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Mulheres na produção de histórias em quadrinhos: da invisibilidade à construção de espaços próprios

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CAMPUS FLORIANÓPOLIS

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM HISTÓRIA

Talita Sauer Medeiros

Mulheres na produção de histórias em quadrinhos: Da invisibilidade à construção de

espaços próprios.

Florianópolis 2020

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Mulheres na produção de histórias em quadrinhos: Da invisibilidade à construção de

espaços próprios.

Tese submetida ao Programa de Pós-Graduação em História da Universidade Federal de Santa Catarina para a obtenção do título de doutor em História Cultural.

Orientador: Profª Maria Bernardete Ramos Flores, Dra.

Florianópolis 2020

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Mulheres na produção de histórias em quadrinhos: Da invisibilidade à construção de

espaços próprios.

O presente trabalho em nível de doutorado foi avaliado e aprovado por banca examinadora composta pelos seguintes membros:

Profa. Daniela Pinheiro Machado Kern, Dra. Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS

Profa. Joana Maria Pedro, Dra.

Universidade Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC Profa. Ana Maria Veiga, Dra.

Universidade Federal da Paraíba – UFPB Profa. Thays Tonin, Dra.

Universidade do Estado de Santa Catarina – UDESC

Certificamos que esta é a versão original e final do trabalho de conclusão que foi julgado adequado para obtenção do título de doutor em História Cultural.

____________________________________ Prof. Lucas De Melo Reis Bueno, Dr.

Coordenador do Programa

____________________________________ Prof. Maria Bernardete Ramos Flores, Dra.

Orientadora

Florianópolis, 20 de fevereiro de 2020.

Documento assinado digitalmente Maria Bernadete Ramos Flores Data: 21/02/2020 17:41:11-0300 CPF: 761.291.289-91

Lucas de Melo Reis

Bueno:151819188

67

Assinado de forma digital por Lucas de Melo Reis

Bueno:15181918867 Dados: 2020.02.27 14:17:21 -03'00'

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Este trabalho é dedicado à Josephina Chiappini Sauer e a todas as mulheres, como ela, fortes, sensíveis e inspiradoras

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Agradeço a Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC pela oportunidade, acolhida e enorme aprendizado ao longo desses anos de desenvolvimento da tese. As professoras Maria de Fátima Piazza, Maria Bernardete Ramos Flores e Letícia Nedel pelas trocas inspiradoras, pelo exemplo e pelo crescimento que me proporcionaram como pesquisadora e professora. A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – CAPES e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – CNPq pelas bolsas de fomento a pesquisa. Aos amigos Karine Lima, Paulo Vinícios de Santana, Gisele Braciak , Tamara Carneiro, Vanissi Araújo, Bruno Azambuja, Cecília Ewbank, Odair José, Selma, Rafael, Davi, Bruno Sanches e Daniela de Moraes, agradeço o apoio e a parceria de sempre - ainda que alguns à distância - vocês foram fundamentais nessa caminhada. Em especial agradeço a minha orientadora Maria Bernardete Ramos Flores pelo suporte, pelas contribuições, direcionamento da pesquisa e compreensão das etapas em meu processo de produção.

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―me levanto sobre o sacrifício de um milhão de mulheres que vieram antes

e penso o que é que eu faço para tornar essa montanha mais alta para que as mulheres que vierem depois de mim possam ver além‖

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RESUMO

Desde os anos 1970 algumas críticas de arte como Linda Nochlin já questionavam as causas da aparente inexistência das mulheres artistas na história, concluindo que tal ausência se deve mais a exclusão das mulheres das principais instâncias de formação de carreiras artísticas nos séculos XVIII e XIX, do que a uma falta ―natural‖ de talentos para as artes. Ainda nos dias de hoje, essa ausência forçada da mulher que lhes limita o trabalho artístico não foi de toda resolvida. Isso fica muito claro, no que se refere à esfera dos quadrinhos, na qual o fato de ser mulher ainda lhe rouba em grande medida a atuação, impondo-lhes diversas dificuldades e limitações. Com esse trabalho examinaremos a participação das mulheres na produção e consumo dessa mídia. Pensando através de algumas obras como se dá a inserção das autoras nesse meio majoritariamente masculino, e os espaços que elas ocupam. Perscrutaremos as iniciativas (como os coletivos de mulheres quadrinistas) que foram e vêm sendo tomadas para colaborar com a atuação das autoras. Observando a importância assumida pela organização e a construção de redes de apoio que surgem como resposta às limitações a que estão submetidas e acabam por ser responsáveis em grande parte, pela viabilização da produção e pela inserção. Constatando um movimento cada vez maior no sentido de criar espaços destinados a participação apenas de autoras mulheres e produzidos por mulheres, analisaremos iniciativas que seguem essa linha. Discutiremos ainda como o cenário vem se modificando nos últimos tempos, observando como num meio ainda superado numericamente pelos homens, a produção das mulheres se desenvolve e surpreende. Incutindo uma polifonia e ampliando consideravelmente as possibilidades da arte sequencial. E, embora, por ora, os espaços exclusivos para as autoras ainda sejam necessários, entendemos que há uma intenção e um movimento no sentido da dissolução dessas separações. Já que, em última instância, ao que parece a intenção das autoras e de seus trabalhos é transcender qualquer associação com gêneros, na direção de serem apreciadas e reconhecidas pelas qualidades das obras.

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ABSTRACT

Since the 1970s, some art critics like Linda Nochlin have questioned the causes of the apparent absence of women artists in history, concluding that such absence is due more to the exclusion of women from the main instances of formation of artistic careers in the 18th and 19th centuries, from than a ―natural‖ lack of talent for the arts. Even today, this forced absence of the woman who limits their artistic work has not been completely resolved. This is very clear, with regard to the sphere of comics, in which the fact of being a woman still largely robs her of her acting, imposing several difficulties and limitations on them. With this work we will examine the participation of women in the production and consumption of this media. Thinking through some works how the insertion of the authors in this mostly male medium occurs, and the spaces they occupy. We will examine the initiatives (such as the collectives of women comic artists) that were and are being taken to collaborate with the authors' work. Noting the importance assumed by the organization and the construction of support networks that emerge in response to the limitations to which they are subjected and end up being responsible in large part for the viability of production and insertion. Noting an increasing movement towards creating spaces for the participation of only female authors and produced by women, we will analyze initiatives that follow this line. We will also discuss how the scenario has changed in recent times, observing how in a medium still surpassed numerically by men, the production of women develops and surprises. By instilling a polyphony and considerably expanding the possibilities of sequential art. And although, for now, the exclusive spaces for the authors are still necessary, we understand that there is an intention and a movement towards the dissolution of these separations. Since, ultimately, it seems the intention of the authors and their works is to transcend any association with genres, in the direction of being appreciated and recognized for the qualities of the works.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Página da história Placas tectônicas de Margaux Motin. . . .. 35

Figura 2 - O Pato, autora: Ciça... 36

Figura 3 - Almanaque da Mônica n° 1, Editora Abril, 1981 ...37

Figura 4 – Colorlilas, autora: Lila Cruz ...37

Figura 5 - Quadrinho de Franziska Becker ...38

Figura 6 - Imagem da capa da Coletânea Gibi de Menininha ...39

Figura 7 – Cena da Graphic Novel Sorge de Isabel Kreitz ...39

Figura 8 - Detalhe da tapeçaria de Bayeux ...40

Figura 9 – Cena do livro Desvendando os quadrinhos de Scottt McCloud... 40

Figura 10 - Andanzas de Tomasita, de Carmen Parra ... 41

Figura 11 - Dolly Dimples de Grace G. Drayton ...43

Figura 12 - Cap Stubbs and Tippie de Edwina Dumm ...44

Figura 13 - Jennie and Jack, also the Little Dog Jap de Margaret G. Hays ...45

Figura 14 - Baby Bear de Grace Dayton ...45

Figura 15 - MODISH MITZI de Jay V. Jay ...46

Figura 16 - Cartoonist's Confessional de Fay Barbara King ...47

Figura 17 - Miss Fury, de Tarpé Mills ...47

Figura 18 - Phanton Lady...48

Figura 19 - Sheena. Quen of the Jungle ...49

Figura 20 – Goldie de Melinda Gebbie ...52

Figura 21 - Capa e imagem de Persépolis de Marjane Satrapi... 54

Figura 22 - Lady Killer de Joëlle Jones e S. Rich, Jamie...55

Figura 23 - Every Dog Has His Day! de Nell Brinkley ...56

Figura 24 - The Old Subscriber Calls de Rose O 'Neill...57

Figura 25 - Kewpies de Rose O'Neill...57

Figura 26 - Campbell Kids de Grace Drayton...58

Figura 27 - Wanda the War Girl de Kath O‘Brien ...61

Figura 28 - Trecho do livro de Scott McCloud, Reinventando os quadrinhos...62

Figura 29 – Capa de Little Lulu...63

Figura 30 - Trecho do livro de Scott McCloud, Reinventando os quadrinhos ...67

Figura 31 - Divulgação da exposição Presentes. autoras de tebeo de ayer e hoy...69

