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Poética e trajetória de vida de artistas da cidade de Ponta Grossa /PR: uma contribuição para o ensino de artes visuais

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Poética e trajetória de vida de artistas da cidade de Ponta Grossa /PR: uma

contribuição para o ensino de artes visuais

Kelly Adena1 kelly.adena@gmail.comm

UEPG/PR Ana Luiza Ruschel Nunes2

analuizaruschel@gmail.com UEPG/PR Resumo: Este artigo apresenta os resultados de um trabalho de investigação, análise e elaboração de um registro da vida pessoal e profissional de artistas da cidade de Ponta Grossa/PR, realizado em 2010. A pesquisa teve como objetivo a construção da biografia dos artistas destacando as fases e o desenvolvimento artístico da poética e a elaboração de material que possibilite o conhecimento e incentive a apreciação e o fazer artístico de alunos e público em geral bem como da participação dos mesmos em eventos artísticos da cidade. A partir de uma metodologia com abordagem qualitativa e direcionada para a História de Vida, História Oral e Autobiográfica, a pesquisa se desenvolveu a partir de entrevistas abertas e semi-estruturadas, da análise documental e do Portfólio com o armazenamento de imagens das obras através da fotografia e anotações da memória da pesquisa. O resultados destacam a trajetória artística de três artistas, sendo neste artigo abordado um deles: Marcelo Schimaneski.

Palavras-chave: História de Vida. Artes Visuais. Vida de artista.

Abstract: This article presents the results of a study of research, analysis and elaboration of a record of personal and professional life of artists from the city of Ponta Grossa/PR, carried out in 2010. The survey aimed at the construction of the biography of the artists highlighting the phases and artistic development of the poetic and the preparation of material that enables the knowledge and encourage the appreciation and the artistic students and general public as well as the participation in artistic events in the city. From a methodology with a qualitative approach and directed to the Life History, Oral History and Autobiographical, the research has developed from open interviews and semi-structured interviews, the documental analysis and portfolio with the storage of images of the works through photography and notes from the memory of the research. The results highlight the artistic trajectory of three artists, being in this article approached one of them: Marcelo Schimaneski.

Keywords: Life History. Visual Arts. Life of an Artist.

1. Introdução:

Nada existe realmente a que se possa dar o nome de Arte. Existem somente artistas. Outrora, eram homens que apanhavam um punhado de terra colorida e com ela modelavam toscamente as formas de um bisão na parede de uma caverna; hoje, alguns compram suas tintas e

1Graduada em Licenciatura em Artes Visuais. Professora Educação Básica Estado do Paraná. Aluna do Mestrado em Educação – UEPG.

Bolsista da CAPES. Participante do Grupo de Estudos e Pesquisa em Artes Visuais, Educação e Cultura – GEPAVEC-CNPq/UEPG/PR.

2 Graduada em Artes Plásticas e Doutora em Educação, Professora e pesquisadora do Programa de Pós- Graduação em Educação-M/D.

Departamento de Artes e Curso de Licenciatura em Artes Visuais-UEPG/PR, Coordenadora do Grupo de Pesquisa- GEPAVEC-CNPq/UEPG. Presidente da Federação dos Arte/Educadores do Brasil –FAEB

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desenham cartazes para tapumes; eles faziam e fazem muitas coisas. (GOMBRICH, 2008, p. 15).

Conhecer a história da arte e sua tessitura na história da humanidade revela aos olhos do espectador as relações do homem com o mundo ao longo da história. O artista, sujeito dessa história, é condutor e o organizador das mudanças ocorridas na arte, quer pelo seu caráter sensível e ligado com o mundo, quer por sua capacidade de transpor reflexões sobre a sociedade através da obra de arte.

Esta pesquisa, que faz parte da Linha de Pesquisa e do Grupo de Estudos em Artes Visuais, Educação e Cultura, GEPAVEC - CNPq/UEPG/PR, surge de uma inquietação na busca sociocultural e na preocupação relacionada à elaboração de um registro do trabalho artístico, da vida e das obras de artistas da cidade de Ponta Grossa/PR. Com uma plausível repercussão desta pesquisa na escola, transformada em conhecimento escolar que contribua para o desenvolvimento na construção do saber e fazer artístico.

