de que há registo, associado a uma rápida industrialização e ao aparecimento de novos sectores tecnologicamente mais avançados e com grandes necessidades de capital. É nesse contexto expansionista que se deve procurar entender as relações entre o Estado e a economia e, em particular, entre o Estado e as grandes empresas industriais. A relação de dependência foi todavia mútua, havendo importantes alterações nas relações de força entre política e economia. Muitas vezes os investimentos industriais dependiam da proteção do Estado para se realizarem, dada a dimensão e o pequeno espaço que podia ser garantido pelo mercado interno. Mas outras vezes os empresários tinham algumas dificuldades com o governo, quando este escolhia repartir o mercado por diferentes investidores. Todavia, quando o regime caiu, em 1974, a sua identificação com os grandes grupos era evidente, tendo crescido alguma animosidade popular durante o período revolucionário, que acabou por levar à nacionalização das principais empresas financeiras e industriais do país. As nacionalizações tiveram outras causas, de índole económica e financeira, mas o contexto político protelou a discussão sobre a avaliação do papel do sector público na economia do país durante mais de uma década. A sua reversão teria de esperar pelo fim da década de 1980 e a década de 1990, não fugindo muito, todavia, do período de igual mudança um pouco por toda a Europa ocidental.9 Este livro trata da história da privatização daquela que é hoje a maior empresa industrial portuguesa, a Galp Energia, ocorrida, na sua substância, durante os anos de 1992 a 2012. Pela primeira vez na história da petrolífera e da sua principal antecessora, a Sacor, fundada em 1938, em plena fase de arranque do Estado Novo, e com uma importante partici8 9. Ver Madureira (2008, 13). Ver Foreman-Peck e Federico (1999), Toninelli (2000) e Millward (2005).. 14.

(15) 00 Petróleos Intro.qxp_Layout 1 20/01/17 10:44 Page 15. Introdução Torre de cracking da Sacor, Cabo Ruivo, Lisboa. pação de capitais públicos, o Estado português deixou de ter qualquer participação enquanto proprietário, passando a exercer apenas as funções de legislador e regulador, porventura nem sempre da melhor forma.10 O facto de a história da Galp e das empresas que a antecederam ter começado com uma forte participação de capitais, tecnologia e conhecimentos importados, e de terem dependido inicialmente de investimento público e de mercados protegidos, decorre das circunstâncias da história económica portuguesa. A Galp resulta da fusão da Petrogal, da GDP e da Transgás. A Petrogal, por sua vez, é herdeira da Sacor, a primeira empresa refinadora de petróleo em Portugal, e da Sonap, fundada anos antes, e que se dedicava à distribuição e comercialização de produ-. 10 Para uma análise de transformações semelhantes no sector do petróleo na Europa ocidental, ver Millward (2005, cap. 11). Ver também Carreras, Tafunell e Torres (2000, 27-231), para o caso da indústria petrolífera espanhola.. 15.

(16) 00 Petróleos Intro.qxp_Layout 1 20/01/17 10:44 Page 16. Os Petróleos em Portugal. tos petrolíferos em Portugal. Durante largas décadas, essas duas empresas disputavam o mercado nacional de produtos petrolíferos, juntamente com outras empresas internacionais, numa concorrência largamente determinada pela política de preços conduzida centralmente pelo Estado. Em 1976, na sequência das nacionalizações ocorridas no ano anterior, o governo procedeu à restauração do sector energético, criando a Petróleos de Portugal — Petrogal, resultante da fusão da Sacor, da Sonap, da Cidla e da Petrosul. Processo de integração semelhante ocorrera em Espanha, ainda antes do fim da ditadura, em 1974, com a criação da Empetrol, que fundia três importantes refinarias.11 Tratava-se de uma empresa integrada verticalmente, de capitais públicos, com investimentos internacionais, geradora de tecnologia e funcionando num mercado concorrencial, que seria posteriormente colocada à venda através de um processo longo e com muitos incidentes de percurso. Também essa história tem de ser compreendida no contexto mais amplo da história do país. Ao colocarmos este estudo de história empresarial nesse contexto alargado aprendemos mais sobre a empresa, mas também mais sobre o país. A história da privatização da Galp Energia precisa de ser entendida tendo em consideração a génese das empresas em Portugal, o papel do Estado e as relações entre este e os acionistas, os problemas do mercado em que funcionavam essas empresas, o contexto das nacionalizações de que foram alvo, a transição para a privatização e, finalmente, o próprio processo de privatização. Esta não é a história de uma iniciativa privada, jogando em mercados livres e abertos, coartada por uma revolução e depois restaurada. É a história de governantes e empresários, nacionais e estrangeiros, procurando soluções para a resolução de um problema económico nacional, a saber, a provisão de energia à economia. O foco da nossa investigação na imprensa económica, mas também na generalista, deve-se essencialmente a vicissitudes com que nos deparámos ao longo da investigação e do processo de recolha de fontes primárias. Se, por um lado, os Relatórios e Contas pouco mais revelam do que a situação económica das sociedades, devidamente filtrada e sempre na perspetiva dos seus órgãos sociais, por outro lado, não nos foi possível aceder aos relatórios de consultoria e a parte da informação interna da empresa. O arquivo da empresa não está devidamente organizado e muitos documentos permanecem sigilosos. Nesse sentido, como forma de. 11. Ver Carreras, Tafunell e Torres (2000, 250).. 16.

(17) 00 Petróleos Intro.qxp_Layout 1 20/01/17 10:44 Page 17. Introdução. colmatar essas lacunas, recorreu-se à imprensa sendo dada particular atenção à diversificação das fontes consultadas. As privatizações em Portugal foram contemporâneas de uma vaga de privatizações à escala mundial, numa altura em que as preocupações com o aumento da eficiência económica passavam pela promoção do aumento da concorrência empresarial, da disciplina do mercado e da disseminação da propriedade por investidores privados. Entre 1977 e 2003, Portugal, todavia, foi o país que mais privatizou em termos de valor por habitante num conjunto alargado de países.12 De notar que, em 1991, nos anos iniciais da fase de privatizações no país, Portugal tinha um dos maiores sectores públicos da Europa ocidental, sendo a produção das empresas estatais equivalente a 25% do PNB.13 Porém, a especificidade do caso português não deve ser exagerada, uma vez que podemos encontrar desenvolvimentos idênticos no que diz respeito à instabilidade e à intervenção do Estado um pouco por toda a Europa, ao longo do século XX. As diferenças são mais de grau do que de substância.. 12. Ver Toninelli (2008, 685 e 688). Ver também Toninelli (2000). Foreman-Peck e Federico (1999, 449). Ver também Confraria (1999, 282-285) e Amaral (2015b). 13. 17.

