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LITERATURA COMPARADA: ESTUDO TÉORICO ACERCA DA TRADUÇÃO INTERSEMIÓTICA DE LIVROS PARA ROTEIROS ADAPTADOS

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Academic year: 2021

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LITERATURA COMPARADA: ESTUDO TÉORICO ACERCA DA TRADUÇÃO INTERSEMIÓTICA DE LIVROS PARA ROTEIROS ADAPTADOS

Clarissa Mazon Miranda1

RESUMO: O conceito de tradução intersemiótica mostra-se hoje em ampliação no âmbito dos estudos literários e uma das vias observadas desse avanço seria a consideração dos estudos das transtextualidades. O roteiro adaptado é, assim, ponto importante de conexão entre o romance e o filme em si. Entre ele e o romance, serão observados diversos pontos de aproximação ou afastamento. Enquanto o livro será escrito para estabelecer uma relação com o leitor, o argumento cinematográfico será lido por interlocutores como a equipe técnica, os atores, os realizadores, os produtores, os agentes do filme, entre outros. Esse aspecto fará com que o argumento apresente determinadas decisões técnicas e dramatúrgicas para o texto. Como elementos chave na criação de um roteiro, podem ser elencados: caracterização, enredo, ação, diálogo e ambientação. Vê-se, portanto, que apesar dos muitos aspectos em comum que permitem, inclusive, uma tradução intersemiótica de uma obra em outra, o romance e o roteiro mantêm seus pontos de afastamento, os quais, sem dúvida, contribuem para o espaço bem delimitado de cada uma dessas artes na sociedade atual. Este projeto visa refletir acerca do tema da tradução intersemiótica por meio dos principais autores que dele tratam, entre eles DINIZ, T. F. N. (2005); PEREIRA, M. V. (2007); SANFILIPPO, M. V. (2013); VIEIRA, A. S. (2014); ZILBERMAN, R. (2007); STAM, R. (2008); HUTCHEON, L. (2011). O objetivo desta pesquisa é a reunião de arcabouço teórico que demonstre os caminhos e as prerrogativas do roteiro adaptado na realidade e a evolução dos estudos acerca da tradução intersemiótica como tema emergente em literatura comparada.

PALAVRAS-CHAVE: Roteiro Adaptado. Tradução Intersemiótica. Transtextualidade.

1. Introdução

O conceito de tradução intersemiótica mostra-se hoje em ampliação no âmbito dos estudos literários e uma das vias observadas desse avanço seria a consideração dos estudos das transtextualidades. O roteiro adaptado é, assim, ponto importante de conexão entre o romance e o filme em si. Entre ele e o romance, serão observados diversos pontos de aproximação ou afastamento. Enquanto o livro será escrito para estabelecer uma relação com o leitor, o argumento cinematográfico será lido por interlocutores como a equipe técnica, os atores, os realizadores, os produtores, os agentes do filme, entre outros. Esse aspecto fará com que o argumento apresente determinadas decisões técnicas e dramatúrgicas para o texto. O trabalho aqui apresentado trata do tema por meio da análise de uma obra específica adaptada para o cinema, O Quatrilho de autoria de José Clemente Pozenato.

Na 12 edição do romance O Quatrilho, publicado em comemoração ao lançamento do filme homônimo, o autor registra: “Ao escrever o romance eu elaborei algumas seqüências imaginando as cenas de um ponto de vista cinematográfico, com um ângulo cinematográfico, uma tomada de câmera por trás, enfim, todos esses movimentos de câmera estão latentes na maneira de estruturar a narrativa” (POZENATO, 1996, p. 6). É possível perceber, deste modo, a influência da linguagem cinematográfica na própria formação do escritor aqui citado como referência.

Texto completo de trabalho apresentado no 4. Encontro da Rede Sul Letras, promovido pelo Programa de

Pós-graduação em Ciências da Linguagem no Campus da Grande Florianópolis da Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL) em Palhoça (SC).

