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SÍNDROME METABÓLICA E ENVELHECIMENTO PAPEL DA RESTRIÇÃO CALÓRICA E DA ACTIVAÇÃO DAS SIRTUÍNAS

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Academic year: 2021

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Com o envelhecimento e doenças associadas à idade as vias metabólicas são profundamente alteradas pelos nutrientes e hormonas. A síndroma metabólica pode ser considerada uma dessas doenças relacionadas com o avançar da idade.

Verifica-se na síndrome metabólica o oposto do que se encontra na restrição calórica, que pode ser definida como a diminuição em cerca de 20% daquilo que uma célula ou organismo utilizarão em condições normais de utilização livre de nutrientes. Na síndrome metabólica há um aumento da gordura corporal, nomeadamente da gordura abdominal, uma redução da tolerância à glicose, aumento das concentrações de triglicerídeos e diminuição dos níveis de HDL-colesterol. Todas estas alterações são também aquelas que se verificam no processo de envelhecimento. A restrição calórica está associada a redução da gordura corporal, aumento da tolerância à glicose, diminuição das concentrações de LDL-colesterol, aumento de HDL--colesterol e diminuição dos níveis de triglicerídeos.

A restrição calórica tem sido amplamente estudada nomeadamente o facto de estar associada a protecção contra a doença e de poder aumentar o tempo médio de vida. É a única intervenção que comprovadamente leva a aumento da longevidade. Provou-se, na levedura da cerveja, que a restrição calórica aumenta a sobrevida. A restrição calórica na levedura de cerveja induz um aumento das enzimas do grupo das sirtuínas, nomeadamente a SIR2 (silent information regulator 2), através do aumento da respiração e da relação NAD+/NADH e de uma diminuição da nicotinamida (figura 1). A SIR2 é uma deacetilase das histonas NAD±dependente, essencial para o processo de silenciamento de genes e importante para vários processos como a regulação do ciclo celular, metabolismo dos ácidos gordos e extensão do tempo médio de vida. O silenciamento transcritor envolve a modificação da cromatina em locais distintos do genoma. Entre as modificações da cromatina mais bem estudadas está a acetilação reversível das histonas. Sabe-se que na levedura a SIR2 leva à repressão da instabilidade genómica e diminuição da formação de círculos tóxicos do DNA, o que contribui também para aumento da longevidade. O resveratrol, uma isoflavona presente nas uvas, aumenta a sirtuína 2 e consequentemente a sobrevida das células de levedura de cerveja em 70% (Nature, 435,191-6, 2003). Por outro lado, a repressão da SIR2 reduz a longevidade para metade. Pensa-se que as sirtuínas são reguladores--chave de vias conservadas na evolução dos seres vivos que permitem aos organismos lidar com a adversidade.

Pedro von Hafe

Professor de Medicina da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto. Assistente Graduado de Medicina Interna do Hospital de S. João E.P.E.

Resumo do artigo

As sirtuínas são uma família de proteínas importantes para muitos processos celulares, incluindo o silen-ciamento de genes, regulação de p53, metabolismo dos ácidos gordos, homeostasia da glicose, regulação do ciclo celular e extensão da longevidade. A activação da sirtuína 2 (Sir2), tal como a restrição calórica, relacionou--se com o aumento do tempo médio de vida em várias espécies. Sabe-se que a restrição calórica activa a Sir2. As sirtuínas homólogas nos mamíferos consistem em sete membros – SIRT1-SIRT7. A SIRT1 é a homóloga mais próxima da Sir2 nos mamíferos e é activada pela restrição calórica, resveratrol (polifenol encontrado no vinho). Recentemente foram descritas pequenas moléculas milhares de vezes mais potentes que o resveratrol na activação das sirtuínas, com efeitos antidiabéticos e que poderão constituir uma terapêutica de futuro nas doenças relacionadas com o envelhecimento como a síndrome metabólica, diabetes tipo 2 e cancro e mesmo no prolongamento da longevidade no ser humano.

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Fazem parte de um sistema que permite aumentar a sobrevida em situações de stress.

Figura 1

Efeito da restrição calórica no aumento da longevidade da levedura de cerveja através do aumento da sirtuína SIR2 (silent information regulator 2).

Na Drosophila a restrição calórica induz uma diminuição da deacetilase das histonas RPD3 e um aumento da SIR2 e da longevidade (figura 2). Nos roedores sob dieta rica em gorduras o resveratrol, ao activar as sirtuínas, melhora a sensibilidade à insulina, aumenta o conteúdo celular em mitocôndrias e aumenta a sobrevida (Nature 444, 337-42,

2006).

Figura 2

Efeito da restrição calórica no aumento da longevidade da drosófila através do aumento da sirtuína SIR2. RPD3: deacetilase das histonas.

