G
ABRIELLAE
RLACHERL
UBE DEA
LMEIDASíndrome de Evans em pacientes com lúpus
eritematoso sistêmico juvenil
Tese apresentada à Faculdade de Medicina de São Paulo para obtenção do título de Doutor em Ciências
Programa de: Pediatria
Orientador: Prof. Dr. Clovis Artur Almeida da Silva
(Versão corrigida. Resolução CoPGr 5890, de 20 de dezembro de 2010. A versão original está disponível na Biblioteca FMUSP)
São Paulo
2017
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) Preparada pela Biblioteca da
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
reprodução autorizada
Almeida, Gabriella Erlacher Lube de
Síndrome de Evans em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico juvenil / Gabriella Erlacher Lube de Almeida. -- São Paulo, 2017.
Tese(doutorado)--Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Programa de Pediatria.
Orientador: Clovis Artur Almeida da Silva.
Descritores: 1.Lúpus eritematoso sistêmico 2.Estudos de coortes 3.Criança 4.Glucocorticoides 5.Estudo multicêntrico 6.Anemia hemolítica autoimune 7.Púrpura trombocitopênica idiopática
DEDICATÓRIA
À minha avó Zilda que dentro da sua pouca instrução e grande
sabedoria fez e refez sua vida mais de uma vez, na esperança de uma vida
AGRADECIMENTOS
À toda grande família da reumatopediatria USP pelo acolhimento incondicional, a todos os professores e profissionais de saúde dos 10 serviços de referência em Reumatologia Pediátrica do estado de São Paulo.
Aos pacientes que nos movem e ensinam todos os dias e ao grande mestre, Prof. Dr. Clóvis Artur de Almeida Silva, pela paciência e generosidade dos seus ensinamentos.
‘
Esta tese está de acordo com as seguintes normas, em vigor no momento desta publicação:
Referências: adaptado de International Committee of Medical Journals Editors (Vancouver)
Universidade de São Paulo. Faculdade de Medicina. Divisão de Biblioteca e Documentação. Guia de apresentação de dissertações, teses e monografias. Elaborado por Annelise Carneiro da Cunha, Maria Julia de A.L. Freddi, Maria F. Crestana, Marinalva de Souza Aragão, Suely Campos Cardoso, Valéria Vilhena. 3ª ed. São Paulo. Divisão de Biblioteca e Documentação: 2011.
Abreviaturas dos títulos dos periódicos de acordo com List of Journals Indexed in Index Medicus.
SUMÁRIO
Lista de Abreviaturas e Siglas Lista de Tabelas Resumo Abstract 1 INTRODUÇÃO... 1 2 OBJETIVO... 5 3 MATERIAIS E MÉTODOS... 7
3.1 Desenho do Estudo e População... 8
3.2 Síndrome de Evans... 9
3.3 Dados Demográficos, Características Clínico-Laboratoriais, Atividade da Doença, Dano Cumulativo e Tratamento... 10
3.4 Análise Estatística... 12
4 RESULTADOS... 13
5 DISCUSSÃO... 21
6 CONCLUSÕES... 26
LISTAS DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ACR= American College of Rheumatology
AHAI= Anemia hemolítica autoimune
ALPS= Síndrome linfoproliferativa autoimune
CMV= Citomegalovírus
CVID= Imunodeficiência comum variável
EBV= Vírus de Epstein-Barr
HIV= Vírus de imunodeficiência humana
LES= Lúpus eritematoso sistêmico
LESJ= Lúpus eritematoso sistêmico juvenil
PCR= Proteína C-reativa
PTI= Púrpura trombocitopênica imune
RIFLE= Risk, Injury, Failure, Loss of kidney function and End-stage kidney disease
SAF= Síndrome do anticorpo antifosfolípide
SE= Síndrome de Evans
SLEDAI-2K= Systemic Lupus Erythematosus Disease Activity Index 2000
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Características da síndrome de Evans (SE) em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico juvenil (LESJ) ao
diagnóstico... 17 Tabela 2 Dados demográficos, manifestações clínicas e escore de
atividade de doença em 850 pacientes com lúpus eritematoso sistêmico juvenil (LESJ) ao diagnóstico de acordo com a presença ou ausência de síndrome de
Evans (ES)... 18 Tabela 3 Características laboratoriais de 850 pacientes com lúpus
eritematoso sistêmico juvenil (LESJ) ao diagnóstico de acordo com a presença ou ausência de síndrome de
Evans (SE)... 19 Tabela 4 Terapêutica ao diagnóstico de 850 pacientes com lúpus
eritematoso sistêmico juvenil (LESJ) de acordo com a
Resumo
Almeida GEL. Síndrome de Evans em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico juveniL [Tese]. São Paulo: Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo, 2017.