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215 A adaptação em estudo

Segundo Vieira (2010), a dialética entre a literatura e as demais artes é a tradução intersemiótica, ou seja, “procedimento de trocas entre sistemas sígnicos distintos” (p. 144). O estudo desse conteúdo permite, portanto, compreender com clareza os parâmetros estabelecidos pelo convívio entre a arte literária e a cinematográfica. De acordo com Sanfilippo (2013), os filmes que se substanciam de referências literárias oferecem ao espectador uma variedade de experiências: “consentindo-lhe percorrer novamente o texto literário em uma nova visitação livre e fértil de histórias prospectivas e colocar em foco a dialética intercorrente entre cinema e literatura” (p. 198, tradução nossa2). Para Diniz (2005), o estudo da adaptação do romance para o cinema deve ser feito como um estudo de inter/transtextualidade. “A relação entre literatura e cinema é evidente desde o início do cinema, seja na interdependência entre os dois sistemas, seja na influência de um sobre o outro” (p. 19). A autora identifica que, nos filmes, por serem constituídos por narrativas, vê-se a adaptação como tradução ou processo de “procura de um signo em outro sistema semiótico, o cinema, que tenha a mesma função que o signo no sistema da literatura” (p. 19). São, no entanto, linguagens que irão se influenciar mutuamente ao longo da criação de ambas as obras de arte.

Para Jakobson (1969), uma tradução intersemiótica dá-se quando se recorre a “um signo não-lingüístico, por exemplo a um signo pictórico. Mas em todos esses casos substituímos signos por signos. O que resta, então, de uma relação direta entre a palavra e a coisa?” (p. 21). O autor defende que a base de todos os sistemas semióticos é a linguagem. Essa é o fundamento da própria cultura, é o instrumento principal da comunicação interativa. A linguagem seria o ponto de contato, portanto, entre a semiótica da literatura e a do cinema. Os pontos em comum localizados entre essas diferentes linguagens perpassariam e tornariam possíveis as traduções intersemióticas.

Vieira (2010) lembra que o cinema desde seu início recorre à literatura. “A partir dos anos 1920, existe um entusiasmo crescente entre os escritores em estabelecer trocas entre o trabalho literário e o trabalho cinematográfico” (p. 145). Enquanto o cinema procura a escrita romanesca – arte essa já sólida – para estabelecer-se também ele como arte respeitada; a escrita romanesca, em diferentes momentos históricos, aproxima-se ou afasta-se do cinema para continuar sua evolução. A troca entre esses dois campos, no entanto, permanece inegável desde a invenção do cinema até os dias de hoje. Conforme Vieira (2010), a literatura vai ao encontro do cinema, no século XX, sobretudo a partir do foco dado ao processo de montagem cinematográfica por Eisenstein. Segundo Barnwell (2013), Eisenstein fez parte de um grupo de cineastas soviéticos que fizeram experimentos com a técnica de montagem nos anos de 1920. Eisentein combinou planos que aparentemente não tinham conexão para criar “associações”.

Sendo assim, um ator não explícito na ação é frequentemente sugerido pela montagem – “a montagem perturba o fluxo da narrativa ao fazer imagens distintas se justaporem; é o contrário da edição de continuidade, cujo objetivo é transmitir um fluxo contínuo do espaço e do tempo” (BARNWELL, 2013, p. 180). A partir do argumento da montagem pode observar-se, por exemplo, o modo como o roteiro deverá diferenciar-se da literatura, pois tendo ele o recurso das imagens, explica menos em texto e mais em visualidade.

2 “...consentindogli quindi di ripercorrere Il testo letterario in una rivisitazione libera e fertile di novelle

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216 Duas linguagens, alguns pontos em comum

Para Vieira (2010), o diálogo com a técnica da montagem cinematográfica trará conseqüências sólidas para a literatura. “Trata-se de uma estética que irá valorizar o corte, a fragmentação da narrativa, bem como a descontinuidade inerente ao corte, forma considerada eficaz para substituir a narrativa linear realista” (VIEIRA, 2010, p. 147). O surgimento do cinema falado afastou os autores de romance da sétima arte, visto que, neste caso, o cinema passa a ser visto como um plágio da literatura. Conforme Vieira (2010), após a Segunda Guerra Mundial, esse movimento reverte-se com autores como Jean Cocteau e Jean Gino os quais transpõe, eles mesmos, suas obras para o cinema, sendo autores dos roteiros da adaptação cinematográfica. “Da mesma forma que o romance, o roteiro alterna em sua estrutura, diálogos e passagens de narração/descrição, prestando-se, portanto, a uma análise literária” (VIEIRA, 2007, p. 57). Vê-se a aproximação entre romance e roteiro mostrar que, na tradução para a linguagem cinematográfica, o romance como que passa por um prisma permitindo ao leitor discernir diferentes instâncias que na linguagem romanesca parecem imbricadas: como o visual, o verbal, o sonoro, a encenação. Ainda segundo Vieira (2007), “a relação entre filme e romance baseia-se principalmente na relação entre a palavra, signo simbólico, e a imagem, signo icônico” (p. 54). O roteiro adaptado apresenta-se como elo entre romance e filme e a presença da possibilidade do cinema marca também a formação dos escritores a partir do século XX.