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(19) 01 Petróleos Cap. 1.qxp_Layout 1 20/01/17 11:08 Page 19. Capítulo 1. Estado e privados, 1937-1992 Cerca de uma década depois do golpe que instaurou a ditadura militar, e depois de controladas as contas públicas, a inflação e a desvalorização cambial, assim como as últimas manifestações de dissidência política, o governo de Salazar virou-se para a criação e consolidação de uma nova ordem económica, o que coincidiu com a promulgação da Constituição de 1933, que institui o regime do Estado Novo. Desse novo ordenamento económico fizeram parte a Campanha do Trigo, de 1929, que reforçou a proteção ao sector cerealífero, a reforma da Caixa Geral de Depósitos, do mesmo ano, que melhorou o enquadramento do investimento apoiado pelo Estado, o Ato Colonial, de 1930, que nacionalizou o comércio com as colónias, o Estatuto do Trabalho Nacional, de 1933, a Lei da Reconstituição Económica, de 1935, que regulou o investimento público, e a Lei do Condicionamento Industrial, de 1937, que enquadrou a atividade da indústria.1 As medidas assinaladas devem ser vistas como atos fundadores do novo regime político, mas também analisadas num contexto mais alargado quer no tempo, quer no espaço. Com efeito, o aumento da intervenção do Estado na economia remontava ao período da República e resultava da necessidade, sentida um pouco por toda a Europa, de recuperação dos efeitos produzidos pela Primeira Guerra Mundial. Por outro lado, a estabilização do défice público e da inflação começara antes de 1926, sendo inclusivamente interrompida nos dois anos seguintes, até Salazar tomar conta da pasta das Finanças. As políticas do Estado Novo português da década de 1930 também replicavam medidas levadas a cabo em outras partes do mundo, tanto em regimes democráticos, como nos Estados Unidos durante a presidência de Roosevelt, como em regimes autoritários, de que o caso mais paradigmático foi a Itália fascista de Mussolini, com a qual o Estado Novo tinha fortes ligações ideológicas e de 1. Ver Confraria (2005).. 19.

(20) 01 Petróleos Cap. 1.qxp_Layout 1 20/01/17 11:08 Page 20. Os Petróleos em Portugal. política económica. Mas também em algumas democracias europeias o período de entre as guerras viu nascer uma nova era para a política económica, cujo objetivo comum era o de ajudar à recuperação das economias nacionais afetadas pela Primeira Guerra Mundial e pelas dificuldades acrescidas que esta trouxe aos mercados internacionais. Esta mudança foi mais pronunciada e generalizada a seguir ao segundo conflito mundial, dada a maior extensão das suas consequências negativas.2 O bloqueio do comércio internacional, a inflação e o endividamento provocados pela guerra, a produção de material bélico, entre outros fatores, alteraram a estrutura económica e financeira dos países envolvidos e a capacidade de intercâmbio internacional, deixando o mundo profundamente desequilibrado em 1918. A instabilidade internacional foi seriamente agravada com o crash da bolsa de Nova Iorque de 1929, com a Grande Depressão que se seguiu, e com o advento de Hitler na Alemanha. O desentendimento político impediu soluções coordenadas internacionalmente, e os governos nacionais, um pouco por todo o lado, enveredaram por políticas de proteção económica e de substituição de importações. Assim, nessa década de 1930, o governo português tinha como principais preocupações o abastecimento de produtos essenciais, incluindo produtos alimentares, como os cereais, que eram largamente importados, e de matérias-primas para a agricultura, como os adubos químicos, e para a indústria, como o carvão, os derivados de petróleo e a produção de eletricidade. Esta foi também a época em que ocorrem mudanças associadas às alterações no consumo de energia em todo o mundo, provocadas por variações nos preços relativos, muitas decorrentes de descobertas de petróleo, mas acima de tudo por alterações tecnológicas na exploração de energia e no seu uso, em resultado da paulatina divulgação do motor de combustão, começando a influenciar de forma determinante o papel da energia na indústria mundial. A intervenção estatal neste sector aconteceu também em países como a Grã-Bretanha e a França, sendo comum a preocupação com o fornecimento regular de produtos petrolíferos num momento agitado da economia europeia.3 Em 1927, foi fundada em Espanha a Campsa com a concessão de um monopólio por parte do Estado na comércio de importação, na refinação e na distribuição.4 2 Ver Foreman-Peck e Federico (1999) e Eichengreen (2007). Ver também Neal e Cameron (2016) e Costa, Lains e Miranda (2016). 3 Ver Millward (2005, cap. 11). 4 Ver Carreras, Tafunell e Torres (2000, 227-228).. 20.