O artista e sua produção são os reflexos do mundo do qual ele vive, suas obras são as transposições de um olhar artístico particular da sociedade, onde ele revela seus valores e sua personalidade. O conhecimento se torna mais significativo se vivenciado na experiência do ver, interpretar e associar. Assim, o ensino das artes visuais tendo o artista, as suas obras e as suas fases artísticas, traz consigo inúmeras estratégias de como transpor a História da Arte, suas técnicas, períodos, influências políticas, filosóficas, sociais e tudo que move o homem na constituição do fazer artístico. O professor se tornará o mediador entre artista e aluno, proporcionando que escola e a arte local estejam interligadas, que o aluno se torne conhecedor, apreciador e crítico da cultura e produção artística de sua cidade, que por meio dessa relação tão próxima entre arte e escola se desenvolva voluntariamente no aluno a necessidade de visitar exposições, galerias e eventos de arte. Desta forma, o educando em contato com a arte local, será instigado a desenvolver sua criatividade a partir do conhecimento e interpretações de diversos artistas que vivem próximos de sua realidade e compartilham as mesmas informações e acontecimentos locais. O conhecimento dos artistas locais que vivem e produzem suas obras artísticas na atualidade exerce o papel de relevar a importância da arte na sociedade, a valorização da cultura, da produção artística e demonstrar que a arte é uma necessidade do homem, que exerce funções importantes e que ela pode estar tão próxima de nós quanto possamos imaginar. Conscientizar o aluno da importância da arte como conhecimento é o caminho que deve ser percorrido para contribuir com a constituição de homens reflexivos e críticos.

Assim, objetivo geral permeia o sujeito artista, a partir da construção da história de vida pessoal e profissional de artistas da cidade de Ponta Grossa/ PR, bem como de suas autobiografias e obras, destacando as suas fases e o seu desenvolvimento artístico e poético como subsídio para elaboração de um material com as obras dos artistas com sua autobiografia, acessível para professores, alunos e público em geral.

Fundamentos teóricos e metodológicas da pesquisa

A fundamentação teórica e a metodologia de ação investigativa amparou-se em uma abordagem qualitativa por estar diretamente associada ao objeto de estudo onde o pesquisador entra em contato com o ambiente da pesquisa.

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A pesquisa qualitativa tem o ambiente natural como sua fonte direta de dados e o pesquisador como seu principal instrumento.(...) a pesquisa qualitativa supõe o contato direto e prolongado do pesquisador com o ambiente e situação que está sendo investigada, via de regra através do

trabalho intensivo de campo. (ANDRÉ ; LUDKE, 1986 p. 11).

Esta abordagem possibilita a interpretação das falas, da expressão e do comportamento do individuo da pesquisa, garantido mais veracidade e compreensão dos fatos. Sendo a pesquisa qualitativa, a metodologia adotada para o desenvolvimento da pesquisa é: a História Oral, Autobiografia e a História de Vida. A História oral e autobiográfica estabelecem uma relação, pois o individuo ao relatar a sua trajetória de vida por meio da historia oral revela suas percepções pessoais, suas afinidades, acontecimentos e sentimentos que marcaram a sua vida.

Na história oral, o investigador reúne informações orais de uma ou mais pessoas, sobre seu contexto, suas causas e efeitos. Esta colocada principalmente na memória, nas emoções, nos anseios. Segundo Marconi e Lacatos (2007, p.282) “A História Oral investiga os fatos e acontecimentos registrados na memória de pessoas de destaque na comunidade”. Meihy (2005, p. 17) apresenta história oral como um conjunto de procedimentos que podem orientar o desenvolvimento da investigação:

(...) História oral é um conjunto de procedimentos que se iniciam com a elaboração de um projeto e que continuam com a definição de um grupo de pessoas (ou colônias) a ser entrevistadas. O projeto prevê: planejamento da condução das gravações; transcrição; conferência da fita com o texto; autorização pra o uso; arquivamento e, sempre que possível, publicação dos resultados, que devem, em primeiro lugar, voltar ao grupo que gerou as entrevistas.

A Autobiografia consiste na narração da experiência vivencial do indivíduo, tanto profissional como individual. Ela é utilizada tendo em vista que o método autobiográfico tem se mostrado como opção e alternativa para fazer mediação entre a história individual e a história social do indivíduo, sendo que podemos tanto conhecer o meio social através de uma práxis pessoal, pois o indivíduo expressa de dentro de si o que o meio social reflete para ele. A Autobiografia é composta por narrativas que solicitam a trajetória de vida, neste procedimento de elaboração, a narrativa apresenta a característica de permitir a autocompreensão. (CORRÊA, 2003).