(11)

Figura 33 - Webcomic da libanesa Maya Zankoul...71

Figura 34 - O fantasma de Anya, de Russa Vera Brosgol...71

Figura 35 – Ilustração de importantes quadrinistas de Scott McCloud...73

Figura 36 - Qualidade editorial de Cinthia Saty... 74

Figura 37 - Cores de Carol Rossetti...75

Figura 38 – Autorretrato Sofonisba Anguissola...80

Figura 39 - The Horse Fair de Rosa Bonheur ...82

Figura 40 – Capa O Lar Doméstico, Vera Cleser ...83

Figura 41 - Fruit of the loom, Anni Albers ...89

Figura 42 - Jogo de prata desenhado por Marianne Brandt...89

Figura 43 - Luncheon on the Grass de Édouard Manet e Les demoiselles d’Avignon de Pablo Picasso ...92

Figura 44 - Susana e os velhos de Rembrandt ...93

Figura 45 – La norme, version Beaux-arts de Chantal Montellier...95

Figura 46 - Página inicial do site da organização AWA ...96

Figura 47 - Trecho do site da AWA ...98

Figura 48 - Trecho do site da AWA ...98

Figura 49 - Painel de Última Ceia de Plautilla Nelli...99

Figura 50 - Male Gaze ...101

Figura 51 - O olhar masculino e heterossexual na produção cinematográfica...101

Figura 52 - Capa de Elektra...102

Figura 53 - Imagem do blog fotos de comic (foto: Melinda Gebbie, Carl Lay e Catherine Yronwode de 1982)...105

Figura 54 - Trabalho de colorização feito por Lynn Valey ...107

Figura 55 – Fotografia ―Françoise Gilot e seu companheiro‖ ...108

Figura 56 – Fotografia ―Frida Kahlo e seu marido‖...109

Figura 57 – Nair de Teffé - Desenho de Pryscila Vieira...114

Figura 58 – Miss Fury ...114

Figura 59 - Brenda Starr...115

Figura 60 - MODISH MITZI ...116

Figura 61 - Folha de rosto das primeiras edições de Sense and Sensibility e de Pride and Prejudice ...117

Figura 62 - Capas criadas pelo projeto Original Writes ...118

(12)

Figura 64 - Quadrinho de Helo D‘angelo ...121

Figura 65 - Cartaz produzido pelo coletivo Guerilla Girls ...122

Figura 66 - Cartaz The advantages of being a woman artist...123

Figura 67 – Cartaz As vantagens de ser uma artista mulher ...124

Figura 68 - HQ da série de quadrinhos Ser artista mulher é.... de Cris Camargo...126

Figura 69 - HQ da série de quadrinhos Ser artista mulher é.... de Cris Camargo...127

Figura 70 - HQ da série de quadrinhos Ser artista mulher é.... de Cris Camargo ...128

Figura 71 - Quadrinho de Riana Duncan ...129

Figura 72 - HQ da série de quadrinhos Ser artista mulher é.... de Cris Camargo ...130

Figura 73 - Quadrinho de Natália Schiavon...130

Figura 74 - HQ da série de quadrinhos Ser artista mulher é.... de Cris Camargo...131

Figura 75 - Twitter da roteirista Gail Simone sobre mansplaining ...132

Figura 76 - HQ da série de quadrinhos Ser artista mulher é.... de Cris Camargo ...132

Figura 77 - Trecho do livro Reinventando os Quadrinhos de Scott McCloud ...133

Figura 78 - Trecho do livro Reinventando os Quadrinhos de Scott McCloud ...133

Figura 79 – Ilustração de Mariza Dias ...134

Figura 80 - Quadrinho de Irena Freitas ...135

Figura 81 - Quadrinho de Júlia França ...136

Figura 82 - HQ da série de quadrinhos Ser artista mulher é.... de Cris Camargo ...137

Figura 83 - HQ da série de quadrinhos Ser artista mulher é.... de Cris Camargo ...138

Figura 84 - Quadrinho de Carolina Ito ...139

Figura 85 – Cartaz de divulgação do prêmio HQ Mix ...139

Figura 86 – Quadrinho Tirabomba de Carolina Ito...140

Figura 87 - Quadrinho de Dora Leroy...141

Figura 88 - Trecho do livro Reinventando os Quadrinhos de Scott McCloud ...142

Figura 89 - Susana e os velhos de Artemisia Gentileschi ...143

Figura 90 – Susana e os velhos de Guido Reni... 143

Figura 91 - Página da Graphic Novel Desconstruindo Una ...144

Figura 92 - Print da página virtual da Association Artemisia ...145

Figura 93 - Mulher invisível, personagem da Marvel Comics...149

Figura 94 - Jornal The East Village...153

Figura 95 - Capa da Zap Comix, arte de Robert Crumb...154

Figura 96 - Selo de provação do Comics Code Authority...155

(13)

Figura 98 - As reuniões de conversas dos grupos feministas...163

Figura 99 - A tomada de consciência através dos grupos feministas de conversa...164

Figura 100 - A experiência compartilhada e o reconhecimento de problemas comuns às mulheres...164

Figura 101 - O Pessoal é Político...166

Figura 102 - Faixa com a dupla reinvindicação: o fim d a guerra no Vietnam e da crise social em casa ...167

Figura 103 – Quadrinho de Husson e Mathieu ...168

Figura 104 - Primeira e segunda onda do feminismo...169

Figura 105 - Reinvindicação por equidade de oportunidades para s mulheres no trabalho e nos estudos... 170

Figura 106 - Convocação para a greve geral de mulheres...171

Figura 107 - Women Strike for Equality, NovaYork, 29 de Augusto de 1970...172

Figura 108 - Fifth Avenue. Women's Strike for Equality, 1970...174

Figura 109 - Jornal feminista It Aint Me Babe ...175

Figura 110 - Cartaz Sister: you are welcome in this house de Trina Robbins...176

Figura 111 - Belinda Berkeley, personagem criada por Trina Robbins...177

Figura 112 - Capa do Jornal It Aint Me babe, vol 1, n° 5...178

Figura 113 - Convocação feita no Jornal It Aint Me Babe para a publicação de um comic book de mulheres...179

Figura 114 - Belinda Berkley de Trina Robbins...180

Figura 115 - Mulheres que participaram do It Aint Me Babe Comix...183

Figura 116 - Capa do It Aint Me Babe Comix...184

Figura 117 - Detalhe da contracapa do It Aint Me Babe Comix...185

Figura 118 - História em quadrinho Breaking Out, no It Ain’t me Babe...186

Figura 119 - Trecho da história Breaking Out, no It Ain’t me Babe...187

Figura 120 - Trecho da história Breaking Out, no It Ain’t me Babe...187

Figura 121 - Trecho da história Breaking Out, no It Ain’t me Babe...188

Figura 122 - Trecho da história Breaking Out, no It Ain’t me Babe...188

Figura 123 - Trecho da história Breaking Out, no It Ain’t me Babe...189

Figura 124 – Trecho da história Breaking Out, no It Ain’t me Babe...189

Figura 125 - Living Blues Collective de Chicago...191

Figura 126 – The Jane Collective...192

(14)

Figura 128 - Trabalho de Aline Kominsky-Crumb...196

Figura 129 - O privado é político de Anne Charlotte Husson e Thomas Mathieu...197