(21) 01 Petróleos Cap. 1.qxp_Layout 1 20/01/17 11:08 Page 21. Estado e privados, 1937-1992 Martin Sain, fundador da Sacor, saudado e aplaudido na inauguração da refinaria de Cabo Ruivo, em 1940.. Como medida principal de proteção económica, a Lei do Condicionamento Industrial de 1937 previa a concessão de licenças de instalação a «novas indústrias de importância económica e custos de instalação excecionais, ou indispensáveis à defesa nacional». A primeira sociedade que beneficiou dessa proteção foi precisamente a Sociedade Anónima Concessionária da Refinação de Petróleos em Portugal (Sacor), que pretendia construir a primeira unidade de refinação de produtos petrolíferos do país, e cujo alvará foi concedido logo em 1937, e regulamentado no ano seguinte.5 A Sacor foi fundada por Martin Sain, um antigo diretor de uma companhia de petróleos da Roménia, país que era um dos maiores produtores de petróleo do mundo, com uma importante participação de capital público nacional (de 1/3), tendo o banqueiro Ricardo Espírito Santo como maior acionista privado. A Sacor ficou assim com o exclusivo da refinação no país e uma quota de mercado de combustíveis de 50%, atribuída durante os 10 anos do alvará.6 No mercado da distribuição, a nova refinaria concorria com outras companhias portuguesas, de que sobressaía a Sociedade Nacional de Petróleos (Sonap), fundada em 1933 por iniciativa conjunta de Manuel Queiroz Pereira e Manuel Boullosa, assim como com outras companhias petrolíferas. 5. Ver Pereira (2005, 227), Pires (2013, 21-23) e Silva, Amaral e Neves (2016, 59 e 63). Para além dos petróleos, através da Sacor, durante o período do Estado Novo, o Estado português tinha participação em empresas hidroelétricas, na TAP, em caminhos de ferro, em empresas de transportes urbanos, e ainda na Siderurgia Nacional e na Caixa Geral de Depósitos, entre outras empresas de menor dimensão – ver Ministério das Finanças (1995). 6. 21.

(22) 01 Petróleos Cap. 1.qxp_Layout 1 20/01/17 11:08 Page 22. Os Petróleos em Portugal. estrangeiras, em que pontificavam a Vacuum Oil Company, depois Mobil Oil, estabelecida em Portugal em 1896, a Shell, que entrou no mercado em 1914, e a Atlantic Refining Company, depois BP, a atuar no país a partir de 1929. Estas companhias eram também aquelas que forneciam crude à Sacor, a que se somava a sua acionista Compagnie Française des Pétroles, de que era também acionista a família Sain.7 O mercado português de produtos refinados tinha uma dimensão pequena, à escala europeia, e tamManoel Cordo Boullosa (1905-2000), bém relativamente à capacidade fundador da Sonap média das refinarias da altura. Em 1938, o consumo total nacional rondava as 200 mil toneladas por ano, quando em França era de cerca de 6 milhões de toneladas e em Itália de cerca de 2 milhões, o que correspondia a um consumo por habitante em Portugal equivalente a 20% do consumidor médio francês e a 60% do italiano. A produção média anual de cada refinaria francesa representava cerca do dobro do consumo em Portugal.8 Sem capacidade de exportação, quer por razões de competitividade, quer por razões da situação internacional, a reduzida dimensão do mercado nacional implicava seguramente desvantagens num sector de utilização intensiva de capital e com economias de escala potencialmente substanciais, o que significava também que a indústria só poderia nascer sob forte proteção legislativa e financeira do Estado. Em 1940, foi inaugurada a refinaria da Sacor, em Cabo Ruivo, junto a Lisboa, nas margens do Tejo, a qual, utilizando uma tecnologia simples, representou um investimento inicial de cerca de 40 mil contos. Esse valor correspondia às importações de energia no país durante um período de um a dois meses.9 Também em 1940, a Sacor entrou com 51% do capital 7 Ver Vicente (2002, 53, 57, 65-66 e 72). Ver também Ribeiro, Fernandes e Ramos (1987, 957) e Cordeiro (2009). 8 Ver Vicente (2002, 16). 9 Para a produção e o valor do investimento, ver Pires (2013, 30 e 37) e acerca das importações de energia, Batista et al. (1997, 101). Entre 1935 e 1939, Portugal importava em média 300 mil contos por ano em energia.. 22.

(23) 01 Petróleos Cap. 1.qxp_Layout 1 20/01/17 11:08 Page 23. Estado e privados, 1937-1992. Sem Salazar: inauguração da refinaria da Sacor, em Cabo Ruivo, em 1940. para a criação de uma empresa de distribuição de gás, a Combustíveis Industriais e Domésticos (Cidla). Nos primeiros anos de existência, a refinaria de Cabo Ruivo operou de forma irregular, dadas as dificuldades que a guerra trouxe à importação de crude, até que em 1943 a atividade virtualmente parou, mantendo-se abaixo da capacidade instalada até ao fim da guerra. A situação alterou-se a partir de 1948, quando a Sacor atingiu a capacidade máxima de refinação de 300 mil toneladas de petróleo por ano, e em 1950 atingiu a quota de mercado de 50% estipulada pela lei de 1938.10 A refinaria de Cabo Ruivo, depois de uma década marcada por dificuldades de expansão a que o clima internacional não foi alheio, ganhou nova força com o fim da guerra e foi ampliada em 1953 para uma capacidade máxima de 1,2 milhões de toneladas. A proteção do Estado à Sacor criou alguns problemas na emergente área dos petróleos. Manuel Boullosa, um dos principais acionistas da 10 Vicente (2002, 22-25). Nas décadas seguintes, a quota da Sacor desceu apenas ligeiramente, havendo alguma redistribuição do mercado entre as outras companhias, nomeadamente com a consolidação da posição da Sonap, que subiu a uma quota de 21% em 1975.. 23.

(24) 01 Petróleos Cap. 1.qxp_Layout 1 20/01/17 11:08 Page 24. Os Petróleos em Portugal Manuel Queiroz Pereira (1906-), fundador da Sonap e à data também administrador do Banco Espírito Santo e Comercial de Lisboa.. Sonap, ao lado de Manuel Queiroz Pereira, manifestou expressamente o seu desagrado sobre a situação, numa carta dirigida a Salazar, em que relatava as dificuldades que a proteção à Sacor impunha à expansão da Sonap.11 O presidente do Conselho tinha relações muito próximas com os principais industriais portugueses, incluindo Alfredo da Silva, Jorge e José de Mello, da CUF, António Oliveira Salazar (1889-1970) com Ricardo Espírito Santo (1900-1955) num dos encontros regulares entre os dois amigos.. Champalimaud, Cupertino de Miranda, Queiroz Pereira ou Manuel Boullosa, entre outros. Todavia, a Sacor era participada pelo Estado e haveria um interesse especial na sua proteção, o que o governo não escondia.12 Em 1955, na sequência da morte de Ricardo Espírito Santo, Salazar indicou João Pinto da Costa Leite (Lumbrales) para substituir o banqueiro na presidência do Conselho de Administração da Sacor. Costa. 11 12. Ver Castro (2009, 376-390). Ver Castro (2009).. 24.