Introdução: Estudos avaliando a prevalência de síndrome de Evans (SE) no lúpus
eritematoso sistêmico juvenil (LESJ) bem como possíveis fatores associados são restritos a poucos relatos de caso. Objetivos: Avaliar a prevalência de SE em uma grande população de LESJ, assim como sua possível associação com dados demográficos, manifestações clínicas, características laboratoriais, atividade/dano cumulativo da doença e tratamento. Métodos: Um estudo de coorte multicêntrico retrospectivo foi realizado em 10 serviços de Reumatologia Pediátrica provenientes do Grupo Brasileiro de Lúpus e incluiu 850 pacientes com LESJ. SE foi avaliada ao diagnóstico do LES e definida pela combinação de púrpura trombocitopênica autoimune (PTI) e anemia hemolítica autoimune (AHAI). Os pacientes foram divididos em dois grupos para a avaliação das associações propostas: pacientes que apresentaram SE e pacientes sem SE. Todos foram avaliados ao diagnóstico do LES. Resultados: SE foi observada em 11/850 pacientes de LESJ ao diagnostico (1,3%). A maioria deles tinha doença ativa (82%) e apresentaram manifestações hemorrágicas (58%). Todos os pacientes com SE foram hospitalizados e não houve nenhum óbito. As comparações entre pacientes LESJ com e sem SE ao diagnóstico demonstrou frequências similares do sexo feminino, envolvimento de múltiplos órgãos, perfil de auto-anticorpos semelhantes e complemento baixo (p>0,05). Pacientes com SE tinham frequências menores de eritema malar (9% vs. 53%, p=0,003) e envolvimento músculo-esquelético (18% vs. 69%, p=0,001) do que aqueles sem esta complicação. A frequência de pulsoterapia com metilprednisolona (82% vs. 43%, p=0,013) e uso de gamaglobulina endovenosa (64% vs. 3%), p<0,0001) foram significativamente maiores no grupo com SE, com dose atual de prednisona semelhante entre os dois grupos [1,1 (0,76-1,5) vs. 1,0 (0-30) mg/kg/dia, p=0,195].
Conclusões: Este foi o primeiro estudo que evidenciou a possível relação de SE
como uma manifestação inicial rara e grave do LESJ, porém com bom prognóstico. O diagnóstico se torna o principal desafio devido à falta de sinais e sintomas característicos de lúpus e a dificuldade de se excluir diagnósticos diferenciais como infecção e imunodeficiência primária.
Descritores: lúpus eritematoso sistêmico; estudos de coortes; criança;
glicocorticoides; estudo multicêntrico; Anemia Hemolítica Autoimune; Púrpura Trombocitopênica Idiopática
Almeida GEL. [Thesis]. Evans Syndrome in childhood-onset systemic lupus erythematosus. São Paulo: “Faculdade de Medicina, Universidade de São Paulo”; 2017.
Abstract
Introduction: Studies evaluating the prevalence of Evans Syndrome (ES) in
childhood-onset systemic lupus erythematosus (cSLE) as well as possible associated factors has been rarely reported and restricted to case reports.
Objectives: To evaluate the prevalence of ES in a large population of cSLE, and the
association with demographic data, clinical manifestations, laboratory characteristics, disease activity, cumulative damage, and treatment. Methods: A retrospective multicenter cohort study was performed in 10 Pediatric Rheumatology services and included 850 patients with cSLE. ES was evaluated at the diagnosis of cSLE and defined as the combination of autoimmune thrombocytopenic purpura (ITP) and autoimmune hemolytic anemia (AIHA). The patients were divided into two groups for the evaluation of the proposed associations: patients who presented ES and patients without ES. All were assessed at the cSLE diagnosis. Results: ES was observed in 11/850 (1.3%) cSLE patients. The majority of them had hemorrhagic manifestations (58%) and active disease (82%). All patients with ES were hospitalized and none died. Comparisons of cSLE patients with and without ES at diagnosis revealed similar frequencies of female gender, multi-organ involvement, autoantibodies profile and low complement (p>0.05). Patients with ES had a lower frequency of malar rash (9% vs. 53%, p=0.003) and musculoskeletal involvement (18% vs. 69%, p=0.001) than those without this complication. The frequencies of intravenous methylprednisolone (82% vs. 43%, p=0.013) and intravenous immunoglobulin use (64% vs. 3%, p<0.0001) were significantly higher in the former group, with similar current prednisone dose between groups [1.1 (0.76-1.5) vs. 1.0 mg/kg/day (0-30), 0.195]. Conclusions: This was the first study that evidenced the possible relationship of ES as a rare and severe initial manifestation of cSLE, but with a good prognosis. Diagnosis becomes the main challenge due to the lack of signs and symptoms characteristic of lupus and the difficulty of excluding differential diagnoses such as infection and primary immunodeficiency.
Descriptors: lupus erythematosus, systemic; Cohort studies; child; glucocorticoids;
multicenter study, Anemia, Hemolytic, Autoimmune; Purpura, Thrombocytopenic, Idiopathic
Introdução 2
Lúpus eritematoso sistêmico (LES) juvenil (LESJ) é uma doença
autoimune rara caracterizada pelo envolvimento de vários órgãos e
sistemas1-3. Embora na maioria das vezes seja diagnosticado na idade adulta, cerca de 15 a 20% dos casos ocorre em crianças e adolescentes,
cujas manifestações acontecem de forma mais grave4,5.
