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O desenvolvimento da criança e a constituição do sujeito

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Academic year: 2021

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UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

DHE- DEPARTAMENTO DE HUMANIDADES E EDUCAÇÃO CURSO DE PSICOLOGIA

ANA PAULA ZARDIN GEHRKE

O DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA E A CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO

IJUÍ (RS) 2018

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ANA PAULA ZARDIN GEHRKE

O DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA E A CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO

Trabalho de Conclusão do Curso de Psicologia do Departamento de Humanidades e Educação da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul - UNIJUÍ, como requisito parcial para a obtenção do título de Psicóloga.

Orientadora: Profª Ma. Ana Maria de Souza Dias

Ijuí/RS 2018

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AGRADECIMENTOS

Primeiramente, quero agradecer a Deus, por me dar força e saúde para superar as dificuldades e conseguir esta conquista.

À minha família, por estar sempre ao meu lado, apoiando e dando suporte para que esse momento chegasse.

Ao meu namorado, pela ajuda, incentivo, compreensão, companheirismo e carinho.

Aos meus amigos, pelo apoio e compreensão pela minha ausência em alguns momentos deste período de construção acadêmica.

À Professora Ana Maria de Souza Dias, minha orientadora, que aceitou trabalhar o tema comigo, buscando sempre me incentivar e auxiliar nessa trajetória.

À Professora Sonia Aparecida da Costa Fengler, por aceitar o convite para avaliar este trabalho na banca examinadora.

A todos os professores da UNIJUÍ pelo conhecimento transmitido e pela contribuição na minha formação acadêmica...essenciais na construção da formação profissional.

A todos que de forma direta ou indireta, contribuíram com este trabalho e durante a minha formação, o meu muito obrigado... sem vocês, nada disso seria possível de ser concretizado com êxito.

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RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo apresentar a forma como ocorre a constituição psíquica da criança, através de uma revisão bibliográfica que tem como referencial teórico a psicanalise. Em um primeiro momento, o texto apresenta como ocorre a estruturação psíquica da criança, desde o tempo do infans, o desejo antecipado por parte dos pais, a criação do mundo simbólico, a importância da linguagem como estrutura, o processo de maturação, crescimento e desenvolvimento tanto biológico como psíquico da criança. Em um segundo momento demonstra-se a importância das funções materna e paterna para que ocorra a constituição psíquica do sujeito, trabalhando a importância do narcisismo, do estádio do espelho, o complexo de édipo, a castração.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 6

1. A ENTRADA DA CRIANÇA NO MUNDO SIMBÓLICO ... 8

2. A RELAÇÃO DUAL E A ENTRADA DO TERCEIRO ... 22

2.1. Função Materna ... 22

2.2. Função Paterna ... 31

CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 44

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INTRODUÇÃO

Durante a trajetória acadêmica, o entendimento em relação a constituição psíquica do sujeito foi fundamental, principalmente para a prática psicanalítica. Neste percurso, alguns questionamentos apareciam: “de que forma se estrutura o sujeito?” “qual a importância da função materna e paterna para a constituição psíquica?”, “como ocorre a inserção do sujeito na linguagem?”. Aspectos que irão ressaltar a importância do desenvolvimento infantil para a constituição psíquica.

O presente trabalho aborda os aspectos essenciais para a constituição psíquica do sujeito, tendo como objetivo ressaltar a importância da função materna e da função paterna para a constituição do sujeito, através do viés psicanalítico. Apontando os aspectos relevantes do desenvolvimento infantil e abordando como ocorre a inserção da criança no campo da linguagem, no campo social, através do Outro. Descrevendo o narcisismo, os processos do estágio do espelho, do complexo de édipo, destacando a relevância desses conceitos no desenvolvimento infantil, assim como para a constituição psíquica do sujeito.

Este trabalho será realizado através de uma pesquisa bibliográfica, com referências teóricas em obras reconhecidas no campo da psicologia, assim como em artigos que constituem o tema da constituição do sujeito. Autores reconhecidos da psicanálise serão abordados, como: Sigmund Freud, Jacques Lacan e os autores contemporâneos, como Alfredo e Julieta Jerusalinsky, Luiz Alfredo Garzia-Roza, Juan David Nasio, entre outros autores que são referências neste tema.

A pesquisa será constituída em dois capítulos, que apresentarão o desenvolvimento infantil na constituição do sujeito. No primeiro capítulo será abordado o processo do desenvolvimento, desde o período de gestação até a formação da constituição do psiquismo do sujeito. Já no segundo capítulo será apresentada a importância das funções materna e paterna para a constituição deste processo.

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O trabalho irá abordar a criança mesmo antes de nascer, a elaboração do mundo simbólico por parte dos pais, do desejo antecipado por estes. Sendo que esta participação ocorre desde o descobrimento da gravidez, no momento em que os pais passam a simbolizar a criança. Ou seja, a organização cultural em volta da criança, que já está estruturada e lhe aguardando. No momento do nascimento, o sujeito precisa se apropriar deste lugar, atuar na organização do corpo, na constituição do psiquismo, se inserir no campo da linguagem, que já está estabelecida.