(25) 01 Petróleos Cap. 1.qxp_Layout 1 20/01/17 11:08 Page 25. Estado e privados, 1937-1992. Jantar com fotografia: Ricardo Espírito Santo (segundo à direita da cabeceira) e Manuel Queiroz Pereira (segundo à esquerda da cabeceira).. Leite, muito próximo do ditador, era até então ministro da Presidência, tendo sido substituído por Marcelo Caetano, e presidente da Câmara Corporativa, cargo que manteve.13 A ligação entre os grupos empresariais e os governantes tinha contornos particulares. Durante um largo período, Ricardo Espírito Santo era recebido todos os domingos ao fim do dia em São Bento, para, segundo relata o próprio presidente do Conselho no seu diário, discutirem os mais diversos assuntos, desde a Sacor, de que Espírito Santo era presidente do Conselho de Administração e um dos principais acionistas, às relações com Martin Sain, outro acionista da mesma empresa, passando ainda pela TAP, pela lapidação de diamantes de Angola, pela siderurgia concedida a Champalimaud e pela construção do Hotel Ritz. Terão existido, todavia, alguns desentendimentos, não especificados na correspondência chegada aos nossos dias, mas que podiam estar relacionados com problemas com a distribuição de lucros da Sacor ou com a concorrência com a Sonap.14 13 Segundo Pereira (2005, 99n), Salazar deu a Costa Leite a possibilidade de escolha entre os cargos de governador do Banco de Portugal, administrador da Sacor ou presidente da Câmara Corporativa, tendo aquele escolhido os dois últimos cargos. Para as relações entre grupos económicos e o Estado, ver Castro (2009) e Silva, Amaral e Neves (2016). Ver também informação útil em Lisboa (2002) e Costa et al. (2010). 14 Ver Castro (2009, 14-15, 85 e 121).. 25.

(26) 01 Petróleos Cap. 1.qxp_Layout 1 20/01/17 11:08 Page 26. Os Petróleos em Portugal. Inauguração da Fábrica de Gás da Martinha da Sacor, em 1944. Ao monopólio da refinação de petróleo e à proteção na distribuição, faltava à Sacor juntar uma maior participação na indústria petroquímica, de utilização de derivados do petróleo. Em 1958, a Sacor inaugurou em Estarreja a unidade de adubos sintéticos, a Amoníaco Português, abastecida pela refinaria de Cabo Ruivo. O governo apoiou essa maior integração, embora tenha tentado colmatar alguns dos problemas decorrentes da posição favorável no mercado da petrolífera de que era acionista. Assim, em 1957, foi criada com o apoio do governo, a Sociedade Portuguesa de Petroquímica (SPP), também em Cabo Ruivo, com capitais da Sacor (55,1%), da CRGE (Companhias Reunidas de Gás e Eletricidade) (15,2%) e da CUF (9,9%), sendo o restante distribuído entre outros acionistas menores. A empresa entrou em funcionamento em 1962 com uma unidade de produção de gasogénio (ou gás de síntese), substituto do gás de hulha utilizado para produzir gás de cidade, para aproveitamento dos derivados da refinaria vizinha em Cabo Ruivo.15 Essa cooperação entre os vários operadores nacionais e internacionais no mercado voltaria a manifestar-se aquando da consulta pública para a construção de uma refinaria no Norte do país, lançada em 1961, e a que responderam a Sacor, o grupo CUF, que começara então a interessar-se pelo sector do petróleo, 15. Ver Teixeira (2010, 39).. 26.

(27) 01 Petróleos Cap. 1.qxp_Layout 1 20/01/17 11:08 Page 27. Estado e privados, 1937-1992. Sem Marcelo Caetano: inauguração da refinaria da Sacor em Matosinhos, em 1970.. a Sonap, e duas das empresas com redes de distribuição em Portugal: a Mobil e a Shell. O governo acabou por conceder a nova refinaria a uma associação entre a Sacor e a Sonap, que passaram a ter participações cruzadas, e com a «obrigatoriedade de envolvimento do grupo CUF em futuros desenvolvimentos na área da petroquímica», na qual participavam ainda a Shell e a Mobil. A refinaria foi instalada em Matosinhos, perto do Porto, no ano de 1969. No seguimento do fecho do Canal do Suez, em 1967, e do início da exploração dos petróleos em Cabinda, Angola, em 1969, o governo lançou em 1970 um concurso para a ampliação da refinaria do Norte, para a instalação de uma nova refinaria a Sul, e para o desenvolvimento da indústria petroquímica nesses dois polos. Com esta medida, pretendia-se dar prioridade à utilização e aproveitamento do petróleo que começava a ser extraído em Angola. No concurso participaram três consórcios, um formado pela Shell, Mobil, BP, Sacor e Fundação Calouste Gulbenkian, outro constituído pela CUF e pela Sonap, numa nova aliança, e prevendo a associação de um grupo internacional, e finalmente o grupo Champalimaud.16 16 Deve ainda assinalar-se que, em 1969, o grupo Champalimaud havia pedido autorização para instalar uma nova refinaria no Sul, um complexo petroquímico e uma unidade gigante de produção de amoníaco, o que marcou «a abertura pública duma disputa pelo controlo futuro do sector petrolífero, que, nos meses finais de 1970 e durante 1971, viria a encontrar os grupos CUF e Sacor em campos opostos» (Ribeiro, Fernandes e Ramos, 1987, 987-992).. 27.