Segundo Marconi e Lakatos (2007, p. 280) a História de Vida “refere-se a uma narração em torno de determinados fatos ou fenômenos, nos quais se evidenciam valores e padrões culturais.”. Com o método de História de Vida, é possível evidenciar e interpretar as informações e obter maior conhecimento sobre a vida do sujeito, no caso, do artista. Considerada por Marconi e Lakatos (2007) como uma técnica de campo, a História de Vida possibilita que o investigador possa ter um maior domínio sobre a efetuação da entrevista, sendo que o pesquisador pode estimular o sujeito da pesquisa, a fim de que possa favorecer o surgimento de novas informações sobre a vida da pessoa.

Partindo do caráter da pesquisa, onde se faz a análise das particularidades e das trajetórias de vida dos colaboradores da investigação, os instrumentos de coletas de dados são as entrevistas abertas ou semi-estruturadas e individuais com os artistas da cidade de Ponta Grossa, PR.

Também é utilizada a Análise documental de catálogos das exposições, com ênfase na autobiografia e obras dos artistas da cidade de Ponta Grossa. Segundo André e Lüdke (1986, p. 39):

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Os documentos constituem também uma fonte poderosa de onde podem ser retiradas evidências que fundamentem afirmações e declarações do pesquisador. Representam ainda uma fonte “natural” de informação. Não são apenas uma fonte de informação contextualizadas, mas surgem num determinado contexto e fornecem informações sobre esse mesmo contexto.

E o Portfólio com armazenamento de imagens das obras de arte através de fotografia e anotações da memória da pesquisa sendo o referencial e documento do presente trabalho.

Assim, os encaminhamentos metodológicos serviram de base para efetivação desta pesquisa sobre a trajetória de vida e poética artística de artistas da cidade de Ponta Grossa /PR..

Poéticas de artistas da cidade de Ponta Grossa /PR

A partir da definição do tema e do estabelecimento dos objetivos, foi elaborado um levantamento dos artistas da cidade de Ponta Grossa/PR através de documentos presentes nos arquivos da Galeria de Artes da PROEX – UEPG (Pró-Reitoria de Extensão da Universidade Estadual de Ponta Grossa) e de indagações feitas à população da cidade de Ponta Grossa/PR.

Com a análise destes documentos e dos nomes obtidos através dos depoimentos da população, foram levantados 51 artistas plásticos da cidade de Ponta Grossa/PR. Destes artistas foram levantadas informações sobre suas produções na cidade, bem como da participação em salões e exposições. A escolha dos primeiros sujeitos a serem abordados e entrevistados na pesquisa se deu a partir dos critérios estabelecidos, a fim de que a pesquisa tivesse um ponto de partida e abordasse o que de mais relevante a cidade possui na produção em arte. Do total de artistas supostos para a pesquisa, sendo indicados como artistas locais através de indagações à população da cidade e registros das Edições das Exposições da PROEX. Após o levantamento do total de 51 artistas, foi feito, além dos critérios já nomeados, um sorteio aleatório para a construção da trajetória e vida de artista sendo sorteado um total de três artistas, sendo eles: 1º Sorteado: Marcelo Schimaneski; 2º Sorteado: Cristina Elisabete Domingues de Sá e 3º Sorteado: Celso Parubocz.

Assim, por meio da abordagem qualitativa com ênfase na história oral e utilizando como principal instrumento a entrevista individual na coleta de dados, destaca-se no trabalho de pesquisa realizado os resultados referentes a elaboração da trajetória artística de três artistas da cidade de Ponta Grossa: o artista Celso Parubocz, a trajetória da artista Cristina Elisabete Domingues de Sá e do artista Marcelo Schimaneski.. No entanto, devido as normas do presente artigo, será apresentado somente uma síntese da poética de um dos artistas para não exceder a quantidade máxima de páginas.

Marcelo Schimaneski: inspiração no campo na representação do popular

Tornei-me um artista devido um acidente de automóvel, pois a arte me ajudou a recuperar alguns movimentos de meus braços e foi uma grande terapia física e mental” .3

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Figura 1: Artista Marcelo Schimaneski em sua residência na cidade de Ponta Grossa onde mostra o portfólio sobre sua

produção artística. Fotografia de Kelly Adena Fonte: Portfólio da pesquisadora, 2010.

Construir a trajetória deste artista revelou não só os aspectos da produção artística da cidade de Ponta Grossa/PR. Desvendou-se a utilidade da arte além da representação e expressão artística, entendida nesta trajetória como fundamental na vida pessoal, profissional e como autoestima de um artista que nasce a partir da superação de limitações físicas. A expressão e a técnica se desenvolvem a partir de um tratamento de fisioterapia, que além de possibilitar a recuperação de movimentos influenciou no desenvolvimento de um artista.