Nos mamíferos a SIRT1 é a proteína ortóloga da SIR2 da levedura. A activação da SIRT1 tem sido estudada principalmente em situações de jejum. Regula a actividade de vários factores e co-reguladores de transcrição, nomea-damente o p53 (supressor tumoral), proteínas FoxO (família de proteínas sensoras das vias de sinalização da insulina), factor de reparação do DNA Ku70 (que leva a inibição da morte celular induzida por stress), do NF-KB, dos PPARγ e do factor de transcrição p300. Actua também no metabolismo lipídico e da glicose, inibe a adipogénese em células precursoras, medeia a diferenciação muscular e protege da degenerescência axonal. Ao actuar no PGC1α, um co-activador de transcrição que regula o metabolismo e a biogénese das mitocôndrias, modula um dos mais versáteis co-activadores metabólicos, regulando a termogénese adaptativa, gliconeogénese hepática e glicólise.

Uma das teorias mais aceites sugere que o consumo de oxigénio pelas mitocôndrias e a consequente formação de espécies reactivas de oxigénio são promotores do processo de envelhecimento. As sirtuínas têm vários efeitos a nível das mitocôndrias. A activação das sirtuínas nos mamíferos leva a aumento da proliferação mitocondrial, reduz o consumo de oxigénio, diminui o potencial da membrana e a génese de radicais de oxigénio, mantendo a produção de ATP (PNAS, 103, nº6, 1768-73, 2006). A

“A actividade física e a restrição

da ingestão calórica,

que são a base de tratamento

da síndroma metabólica,

aumentam

a actividade mitocondrial, e

sabe-se que nos estados

de insulinorresistência e

também no idoso há uma

redução significativa da função

mitocondrial.”

Restrição calórica

↑ SIR2

↑ longevidade

↓ RPD3

↑ respiração ↑ NAD+/NADH ↑ PCN1 ↓ nicotinamida ↑ SIR2 ↑ longevidade Restrição calórica

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actividade física e a restrição da ingestão calórica, que são a base de tratamento da síndroma metabólica, aumentam a actividade mitocondrial, e sabe-se que nos estados de insulinorresistência e também no idoso há uma redução significativa da função mitocondrial. Os animais de experiência com elevada capacidade aeróbia apresentam no músculo esquelético níveis elevados de PGC1α, PPARγ e outras proteínas que controlam a função mitocondrial (Science 307, 418-20, 2005). Os defeitos da função mitocondrial no músculo esquelético podem contribuir indirectamente para a doença cardiovascular pela promoção do aumento do peso e acumulação de gordura visceral e pelos efeitos sistémicos na homeostase da glicose e lipídeos.

Nos mamíferos, a activação das sirtuínas pela restrição calórica induz, nas células beta pancreáticas, um aumento da secreção de insulina por via das ucp e proteínas FoxO. A expressão aumentada do PGC1α nas células beta pancreáticas regula a activação dos genes da gliconeogénese e repressão dos genes envolvidos na captura da glicose e da glicólise nessas células, resultando numa redução dos níveis de ATP e numa inibição marcada da secreção de insulina estimulada pela glicose (figura 3). No fígado, induz uma inibição da glicólise e um aumento da gliconeogénese através de um co-activador dos PPARγ, o PGC1α (figura3). No músculo esquelético, resulta num aumento da biogénese e do metabolismo mitocondrial, com aumento da oxidação dos ácidos gordos, por intermédio do PGC1α e das proteínas FoxO (figura 3). Todas estas acções são promovidas também pelo resveratrol.

Figura 3

Efeito da restrição calórica nas células beta pancreáticas, fígado e músculo esquelético nos mamíferos.

A restrição calórica origina também um aumento da expressão dos genes da adiponectina via FoxO1 e C/EBPα (The Journal of Biological Chemistry, 281,42, 38815-24,

2006). A adiponectina é uma hormona originada no tecido

adiposo que tem um papel importante na homeostase energética, com propriedades antidiabéticas (melhoria da sensibilidade à insulina, diminuição da produção hepática de glicose e diminuição da acumulação de triglicerídeos nas células musculares) e anti-ateroscleróticas (diminuição da expressão das moléculas de adesão, da adesão dos monócitos ao endotélio, da entrada na parede arterial de partículas LDL oxidadas, da formação das células espumosas e da proliferação e migração das células musculares lisas). Sabe-se que a expressão dos genes da adiponectina está diminuída na obesidade e na diabetes tipo 2. Estudos realizados nos últimos anos mostraram claramente que a adiponectina circulante tem um importante papel na sensibilização à insulina das células hepáticas e musculares. A expressão diminuída de SIRT1 poderá contribuir para a redução da expressão do gene da adiponectina na diabetes tipo 2 e obesidade. Há evidência de que a SIRT1 activa a lipólise em adipócitos diferenciados e diminui o seu tamanho (Nature 429, 771-6, 2004). Pode-se então afirmar que, sob restrição calórica, é induzida a expressão de SIRT1 o que leva a mobilização das reservas de gordura nos adipócitos e aumento da expressão dos

ÉTICO

DRIAL

GC1α FÍGADO MÚSCULO ESQUEL CÉLULAS BETA SIRT1 ucp2 FoxO ↑ ATP Resistência stresse SECREÇÃO INSULINA SIRT1 PGC1α (co-activador PPAR-γ)

↑ GLICONEOGÉNESE METABOLISMO MITOCON↑ BIOGÉNESE E

↑ Oxidação AG

SIRT1

FoxO P

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genes da adiponectina. O aumento das concentrações de adiponectina circulante aumenta a sensibilidade dos tecidos à insulina e aumenta a oxidação de ácidos gordos.