A sua etiopatogenia permanece desconhecida. No entanto, hoje
sabe-se que a combinação de vários fatores, em pacientes geneticamente
predispostos, tais como: infecções, drogas, imunodeficiências primárias,
fatores hormonais e ambientais podem desencadear alterações nos
mecanismos imunorreguladores responsáveis pelas manifestações clinicas e
alterações laboratoriais do LESJ4,5.
A incidência anual do LESJ nos Estados Unidos é estimada em 0,4 a
0,6 casos/100.000 crianças e adolescentes6, sendo excepcional antes dos cinco anos de idade7. Há predileção pelo gênero feminino e a proporção varia de 4:3 em pacientes com idade de início do LESJ durante a primeira
década de vida a 9:1 e com início durante a segunda década de vida8. Pacientes com LESJ tem maior probabilidade de ter complicações
graves decorrentes do LES do que os adultos, incluindo nefrite, pancreatite,
miocardite, síndrome de ativação macrofágica e envolvimento
neuropsiquiátrico. Como consequência da doença ativa e com maior
gravidade, esses pacientes necessitam maiores doses de glucocorticoides e
ciclofosfamida, o que aumenta o risco de morbidade e mortalidade
Introdução 3
Os três principais comprometimentos na apresentação e no
diagnóstico da doença são constitucionais, cutânea e articular. Sinais e
sintomas constitucionais podem ser as primeiras manifestações da doença,
tais como: febre, perda de peso, linfadenopatia difusa, hepatomegalia e
esplenomegalia4,5.
Ao diagnostico, as principais alterações evidenciadas a urina tipo I
nos pacientes com LESJ são: proteinúria acima de 0,5 g/dia, hematúria,
leucocitúria e cilindrúria. Outras manifestações da doença no momento do
diagnóstico e associadas habitualmente as formas mais graves, como
glomerulonefrite proliferativa difusa e focal são: hipertensão arterial
sistêmica, insuficiência renal aguda e insuficiência renal crônica4,5.
Na população de LESJ, manifestações hematológicas foram relatadas
em 34% a 86%2, 3, 9-12 dos pacientes sendo as mais frequentes: anemia de doença crônica11, púrpura trombocitopênica imune (PTI)13,14, anemia hemolítica autoimune (AHAI)9,11,12,14, púrpura trombocitopênica trombótica11,
14-16
e síndrome do anticorpo antifosfolípide11,14,17,18.
Síndrome de Evans (SE) é uma manifestação incomum, caracterizada
pela destruição autoimune das hemácias e plaquetas levando ao
aparecimento concomitante ou sequencial de PTI e AHAI19-22. Esta associação tem sido relacionada à atividade da doença grave em pacientes
adultos com LES, particularmente no início da doença21,23,24.
Essa síndrome foi raramente descrita em pacientes com LESJ,
Introdução 4
entanto, a prevalência dessa manifestação na população de LESJ bem
como seus possíveis fatores associados, ainda não foi estudada.
A ausência de estudos sobre a prevalência de SE em pacientes
brasileiros com LESJ, bem como sua associação com características da
doença e dos pacientes, utilizando uma expressiva população de pacientes
com LESJ, torna este estudo de relevante impacto para a Reumatologia
Pediátrica.
A hipótese do presente estudo foi que pacientes com LESJ
apresentam SE no inicio da doença associada a doença ativa, com
Objetivos 6
1. Avaliar a prevalência de SE em pacientes com LESJ ao
diagnostico.
2. Avaliar a possível associação entre a presença de SE em
pacientes com LESJ com: dados demográficos, características
clínico-laboratoriais, atividade/dano cumulativo da doença e
Materiais e Métodos 8
3.1. Desenho do Estudo e População
Este estudo se desenvolveu como uma coorte retrospectiva
multicêntrica, proveniente do Grupo Brasileiro de Lúpus Eritematoso
Sistêmico Juvenil, que incluiu inicialmente avaliação de 1.017 pacientes
acompanhados em 10 serviços de referência em Reumatologia Pediátrica do
estado de São Paulo (Unidade de Reumatologia Pediátrica do Instituto da
Criança do Hospital das Clínicas da FMUSP; Setor de Reumatologia
Pediátrica do Departamento de Pediatria da UNIFESP; Setor de
Reumatologia do Departamento de Pediatria da Santa Casa de Misericórdia
de São Paulo; Serviço de Imunologia, Alergia e Reumatologia do
Departamento de Puericultura e Pediatria da Faculdade de Medicina de
Ribeirão Preto – Universidade de São Paulo; Disciplina de Reumatologia Pediátrica da Universidade Estadual Paulista UNESP – Botucatu; Unidade de Reumatologia Pediátrica da Universidade Estadual de Campinas;
Disciplina de Reumatologia da FMUSP; Unidade de Reumatologia Pediátrica
da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; Unidade de Reumatologia
Pediátrica do Hospital Municipal Infantil Menino Jesus; Serviço de
Reumatologia Pediátrica do Hospital Infantil Darcy Vargas).