Quando questionado sobre o que é ser artista, responde: “No meu caso foi ao acaso, me tornei artista depois que sofri um acidente. Existia um artista em mim que surgiu. Que usei isto para exercitar meus braços. Aí que começou o serviço de artista em mim, então foi ao acaso mesmo.” (informação verbal) 4

A partir desta concepção, trazemos aqui, a trajetória de superação e de perseverança do artista ponta-grossense Marcelo Schimaneski.

Marcelo é um artista natural de Ponta Grossa, nasceu em 18 de janeiro de 1967. Possui uma produção artística profissional e intensa de produção, participação em salões e exposições há mais de 12 anos. Sua dedicação à arte ocorreu a partir de um fato marcante em sua vida, um acidente que com emoção relatou na entrevista:

O meu acidente... Eu trabalhava numa empresa que dava assistência técnica em serrarias. Eu trabalhava no estado de São Paulo, Minas e Santa Catarina, então foi em 89 que aconteceu o acidente. Eu estava trabalhando próximo a Campinas, estávamos na estrada e o motorista dormiu no volante... uma caminhonete F1000. Então ele dormiu no volante e nós viemos a capotar (...) eu tive lesão na coluna cervical, aonde eu perdi os movimentos das mãos, das pernas... eu fiquei tetraplégico.( informação verbal)

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No ano de 2000, Marcelo começou a fazer alguns desenhos de caricatura com o lápis grafite, que tinha uma grande dificuldade de manusear. Esta prática foi na verdade uma retomada de experiência da infância. Aos dez anos de idade Marcelo começou a fazer desenhos de personagens de gibi, foi uma fase na qual descobriu que tinha afinidade e gostava do desenho. No entanto, com o passar dos anos, com o trabalho e o dia a dia, esta

4 Narrativas da entrevista com o artista Marcelo Schimaneski. 2010. 5 Narrativas da entrevista com o artista Marcelo Schimaneski.2010

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atividade foi deixada de lado. Um ano antes do acidente, em 1988, Marcelo se interessou por um pequeno curso de um mês de desenho no SENAC6, no qual aprimorou técnicas de sombreamento. O gosto pela prática artística

era um interesse que o artista possuía desde a infância, mas uma área na qual não aprofundou estudos. O artista também não possui outra formação acadêmica, o que o faz viver de sua produção artística, sendo sua fonte de renda.

Marcelo passa a se dedicar primeiramente ao desenho a partir de 2000, onde utiliza o lápis grafite como material, o que depois vai repercutir no uso da tinta:

A pintura entrou depois de 2000. Em 2000 que eu fiz alguns desenhos, (...) Eu comecei com o grafite porque eu fazia o desenho com lápis, mal podia pegar o lápis...então fazia algumas caricaturas, alguns desenhos assim, onde também me ajudou bastante, comecei com o grafite.( informação verbal). 7

Como amigo e incentivador do uso da tinta, o artista paranaense e também natural de Ponta Grossa João Carneiro é citado por Marcelo:

(...) ele é meu amigo então ele me incentivou também. Ele fez algumas listas de material para mim, mandou comprar e fazer(...) daí eu comprei e comecei a pintar, fazer os desenhos e pintar do meu jeito. Eu aprendi sozinho. E sou autodidata. Fui fazer do meu jeito de estilo próprio. Depois ele deu olhada e me incentivou mais ainda...então eu até hoje estou aí.( informação verbal) 8.

Neste trecho da entrevista, o artista também pontua ser autodidata, aprender e desenvolver a sua técnica a partir da prática, sendo um processo de autoconstrução. O uso da tinta também além do lápis grafite contribuiu com eficácia para o tratamento de Marcelo após o acidente.

Eu sofri o acidente e tinha poucos movimentos nos braços, eu não conseguia levantar os braços, então eu comecei a pintar, a me exercitar como se fosse uma fisioterapia. A levantar o braço pra pintar em cima, embaixo, esticar tudo. Então foi mais por causa disto mesmo, pra fortalecer os braços. A arte me ajudou nisso daí. (informação verbal)9.

A prática artística deste artista veio como consequência de seu tratamento. Não foi um objetivo se tornar artista. O exercício de desenhar e pintar foram primeiramente vistos como uma maneira de Marcelo recuperar seus movimentos nas mãos e nos braços, como um treinamento. Mudar a perspectiva de tratamento para produção artística ocorreu com incentivo das pessoas que passaram a apreciar os seus trabalhos.