A SIRT1 reprime a actividade do factor de transcrição p300, e esta actividade tem sido implicada em várias situações como o cancro, hipertrofia cardíaca e doença de Huntington (The Journal of Biological Chemistry, 280,11,

10264-76, 2005). Relativamente ao supressor tumoral

p53 é possível que a sua regulação normal tenha impacto na longevidade pela eliminação de lesões de DNA ou de células contendo DNA alterado. Foi documentado que ratos com expressão aumentada de p53 mostraram atraso no processo de envelhecimento (Nature 448, 375-9, 2007).

O envelhecimento está associado a várias alterações patológicas como a doença de Alzheimer. Sabe-se que na doença de Alzheimer a activação das sirtuínas leva a inibição da degeneração neuronal por diminuição da acumulação de substância amilóide (figura 4). A SIRT1 expressa-se no cérebro adulto e em desenvolvimento. Dado que a restrição calórica previne a neuropatologia amilóide tipo doença de Alzheimer testou-se a hipótese de esta intervenção poder reduzir essa neurodegeneração através de mecanismos promovendo a activação da SIRT1 (The

Journal of Biological Chemistry, 281,31, 21745-54, 2006).

A SIRT1 liga-se a FoxO1 e a activação da FoxO1 contribui para o atraso da morte celular após lesão isquémica.

Figura 4

Efeito anti-degenerativo da activação da SIRT1 pelo resveratrol a nível neuronal. Adaptado de J. Biol. Chem., Vol. 280, 48, 40364-74, 2005. Aβ: substância amilóide.

Foram recentemente identificadas e caracterizadas pequenas moléculas activadoras da SIRT1 que são estruturalmente diferentes e 1000 vezes mais potentes que o resveratrol (Nature 450, 712-16, 2007). Tal como o resveratrol, estes compostos ligam-se directamente ao complexo peptídico SIRT1-acetilado. Estes compostos melhoraram a sensibilidade à insulina, diminuíram as glicemias e aumentaram a capacidade mitocondrial em ratos com obesidade genética ou induzida pela dieta. Em animais Zucker fa/fa, estudos de clampagem euglicémica hiperinsulinémica demonstraram que estes activadores da SIRT1 melhoravam a homeostasia da glicose e sensibilidade à insulina no tecido adiposo, músculo esquelético e fígado (Nature 450, 712-16, 2007). Estes compostos mimetizam os efeitos metabólicos benéficos da restrição calórica.

O envelhecimento e o cancro apresentam aspectos comuns, entre os quais se pode referir a lesão do DNA. As sirtuínas são essenciais para a manutenção da integridade genómica e a sua desregulação pode eventualmente predispor à formação de tumores. Em roedores de laboratório a restrição calórica atrasou o aparecimento de doenças associadas à idade, incluindo cancros da mama e da próstata, além de nefropatia, cataratas, diabetes, hipertensão arterial e dislipidemia. Num estudo realizado em ratos predispostos geneticamente a cancro da próstata foram avaliados dois grupos em que se permitiu

a ingestão da mesma quantidade exacta de calorias (Cancer Res 2007;67(1):417–24). Num dos grupos a gaiola encontrava-se à temperatura ambiente enquanto no outro a gaiola estava arrefecida o que levava os animais de

Resveratrol SIRT1

Activação astroglial

Degeneração neuronal iNOs, Catepsina B, outros

Activação microglial Deacetilação de p65 Ab NF-κB NF-κB

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menos probabilidade de desenvolver cancro da próstata. Numa segunda experiência ambos os grupos ingeriam as calorias ad libitum. Os ratos da gaiola mais fria ingeriram cerca de 30% mais calorias que os outros e ficaram com o mesmo peso, tendo a taxa de desenvolvimento de cancro da próstata sido semelhante, apesar do excesso de calorias ingeridas. Estes resultados apontam para que seja a quantidade de calorias armazenadas e não as calorias ingeridas que possa estar relacionada com o excesso de risco de neoplasia. No ser humano as calorias armazenadas depositam-se principalmente no compartimento visceral. Tivemos oportunidade de mostrar pela primeira vez que a acumulação de gordura visceral constituía um potente factor de risco de cancro da próstata, com um aumento de risco de 14,5 vezes (Obesity Research: 1930-5, 2004).

Em conclusão, a activação da SIRT1 é uma abordagem terapêutica muito promissora para o tratamento das doenças relacionadas com a idade como a síndrome metabólica, diabetes tipo 2 e cancro e poderá eventualmente no futuro ser a chave para o prolongamento do tempo de vida no ser humano.

Referências

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