Figura 130 - Trecho de Teenage Abortion de Lora Fountain...199

Figura 131 - Trecho de Teenage Abortion de Lora Fountain...200

Figura 132 - Trecho de Teenage Abortion de Lora Fountain...200

Figura 133 - Imagem de Tits & Clits...202

Figura 134 - Capa Wet Satin #1...203

Figura 135 – Detalhe da Capa do primeiro volume do Wimmens Comix...204

Figura 136: Capa Wimmens Comix #4 ... 206

Figura 137: Capa Wimmens Comix #2...208

Figura 138: Sandy Comes Out de Trina Robbins...209

Figura 139: Come Out Comix de Mary Wings...210

Figura 140: Tabela de Revistas em circulação no ano de 1976 nos EUA, produzidas pelas “most talented women in the cowtry”...211

Figura 141: Capa Wimmin’s Comix – última edição da revista...215

Figura 142: The Complete Wimmen's Comix. Compilação de todas as edições da revista, publicado em 2016...215

Figura 143: Fotografia da Women’s March, 2017...217

Figura 144: Primeira edição do RESIST!...218

Figura 145: Trabalho de Anne Van der Linden no RESIST! #1...219

Figura 146: Trabalho de Jazmine Boatman no RESIST! #1...219

Figura 147: RESIST! #2...220

Figura 148: Trabalho de Abigail Swartz para o RESIST! #2...222

Figura 149: Rosie, a rebitadeira de J. Howard Miller, 1943...222

Figura 150: Na página central da RESIST! #2...223

Figura 151: Figura 151: Trabalho de Teresa Roberts Logan para o RESIST! #2...224

Figura 152: Olga a sexóloga de Thaïs Gualberto...225

Figura 153: Viola Daves discursando no Emmy Awards...229

Figura 154: Trecho de Transistorizada de Luisa Lemos...230

Figura 155: Transistorizada. Problematizando a confusão entre identidade degênero e sexo biológico...231

Figura 156: Transistorizada. Problematizando sexo biológico, identidade de gênero e afetitivade...233

(15)

Figura 157: As diferentes dimensões que compõem a identidade de gênero e suas

articulações...234

Figura 158: Meire, da autora Laerte...234

Figura 159: Trans Girl Next Door de Kylie Wu...236

Figura 160: Ah! Nana #8...236

Figura 161: No Straight Lines: 4 Decades of Queer Comics...237

Figura 162: Capa de Faith #0 ...238

Figura 163: As Empoderadas...239

Figura 164: Quadrinho em referência as histórias de Tintin no Congo, de Hergé...240

Figura 165: Trecho do livro Reinventando os quadrinhos de Scott McCloud...241

Figura 166: Torchy Brown in Dixie Harlem de Jackie Ormes...242

Figura 167: Biografia de Carolina Maria de Jesus em quadrinhos...242

Figura 168: D.A.D.A. Salvando o mundo com a força das Orixás...243

Figura 169: Quadrinho da autora Crocomila...244

Figura 170: Dykes to watch out for de Alison Bechdel...245

Figura 171: Cena de Azul é a cor mais quente de Julie Maroh...246

Figura 172: Página inicial do site Comicosity...247

Figura 173: Cartaz do FIQ 2015, arte de Lu Cafaggi...248

Figura 174: Les Coquins de Marion Fayolle ...248

Figura 175: Les Coquins de Marion Fayolle ...249

Figura 176: Les Coquins de Marion Fayolle ...249

Figura 177: Bichinhos de jardim de Clara Gomes...254

Figura 178: Trecho do livro Reinventando os quadrinhos de Scott McCloud...261

Figura 179: Trecho do livro Reinventando os quadrinhos de Scott McCloud...262

Figura 180: Trecho do livro Reinventando os quadrinhos de Scott McCloud...262

Figura 181: Tecnologia que agiliza de Clara Gomes...265

Figura 182: Interface do banco de dados do Women in comics wiki...268

Figura 183: Interface do site Webrecorder...271

Figura 184: Interface do site de arquivamento WaybackMachine...272

Figura 185: Quadrinho da autora Helo D'angelo...274

Figura 186: Pedido da autora Heloísa D‘angelo...277

Figura 187: Trabalho de Fernanda Alves...277

Figura 188: Trabalho de Tais Campos...278

(16)

Figura 190: Autorretrato de Sarah Andersen...284

Figura 191: Processo criativo da autora Maritza Campos...284

Figura 192: Desenvolvimento do quadrinho digital de Ana Rocha...285

Figura 193: Recursos utilizados nos quadrinhos digitais...287

Figura 194: Ícone indicativo de carregamento...287

Figura 195: Trabalho de Briana Burpo...288

Figura 196: Trabalho de Briana Burpo na publicação original...289

Figura 197: Trabalho de Sarah Andersen com o uso de gif animado...290

Figura 198: Trabalho de Carolina Ito...293

Figura 199: Página de Vanessa Satone na internet...294

Figura 200: Página de Vanessa Satone na internet...294

Figura 201: Página de Vanessa Satone na internet...295

Figura 202: Livros da quadrinista Sarah Andersen...295

Figura 203: Livros da quadrinista Kate Beaton...296

Figura 204: O ônibus da madrugada - Campanha de arrecadação...296

Figura 205: O ônibus da madrugada - Arrecadação ate o dia 05/10/2019...297

Figura 206: Como apoiar o trabalho de um artista independente – Heloísa D‘angelo..299

Figura 207: Inferface do site Social Comics...301

Figura 208: Interface do site ComiXology...301

Figura 209: Imagem divulgada no twiter de Beatriz Bravo...302

Figura 210: Tumblr de Giulia Fioratti...303

Figura 211: Zine XXX... ...304

Figura 212: Quadrinho no Zine XXX...304

Figura 213: Capas da Revista Clitoris...307

Figura 214: Troca de mensagem com o site Social Comics...309

Figura 215: Guia para desenhar personagens femininas...313

Figura 216: Jane de Norman Pett...315

Figura 217: Litle Annie Fanny de Harvey Kutzmann...316

Figura 218: Capas Green Lantern...318

Figura 219: Barbarella de Jean-Claude Forest ...319

Figura 220: Trabalho de Milo Manara ...320

Figura 221: Valentina de Guido Crepax...321

Figura 222: Blanche Èpiphanie de Georges Pichard e Jacques Lob...321

(17)

Figura 224: Os Catecismos de Carlos Zéfiro...323

Figura 225: Capa de Red Sonja...324

Figura 226: Capa Wonder Woman...325

Figura 227: Cloak and Dagger da Marvel...326

Figura 228: Plop de Kate Beaton...327

Figura 229: Battle Tactic de Kate Beaton...327

Figura 230: No Dice de Kate Beaton...328

Figura 231: Trabalho de Erica Henderson...329

Figura 232: The Hawkeye initiative ...330

Figura 233: The Hawkeye initiative ...331

Figura 234: The Hawkeye initiative ...331

Figura 235: Iniciativa site Buzzfeed...332

Figura 236: Capa feita por Milo Manara...333

Figura 237: A Thor ...335

Figura 238: Capa MS. Marvel...335

Figura 239: Women in refrigerators...336

Figura 240: Cena de Womanthology...337

Figura 241: Desenho de Renae de Liz...339

Figura 242: How to draw boobies de Meghan Hetrick...342

(18)

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO...20

2. CAPÍTULO I – O Clube do Bolinha ...34

1 As histórias em quadrinhos ...34

1.1 A era de ouro das HQs ...47

1.2 Recessão (1946-1960) ...50

1.3 A era de prata (1961-1980) ...53

1.4 A partir dos anos 1980 - período de novas tendências ...53

2 As mulheres e a produção das histórias em quadrinhos...55

3 Os Clubes do Bolinha: espaços ―masculinos‖ ...63

3. CAPÍTULO II - Mulheres, artes e histórias em quadrinhos ... 75

1 A invisibilidade das mulheres nas artes ...75

1.1 A arte como um campo de poder ...91

1.2 As mulheres eclipsadas ...103

1.3 Autoria: reconhecimento e visibilidade ...112

2 Ser uma artista mulher nos tempos atuais: as quadrinistas ...126

3 Os silenciamentos das mulheres ...146

4. CAPÍTULO III - “O pessoal é político!” - As primeiras incursões coletivas das mulheres nos quadrinhos e a participação das autoras no comix underground....151