Cento e sessenta e cinco pacientes foram excluídos devido a:
prontuários incompletos (n=96), doença do tecido conjuntivo indiferenciada
com 3 ou menos critérios do American College of Rheumatology (ACR)27 (n=43), lúpus cutâneo isolado (n=11), lúpus neonatal (n=8), lúpus induzido
Materiais e Métodos 9
de LESJ (n=2). Portanto, o grupo de estudo final foi composto por 850
pacientes com LESJ.
Todos os pacientes preencheram os critérios de LES do ACR antes
dos 18 anos de idade28 e tiveram seguimento até a idade máxima de 25 anos incompletos. O estudo foi aprovado localmente pelos Comitês de Ética
em pesquisa de cada instituição envolvida.
Um workshop com os pesquisadores participantes foi realizado em 29
de setembro de 2012, a fim de garantir um preenchimento uniforme do
banco de dados e padronizar definições relacionadas às variáveis em
estudo. Os dados foram coletados entre novembro de 2012 e outubro 2014.
Os prontuários dos pacientes foram cuidadosamente analisados de
acordo com um extenso protocolo, incluindo dados demográficos,
características clínicas, dados laboratoriais, tratamento recebido, resultados
obtidos e características da SE. Pacientes com e sem SE (avaliados ao
diagnostico) foram divididos em dois grupos para estudo das características
clínicas, laboratoriais e de tratamento relativos ao LESJ.
3.2. Síndrome de Evans
SE foi definida pela combinação de PTI e AHAI19-21. A trombocitopenia foi definida de acordo com a contagem de plaquetas < 100.000/mm3 em duas ou mais vezes na ausência de infecções ou uso de medicações. AHAI
foi definido como anemia (hemoglobina < 10 g/dL) e sinais de hemólise
Materiais e Métodos 10
como teste de antiglobulina direta)27. O protocolo incluiu a avaliação das seguintes variáveis no grupo com SE: idade ao início da SE, duração total da
SE, intervalo entre AHAI e PTI, necessidade de transfusões de sangue e/ou
plaquetas, presença e localização de hemorragias, mielograma e
tratamentos prescritos. Foram avaliadas sistematicamente a infecção por
vírus de Epstein-Barr (EBV), citomegalovírus (CMV) e vírus de
imunodeficiência humana (HIV) em pacientes com SE. A síndrome
linfoproliferativa autoimune (ALPS) foi definida pela presença de
linfadenopatia crônica benigna e/ou esplenomegalia e confirmada por
citometria de fluxo de linfócitos T TCRαβ+ duplamente
negativos29. Imunodeficiência comum variável (CVID) foi descartada de acordo com as manifestações clínicas e da análise quantitativa de
imunoglobulinas soro (IgG, IgA e IgM)30.
3.3. Dados Demográficos, Características Clínico-Laboratoriais, Atividade da Doença, Dano Cumulativo e Tratamento
Os dados demográficos incluíram gênero, raça, idade atual, idade de
início do LESJ e duração da doença. Manifestações clínicas do LESJ foram
definidas como: sintomas constitucionais (febre e perda de peso),
acometimento do sistema retículo-endotelial (adenomegalia, hepatomegalia
e esplenomegalia), lesões muco-cutâneas (eritema malar ou discoide,
fotossensibilidade, úlcera oral, alopecia e vasculite cutânea: ulceração,
Materiais e Métodos 11
musculoesquelético (artrite não erosiva e miosite), serosite (pleurite e pericardite), nefrite (proteinúria ≥ 0,5 g/24h, presença de cilindros celulares, hematúria persistente ≥5 hemácias por campo e leucocitúria persistente ≥5 leucócitos por campo), alterações hematológicas [leucopenia (contagem de
leucócitos < 4.000/mm3), neutropenia (contagem de neutrófilos < 1.500/mm3) e/ou linfopenia (linfócitos < 1.500/mm3) em duas ou mais ocasiões, na ausência de drogas ou infecções] e manifestações hemorrágicas (hematúria ≥ 5 hemácias por campo, petéquias, hematomas/equimoses, epistaxe, sangramento gengival e hemorragia digestiva).
Avaliação das 19 síndromes neuropsiquiátricas do LESJ foi realizada
de acordo com os critérios de classificação do ACR31. Síndrome do anticorpo antifosfolípide (SAF) foi diagnosticada de acordo com a presença
de trombose arterial ou venosa associada à positividade de pelo menos um
dos anticorpos antifosfolípides18. Hipertensão arterial foi definida como pressão sistólica ou diastólica maior ou igual ao percentil 95 para gênero,
idade e peso em 3 ou mais ocasiões32. Lesão renal aguda foi determinada pelo aumento súbito na creatinina sérica acima de 2 mg/dl ou segundo os
critérios modificado do Risk, Injury, Failure, Loss of kidney function and
End-stage kidney disease (RIFLE)33,34 e doença renal crônica foi definida como anormalidades estruturais ou funcionais do rim com duração ≥ 3 meses (com ou sem diminuição da taxa de filtração glomerular) ou taxa de filtração glomerular <60 ml/min/1,73m2 com duração ≥ 3 meses35
.