(28) 01 Petróleos Cap. 1.qxp_Layout 1 20/01/17 11:08 Page 28. Os Petróleos em Portugal. À Sacor foi adjudicada a ampliação da refinaria do Norte, mediante certas condições que incluíam uma redução da quota máxima de mercado de 50% para 40%, assim que a refinaria do Sul, entregue ao consórcio Sonap/CUF, que formaram a Sociedade Portuguesa de Refinação de Petróleos (Petrosul), entrasse em funcionamento. A Petrosul deveria também lançar a Companhia Nacional de Petroquímica, promovendo assim concorrência com a Sacor.17 Em 1972 foi criada a Petrosul, que viria a ser responsável pela construção da refinaria de Sines, inaugurada em 1978. Desta vez o Estado não interveio enquanto acionista, seguindo um modelo diferente do da primeira fase da instalação da indústria em Portugal. Estas alterações viriam a ditar a perda gradual da importância da refinaria de Cabo Ruivo e, claro, do fim do domínio da Sacor no sector da refinação. No final do Estado Novo, a estrutura empresarial portuguesa era dominada por sete grupos económicos, incluindo dois grupos essencialmente industriais, a CUF e o grupo Champalimaud, e cinco controlados pelos bancos Espírito Santo, Português do Atlântico, Fonsecas & Burnay, Nacional Ultramarino e Borges & Irmão. Os grupos empresariais do país juntavam bancos de Lisboa, muito ligados ao financiamento do Estado, bancos do Porto, com uma maior participação em investimentos industriais, e empresas industriais de capitais privados ou participadas pelo Estado. Esses grupos operavam num vasto leque de sectores económicos, nomeadamente os petróleos, a petroquímica, a siderurgia, as celuloses, a construção e reparação naval, as cervejas, as oleaginosas e os tabacos.18 Entre 1969 e 1973, «completara-se a formação dos grupos financeiros portugueses no quadro de um ambicioso projeto de industrialização».19 Todavia, tinham algumas debilidades, resultantes da acrescida concorrência dos bancos internacionais, da necessidade de consolidação financeira dos grupos industriais, do fraco nível de rentabilidade sem proteção do Estado, e da sua maior exposição aos mercados internacionais para onde começaram a exportar. Em 1974, os maiores grupos empresariais em Portugal agregavam um total de 300 empresas, controlavam a totalidade dos depósitos do sector privado (não incluindo, portanto, a Caixa Geral de Depósitos), e 84,1% 17 Para uma cabal descrição das movimentações entre grupos empresarias quanto a estes negócios, ver Ribeiro, Fernandes e Ramos (1987, 996-998). 18 Ver Silva, Amaral e Neves (2016). Ver também Pintado e Mendonça (1989), Sousa e Cruz (1995) e Caeiro (2004). 19 Ver Ribeiro, Fernandes e Ramos (1987, 1016).. 28.

(29) 01 Petróleos Cap. 1.qxp_Layout 1 20/01/17 11:08 Page 29. Estado e privados, 1937-1992. do valor dos títulos em bolsa. Indicativamente, o valor do capital social destas empresas correspondia a cerca de 75% do produto interno bruto do país.20 A estes grupos deve ainda juntar-se o Banco Pinto de Magalhães.21 A concentração da propriedade e a ligação ao Estado seriam um problema político, mas não implicavam necessariamente a ausência de concorrência ou um menor grau de eficiência dos grupos empresariais, relativamente a um cenário alternativo de maior dispersão de capital.22. Grupos económicos, nacionalizações e integração A nacionalização das mais importantes empresas financeiras, industriais e de serviços, levada a cabo em Portugal, foi uma consequência direta da radicalização política que se seguiu ao golpe de Estado de 25 de Abril de 1974. Mas foi fruto, também, de um conjunto de circunstâncias que caracterizavam a economia e a política do país, assim como do contexto internacional. Uma revolução pode ter muitos caminhos, e o caminho percorrido nesse ano de 1975 esteve associado ao facto de o mundo empresarial do Estado Novo se encontrar fortemente ligado ao regime político, à existência de uma relação muito forte entre empresas industriais e financeiras, à circunstância de muitas das maiores empresas pertencerem a sectores que estavam a sofrer mais severamente a crise dos preços do petróleo, e à crise social, política e económica generalizada que então se vivia na Europa, em que as forças favoráveis a uma maior intervenção do Estado tinham algum predomínio. Muitas das empresas de maior dimensão tinham também uma forte relação com as colónias africanas, sendo por isso mais diretamente afetadas pela descolonização, o que ajudou também à intervenção do Estado.23 As nacionalizações não estavam no programa inicial de quem tinha comandado o golpe de Estado, nomeadamente o Movimento das Forças Armadas (MFA), com a exceção dos bancos emissores de Portugal, de 20 Ver Sousa e Cruz (1995, 65-66). Na fonte refere-se que os grupos «geravam quase três quartos do Produto Interno Bruto do país». Todavia, é preciso notar que se trata da comparação do valor total do capital dos mesmos grupos com o valor anual do PIB. Também não se considera a Caixa Geral de Depósitos, cujos depósitos ascendiam a cerca de 20% do total do país. 21 Ver Faria e Mendes (2011). 22 Ver Amaral (2015b) e, quanto à CUF, Silva, Amaral e Neves (2016). 23 Ver Ferreira (1993, 113).. 29.

(30) 01 Petróleos Cap. 1.qxp_Layout 1 20/01/17 11:08 Page 30. Os Petróleos em Portugal. Angola e o Banco Nacional Ultramarino, que foram tomados pelo Estado logo em setembro de 1974, mas Portugal era o único país da Europa com bancos emissores ainda com capitais privados, embora não maioritários. Com efeito, o primeiro plano sobre a ação económica dos governos do período, o «Plano Melo Antunes», de 1975, que teve a contribuição de José da Silva Lopes, Rui Vilar e Vítor Constâncio, não fazia referência a nacionalizações.24 Todavia, tudo viria a mudar rapidamente. Após a tentativa falhada do golpe de 11 de março de 1975 entrou em funções o IV Governo Provisório, com Vasco Gonçalves como primeiro--ministro. Logo nos primeiros dias, o novo governo deu início ao processo de nacionalizações, começando pela banca e seguros, tendo em vista, alegadamente, a substituição de uma «economia capitalista do tipo monopolista por um capitalismo de Estado».25 Refletindo claramente o espírito revolucionário que caracterizou o processo de transição para a democracia em Portugal, o objetivo subjacente a estas nacionalizações era o de potenciar uma «política económica posta ao serviço das classes trabalhadoras e das camadas mais desfavorecidas da população portuguesa», tal como estava exposto no Programa do Movimento das Forças Armadas. Neste sentido, considerando o «carácter estratégico» do sector dos combustíveis, visto como a «base da produção industrial e dos transportes, e, portanto, de toda a atividade económica», deu-se um importante passo no objetivo da nacionalização do sector produtivo em Portugal.26 A intenção seria assim a de pôr termo à economia corporativa do Estado Novo e dar lugar a uma economia de tipo socialista, a qual viria a ser consagrada largamente na Constituição da República de 1976.27 O ambiente político revolucionário levou a que as nacionalizações fossem feitas sem grandes cuidados políticos ou empresariais. Simplesmente, a decisão foi tomada numa assembleia do Movimento das Forças Armadas, na qual os ministros e outros responsáveis pela condução da política económica não tiveram palavra. As nacionalizações começaram pelos bancos e seguradoras, seguindo-se outras áreas, entre as quais se contavam as indústrias pesadas. A 16 de abril de 1975 foi aprovado um pacote de nacionalização das indústrias de base portuguesas, onde se incluíam quatro empresas que se dedicavam à exploração, refinação e distribuição de. 24. Uma boa análise destes conturbados meses é feita por Faria (1999, 26-35). Ver Rezola (2006, 151-153). Sobre a situação económica, ver Franco (1993, 176-189). 26 Decreto-Lei n.º 205-A/75 de 16 de abril. 27 Lopes (2002, 289). 25. 30.