1 Os Coletivos de Mulheres Quadrinistas no underground ...161

1.1 It Aint Me Babe Journal ... 175

1.2 It Aint Me Babe Comix ... 179

2 Os coletivos como ferramentas de ação coletiva...190

3 O Wimmen’s Comix e as revistas underground de mulheres... 193

4 RESIST! - Quadrinhos, feminismo e a resistência no momento atual...215

5 A relevância dos coletivos underground para a posterior produção das mulheres nos quadrinhos ...225

5. CAPÍTULO IV - Subjetividades e polifonias: a diversidade nos quadrinhos 227 6. CAPÍTULO V - Mundo virtual, possibilidades reais: quadrinhos, arte e a internet... 251

1 As novas tecnologias do século XX...252

(19)

1.2 As possibilidades da arte na internet...260

1.3 A Net. Art...264

1.4 Arquivos virtuais: possibilidades e fragilidades de arquivamento...269

1.5 A internet e as questões relacionadas à autoria... 274

2 A internet na produção de HQ ... 280

2.1 A diversidade dos quadrinhos digitais...283

2.2 A internet e as autoras de quadrinhos...292

2.3 Quadrinhos, arte e internet – qual o futuro desse encontro?...308

7. CAPÍTULO VI - As mulheres nos quadrinhos do mainstream, as grandes produtoras e suas representações do feminino ...312

1 O apelo sexual como forma constitutiva das personagens femininas...314

2 A desnaturalização da erotização das personagens femininas...323

3 Reação das editoras à maior presença das mulheres nos quadrinhos...334

4 Para além dos corpos hipersexuais...338

8. CONSIDERAÇÕES FINAIS...344

9. REFERÊNCIAS ... ...348

10. ANEXO 1 - Charte des créatrices de bande dessinée contre le sexisme...370

11. ANEXO 2 - Colaborações nas revistas analisadas no capítulo 3...373

(20)

1. INTRODUÇÃO

Foi com notável sabedoria que Charles Chaplin afirmou: ―o assunto mais importante do mundo pode ser simplificado até ao ponto em que todos possam apreciá-lo e compreendê-apreciá-lo. Isso é –– ou deveria ser –– a mais elevada forma de arte‖. Assim, o artista que produziu obras magistrais sem expressar uma sequer palavra, considera que o valor artístico de uma obra está associado ao alcance e a retilineidade da transmissão de suas ideias. As histórias em quadrinhos (HQ‘s)1 são uma forma de expressão

contemporânea cuja simplificação faz parte de sua linguagem. Na qual, quadro a quadro, cria-se uma sequência de ações que estruturam uma história com começo, meio e fim, compostas de elementos, normativas e códigos próprios. As HQs constituem uma ―mídia autônoma que se gesta a partir de uma ideia sólida, geradora de uma narrativa que conjuga elementos verbais e não verbais‖ (PESSOA, 2014, p. 20), e utiliza-se de uma combinação entre imagem e texto, de um ritmo próprio e muitas vezes do humor para propiciar uma ―fácil‖ apreensão, ou melhor, uma apreensão imediata.

Artistas e teóricos como Will Eisner (1989) e Scott McCloud (1995) nos mostram que a linguagem própria das HQs é bastante rica e constituída por diversos elementos como planos, temas e formas narrativas, recorrendo à linguagem visual para simular tempo e ação. Todavia, por um bom tempo, as HQs estiveram cercadas por preconceitos que lhes renderam uma desvalorização no campo das artes, fazendo com que fossem vistas apenas como um produto juvenil e/ou entretenimento barato. Derivando em uma trajetória bastante peculiar.

É importante considerarmos a assertiva de Kennedy Piau (2005), na qual o autor ressalta que a ―arte‖ enquanto sistema de ideias cria as condições para a formulação de juízos de valor sobre as obras, não sendo um conceito natural, nem universal, mas, dependendo de uma valoração e dos critérios. Os parâmetros que possibilitam esses julgamentos seriam construídos historicamente, tornando assim, variável o que pode ou não ser considerado uma ―obra de arte‖2. Atualmente diversos autores como Waldomiro

1 Existem outras conceituações que definem gêneros próximos às histórias em quadrinhos, como o

cartum, a charge e a caricatura, dos quais a HQ se diferencia devido a necessidade de haver uma ação, de onde deriva a alcunha ―arte sequencial‖ (Cf. RIANI, 2002, p. 31).

2 A obra de arte difere-se da arte enquanto sistema, sendo a primeira entendida como um produto do

trabalho humano, um ato, que pode ser percebido através de sua forma. Trata-se de representações, contudo, num sentido em que se aproxima da dinâmica da performance, a qual nos remete a uma realidade que se faz presente por meio da materialidade das palavras ou imagens (Cf. FLORES et. al., 2016, p. 13).

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Vergueiro (2015) e Santiago Garcia (2010), já naturalizaram a alcunha ―nona arte‖ para falar dos quadrinhos, conferindo-lhes um reconhecimento e agregando- os à música, a dança, a pintura, a escultura, a literatura, o teatro, o cinema e a fotografia, enquanto categoria artística.

O interessante é que uma história em quadrinhos pode ser aparentemente simples aos olhos do leitor, mas isso se deve a um pequeno porém: o fato de o leitor contemporâneo já estar letrado neste tipo de mídia. Por ser um conhecedor dessa forma de linguagem, ele está apto a entender o que a narrativa dos quadrinhos, composta por dois tipos de linguagem: verbal e não verbal quer dizer. Ou seja, a apreciação deste meio de comunicação está em confluência com o momento histórico em que se vive, por estar familiarizado/ letrado neste tipo de mídia, o leitor é capaz de compreender as intersecções entre o que é dito de forma verbal ou não, direta ou intrinsecamente. Com o passar do tempo, novos meios de expressão vão surgindo e temos que lidar cada vez mais, com uma infinidade de meios de comunicação e diversas transformações de linguagens - cada qual exigindo uma forma própria de leitura e apreensão. Contudo, como ressalta Jay Lemke (2010), os significados em outras mídias não são fixos e aditivos (o significado da palavra mais o significado da imagem, por exemplo), mas sim, multiplicativos (o significado da palavra se modifica através do contexto imagético e o significado da imagem se modifica pelo contexto textual) fazendo do todo algo muito maior do que a simples soma das partes. Assim, o leitor que já está familiarizado com a linguagem do texto escrito e da imagem, ao lidar com os quadrinhos adquire uma nova habilidade de ―leitura‖, um novo letramento para uma nova linguagem. A qual integra as regências da arte (como a perspectiva, simetria, traço), e as regências da literatura, tais como a gramática, o enredo e a sintaxe, que se superpõem mutuamente, tornando a leitura da HQ um ato de percepção estética e de esforço intelectual (Cf. EISNER, 1989, p.8).

Outra característica particular desta linguagem é o fato de se valer da experiência comum do criador e do leitor, já que uma compreensão adequada depende de um elemento importante por parte do leitor: a conclusão, ou seja, o processo mental de observar as parte e perceber o todo. Assim, o espaço entre um quadro e outro é preenchido pela imaginação do leitor, que num pacto entre produtor e receptor, presume as intenções do primeiro. Isso se dá, pois, embora os quadros das histórias fragmentem o tempo e o espaço, oferecendo um ritmo recortado de momentos dissociados e, ainda que, nada seja visto entre dois quadros, a experiência indica que alguma coisa deve

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haver lá (Cf. McCLOUD, 1995, p. 67). Assim, a ―conclusão nos permite conectar esses momentos e concluir mentalmente uma realidade contínua e unificada‖ (McCLOUD, 1995, p. 68). Esta conclusão não é involuntária, pois o autor tem a consciência de que cada uma de suas escolhas é auxiliada e apoiada por seu cúmplice silencioso. Portanto, os quadrinhos constituem-se num ―meio onde o público é um colaborador consciente e voluntário, e a conclusão é um agente de mudança, tempo e movimento‖ (McCLOUD, 1995, p. 65).

Da mesma forma que a apreciação, o desenvolvimento das HQs também está associada a seu contexto, estando seu público, num contexto cognitivo e temporal favoráveis. A progressão da modernidade desencadeou, em especial a partir de meados do século XX, através das novas concepções de mercado, de industrialização e comunicação, um universo diferente do transcorrido até então. Momento no qual há um distanciamento da crença no progresso da razão e na construção racional da sociedade, da ética e da moral. Novos instrumentos de conhecimento geraram novos conteúdos, que geraram novos posicionamentos sociais frente às mudanças culturais da pós-modernidade (Cf. RAMOS, 2006, p. 25). E embora, como demonstra Andreas Huyssen (1996), tenha havido estratégias de exclusão da cultura de massa em favor de uma lógica que intenta estabelecer a ―alta‖ cultura como critério de valor, ―como uma membrana elástica, o pop remodela e reconfigura a própria ideia de cultura popular ao fazer propagar através da cultura midiática expressões culturais de ordem diversas como filmes, seriados, músicas e quadrinhos‖ (FANOTTI JUNIOR, 2015, p. 45).