A avaliação laboratorial incluiu velocidade de hemossedimentação
Materiais e Métodos 12
séricas, urina I e proteinúria de 24 horas. Níveis de complemento (C3, C4 e
CH50), anticorpo DNA nativo, anticorpo Ro/SSA, anticorpo
anti-La/SSB, anticorpos anticardiolipina (IgG e IgM) e anticoagulante lúpico foram
realizados em cada centro, e os valores de normalidades foram
estabelecidos de acordo ao fabricante e sugerido em cada teste. A atividade
da doença foi mensurada através do Systemic Lupus Erythematosus
Disease Activity Index 2000 (SLEDAI-2K), que pode variar de 0 a 10536. Também foram obtidos dados sobre realização de esplenectomia,
plasmaférese e o tratamento atual (prednisona, pulsoterapia com
metilprednisolona, difosfato de cloroquina, sulfato de hidroxicloroquina,
metotrexato, azatioprina, ciclosporina, micofenolato mofetil, ciclofosfamida
endovenosa, gamaglobulina endovenosa e rituximabe).
3.4. Análise Estatística
Os resultados foram apresentados como número (%) para variáveis
categóricas e mediana (variação) ou média ± desvio padrão para variáveis
contínuas. As variáveis categóricas foram comparadas através do teste do
qui-quadrado de Pearson ou teste exato de Fisher. As variáveis contínuas
dos pacientes com LESJ com e sem SE foram comparadas pelo teste t ou
teste de Mann-Whitney. Os níveis de significância foram fixados em 5%
Resultados 14
SE foi observada em 11/850 (1,3%) pacientes com LESJ ao
diagnóstico. Nenhum dos pacientes com LESJ e SE tinha infecções como
HIV, CMV e EBV, síndrome de ativação de macrofágica, câncer,
linfadenopatia crônica benigna e/ou esplenomegalia, nem diminuição dos
valores de imunoglobulinas séricas (IgG, IgM e IgA) ou imunodeficiência
primária. Portanto, ALPS29 e CVID30 também foram
excluídos. Características da SE em LESJ ao diagnóstico são ilustradas na
Tabela 1. No momento do diagnóstico, PTI e AHAI foram vistos
simultaneamente em 9/11 casos e sucessivamente em 2/11 (em um caso
PTI precede o diagnóstico de LESJ e em outro AHAI). Manifestações
hemorrágicas foram observadas em 10/11 pacientes (Tabela 1). Todos eles
tinham anemia (hemoglobina < 10 g / dL) e as apresentações hemorrágicas
mais comuns foram hematúria (7/11), petéquias (5/11),
hematomas/equimoses (4/11), epistaxe (3/11), sangramento gengival (3/11)
e hemorragia digestiva (5/11).
Dados demográficos, manifestações clínicas e escore de atividade da
doença ao diagnóstico dos 850 pacientes com LESJ de acordo com a
presença do SE são mostrados na Tabela 2. Comparações entre pacientes
com LESJ com e sem SE revelaram menores frequências de eritema malar
(9% contra 53%, p=0,003) e envolvimento musculoesquelético (18% vs.
69%, p=0,001) devido à artrite (18% vs. 68%, p=0,001) (Tabela 2). Atividade da doença elevada (SLEDAI-2K ≥ 6) foi observada em 9/11 casos de LESJ com SE e 706/768 sem SE, sendo a mediana de SLEDAI 13 e 15,
Resultados 15
atividade da doença foram semelhantes em ambos os grupos (p>0,05,
Tabela 2).
Características laboratoriais ao diagnóstico de 850 pacientes com
LESJ de acordo com a presença do SE são ilustrados na Tabela 3. Em
pacientes com LESJ sem SE, 20% dos pacientes tinham AHAI e 14% dos
pacientes tinham PTI. As medianas da hemoglobina [7,4 (5,4-9,4) vs. 10,3
(3,5-16,4) g/dL, p<0,001] e plaquetas [27 (15-54) vs. 231 (2-761) x10³/mm³,
p=0,005] foram significantemente menores no grupo de pacientes com SE
em comparação com pacientes sem SE. Considerando que a contagem de
linfócitos foi significante maior em pacientes com SE [1,8 (1-2,38) vs. 1,16
(0,07-7) x10³/mm³, p<0,001] (Tabela 3), nenhum dos pacientes SE teve
leucopenia, neutropenia, e dois tiveram linfopenia. O teste de Coombs foi
positivo em 170/839 casos de LESJ sem SE, sendo que 165/170
apresentaram AHAI e 5/170 não apresentava anemia (hemoglobina > 10
g/dL). Em pacientes com SE, a mediana de bilirrubina indireta foi 1,5 mg/dL
(0,27-2.8), DHL foi 447,5 mg/dL (252-694) e reticulócitos foi de 2,9%
(2,5-9.5). Haptoglobina e anticorpos antiplaquetários não foram
realizados. Mielograma foi realizado em 10/11 de pacientes com SE e
revelou hiperplasia de precursores eritroides e megacariócitos em 5/10
resultados.