(31) 01 Petróleos Cap. 1.qxp_Layout 1 20/01/17 11:08 Page 31. Estado e privados, 1937-1992. produtos petrolíferos: a Sacor, a Petrosul, a Sonap e a Cidla.28 Nacionalizaram-se as maiores empresas, ligadas aos nomes mais diretamente associados ao regime deposto. Começando a 14 de março de 1975, em 24 números do Diário do Governo foram publicados decretos que nacionalizaram 244 empresas.29 A família Champalimaud perdeu os cimentos e a siderurgia, a família Mello perdeu a CUF, a construção naval, as celuloses, a tabaqueira e a participação na refinaria de Sines, e a família Espírito Santo perdeu as cervejas, os cimentos e a Sacor. As nacionalizações abrangeram não só as grandes empresas, como as empresas por elas participadas, muitas de reduzida dimensão, ficando o Estado proprietário de um número significativo de pequenas empresas.29 As nacionalizações de 1975 têm de ser enquadradas no contexto mais alargado das políticas económicas da Europa ocidental onde não eram seguramente apanágio dos governos de esquerda. Com efeito, a seguir à Segunda Guerra Mundial em muitos países europeus, nomeadamente na Grã-Bretanha e em França, governos de partidos de diferentes cores políticas implementaram programas de nacionalização com o mesmo objetivo de criar medidas de política económica com vista à recuperação das economias. Essas nacionalizações abrangiam sectores pesados, como o carvão ou a energia. 30 Por outro lado, a Europa conheceu desde muito cedo empresas públicas em várias áreas de atividade. Por exemplo, no século XIX, os caminhos de ferro alemães eram na sua maioria propriedade dos estados e também uma das suas principais fontes de receita. Ainda atualmente os estados federados alemães detêm participações importantes em empresas de sectores diversos, como a banca ou o automóvel. Também é controlada por capitais públicos a fabricante europeia de aviões, que concorre com o gigante privado norte-americano para o lugar cimeiro na área ao nível mundial. Um outro aspeto que é preciso ter em atenção é que a segunda metade da década de 1970 e parte da seguinte foram, não apenas em Portugal, marcadas por políticas de esquerda, resultantes por um lado da crise internacional provocada pela subida dos preços do petróleo no inverno de 1973, e por outro herdeiras dos movimentos contestatários da década de. 28 Ver Martins e Rosa (1979, 9). «Nacionalizadas as indústrias-base», Diário de Lisboa, 16-4-1975, 1 e 4. 29 Ver Sousa e Cruz (1995, 68-69). 30 Ver Toninelli (2000) e Millward (2005).. 31.

(32) 01 Petróleos Cap. 1.qxp_Layout 1 20/01/17 11:08 Page 32. Os Petróleos em Portugal. Sem inauguração oficial: refinaria de Sines inaugurada em 1978.. 60, nomeadamente do maio de 1968, em França, e dos movimentos antiguerra do Vietname, nos Estados Unidos. Um dos pontos altos desse clima foi o governo de coligação entre socialistas e comunistas, em França, sob a presidência de François Mitterrand, que arrancou em 1981 com um programa de nacionalizações que incluiu o banco Paribas e um conjunto significativo de grupos industriais. No entanto, tal clima começaria a inverter-se quase ao mesmo tempo que em Portugal, sendo a eleição de Margaret Thatcher, em 1979, e a alteração da orientação de política económica do governo francês, em 1982, os seus principais marcos europeus.31 Mas as nacionalizações em Portugal foram de maior alcance e mais concentradas no tempo, o que teve implicações imediatas de grande importância para a economia portuguesa. Na verdade, é difícil medir esse impacto, embora se possam balizar as suas consequências tendo em consideração os efeitos na estrutura de gestão das empresas nacionalizadas, no seu financiamento e nas decisões quanto à força de trabalho e o investimento.32 A contextualização do período das nacionalizações em Portugal é necessária para se medir a distância daquilo que aconteceu no país relativamente ao resto da Europa, exercício que temos de estender ao período subsequente, a partir de 1988, quando se passou à fase de privatizações, mais uma vez a par do que se passava no resto do mundo. Em 1977, foram definidos por lei os sectores cuja nacionalização a Constituição de 1976 definia como irreversíveis, numa longa lista que incluía a banca e os seguros (com algumas exceções), a energia, a água, 31. Ver, entre outros, Marsh (2011). Apesar da sua relevância, não têm sido muitos os estudos sobre as nacionalizações. Ver, todavia, Sousa e Cruz (1995), e, mais recentemente, Lino (2016). Ver também Viegas (1996). 32. 32.