Diniz (2005) expõe que a adaptação do romance para o roteiro cinematográfico pode ser vista como hipertexto, quando essa hipertextualidade é entendida como uma das formas de relações transtextuais. Segundo essa autora, o hipertexto está sempre presente na obra literária, tendo em vista que é possível em uma obra sempre identificar vestígios de outra. O hipertexto estará também na imagem dos personagens e cenários criada pelo leitor. O maior grau de hipertextualidade dá-se quando uma obra inteira é derivada de toda uma outra obra: “filmes adaptados de uma mesma obra (“remakes”) podem ser vistos como leituras variantes hipertextuais iniciadas a partir de um mesmo hipotexto” (DINIZ, 2005, p. 44). O roteiro adaptado é ponto importante de conexão entre o romance e o filme em si. Observam-se diversos pontos de aproximação ou afastamento.

Parent-Altier (2004) diz que deve-se lembrar, por exemplo, para quem um roteiro é escrito - enquanto o livro será escrito para estabelecer uma relação com o leitor, o argumento cinematográfico será lido “por várias entidades profissionais, cujas necessidades são profundamente diferentes” (p. 16). Entre os públicos leitores do roteirista, estão interlocutores como a equipe técnica, os atores, os realizadores, os produtores, os agentes, entre outros.

Esse aspecto fará com que o roteirista tome determinadas decisões técnicas e dramatúrgicas para o texto. Conforme Barnwell (2013), uma adaptação será sempre diferente da obra literária, pois “quando um romance é adaptado para as telas, várias mudanças serão necessárias; isto ocorre porque alguns aspectos do romance não podem ser alcançados na tela” (p. 44). Como elementos chave na criação de um roteiro, elenca-se: caracterização, enredo, ação, diálogo e ambientação.

Pereira (2007), ao estudar a adaptação do romance O Invasor, de Marçal Aquino, para o cinema, fundamenta-se na pesquisa sobre a tradução de obras literárias para a linguagem cinematográfica. Percebe que o cinema se associou, desde o início de sua história, à literatura: “as adaptações fílmicas realizam uma simbiose importante entre essas duas formas de arte tão distintas, mas que, ao mesmo tempo, guardam pontos em comum e se influenciam” (p. 21). Segundo o autor, a relação entre cinema e literatura adquire um caráter amplo ao longo do desenvolvimento de ambas as artes. “Se por um lado a literatura ensinou o cinema a narrar, por outro, as técnicas específicas do cinema ajudaram a promover uma renovação na narrativa literária” (p. 24). É o caso que se observa em O Quatrilho, obra na qual o autor mesmo coloca-se como influenciado pela linguagem cinematográfica, depoimento esse obtido também por meio de entrevista realizada com ele por essa pesquisadora em 2014.

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Para Hutcheon (2013), a preocupação do roteirista deveria ser a de tornar o texto literário “roteiro” o mais próximo possível da mídia a qual ele se destina. “Se a ideia de fidelidade não deveria hoje guiar nenhuma teoria da adaptação, o que, então, deveria? De acordo com sua ocorrência no dicionário, “adaptar” quer dizer ajustar, alterar, tornar adequado” (p. 29). A autora indica três perspectivas distintas para a adaptação, bem sendo: uma entidade ou produto formal, um processo de criação, um processo de recepção. Atesta-se, deste modo, que, mesmo que possam inspirar-se mutuamente, literatura e roteiro são obras de arte distintas e como tais devem ser analisadas separadamente.