Foi a persistência das pessoas, falam: “Continue!”. Ah! Foram incentivando, onde fui aprimorando cada vez mais. Mas foi legal mesmo as pessoas estarem incentivando, mesmo vendo um a coisa que não era bonita.. “Não, mas continue! Continue!” Mas pra incentivar mesmo. (informação verbal) 10.

Marcelo comenta que seus primeiros quadros não apresentavam uma qualidade ou uma beleza que agradava as pessoas e nem que lhe agradava. Sentia que os comentários eram mais como incentivo, que

6 Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial.

7 Narrativas da entrevista com o artista Marcelo Schimaneski, 2010. 8 Narrativas da entrevista com o artista Marcelo Schimaneski.2010. 9 Narrativas da entrevista com o artista Marcelo Schimaneski.2010 10 Narrativas da entrevista com o artista Marcelo Schimaneski.2010.

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considerou e procurou aprimorar. Os primeiros trabalhos (ver FIGURA 2) revelam a experiência com técnicas que possibilitassem efeitos de volume e perspectiva. Influenciado pela necessidade da busca da perfeição da forma e da representação, se percebe em seu trabalho de iniciante uma preocupação com os detalhes, que variam entre o formato do animal representado no lado esquerdo inferior do quadro e a representação das aves e da planta com flor que cresce ao lado da casa. A mistura e a justaposição das cores são usadas para delinear a forma e representar o volume das figuras, assim como representa as árvores e a estrada em tamanhos crescentes ou decrescentes com a intenção do efeito da perspectiva.

Figura 2: Uma das primeiras obras do artista – técnica: óleo sobre tela

Fotografia: Kelly Adena Fonte: Portfólio da pesquisadora, 2010

É visível em suas obras as mudanças que ocorreram durante sua trajetória, principalmente nos detalhes.

Teve mudança, você vê o primeiro, tinha poucos detalhes. Com o tempo fui acrescentando mais, fui vendo como é que faz as folhas, as árvores, fui colocando mais detalhes, aumentando mais. Eu levava uns cinco dias para pintar uma tela, hoje está passando acho que uns 15 dias, quase 20 dias (...). E é mais demorado então, mas é mais detalhado. Também eu participo muito de salão. Então pra salão tem que ser bastante detalhado, tem que ser umas telas bem feitas mesmo É o estilo naif. Eu estou mais conhecido como estilo naif.( informação verbal) 11.

As transformações ocorreram principalmente na evolução da técnica e da habilidade do artista em acrescentar cada vez mais detalhes em seus trabalhos. Capinando (ver FIGURA 3) apresenta uma concentração maior de detalhes. As figuras são melhores delimitadas, o artista usa mais totalidades de cores que variam entre suas matizes. Com relação a sua técnica do uso da cor o artista diz: “Eu não gosto estar misturando muitas tintas porque as tintas já vêm todas, vários tipos de verde, de azul. Então eu sou uma pessoa que não faço muita mistura.” (informação verbal). Sua técnica então não consiste em criar totalidades de cores na paleta, utiliza cores que saem do tubo da tinta sendo apenas misturadas na tela, onde causam o efeito de luz e sombra e de volume.

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Figura 3: “Capinando” – óleo sobre tela – 40x60 – 4º lugar Salão de Arte Unimed 2006

Fotografia:Kelly Adena Fonte: Portfólio da pesquisadora, 2010.

O uso de detalhes remete ao artista que o seu trabalho é considerando como Naïf. “Eu não sabia que era naïf(...) tanto que foi esse amigo, João Carneiro que falou: Não tem estilo, é naïf. É naïf porque você coloca detalhes. Daí marcou que é naïf mesmo.”( informação verbal) 12. Segundo Marcelo, é naïf porque seus

trabalhos apresentam muitos detalhes e seu modo de pintar desenvolveu-se de maneira autodidata, sem cursos ou orientações. Focamos então algo contraditório, sendo o naïf, considerado dentro do conhecimento da arte como um tipo de pintura que não segue regras acadêmicas, o trabalho do artista apresenta características que podem por em questão sobre o tipo de sua pintura. Marcelo, ao longo de sua trajetória, mesmo de maneira autodidata, aprimorou suas técnicas que resultam em trabalhos que possuem perspectiva, noções de proporção e figuras com volumes. No entanto, Marcelo é conhecido por ser considerado naïf, não apenas na cidade de Ponta Grossa, mas em outros estados, como em Piracicaba, São Paulo, quando em 2006, uma de suas obras foi selecionada para participar na Bienal Naifs – Piracicaba/SP.