Apesar de sua grande difusão e popularização através de linguagens e estratégias que atingem diretamente o público receptor, as expressões culturais da cultura pop, possuem uma instigante contradição, pois habitam curiosamente um lugar entre o produto de massa e a condição de um produto diferenciado, estando ―de um lado seu aspecto serial, a produção massiva, e de outro, o modo como os produtos pop servem para demarcar experiências diferenciadas através de produtos midiáticos, que nem por isso deixam de ser ‗populares‘‖ (FANOTTI JUNIOR, 2015, p. 45). A partir de um gosto comum por um produto midiático, se estabelece uma identidade e conjuga-se todo um ―universo‖ próprio pertencente aos que dela partilham. As HQs, por exemplo, se inserem no universo geek, uma subcultura que se caracteriza pelos interesses comuns relacionados a tecnologia, a eletrônica, jogos eletrônicos ou de tabuleiro, filmes, seriados e quadrinhos. Gerando produtos, lugares e hábitos destinados aos que partilham destes gostos comuns. Ainda que se aproxime do que outrora era conhecido

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pejorativamente como nerds, os geeks gozam de uma aceitação social, já que com a popularização da internet na década de 1990 - e tudo o que veio com ela - o termo adquiriu uma conotação positiva, definindo um estilo de vida e uma identificação social.

A aceitação social das pessoas ligadas à tecnologia está interligada à importância adquirida por esta atualmente, quando se fala da indústria cultural contemporânea, é impossível desconsiderar sua relação com o que circula na internet, com as demandas e as redes de recepção criadas pela rede mundial de computadores. Uma dinâmica própria de nosso tempo, já que a ―comunicação instantânea, a fragmentação do sujeito e a predominância da mídia na constituição do universo simbólico das grandes massas produziram sensíveis mudanças no dinamismo institucional, na política, na economia, ou seja, nas bases de reprodução de um sistema antes estável, agora em permanente mutabilidade‖ (RAMOS, 2006, p. 25).

A partir dessas ponderações, podemos pensar como alguns elementos, como uma história em quadrinhos, podem parecer ilusoriamente simples. Ledo engano, pois estão inundados de toda sorte de questões. O mesmo se dá com as imagens, por tanto tempo, ignoradas em seu potencial como fonte de pesquisa, embaraço, porém, em grande medida superado. Atualmente autores como Georges Didi-Huberman (1998) situam as imagens e o saber visual como um campo privilegiado de questionamentos. Porém, sem a pretensão de se chegar a uma ―verdade‖, ou ―fala‖ definitiva das imagens, já que, o autor compreende as imagens como pertencentes à ordem do inverificável, ou seja, das quais nunca será possível ver tudo, pois algo sempre há de nos escapar. Ainda assim, elas podem ser ricas fontes de pesquisa, pois, estão repletas, de ressonâncias, de temporalidades, carregadas de memórias e de referências. Elas estão por toda a parte, sejam ligadas aos mecanismos visuais, às associações imagéticas e simbólicas produzidas pelas lógicas neurais, à imaginação individual ou social, aos rituais, à memória, às imagens mentais resultantes das percepções, relacionadas ao mundo das mercadorias ou à estetização da política.

As imagens estão imbricadas nas práticas culturais e no humano, ―intervêm entre o mundo e nós. Mais que representar o mundo, elas o obstruem e nos levam a viver com elas, frutos de nossa criação‖ (FLUSSER apud BELTING, 2006, p. 55). Nossa memória e nossos referenciais estão encharcados de imagens, somos poços de imagens e uma vez que as formamos, elas estão em constante ebulição. Como evidencia Didi-Huberman (1998), é impossível ignorar a presença e o potencial das imagens, sobretudo no momento atual, no qual nunca a imagem se impôs com tanta força, presentes nos mais

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diversos atos cotidianos, seja nos momentos de lazer (nos filmes e outros recursos audiovisuais), na comunicação interpessoal permeada por mensagens instantâneas e

emoticons, na publicidade (como recurso usado para influenciar nossos desejos), dentre

outras dimensões, a imagem é imperiosa. Tão presente e relevante social ou individualmente, que não há como a ignorar.

Pessoalmente, me deparei mais fortemente com esse ―poder‖ da imagem, ao realizar minha dissertação de mestrado, no cerne da pesquisa estava a autora inglesa de

graphic novels, Posy Simmonds3, entretanto, ao pesquisá-la me defrontei com outras questões que por ora não pude desenvolver, mas que permaneceram latentes. Ao investigar uma autora de quadrinhos, me surpreendi com a falta de dados sobre as autoras deste tipo de material. E com o fato de me deparar com afirmativas como: ―- As mulheres não fazem quadrinhos!‖, ―- As mulheres não se interessam por quadrinhos!‖, ou quando muito, ―- Elas produzem apenas quadrinhos ‗de mulher‘, quadrinhos fofos!‖. Todavia, ao seguir na pesquisa percebi que havia uma infinidade de mulheres, envolvidas em todas as áreas da produção das HQs (ilustradoras, coloristas, roteiristas, diretoras de arte, finalizadoras, etc.) e também como autoras dos mais diversos tipos de quadrinhos. Mas então porque pouco se sabe acerca delas?

Como pondera Maria José Justino (2013), a ausência forçada da mulher na história que lhes roubava a atuação artística, ainda não foi de todo resolvida. Isso fica muito claro, no que se refere à esfera dos quadrinhos, na qual o fato de ser mulher ainda lhe rouba em grande medida a atuação artística, impondo-lhes diversas dificuldades e limitações. Fato que se dá devido à estruturação do meio como um segmento no qual desde seu início a atuação masculina foi predominante. O fato dos homens constituírem a maior parte dos artistas gráficos e escritores de sucesso, assim como, de seu público consumidor, faz com que esta indústria acabe submetida a uma lógica de mercado voltada para seu maior público, no caso, os homens, e dificulta em grande medida o acesso das quadrinistas e leitoras a esse mundo. Incutindo-se um pensamento dominante de que os quadrinhos são produzidos apenas por homens e para os homens.

3 O trabalho teve como foco os romances gráficos (graphic novels), em especial as obras da autora inglesa

Rosemary Elizabeth Simmonds (Posy Simmonds). O Romance Gráfico é um quadrinho adulto

contemporâneo, cujas suas primeiras obras importantes surgiram no fim da década de 1970, é também em parte uma continuação e uma consequência de outras tradições anteriores. Além de ser fruto de um fenômeno que ocorreu nos últimos trinta anos de conscientização do quadrinho como forma artística adulta. As obras de Posy Simmonds são representativas de algumas das principais características desse

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Duas falas de personalidades importantes do meio, são muito representativas desse senso comum, a primeira de Franck Bondoux, diretor do Festival Internacional de

la Bande Dessinèe Angoulême. O festival que ocorre anualmente na comuna

Angoulême, na França, é um dos maiores do mundo, não apenas pelo número de pessoas, mas pela grande quantidade de países, autores, atividades e exposições presentes. E em 2016 houve uma grande polêmica deflagrada quando a organização do festival lançou sua lista de 30 indicados para o Grande Prêmio da edição, e não havia uma mulher sequer entre eles - ainda que naquele ano tenham sido lançadas importantes obras de autoras mulheres. Como consequência, um terço dos autores indicados desistiu da premiação e o assunto reverberou mundialmente. Contudo, a situação tornou-se ainda mais infeliz após a declaração de Bondoux de que ―Infelizmente, há poucas mulheres na história dos quadrinhos. É uma realidade‖ (BONDOUX, 2016, n.p.).