Como elementos chave na criação de u

m roteiro, podem ser elencados:

caracterização, enredo, ação, diálogo e ambientação. Vê-se, portanto, que

apesar dos muitos aspectos em comum que permitem, inclusive, uma tradução

intersemiótica de uma obra em outra, o romance e o roteiro mantêm seus pontos de

afastamento, os quais, sem dúvida, contribuem para o espaço bem delimitado de cada uma

dessas artes na sociedade atual.

Considerações finais

A aproximação entre literatura e cinema molda constantemente o contato que o público dos dias de hoje tem com a obra literária. Por vezes, está no cinema a primeira interação de um leitor com a história de um livro. Esse leitor, depois, poderá procurar o livro como uma forma de ampliar o conhecimento da história.

A interação entre o texto do romance e o roteiro cinematográfico torna-se, portanto, prevista para muitos autores das obras literárias já adaptadas para o cinema. Tem-se ainda toda uma sociedade habituada ao contato frequente com a narrativa cinematográfica, seus moldes e seus ritmos. Tal convivência tem consequências não só para leitores, como também para os autores de obras literárias que se inserem no público daqueles que hoje convivem com cinema. Da conversa entre sistemas, decorre a percepção de que algumas obras literárias são mais adequadas a virarem obra cinematográfica.

Quando comparado à literatura, o roteiro de cinema irá depender não somente da visão do autor em relação à história que vai contar, mas também de outros fatores que pesam sobremaneira sobre a indústria cinematográfica, a qual tem suas regras para o que seria uma história de valor. São pontos como: mercado cinematográfico, público, problemas de custos de produção, deficiência na possibilidade de representação dos estados psicológicos dos personagens, dentre outros. Esses são todos pontos que geram dificuldade em ter-se a fidelidade de uma obra cinematográfica em relação ao seu original literário.

Referências

BARNWELL, J. Fundamentos de Produção Cinematográfica. Porto Alegre: Bookman, 2013. p. 27-49.

DINIZ, T. F. N. Literatura e Cinema: Tradução, hipertextualidade, reciclagem. Belo Horizonte: Faculdade de Letra da UFMG, 2005.

EISENSTEIN, S. A forma do filme. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor Ltda., 2002. GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas, 2010. p. 25 – 44. HUTCHEON, L. Uma teoria da adaptação. Florianópolis: Editora UFSC, 2013.

JAKOBSON, R. Lingüística e Comunicação. São Paulo: Editora Cultrix e Universidade de São Paulo, 1969.

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PARENT-ALTIER, D. O argumento cinematográfico. Lisboa: Edições Textos & Grafias, Lda., 2009. p. 15-37.

PEREIRA, M. V. A adaptação do romance O Invasor para o cinema: tensão e impasse na relação entre as classes sociais. 2007. 139 f. Dissertação (Mestrado Acadêmico em Lingüística Aplicada) - Universidade Estadual do Ceará, Fortaleza, 2007.

POZENATO, J. C. O Quatrilho. 12 ed. Porto Alegre: Mercado Aberto, 1996.

POZENATO, J. C. José Clemente Pozenato: depoimento. Entrevistador: C. Miranda. Caxias do Sul: 2014. 1 gravação de áudio em gravador digital. Entrevista concedida para projeto de pesquisa. SANFILIPPO, M. V. Luchino Visconti e Giovanni Verga: fedeltà e autonomia tra cinema e

letteratura. In: MELLO, A. M. L. et al. Literatura e Cinema: Encontros Contemporâneos. Porto Alegre: Dublinense, 2013. p. 196 – 207.

VIEIRA, A. S. Do filme ao romance: aspectos do processo de adaptação romanceada. In: Caligrama: Revista de Estudos Românicos. V. 15, n. 1, p. 143-156. Belo Horizonte: 2010. Disponível em: < http://periodicos.letras.ufmg.br/index.php/caligrama/article/view/156>. Acesso em: 10 out. 2014.

VIEIRA, A. S. Literatura e roteiro: leitor ou espectador. In: Revista Letras: Literatura, Outras Artes & Cultura das Mídias. n. 34. Santa Maria: Programa de Pós-Graduação em Letras UFSM, 2007. Disponível em:

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