As modalidades de tratamento utilizadas ao diagnóstico dos 850
pacientes com LESJ de acordo com a presença do SE são ilustrados na
Tabela 4. Ao diagnóstico nos pacientes com LESJ, todos os pacientes com
Resultados 16
pacientes sem SE, (p<0,0001). Transfusão de plaquetas foi indicada em
6/11 (54%) pacientes com LESJ e SE devido a sangramento ativo, enquanto
transfusão de concentrado de hemácias foi indicada em quatro pacientes
(Tabela 1). O tratamento de primeira escolha para a SE foi glicocorticoide
e/ou gamaglobulina endovenosa (n=11/11) sendo que em 6/11 pacientes
não-responsivos ao primeiro tratamento receberam também azatioprina
(n=3) e/ou ciclofosfamida endovenosa (n=4). Durante o seguimento desses
pacientes, 7/11 receberam antimaláricos e nenhum foi tratado com o danazol
ou rituximabe nem foram submetidos a plasmaférese ou esplenectomia. Em
relação aos pacientes LESJ sem SE, plasmaférese foi necessária em 24/839
(3%), rituximabe foi prescrito para 9/839 (1%), danazol para 3/839 (0,3%) e
esplenectomia realizada em 2/839 (0,2%) pacientes.
As frequências do uso da metilprednisolona (82% versus 43%,
p=0,013) e de gamaglobulina endovenosa (64% vs. 3%), p<0,0001) foram
significantemente maiores no grupo com SE. A mediana da dose atual de
prednisona foi similar entre os grupos [1,1 (0,76-1,5) vs. 1,0 mg/kg/dia
(0-30), p=0,195]. A mediana de duração das citopenias em pacientes de LESJ
e SE foi de 4 meses (1-12). Nenhum de dos casos de SE apresentou
recorrência da PTI, AHAI ou foi a óbito. O tempo médio de acompanhamento
foi significantemente menor no grupo com SE em comparação com
pacientes sem SE [31 (4-86) vs. 55 (0-281) meses, p=0,01]. Não foi
observada diferença na mediana do SLEDAI-2K na última visita
ambulatoriais em ambos os grupos [2 (0-23) vs. 2 (0-45), p=0,763].
Resultados 17
Tabela 1 - Características da síndrome de Evans (SE) em pacientes com lúpus eritematoso sistêmico juvenil (LESJ) ao diagnóstico
Paciente Intervalo entre AHAI e PTI, meses Manifestação hemorrágica Transfusão de hemácias Transfusão de plaquetas Tratamento medicamentoso
1 0 HD, HE Não Não PD, AM, MP, CFE, GGE
1 0 HD, HE Não Não PD, AM, MP, CFE, GGE 3 0 PT, EQ, EP, HE Não Sim PD, AM, MP, CFE 4 30** SG, PT, EQ, HE Não Não PD, AZA, MP
5 0 PT, HE Não Não PD, AM
6 0 HD Sim Sim PD, GGE, MP
7 0 EP, SG, HD, PT, EQ
Sim Sim PD, AM, AZA, GGE, MP
8 0 Ausente Não Não PD, MP, GGE
9 0 EP, HE Não Não PD, AM, AZA, GGE, MP,
CFE
10 0 HD, SG Não Sim PD, GGE, MP
11 0 EP, PT, EQ, HE Sim Sim PD, AM, GGE, MP, CFE AHAI – anemia hemolítica autoimune, PTI – trombocitopenia imune, PD - prednisona, AM -
antimaláricos, GGE – gamaglobulina endovenosa, MP – pulsoterapia com metilprednisolona, CFE – ciclofosfamida endovenosa, AZA - azatioprina, PT- petéquias, EP – epistaxe, SG – sangramento gengival, HD – hemorragia digestiva EQ - equimoses/hematomas, HE – hematúria, *AHAI precede PTI, **PTI precede AHAI.
Resultados 18
Tabela 2 - Dados demográficos, manifestações clínicas e escore de atividade de doença em 850 pacientes com lúpus eritematoso sistêmico juvenil (LESJ) ao diagnóstico de acordo com a presença ou ausência de síndrome de Evans (ES)
Variáveis Com SE (n=11) Sem SE (n=839) P Dados demográficos Gênero feminino, n=850 10/11 (91) 720/839 (86) 720/839 (86) Caucasianos, n=828 9/11 (81) 582/817 (71) 582/817 (71) Idade ao diagnóstico de LESJ, anos, n=845 13 (6,83-14,6) 11,83 (0,25-17,8) 11,83 (0,25-17,8)
Manifestações clínicas
Sintomas constitucionais, n=850 5/11 (45) 540/839 (60) 0,364
Febre, n=835 4/11 (36) 453/824 (55) 0,239
Perda de peso, n=820 2/11 (18) 252/809 (31) 0,518 Comprometimento do sistema reticuloendotelial n=850 1/11 (36) 282/839 (34) 1,000 Adenomegalia n=823 1/11 (9) 166/812 (20) 0,704 Hepatomegalia, n=829 3/11 (27) 178/818 (21) 0,703 Esplenomegalia, n=829 1/11 (9) 75/818 (9) 1,000 Comprometimento mucocutâneo, n=850 6/11 (54) 644/839 (76) 0,142 Artrite, n=848 1/11 (9) 447/829 (53) 0,003 Miosite, n=849 0/11 (0) 36/831 (4) 1,000 Serosite, n=850 3/11 (27) 376/831 (45) 0,362 Pleurite, n=844 3/11 (27) 280/833 (34) 0,759 Pericardite, n=844 3/11 (27) 256/829 (31) 1,000 Comprometimento neuropsiquiátrico, n=850 1/11 (9) 169/831 (20) 0,704 Sistema nervoso central, n=850 2/11 (18) 576/839 (69) 0,001
Sistema nervoso periférico, n=850 2/11 (18) 566/837 (68) 0,001
Nefrite, n=834 0/11 (0) 34/830 (4) 1,000
Outros 3/11 (27) 238/839 (28) 1,000
Hipertensão arterial, n=838 1/11 (9) 149/833 (18) 0,699 Insuficiência renal aguda, n=837 2/11 (18) 165/833 (20) 1,000 Insuficiência renal crônica, n=833 3/11 (27) 211/839 (25) 1,000 Atividade de doença
SLEDAI-2K, n=779 13 (1-29) 15 (0-58) 0,585
SLEDAI-2K 6, n=779 9/11 (82) 706/768 (92) 0,227 Resultados expressos em n (%) ou mediana (intervalo), SLEDAI-2K - Systemic Lupus Erythematosus Disease Activity Index 2000.