A segunda declaração foi feita por Maurício de Sousa na feira do livro em Frankfurt em 2013. Quando uma pergunta acerca das quadrinistas brasileiras foi lançada a mesa da qual participava, Maurício declarou: "Fazer um quadrinho é um trabalho braçal" (...) "Mulher ainda não tem essa liberdade sem vergonha que homem tem, de trabalhar até tarde, tem que cuidar da casa, dos filhos, quadrinho exige muito tempo de dedicação" (SOUSA, 2013: n.p.)4. Essas declarações, no entanto, não batiam com o que eu encontrava acerca das autoras. Instigando um aprofundamento necessário sobre as mulheres autoras de quadrinhos. Já que, em fato, notei que este senso comum de que as mulheres não se interessam por quadrinhos, não os produzem (ou se produzem, eles seriam de baixa qualidade, ou segmentados) e não os leem, não tem fundamento. O que ocorre na realidade é que há uma falta de espaço para as mulheres, uma série de dificuldades de inserção, mas ainda assim, elas estão lá! Levando-nos a uma importante questão, a invisibilidade, naturalizada, por exemplo, pelas falas de Frank Bondoux e Maurício de Sousa. Assim, ao constatar que existe um grande número de mulheres atuantes e leitoras e ao analisar algumas obras, a constatação de que o problema passa longe de uma suposta falta de interesse ou de talento. Está nas estruturas da indústria e permeado pelas relações de poder: quem escolhe o que vai ser publicado? O que é aceito na arte? O que vende?

Não obstante, embora a cena tradicional tenha sido desde sempre limitante para as autoras, este cenário já apresenta mudanças, em grande parte reagindo aos quadrinhos

4 A despeito desta declaração, seria injusto deixar de citar que existem muitas mulheres trabalhando na

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independentes5, através dos quais as quadrinistas vêm, pouco a pouco mostrando que

existem sim, e que querem sair dos bastidores da indústria. Hoje há um grande número de mulheres atuando no mercado de quadrinhos mainstream6 e também uma melhor representação de personagens femininas nesses títulos. Porém, as dificuldades ainda persistem, as informações sobre elas são de difícil acesso, sendo necessário buscar nas entrelinhas. Já que nos bancos de dados sobre quadrinhos, constam pouquíssimas autoras; assim como pudemos ver pelo caso do festival Angoulême, os prêmios nacionais e internacionais ainda são excludentes; e na maior parte das livrarias é possível contar nos dedos as obras de autoras, salvo alguns best sellers como os de Marjane Satrapi e Alison Bechdel, e talvez, com muita sorte, Rutu Modan.

Mas embora, haja, nessas últimas décadas, este movimento crescente das autoras, a situação das mulheres no meio ainda é desafiadora e a disparidade entre autores e autoras é um fato. Mas porque isso acontece? Acreditando que as ausências dizem muito, reflexiono acreca desse entrevero. Podemos partir do fato de que como ressalta Jacques Leenhardt, uma suposta igualdade política, não implica necessariamente numa igualdade no âmbito privado. Assim, mesmo que a igualdade política homem/mulher, em seu princípio, tenha sido estabelecida durante a Revolução Francesa, ―no entanto, não foi capaz de se insculpir de forma durável na lei, tampouco de alterar as práticas na ordem política e menos ainda de fazer penetrar essa igualdade teórica no cotidiano da privacidade do casal e da família‖ (LEENHARDT, 2013, p. 7). Segundo o autor, entender a permanência da desigualdade de fato, ainda que a igualdade de direito seja postulada, ou até mesmo disposta em lei, ―requer considerar a exclusão como um mecanismo cujas engrenagens encontram-se aquém da lógica aparente dos discursos‖ (LEENHARDT, 2013, p. 8). Pois, ―seja baseada na diferença natural em si, na diferença dos sexos, e em suas consequências sociais: a maternidade e os papéis sociais que daí resultam‖ (LEENHARDT, 2013, p. 8), as diferenças apresentam efeitos na vida prática. Desta forma, Leenhardt esclarece que postular igualdade, ou fazer disso uma demanda política, não permite ocultar, ou esquecer esse ponto de partida diferenciado e suas consequências. Conclui, portanto, que o espaço de troca entre homens e mulheres ainda é um espaço calcado em suas diferenças, ―e, portanto, uma questão de poder‖ (LEENHARDT, 2013, p. 8).

5 Os meios alternativos, como os zines, foram caminhos encontrados para a publicação das autoras. 6 Corrente principal.

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Assim, a reivindicação igualitária não deve negar as diferenças, mas, em vez disso, deve levar essa diferença em conta e, por conseguinte, seus efeitos sobre os diversos atores. ―A abordagem histórica deve permitir escapar das aporias da binariedade dominante, ainda que esta seja invocada como ponto de partida necessário de uma reivindicação libertadora‖ (LEENHARDT, 2013, p. 8). Essas diferenças nos suscitam algumas reflexões no que concerne ao nosso objeto: existem histórias em quadrinhos de mulheres? É legítimo classificar uma obra como quadrinho feminino? É possível/ necessário fazer divisões? Existem traços ou temáticas particularmente femininos?

Para começar a pensá-las, um ponto de partida possível, é a noção ―mulher‖. Como demonstra Judith Butler (2003) na essência da teoria feminista há um entendimento de uma identidade fixa, proveniente da necessidade de uma representação política que intentava promover a visibilidade das mulheres. Contudo, nas discussões feministas mais contemporâneas, essa concepção vem entrando em colapso, pois, ao se questionar o sujeito mulheres, este passa a ser reconhecido não mais em ―termos estáveis ou permanentes‖ (BUTLER, 2003, p. 18). O problema, como esclarece a autora, é que a definição ―mulher‖ está associada a uma identidade comum limitante que não dialoga com intersecções nas identidades discursivamente constituídas - raciais, classistas, étnicas, sexuais e regionais. Outro ponto também seria o fato do gênero não se constituir totalmente como coerente e consistente. Dessa forma, é importante destacar que não há de maneira alguma, a intenção de tratar de uma suposta ―escrita feminina‖, não é essa a questão, pois, poderia incorrer em problemas de essencialização. A fim de contornar os impasses inerentes a qualquer atitude que afirme uma ―essência‖ feminina, sigo uma postura construtivista, partindo do pressuposto de que, como dizia Simone de Beauvoir (2010), ―não se nasce mulher, torna-se‖. Ciente de que o problema não pode ser abordado a partir do ângulo de uma suposta identidade feminina ―sexualizada‖, procurarei ―ir além dos conceitos binários que aprisionam a reflexão em aporias estéreis, mas que infelizmente a tradição gravou em letras de ouro na ordem do dia: homem versus mulher, cultura versus natureza, razão versus sensibilidade etc. etc.‖ (LEENHARDT, 2013, p. 7). Buscando ter em mente que a ―categoria ―mulher‖ não é única e universal, mas situada em um tempo, em uma cultura, ou seja, ―masculino e feminino são, em suma, conceitos relacionados com as normas de ordem social‖ (ESCANDÓN et. al., 1992, p. 13 e 23). Nessa perspectiva penso mulher(es) no plural, já que, as mulher(es) são inúmeras e únicas, não um conceito abstrato, não havendo uma

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essência feminina, ou uma categoria fechada de mulher. O que se entende por ―mulher‖ é afinal, como apontam autoras como Carla Akotirene (2019) e Kimberlé Crenshaw (2002), uma interseccionalidade de outras categorias, não sendo o gênero a única intersecção, assim, poderíamos dizer que não existe uma ―mulher‖, mas sim, mulheres interseccionadas.

Logo, ao invés de me apoiar em conceitos abstratos, acredito que o importante é abordar as questões de um ângulo histórico. Partindo do particular (os quadrinhos) para o geral (tudo que permeia a atuação das mulher(es) autora). Seguindo a linha da filósofa e historiadora Geneviève Fraisse (1995), a qual para ―evitar qualquer debate abstrato (...) começa substituindo a oposição binária ―homem vs. mulher‖ por um exame cuidadoso das manifestações concretas dessa oposição no campo da criação artística7‖ (LEENHARDT, 2013, p. 8). Desta forma, mais do que fazer um recorte temporal, faço um exame de manifestações concretas que permitam desenvolver as questões a serem debatidas ao longo dos capítulos.