Deste então, o artista participa deste evento que ocorre de dois em dois anos. A produção de Marcelo pode ser compreendida como um trabalho com muitos detalhes, cores variadas, temas populares e que expressam qualidades plásticas próprias de técnicas que evidenciam a autoconstrução de um artista local, que não busca se apropriar de técnicas acadêmicas a partir de cursos e nem do estudo da história da arte. Quando ao se referir aos acadêmicos do curso de Licenciatura em Artes Visuais da UEPG/PR, diz que:

Vocês estudam sobre isto porque eu mesmo de arte não entendo. Entendo só de tá pintando. E acho que se perguntar assim o que é estilos de pintura eu não sei nada disso aí, tem pessoas que querem vender livros para mim sobre a vida desses artistas para eu ver, conhecer. Ah! Para mim acho que não interessa, quero viver a minha arte. O que eu faço, quero dedicar a minha arte não de aprender a dos outros, quero estar aprendendo a minha mesmo. (informação verbal) 13

Neste trecho, o artista demonstra que sua prática artista é totalmente autodidata e que não quer aprofundar estudos na história da arte, pois não deseja sofrer influências que podem interferir na sua produção e

12 Narrativas da entrevista com o artista Marcelo Schimaneski.2010. 13 Narrativas da entrevista com o artista Marcelo Schimaneski.2010.

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estilo. Porém, é possível perceber mudanças ao longo de sua trajetória, como o acréscimo de detalhe que como ele afirma, desenvolveu de forma autodidata . Atualmente, Marcelo trabalha com temas populares, destacando uma temática voltada para a representação do campo.

O meu tema mais específico que eu gosto mesmo é o do campo. As vaquinhas, os cavalos, é mais isso aí. Veja: quando faço alguma coisa da cidade, se a respeito da cidadezinha, eu faço, mas o meu, que eu gosto mesmo, é o do campo. A maioria das telas minhas se for ver são do campo. (informação verba) 14.

As figuras de animais domésticos do campo, como as ‘vaquinhas’, assim chamadas pelo artista, aparecem com frequência em suas produções, bem como festas tradicionais, o cotidiano, os costumes das pessoas do campo e construções típicas e com características do interior da região da cidade de Ponta Grossa (ver FIGURA 4). Marcelo faz referências a costumes do campo que remetem ao período de sua infância. O campo é visto como um local onde ainda são preservados os costumes, a simplicidade e rusticidade dos moradores, como também o trabalho braçal.

Para participar de salões, Marcelo evita exposições com temáticas, pois considera difíceis e complicadas de trabalhar. Sente-se preso quando é proposto um tema e acredita perder a obra, pois dependendo da temática, é difícil comercializá-la depois.

Figura 4: “Casamento no dia da Festa da Colheita” – óleo sobre tela - 50x70 – Salão de Arte Câmara Municipal de Ponta

Grossa/PR Fotografia: Kelly Adena Fonte: Portfólio da pesquisadora

A temática do campo é inspirada em sua infância e em viagens que realizou, para o interior de cidades dos estados de São Paulo, Minas Gerais e Santa Catarina, desencadeando sua admiração e inspiração nas belezas singelas do campo.

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Quando eu era pequeno, trabalhava com minha tia numa chácara, então lidava com as galinhas, com vacas, cavalos, com tudo, então vem daí. Também nesse serviço que eu trabalhava viajando, que eu fazia, maior parte no interior. No interior assim, cidade pequenininha, onde tem bastante isso aí, então é uma coisa que chama muita atenção. Tem certos quadros que eu fiz, são coisas que eu passei nessas cidadezinhas, coisas que a gente guarda. Aí eu coloco nos quadros e o campo me encanta mesmo, porque é bonito. Tem campos pra você trabalhar, tem bastante coisa assim, o campo é o meu encanto, eu gosto muito das coisas do campo. (informação verbal) 15.

O artista também prefere abordar em suas representações o sítio, e como ele fala “colocar vida” em seus quadros, seja tanto pela representação de animais, pessoas ou casas bem detalhadas. A figura da araucária também é presente em seus quadros, designando sua obra como expressiva das características locais. Como materiais que trabalha, utiliza sempre a tinta a óleo, geralmente em muitas cores. A tinta a base de óleo favorece o trabalho de Marcelo, que devido ao excesso de detalhes de seus quadros, necessita de tempo para executá-los. O artista produz em sua casa, em espaços que podem variar. Os pincéis utilizados são sempre os menores como os tamanhos 0 e 00, principalmente no acabamento, onde o artista trabalha com precisão e paciência.