Resultados 19
Tabela 3 - Características laboratoriais de 850 pacientes com lúpus eritematoso sistêmico juvenil (LESJ) ao diagnóstico de acordo com a presença ou ausência de síndrome de Evans (SE)
Variáveis Com SE
(n=11)
Sem SE
(n=839) P
Exames laboratoriais
Teste de Coombs positivo 11/11 (100) 170/839 (20) <0,0001
Hemoglobina g/dL 7,4 (5,4-9,4) 10,3 (3,5-16,4) <0,001 Neutrófilos x10³/mm³ 2,6 (1,84-5,47) 3 (0,22-15,3) 0,49 Linfócitos x10³/mm³ 1,8 (1-2,38) 1,16 (0,07-7) 0,005 Plaquetasx10³/mm³ 27 (15-54) 231 (2-761) <0,001 VHS ≥ 20 mm/1a /h, n=716 7/8 (87) 601/709 (85) 1,000 PCR ≥ 0.5 mg/dL, n=513 6/7(85) 344/506 (68) 0,440 Hematúria, n=823 7/11 (64) 358/812 (44) 0,231 Cilindrúria, n=820 2/11 (18) 172/809 (21) 1,000 Proteinúria, n=802 5/11 (45) 368/791 (46) 0,944 C3, C4 e/ou CH50 baixo, n=850 7/11 (64) 523/839 (62) 1,000 Autoanticorpos Anti-ds-DNA, n=799 7/11 (64) 551/788 (70) 0,742 Anti-Ro/SSA, n=593 1/11 (9) 186/582 (32) 0,186 Anti-La/SSB, n=579 0/11 (0) 80/568 (14) 0,376 Anticardiolipina IgM, n=496 4/10 (40) 110/486 (23) 0,248 Anticardiolipina IgG, n=494 5/10 (50) 129/484 (27) 0,144 Anticoagulante Lúpico, n=416 4/10 (40) 62/406 (15) 0,057
Resultados expressos em n (%) ou mediana (intervalo), VHS – velocidade de hemossedimentação, PCR proteína C-reativa.
Resultados 20
Tabela 4 - Terapêutica ao diagnóstico de 850 pacientes com lúpus eritematoso sistêmico juvenil (LESJ) de acordo com a presença ou ausência de síndrome de Evans (SE)
Variáveis Com SE (n=11) Sem SE (n=839) P Glicocorticoide Prednisona, n=828 11/11 (100) 759/817 (93) 1,000 Dose atual, mg/kg/dia, n=727 1,1 (0,76-1,5) 1,0 (0-30) 0,195 Pulsoterapia com metilprednisolona, n=819 9/11 (82) 350/808 (43) 0,013
Antimaláricos, n=836 7/11 (64) 452/825 (55) 0,762 Difosfato de cloroquina, n=821 5/11 (45) 245/810 (30) 0,325 Sulfato de hidroxicloroquina, n=822 2/11 (18) 212/811 (26) 0,737 Imunossupressores, n=850 6/11 (54) 273/839 (32) 0,192 Azatioprina, n=837 3/11 (33) 99/826 (12) 0,140 Ciclosporina, n=837 0/11 (0) 8/826 (1) 1,000 Metotrexato, n=838 0/11 (0) 35/827 (4) 1,000 Micofenolato mofetil, n=836 0/11 (0) 9/825 (1) 1,000 Ciclofosfamida, n=839 4/11 (36) 141/828 (17) 0,105 Gamaglobulina endovenosa, n=843 7/11 (64) 24/832 (3) <0,0001
Discussão 22
Este foi o primeiro estudo multicêntrico que demonstrou que a SE foi
uma manifestação rara e grave no início LESJ, sendo muitas vezes um difícil
diagnóstico devido à ausência de manifestação típica dessa doença.