O primeiro capítulo, se intitula O Clube do Bolinha, termo que ganhou força a partir da HQ Little Lulu (Luluzinha, no Brasil) criada em 1935 pela quadrinista Marge (Marjorie Henderson Buell), na qual, dois de seus personagens principais, Luluzinha e Bolinha vivem situações de seu cotidiano. Contudo, na história, as personagens com idades entre 8 e 10 anos estão vivendo o que na psicologia se define por ―fase latente‖, na qual pertencer à um grupo com os mesmos interesses e gostos se torna o mais importante, o que fica bastante evidente na história, como no fato de Bolinha ser presidente do clube dos meninos, cujo lema é ―menina não entra‖. Uma atitude representativa desta etapa de separação (natural e muito visível) entre os meninos e as meninas em grupos do mesmo sexo, que acabou por popularizar as expressões ―Clube do Bolinha‖ e ―Clube da Luluzinha‖, para se referir a grupos ou locais nos quais a apenas um dos sexos é permitida a entrada. O meio dos quadrinhos pode ser pensado como um desses redutos, um ―Clube do Bolinha‖, no qual a presença feminina é limitada ao máximo, a discussão acerca dessa questão é trazida neste capítulo, explorando como se constitui esse ―clube‖ masculino e as consequências que isso traz. Assim, a disparidade entre autores/as é debatida. Traçando um panorama da participação da mulher(es) como criadora de quadrinhos, e demonstrando como as

7 Fraisse observa que, após a Revolução Francesa e sua pretensa igualdade, aparece um novo tipo de

oposição, com base em um tipo de divisão sexual de papéis entre a ―musa‖ inspiradora (ainda que as mulheres mereçam um lugar nas artes, o lugar destinado às mulheres era o de musa) e o ―gênio‖, permanecendo o homem como o único pretendente ao desempenho criativo.

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mulheres, bem ou mal, sempre estiveram presentes no mundo das HQs, desde seu início no século XX. Tencionando a partir dessa discussão, expor que não se trata de uma questão de falta de capacidade ou interesse, mas sim, um impedimento histórico e social que há tempos limita e dificulta a atuação das quadrinistas.

No capítulo II, Mulheres, artes e histórias em quadrinhos um exame do que é ser uma mulher que produz arte, refletindo acerca das possíveis limitações profissionais encontradas por elas e o lugar atribuído às mulheres nas artes ao longo da história, expondo algumas estratégias como o uso de nomes ambíguos ou pseudônimos para conseguirem se inserir e produzir. Em especial, pensando através de algumas obras e depoimentos, o que é ser uma mulher que produz quadrinhos.

Se mais acima já concluímos a não existência de um quadrinho por essência ―feminino‖, com certeza, é possível afirmar que existem quadrinhos feministas! No capítulo III – “O pessoal é político!” - As primeiras incursões coletivas das mulheres

nos quadrinhos e a participação das autoras no comix underground, a reflexão sobre

algumas das principais iniciativas que as mulheres desenvolveram para forjar seu espaço nesse segmento. Neste capítulo, proponho a observação de algumas de suas primeiras estratégias de inserção. Em especial, quando no bojo da contracultura norte-americana, surgem as primeiras articulações e coletivos de mulheres quadrinistas: as obras It aint' me babe (1970) e Wimmens comix (1972-1992), Tits & Clits (1972-1987), as quais serão analisadas e discutidas neste tópico. Essas iniciativas emergem a partir das discussões geradas nas reuniões feministas e nos jornais underground em circulação nas Universidades dos Estados Unidos da América. É um momento no qual, as autoras percebem que as questões pessoais vividas pelas mulheres em seu cotidiano muito tinham de político, estando entrelaçadas ao papel social e aos espaços a elas destinados e utilizam-se dos quadrinhos para tratar destas questões. A partir disso, a explanação de como a atual reação das mulheres na cena dos quadrinhos só se tornou possível depois de muita luta feminista, porém, sem esquecer que batalha ainda está no começo.

Já no capítulo IV - Subjetividades e polifonias: a diversidade nos quadrinhos a construção de um debate acerca de como quando outros agentes começam a fazer parte do campo dos quadrinhos de maneira acentuada, o meio ganha polifonia e as possibilidades da área são ampliadas. Analisando de que forma produtos culturais como as histórias em quadrinho têm sido nos últimos anos, um instrumento para dar espaço a agentes invisibilizados. Tornando-se uma ferramenta de discussão importante, por exemplo, no que se refere ao gênero, têm aberto possibilidades para que autoras queers

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e trans debatam a representatividade e rompam com a ideia binária de gênero, assim como, têm sido para autoras negras e periféricas uma ferramenta de empoderamento e resistência.

Importante, pois, como destaca Jacques Leenhardt, hoje, ―nas democracias ocidentais, vivemos em um sistema social no qual os lugares e os papéis sexuais se redistribuem em boa parte conforme as histórias pessoais e os desejos individuais de cada um‖ (LEENHARDT, 2013, p. 9). Assim, a partir da desconstrução da ideia de que quadrinho é apenas para o público masculino, hétero e branco ou apenas infantil e considerando que, como todo produto cultural é produto e ―arma‖ da sociedade que o produziu, a buscar por desenvolver uma profícua discussão sobre a arte, o entretenimento e a comunicação como veículo de empatia e inclusão - uma possível e importante ferramenta na resolução de conflitos.

No capítulo V – Mundo virtual, possibilidades reais: quadrinhos, arte e a

internet traremos uma discussão acerca das redes de sociabilidades das autoras, as quais,

vão muito além das fronteiras geográficas, assim como, o alcance de suas obras e público leitor. Relevante, pelo fato de notarmos que seria falho categorizar as autoras apenas por países, já que em grande medida, as quadrinistas têm uma grande circularidade, tendo em vista o fato de que transitam geograficamente, identitariamente e nos espaços de atuação transnacional forjados por elas (revistas, publicações, premiações, feiras, coletivos, grupos em redes sociais, etc.).

Trataremos também, da importância da rede mundial de computadores tanto como meio de veiculação, compartilhamento, financiamento, articulação entre as autoras, via de contato direto com o público, produção de obras, espaço de auto edição e divulgação dos quadrinhos8. Neste sentido, um ponto importante no que concerne às possibilidades abertas pelos meios digitais, é o fato de que tem havido uma grande profusão de trabalhos que se enquadram no que vem sendo conceituado como Net.art , termo que refere-se a uma arte realizada para/no meio virtual, que difere-se de uma arte na internet (a qual utiliza-se da internet como meio de divulgação das obras), e tem sido bastante popular entre as autoras de quadrinhos independentes. É relevante pensarmos também nas especificidades da preservação de obras artísticas produzidas com meios digitais. Giselle Beiguelman (2014) aponta para um vazio metodológico no trato dos

8 Contudo, conscientes de que, embora esteja sendo um veículo muito importante, possibilitando com que

as mulheres construam sua dinâmica própria de atuação, por mais que traga possibilidades, não está ao alcance de toda e qualquer autora, mas apenas daquelas que têm acesso à rede mundial de computadores.

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produtos culturais criados com meios digitais. A autora enxerga a Net.art como um exemplo de bens culturais que não só resistem à objetificação, mas que muitas vezes só existem contextualmente. Portanto, é importante considerar que o contexto fatalmente interfere na compreensão da obra, pois, como nos coloca Margot Lovejoy (2004), a internet cria uma situação totalmente inédita em que a relação entre conteúdo e contexto é de intercâmbio permanente:

Na internet o contexto está intimamente ligado ao conteúdo. A dinâmica da web traz elementos informacionais por meio de diferentes fontes que são combinadas apenas quando o participante ativa a tela. Os comandos do monitor estão conectados ao código estruturado e programado do site, os quais estão disponíveis por meio de um servidor local conectado a um território globalmente acessível. (...) Por intermédio de meios de transferência e transmissão, o contexto também pode se tornar conteúdo (LOVEJOY, 2004, p. 223).

Ainda nessa perspectiva, quanto à recepção, Beiguelman destaca que o que particulariza as artes em rede, em relação às outras, é o fato de que em ambientes online, o contexto não só interfere na recepção da obra como também a modela.

Afinal, a net art é bem mais do que arte criada para a internet. É arte que depende da internet para se realizar, um tipo de criação que lida com diferentes modos de conexão, de navegadores, de velocidade de tráfego, de qualidade de monitor, resolução de tela e tantas variáveis que alteram as formas de recepção. (...) Trata-se, portanto, de uma arte intrinsecamente ligada a uma fruição do/em trânsito. Obras que só se dão a ler enquanto estiverem em fluxo, transmitidas entre computadores e interfaces diversas (BEIGUELMAN, 2014, p. 14).