Quando interrogado sobre as dificuldades de ser artista, Marcelo apresenta vários aspectos. Dentre eles, é o tamanho limitado de quadros que pode trabalhar que é 50x70 cm. O artista considera um tamanho bom de tela, que geralmente usa como padrão. Trabalhou com telas maiores, mas teve dificuldades. Com o alcance dos braços e movimentos limitados, os quadros maiores não podem ser virados e posicionados com facilidade pelo artista, “tela grande dá mais dificuldade para pintar, é ruim porque têm certas coisas que eu tenho que fazer de ponta cabeça, daí não fica muito legal.” (informação verbal) 16. Outra dificuldade que o artista destaca, com

relação a ser artista na cidade de Ponta Grossa é a falta de locais para expor: “Mas a maior dificuldade mesmo aqui na cidade acho que é expor porque não tem lugar. Os lugares que nós tínhamos, foi tudo tirado, então é isso, de tá mostrando mesmo.” (informação verbal) 17.

Com mais de 150 obras, Marcelo teve em sua carreira importantes premiações, como a premiação de Incentivo a Cultura em 2008 na Bienal Naifs de Piracicaba/SP, com a obra ‘Cidade Agitada”( ver FIGURA 6), que ilustra uma ruas, pessoa, uma praça, casas, apartamentos, lojas do passado com os veículos que ganham destaque na obra por estarem localizados no centro da composição.

15 Narrativas da entrevista com o artista Marcelo Schimaneski.2010. 16 Narrativas da entrevista com o artista Marcelo Schimaneski.2010. 17 Narrativas da entrevista com o artista Marcelo Schimaneski.2010.

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Figura 6: “Cidade Agitada” – óleo sobre tela – 50x70 – Premiação de Incentivo à Cultura, na Bienal Naifs de

Piracicaba/SP, em 2008 Fonte: Portfólio da pesquisadora, 2010.

Esta é uma de suas premiações que datam desde o ano de 2006, tendo participado de mais de trinta exposições, com duas individuais, Marcelo mostrou e expôs seus trabalhos na cidade de Ponta Grossa, em cidades vizinhas como Castro, Curitiba e também fora do estado, em Piracicaba/SP. Com várias exposições, Marcelo já vendeu muitas obras, duas para o exterior, países da Alemanha e França até o momento da entrevista realizada em 2010.

O artista também reconhece importância e a influência que a participação em exposições, salões e demais eventos contribuem para a carreira e o reconhecimento do trabalho, que acaba resultando em compradores e em preços melhores. Marcelo apresenta sempre o objetivo de vender suas obras, não possui nenhum trabalho que não queira vender. Sempre procura aproveitar as obras que retornam de uma exposição recente ou que foram premiadas, se tiver compradores, pode adequar um preço significativo e vender a obra. Desta forma, o artista revela a intencionalidade de através de sua produção, adquirir lucros, quando diz o seguinte sobre sua obra: “Dá pra dizer que é uma mercadoria sim. Uma coisa que você esta sempre vendendo, comercializando, então dá para dizer que é uma mercadoria.” (informação verbal) 18. Se sua produção é

compreendida como mercadoria, quando interrogado se arte é trabalho responde:

Pra mim, no meu caso, sim. Está sendo minha profissão e conforme às vezes eu tiro até mais que meu salário, é uma dedicação também exclusiva, também um incentivo, também quando você vê numa obra aquilo incentiva, mais pessoas gostam, então é um incentivo pra gente continuar. Pra mim no caso, é um trabalho. É uma ocupação também, porque a gente sem fazer nada e deixar a mente desocupada, é ruim. (informação verbal) 19.

Marcelo também expressa sua preocupação, defende e incentiva que a arte local, como os artistas da cidade, as tendências os eventos sejam levados aos alunos nas escolas da cidade de Ponta Grossa: “Acho que

18 Narrativas da entrevista com o artista Marcelo Schimaneski.2010. 19 Narrativas da entrevista com o artista Marcelo Schimaneski.2010.

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tinha que estar divulgando mais os artistas nas escolas para desde pequenos eles estarem identificando, estarem vendo, conhecendo o que é arte mesmo.”(informação verbal) 20.