Síndrome de Evans é caracterizada pela destruição imunomediada de
linhagens de células hematológicas e a combinação de anemia hemolítica
com teste de Coombs positivo e PTI19,24,37,38. Esta condição pode estar associada a mecanismos imunes humorais e celulares39.
Apesar do fato que AHAI ou PTI isoladas serem manifestações
comuns no lúpus, SE tem sido raramente relatada em LESJ12,14,25,26,40 ou em adultos com LES21,23,24,41. A ocorrência de SE foi observada em 2,7-10% dos pacientes adultos com LES21,24e 8,4-10% dos pacientes com LESJ14,40. A baixa frequência de SE nessa pesquisa, contrastando com estudos anteriores canadenses14, 40, pode sugerir diferentes polimorfismos genéticos e alteração particulares do sistema imunológica nesta população brasileira com LESJ.
Um estudo de meta-análise entre as diferenças entre LESJ e adultos com LES observou que alterações hematológicas autoimunes (AHAI e PTI)
foram significantemente mais frequentes no primeiro grupo 42. Demonstrou-se no preDemonstrou-sente estudo que SE ocorreu mais frequentemente no início da
doença, embora estas manifestações autoimunes órgão-específicas também
possam estar presentes durante o curso da doença41,43. Na presente coorte, a maioria dos pacientes apresentaram SE no momento do diagnóstico e
Discussão 23
Vários mecanismos estão envolvidos na desregulação imunológica do
LES incluindo tolerância anormal de células B central e periféricas, aumento
da apoptose44, células auto-reativas e autoanticorpos 45, podendo estar relacionados também a patogênese da SE. Além disto, imunodeficiência
primaria citopênica aparenta ser exclusivamente mediada por autoanticorpos
devido ao comprometimento da maturação de células B46. Até o presente momento, não há associação de ALPS com LES47 e há apenas raros relatos de casos de CVID associados com esta doença sistêmica41,48.
Surpreendentemente no momento do diagnóstico pacientes com
LESJ e SE apresentaram baixas frequências de manifestações comuns de
lúpus (cutâneas e musculoesqueléticas). Estes aspectos podem dificultar o
diagnóstico do LESJ, mimetizando assim outros diagnósticos diferencias,
tais como: como infecções agudas/crônicas, imunodeficiências primárias,
câncer ou outras doenças autoimunes.
Um outro aspecto relevante foi que a recorrência da SE não foi
observada em pacientes LESJ, sugerindo remissão completa contínua.
Assim como, não houve óbitos entre esses pacientes, contrastando com
outras series de casos de SE na faixa etária pediátrica sem a associação
com LES49,50. De fato, estudos multicêntricos avaliando citopenias na infância relataram que em torno de um terço dos pacientes pediátricos com
SE não apresentaram recorrência22 e 10% destes evoluíram ao óbito antes dos 14 anos de idade51. Além disso, SE e outras citopenias autoimunes associadas ALPS parecem ser ter uma evolução tormentosa, com risco
Discussão 24
Serão necessários estudos adicionais para determinar se há alguma
alteração fisiopatológica ou se o uso de drogas imunossupressoras
concomitantes ou de antimaláricos contribuirá para a ausência de recidiva e
boa evolução dos pacientes com SE e LESJ.
Além disso, a ausência da neutropenia em pacientes com SE e LESJ
sugere que a neutropenia autoimune não é um mecanismo relevante nesta
doença.
O perfil de autoanticorpos não diferiu entre pacientes LESJ com e
sem SE e a maior ocorrência de anticorpos antifosfolípides não atingiu
significância estatística, apesar de um relato de caso de síndrome de
anticorpo antifosfolípide associada com SE17,53.
Glicocorticoide e gamaglobulina endovenosa foram o tratamento de
primeira linha para pacientes com SE24,38. Nos casos graves e refratários deste estudo foram utilizados também os imunossupressores26,37,38.
Dentre os pontos positivos deste estudo destacam-se: expressiva
amostra de uma população com LESJ seguida em 10 centros universitários
do estado de São Paulo e o uso de um banco de dados padronizado,
minimizando assim a possibilidade de viés. Além disso, causas secundárias
de citopenias autoimunes, como infecções, imunodeficiências primárias e
malignidades foram excluídos13,15,29,30,54,55. No entanto, a limitação do presente estudo fundamentou-se no modelo retrospectivo, e na ausência de
pesquisa de autoanticorpos contra plaquetas e hemácias38.
Recentemente, Ghaithi et al, sugeriram um algoritmo de investigação
Discussão 25
desregulação do sistema imunológico, incluindo também doenças
autoimunes como o LESJ56. Assim sendo, o diagnóstico diferencial de LESJ deveria ser considerado em os pacientes que apresentarem SE, mesmo na
Conclusões 27
1. Síndrome de Evans foi raramente evidenciada ao diagnóstico nos pacientes com LESJ.
2. Pacientes com SE e LESJ apresentaram doença hemorrágica com poucos sinais e sintomas típicos de LESJ, tiveram atividade sistêmica da doença ao diagnóstico, necessitaram de hospitalização e evoluíram com bom prognóstico.
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