(33) 01 Petróleos Cap. 1.qxp_Layout 1 20/01/17 11:08 Page 33. Estado e privados, 1937-1992. os serviços postais, as telecomunicações, os transportes aéreos, os caminhos de ferro, os portos e aeroportos, e ainda as indústrias metalúrgica, de refinação de petróleo e petroquímica, de adubos e de cimentos. Em 1980, 23% do produto, 19% do emprego e 43% do investimento nacionais emanavam do sector empresarial do Estado.33 A contextualização também nos permite concluir que, apesar de as nacionalizações terem sido claramente impostas por uma situação dita revolucionária, o que conduziu à sua realização de forma apressada, sem grandes critérios, e sob uma grande convulsão, a gestão das empresas nacionalizadas acabou por não só preservar algum do valor das empresas, como por proceder a alterações estruturais que viriam a ter um impacto positivo em períodos subsequentes, inclusivamente aquando dos respetivos processos de privatização. A história das empresas que estão na génese da Galp Energia é disso um exemplo de grande importância. Um dos aspetos mais importantes da gestão das empresas nacionalizadas será talvez o facto de terem sido sujeitas a importantes processos de reestruturação quando estavam a ser preparadas as reprivatizações. Assim, os ativos que o Estado vendeu a partir de 1988 eram substancialmente diversos daqueles que o Estado nacionalizou em 1975. Essa reestruturação terá tido seguramente implicações no valor de mercado das empresas mas, mais importante, só foi possível efetuar de uma forma concentrada no tempo, em virtude de o respetivo controlo pertencer a uma única entidade. É comum considerar as privatizações como uma «reforma estrutural», mas é preciso ter em atenção que a preparação para a alienação do capital havia constituído já uma reforma assinalável de uma importante parte da estrutura empresarial portuguesa, tão ou mais determinante do que a posterior mudança de propriedade. Entre as primeiras empresas que sofreram essa reestruturação, contam-se a Unicer, Quimigal, a Portucel, a Siderurgia Nacional, a Rodoviária Nacional, a Portugal Telecom (ex-Telefones de Lisboa e Porto – TLP) e a Gás de Portugal.34 De regresso ao sector petrolífero, foi no mês de março de 1976 que, após quase um ano de estudos, foi aprovada a reestruturação das quatro empresas de exploração, refinação e distribuição de produtos petrolíferos que haviam sido nacionalizadas (a Sonap, a Sacor, a Cidla e a Petrosul), dando origem à empresa pública Petróleos de Portugal, a EP-Petrogal. 33. Ver Nunes, Bastien e Valério (2006, 4). Para uma análise das reestruturações dessas empresas, levadas a cabo entre 1987 e 1995, ver Ministério das Finanças (1995, cap. V). 34. 33.

(34) 01 Petróleos Cap. 1.qxp_Layout 1 20/01/17 11:08 Page 34. Os Petróleos em Portugal. Esta empresa manteve a sua atividade nas três áreas das anteriores quatro empresas, dedicando-se à pesquisa e prospeção de petróleo e gás natural, refinação de petróleo bruto e seus produtos, e ao transporte, distribuição e comercialização de petróleo e seus derivados.35 A fusão numa única empresa pública era uma medida que vinha a ser considerada, desde a elaboração do IV Plano de Fomento no período do marcelismo. Paradoxalmente ou não, foi no conturbado período entre 1975 e 1976 que se criaram as condições para a sua realização.36 Progressivamente, ao longo da década de 1980, a situação da indústria foi melhorando, tendo a Petrogal feito fortes investimentos na re37 finaria de Matosinhos. Adicionalmente, tirando proveito da possibilidade de endividamento das empresas públicas suportadas pelo aval do Estado, a Petrogal evitou a racionalização dos custos através da baixa de produção como se exigia perante os problemas do mercado do petróleo a que se assistia à escala mundial. De acordo com José da Silva Lopes, a Petrogal foi, de certa forma, incapaz de desenvolver um conjunto de transformações que assegurassem a competitividade das suas atividades. Perante isto, entre 1982 e 1992, o sector dos petróleos em Portugal acabou por perder peso na economia nacional. A refinação de petróleo cresceu 2,68% ao ano durante este período, mas houve uma clara diminuição da estrutura de emprego, com uma diminuição média entre –5,8% e –9,28%.38 Progressivamente, após a revisão constitucional de 1982, a política económica nacional orientou-se no sentido da economia de mercado, «substituindo as disposições de natureza mais claramente socialista do texto de 1976», ciclo que se encerrou com a terceira revisão constitucional de 1989.39 Contudo, será importante ressalvar que apesar destas transformações, «o intervencionismo do Estado na vida económica continuou a ser intenso até meados dos anos 80». Na verdade, as forças favoráveis à liberalização eram comparativamente débeis: à direita prevaleciam os interesses dos que estavam acostumados a utilizar o poder 35 Decreto-Lei n.º 217-A/76 de 26 de março. Ver Martins e Rosa (1979, 31-32) e António, Mata e Carvalho (1983, 187-190). 36 Santos (2011, 139-143). 37 Ver Lopes (2002, 312). 38 Ver Lopes (2002, 92-97). 39 Ver Lopes (2002, 291).. 34.

(35) 01 Petróleos Cap. 1.qxp_Layout 1 20/01/17 11:08 Page 35. Estado e privados, 1937-1992 do Estado para conseguir proteções, subsídios e restrições à concorrência; à esquerda estava generalizada a desconfiança em relação aos mecanismos de mercado e a convicção de que as atividades privadas careciam de ser apertadamente disciplinadas através de ações governamentais.40. A orientação política da ação dos governos do Partido Social Democrata (PSD) a partir de 1985, a juntar à estabilidade política e à adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia (CEE) – que obrigou ao desmantelamento dos sistemas protecionistas até 1992 e à diminuição do intervencionismo do Estado na atividade económica – foram um impulso fundamental para este processo.41 Assim, refletindo em grande parte o projeto de integração de Portugal na CEE, a economia portuguesa afastou-se progressivamente das propostas de intervenção do Estado no mercado, aderindo a perspetivas mais liberais. Foi um processo longo que, apesar de liberalizante, não deixou de preservar em boa parte a capacidade de influência significativa pelos governos, sobretudo em áreas consideradas estratégicas, como era o caso do sector petrolífero.42 A adesão de Portugal à CEE em 1986 forçou, definitivamente, a banca, indústria e serviços, processo a que a Petrogal não escapou. Um primeiro passo no sentido da reprivatização de vastos sectores da economia portuguesa que tinham sido nacionalizados na sequência do 11 de março de 1975 tinha já sido dado com a publicação, em julho de 1988, de uma lei que permitia a transformação de empresas públicas em sociedades anónimas de capitais públicos ou de maioria de capitais públicos, desde que ficasse salvaguardado que a maioria absoluta do capital social permaneceria nas mãos do Estado e que a representação da parte pública nos órgãos sociais fosse sempre maioritária (Lei n.º 84/88, de 20 de julho). Uma vez aprovada a alteração da Constituição, a Lei-Quadro das Privatizações (Lei n.º 11/90, de 5 de abril) estabeleceu os processos e as modalidades das reprivatizações. Na revisão de 1989 foi retirado da Constituição o princípio da irreversibilidade das nacionalizações, mas tal não aparece como um marco fundamental. A razão prende-se com o facto de a Constituição proibir a privatização das empresas públicas, mas não a concessão da sua exploração.43. 40. Ver Lopes (2002, 291). Ver Lopes (2002, 291-292). 42 Vicente (2002, 257-271). 43 Sousa e Cruz (1995, 85-88). Para a análise das privatizações, ver também Ministério das Finanças (1995 e 1999). Ver ainda Amaral (2015a) e Silva, Amaral e Neves (2015). 41. 35.