Esse tipo de arte tem uma natureza efêmera e exige novos procedimentos de preservação. Assim, discuto como a internet vem marcando as formas de arquivamento, leitura e desenvolvimento artístico e tem sido muito importante para a construção de uma dinâmica de atuação que tem trazido maiores possibilidades e visibilidade para as quadrinistas.

No sexto e último capítulo, As mulheres nos quadrinhos do mainstream, as

grandes produtoras e suas representações do feminino a formulação de uma discussão

sobre as mulheres nos quadrinhos de nicho mercadológico. Perpassando pela representação das mulheres nesse tipo de quadrinhos e as reações à estética hipersexualizada recorrente no gênero. Observando como a maior presença atualmente de autoras e personagens femininas não parte apenas de uma tentativa de tornar os produtos mais diversificados, mas de uma necessidade mercadológica. A ênfase em como, no meio editorial mais tradicional (mainstream), no qual a situação sempre foi

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mais excludente, surgem selos de editoras como a Boitempo e Nemo que — ao notar a tendência dos quadrinhos autorais independentes, e uma possível fatia de mercado não alcançada — lançam linhas editoriais voltadas para as mulheres. Assim, a observação sobre como o mercado tem reagido às articulações das autoras. Outra questão relevante, é o fato de que, curiosamente está neste segmento uma das contradições que perpassam a produção das autoras, já que são algumas obras desta natureza, os quadrinhos mainstream, os responsáveis por alcançar um lugar de destaque nas vendas entre as obras de autoras mulheres, mas é também neste segmento que se encontram as maiores dificuldades para a grande maioria delas.

Assim, além de tantas outras questões, ao longo do trabalho perpasso pelos principais nichos temáticos que foram sendo identificados ao longo da pesquisa, presentes nas obras das quadrinistas, sendo eles três: o ativismo, a subjetividade e o mercado. O primeiro deles, o ativismo dá origem a HQ's feministas, cujo ponto de partida é uma motivação militante (capítulo III); o segundo nicho, se relaciona à subjetividade de quem narra (capítulo IV), no qual as HQs tornam-se uma forma de lidar com dramas pessoais, e de se expressar, não havendo aí, necessariamente uma preocupação comercial, ou com uma grande circulação das obras; e por fim, o nicho mercadológico (capítulo VI).

Através dessa pesquisa penso como se dá a inserção das mulheres nesse meio até há pouco, um ―clube do bolinha‖, um espaço em que predominava a atuação masculina. Fazendo isso através da investigação e análise do espaço ocupado por elas, das formas utilizadas por elas para se inserir e das maneiras encontradas para produzir e distribuir seus trabalhos. Ao longo dos capítulos pontuo as iniciativas articuladas por elas para viabilizar sua atuação como autoras, as maneiras encontradas pelas artistas para forjar seu espaço no segmento das histórias em quadrinhos. Para assim, discutir questões que permeiam o cotidiano profissional das autoras através de uma análise de iniciativas e articulações, ou seja, de suas estratégias de inserção, as formas que as mulheres se utilizaram e se utilizam e o percurso construído por elas na busca por espaços profissionais como quadrinistas. Porém, tendo em mente a importância de não olhar para as questões numa dicotomia masculino/feminino. Lembrando ainda, que dentro da categoria ―autoras de quadrinhos‖ existe uma grande diversidade a ser considerada.

Pretendo através desses debates, demonstrar que os quadrinhos feitos por mulheres, não são um assunto nada simples, pelo contrário, há uma infinidade de nuances. E se possível, com a tese, colaborar para uma maior visibilidade e

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reconhecimento com igualdade das autoras. Desconstruindo o silenciamento forjado pelas relações de poder nesse campo. Entendendo que, por enquanto, os espaços exclusivos para as autoras ainda são necessários, mas que há uma intenção e um movimento no sentido da dissolução dessas separações. Observando que a intenção das autoras e de seus trabalhos é transcender qualquer associação com gêneros, na direção de serem apreciadas/ reconhecidas em última instância, pelas qualidades das obras. Assim, almejo que dentro em breve, o que importe, no fim das contas, seja, ―o que cada artista, com o corpo que tem, pode pôr na pauta da contemporaneidade‖ (JUSTINO, 2013: s/p).

Com a pesquisa busco demontrar que as mulheres sempre fizeram parte das histórias em quadrinhos (ainda que em menor número quando em relação aos homens) estando suas participações como produtoras de histórias em quadrinhos relacionada muito mais a uma falta de visibilidade de sua atuação, do que a uma pretensa falta de interesse em produzir esse tipo de material, e muito menos a uma falta de capacidade para tal.

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2. CAPÍTULO I - O Clube do Bolinha

Neste capítulo discutiremos acerca dos ―Clubes do Bolinha‖, ou seja, espaços tidos como territórios masculinos. Nesses locais, a presença das mulheres ou de outros sujeitos sociais que não sejam homens, é diminuta. E quando o acesso a eles é desejado, apresentam-se uma série de desafios a serem transpostos.

Investigaremos sobretudo, o que acontece quando as mulheres reivindicam uma participação em espaços que não são construídos para elas. Assim como, observaremos as estratégias utilizadas por elas para adentrá-los. O ―clube do Bolinha‖ ao qual dedicaremos especial atenção é o campo da arte, em especial, discutiremos o trabalho de mulheres envolvidas na produção da ―nona arte‖9: as histórias em quadrinhos. Observaremos os desafios que podem se interpor numa profissão na qual a maioria de seus editores, roteiristas, ilustradores, coloristas, e demais profissionais envolvidos em sua produção e distribuição - desde o surgimento desse produto cultural - são sujeitos do sexo masculino.

Além do papel atribuído a elas no campo artístico e nos quadrinhos, observaremos as questões que permeiam os trabalhos das mulheres, seus desafios para produzir e veicular suas obras. Nesse sentido faremos um panorama da participação das autoras no universo das historias em quadrinhos, debateremos a disparidade entre autores e autoras e pontuaremos as estratégias de inserção forjadas por elas.

Contudo, ao examinar o lugar que as autoras ocupam, a intenção é demonstrar como a despeito das dificuldades encontradas, e de preconceitos que habitam o senso comum (como a ideia de que as mulheres não produzem ou não se interessam por quadrinhos), elas são parte constitutiva dessa arte, pois, estão e sempre estiveram presentes no mundo das histórias em quadrinhos.

1 - As histórias em quadrinhos

As histórias em quadrinhos (HQs) são uma forma de expressão da cultura moderna e contemporânea. Alguns elementos são característicos de sua linguagem, a qual é formada por ―uma combinação de imagem e texto em balões, que obedecem a

9 Em finais do século XX, após o surgimento de um gênero de quadrinhos conhecidos como graphic novels, e uma intensa discussão se os quadrinhos seriam ―arte‖, muitos autores passaram a utilizar a

alcunha de ―nona arte‖ para classifica-los. As histórias em quadrinhos somaram-se a música, a dança, a pintura, a escultura, a literatura, o teatro, o cinema e a fotografia, e passaram a ser entendidos como um gênero artístico independente, baseado em valores literários e artísticos próprios.

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uma sequência narrativa estabelecida por quadros, em que se mesclam discursos diretos dos interlocutores contidos na história, tais como personagens narradores‖ (PESSOA, 2014, p. 11). Porém, em última instância, a denominação ―histórias em quadrinhos‖ se refere a um meio em si, não a um objeto físico específico como um ―gibi‖, isso porque, as histórias em quadrinhos podem ser de diversos tipos e utilizar uma grande variedade de suportes. Então, ao falamos desse tipo de arte torna-se necessário separar a forma de seu conteúdo.

Figura 1: página da história "Placas tectônicas" de Margaux Motin

Fonte: (MOTIN, 2016, p. 9)

O que quero pontuar é que a forma artística conhecida como ―histórias em quadrinhos‖, pode usar seus elementos narrativos e sua linguagem (que mistura imagens e textos) de formas diferentes no desenvolvimento de suas histórias. Assim como, pode utilizar para isso variados suportes, derivando em formatos e tipos diversos, que, entretanto, não deixam de ser HQs. Embora a palavra ―quadrinho‖ na denominação

Referências

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