Assim, para artista Marcelo Schimaneski estudo, a análise e a busca por novas formas de arte e conhecimento são descartadas, pois prevalece a arte e a técnica puramente subjetiva, dentro de sua poética particular. Desta forma, não há o interesse em aprofundar seu conhecimento no âmbito da arte, isso refere-se ao fato de que sua pintura sendo “naïf”, realmente não pode sofrer influências acadêmicas baseadas em técnicas tradicionais o que atrapalharia a sua produção. O artista procura evitar tais aprofundamentos em conhecimento da arte, a fim de que sua produção mantenha-se fiel e digna de sua poética e técnica própria de elaboração.

Considerações

A construção das trajetórias se estendeu em uma profunda análise das falas dos sujeitos e dos documentos autobiográficos. Fez-se um estudo dos fatos para possibilitar a coerência das informações, a fim de que o trabalho revele a realidade da trajetória, da produção e das percepções do artista com relação a aspectos da sociedade e da própria arte. Destaca-se a interpretação subjetiva da pesquisadora em compreender e analisar os fatos, bem como a leitura das obras e considerações sobre a produção artística dos artistas, sempre balizada pelas narrativas orais e visuais dos artistas e documentos que deram possibilidade à construção de suas histórias pessoal e profissional de artistas, no contexto da cidade de Ponta Grossa/PR.

O processo de construção das trajetórias revelou aspectos até então desconhecidos da arte local da cidade de Ponta Grossa/PR. Ficou evidente que os três artistas abordados na pesquisa apresentam influências diferenciadas que os levaram a serem artistas. Todos viveram em um mesmo contexto local, no entanto, caminhos trilhados e direcionamentos optados acabaram por construir ao longo dos anos artistas que se diferem com relação à produção e modo de ver a arte.

Por meio dos encontros e entrevistas com o artista Marcelo Schimaneski, foi possível perceber o que movimenta e conduz a produção, a reflexão, o consumo e apreciação artística da arte da cidade na perspectiva deste artista. São informações de um indivíduo artista que vive diariamente nesta área, que dedica a vida à arte. Por isso, é possível constatar as dificuldades presentes, compreender como funciona a produção, o processo poético de criação e de elaboração das obras, o outro lado da arte a partir da visão subjetiva do artista em seu atelier, o seu cotidiano, o seu dia a dia. Foi perceptível também a preocupação do artista Marcelo Schimaneski com a cidade, a cultura e a sociedade, expressando a preocupação e o objetivo de sempre transmitir algo que possa incentivar a reflexão do espectador sobre a sociedade e a memória desta. Assim o sujeito artista por meio de sua obra de arte relaciona e une o espectador com a reflexão sobre sua existência e o seu papel na sociedade. De certa forma, o artista abre janelas, revela aspectos subjetivos da interpretação sobre a vida. Ouvir os depoimentos destas pessoas de mentes abertas e conectadas com o mundo desvenda a importância e a necessidade da arte ao ser humano.

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Por fim, este trabalho precisa ser compreendido como um material que possui um método elaborado que possibilite futuras pesquisas e aprofundamentos. Trata-se de um percurso que tomou seus direcionamentos e pode ser enfocado na conclusão de uma grande análise das trajetórias. Neste sentido, traçar a trajetórias de todos os artistas da cidade de Ponta Grossa/PR é uma proposta que fica a espera de novas oportunidades e continuidades, que aqui teve seu início e abre outras possibilidades.

Referências

ANDRÉ, M. E. D. A.; LÜDKE, M.. Pesquisa em Educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1986. CORRÊA, A. D. Ensino de Artes: trajetórias de vida com relevância para a arte- educação no Brasil. 2003, 549 f. Tese (Relatório de Pesquisa em pós Doutorado) – Universidade de São Paulo, Escola de comunicações e arte. São Paulo, 2003.

GOMBRICH, E.H. História da Arte. Rio de Janeiro. LTC, 2008.

MARCONI, M. A.; LAKATOS, E. M. Metodologia Científica. São Paulo: Atlas, 2007. MEIHY, J. C. S. B.. Manual de História Oral. São Paulo, SP. Loyola, 2005.

SCHIMANESKI, M. Narrativas da entrevista com o artista Marcelo Schimaneski. [mai, 2010].

Entrevistadora: K. Adena. Ponta Grossa: Casa do artista. 2010. 1 cd de áudio. Entrevista concedida para coleta de dados da pesquisa “Trajetórias de artistas da cidade de Ponta Grossa/PR: uma contribuição para o ensino de artes visuais na escola”.

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