(36) 01 Petróleos Cap. 1.qxp_Layout 1 20/01/17 11:08 Page 36. Os Petróleos em Portugal. Em suma, a calendarização das privatizações poderá ter mais que ver com a capacidade de absorção do mercado, para exploração ou compra das empresas, do que propriamente com restrições de ordem constitucional. Os governos de Cavaco Silva, entre 1985 e 1995, privatizaram aquilo que era mais rentável e deixaram para depois as empresas em maiores dificuldades. Em consequência, na fase inicial as privatizações incidiram de forma esmagadora sobre a banca e os seguros: entre 1989 e 1995, do total de receitas das privatizações, 74% resultaram da venda das instituições financeiras. O resto deveu-se à venda das fábricas de cimento (11%) e de cerveja (6%), ficando um residual de 9% para todas as outras empresas envolvidas no processo. A maior parte das empresas industriais e de comunicações, nacionalizadas em 1975 e 1976, encontravam-se ainda na posse do Estado em 1993.44 Aproveitando as condições favoráveis que se viviam na altura nos mercados de capitais, os sucessivos governos optaram por privatizar essencialmente através de operações nesses mercados, e não por negociação direta ou concurso limitado, com o que se conseguiu maior transparência, participação do público e, sobretudo, um grande encaixe financeiro. Todavia, tal opção parece ter limitado a formação de núcleos fortes de investidores. Acresce que, atendendo ao otimismo financeiro do período em que foram realizadas, algumas das privatizações resultaram em negócios menos vantajosos para os investidores. Das 15 empresas cotadas nas bolsas, dez delas viram os seus valores cair, sistematicamente, a seguir à sua privatização. O Estado privatizou «bem e caro», facto a que os investidores não foram, evidentemente insensíveis, sobretudo os pequenos, refletindo-se isso na cada vez menor apetência de alguns segmentos pela compra deste tipo de ações. As receitas das privatizações foram essencialmente canalizadas para a redução da dívida pública portuguesa. Em 1993, as privatizações permitiram a redução da dívida pública de 65 para 61% do PIB. Certamente um bónus para a famosa convergência nominal com as restantes economias da CEE.45 As privatizações tiveram como justificação principal a necessidade de aumentar a eficiência económica das empresas, até então sob alçada do Estado. Alegadamente, os gestores públicos não eram capazes de empreender uma melhor gestão, para o que seria necessário a concorrência nos mercados. Todavia, algumas das mais importantes empresas vendidas pelo Estado continuaram em situação de monopólio, ou quase, no mer44 45. Sousa e Cruz (1995, 127). Ver também Toninelli (2000) e Toninelli (2008). Ver Sousa e Cruz (1995, 191).. 36.

(37) 01 Petróleos Cap. 1.qxp_Layout 1 20/01/17 11:08 Page 37. Estado e privados, 1937-1992 Sá Carneiro de visita a Sines com Jorge Gonçalves e Corrêa Gago.. cado nacional. Por isso, as privatizações não trouxeram, por si mesmas, um acréscimo significativo de concorrência em alguns sectores, como o dos telefones fixos e da eletricidade. Nestes casos, voltou-se a uma situação já conhecida antes das nacionalizações de 1975: empresas detidas por capitais privados, com preços regulados pelo Estado. Mas as privatizações tiveram dois efeitos importantes. Em primeiro lugar, através das receitas geradas para o Estado, ajudaram ao equilíbrio das contas públicas. Em segundo lugar, estimularam o desenvolvimento do mercado nacional de valores mobiliários, constituindo atualmente os títulos das empresas privatizadas mais de metade do valor das transações na bolsa. Com base na Lei n.º 84/88, a Petrogal E. P. foi transformada, por Decreto de 4 de abril (Decreto-Lei n.º 103-A/89) em sociedade de direito privado. Movido este primeiro obstáculo, no seguimento da aprovação da Lei-Quadro das Privatizações, deu-se início ao processo de privatização da Petrogal que se passa a detalhar. A justificação oficial para esta alteração era a da «salvaguarda da futura competitividade e eficiência da empresa», que seria dotada da «flexibilidade necessária à tomada de decisões nos domínios financeiro e operacional, adequando a sua capacidade de resposta à complexidade e dinâmicas próprias do mercado dos petróleos», sendo-lhe proporcionada a possibilidade de uma nova fase com um «ritmo de modernização compatível com o desenvolvimento de uma estratégia de ajustamento estrutural». A medida era enquadrada também no «expressivo avanço no processo de gradual redução do peso do Estado na economia».46 A Petrogal passava, assim, a ser uma sociedade anónima, com um capital social de 40 milhões de contos que pertenciam, na sua totalidade, ao Estado. 46. Decreto-Lei nº 103-A/89 de 4 de abril.. 37.

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Foto da capa: Torre de cracking da Sacor, Cabo Ruivo, Lisboa
Foto da capa: Torre de cracking da Sacor, Cabo Ruivo, Lisboa

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