O sujeito encontra-se em constante processo de desenvolvimento, de crescimento, constituindo-se enquanto sujeito único e singular, elaborando a sua constituição psíquica, através das marcas inscritas pelos pais. As funções materna e paterna são as responsáveis pela inserção do sujeito no mundo.

Em um segundo momento do trabalho será ressaltado a importância da função materna, do narcisismo, do estádio do espelho, para em seguida apresentar a função paterna e o complexo de édipo. Dito de outra forma, o segundo capitulo trabalhará o drama familiar em torno da constituição psíquica do sujeito.

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1. A ENTRADA DA CRIANÇA NO MUNDO SIMBÓLICO

Conforme Zornig (2000), os primórdios da psicanálise apontam diversos significados ao conceito da infância. Freud ao apresentar a infância, relaciona esta como um fator infantil que retorna do recalcado, ou seja, o infantil trata-se de uma infância que foi recalcada, mas ao mesmo tempo pode ser considerada como fundadora, pois é através da amnésia infantil que passa a constituir o sujeito, a sua história. Ressalta-se que no momento em que a criança passa a ser inserida no registro imaginário, através da linguagem, ela já pode ser considerada um sujeito em pleno direito.

A criança não ocupava um lugar central na relação familiar, sendo que foi a partir do período da Renascença que surgiu a infância. Até o século XII, a infância não tinha um lugar no mundo ocidental, não havia uma distinção entre o mundo infantil e adulto. Conforme Zornig (2000), no século XVII, a criança começa a ser vista como centro no seio familiar, mas ainda a infância era pouco vista, considerada como algo sem importância, sendo que a criança ocupava um lugar anônimo.

No mundo antigo, a criança possuía uma relação melhor com a comunidade, do que com os próprios pais, sendo que as crianças acabavam amadurecendo antes, se tornando adultos desde muito cedo, pois assumiam posições de poderes em idade bem prematura. Através da distinção do espaço público e privado, a família passa a se estabelecer e a infância passa a ser vista como um período que a criança se prepara para o futuro (ZORNIG, 2000).

Conforme Badinter (1985), a família do século XVII não deve ser considerada como moderna, pois não se caracteriza pela intimidade que ligam os pais de seus filhos. A criança ainda possuía um lugar insignificante, sendo que a infância era ressaltada pelo lado negativo, ligado a teoria do pecado. Os teólogos da época apresentavam o nascimento da criança ligado ao símbolo do mal, sendo que a sua libertação ocorreria através da luta contra a infância.

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Descartes (1983) apresenta que a infância não é um momento apenas de pecado, mas também de erro, em que a criança era dependente das impressões que seu corpo manifesta. Desprovida de intuição e de crítica, a criança que se deixava levar pelo prazer e pela dor, estava condenada ao erro. Para os pais, a criança era considerada como um estorvo, principalmente por necessitar tanto destes nos primeiros momentos da sua vida, sendo que na França por exemplo, as mães deixavam de amamentar seus filhos, para amamentar as demais crianças, para possuir um reconhecimento e receber mais.

Entende-se que a criança necessita dos adultos, principalmente da função materna e a função paterna. A psicanálise, principalmente a teoria freudiana, ressalta a importância dessas primeiras relações objetais da criança, do narcisismo que ocorre na relação parental com o filho, do discurso dos pais, que apresentam as expectativas e desejos a respeito desta criança, da entrada desta na ordem da cultura e da linguagem, sendo que isso depende do lugar que os pais designam esta criança, sendo que este lugar irá garantir a sobrevivência da criança, humanizando-o. (ZORNIG, 2000).

Conforme Zornig (2000), o conceito de infantil, segundo a teoria freudiana, sofreu algumas modificações com o decorrer do tempo. Sendo que este conceito se encontrava ligado a infância, mas ao mesmo tempo se distanciava deste, pela necessidade teórica de propor um modelo baseado na fantasmática do sujeito, do desejo inconsciente, assim como na investigação do aparelho psíquico.

Conforme Ferranti (2002), a infância para a psicanalise é considerada como um tempo em que o sujeito busca dar significação à pulsão. Os textos freudianos apresentam a pulsão ligada a erogenização que o bebê faz com o corpo, em que o investimento feito pela criança parte das marcas feitas pelo Outro1.

As teorias freudianas apresentam a infância relacionada em primeiro momento com a sexualidade, com as cenas sexuais que ocorriam neste período, em que a infância era considerada como uma cronologia do sujeito. Estas postulações, que relacionavam a infância com as cenas sexuais acabaram gerando grande impacto repulsivo, da sociedade do século XX.

1 Os textos lacanianos caracterizam como um lugar simbólico que determina o sujeito, representado

pelo significante, que se encontra em uma cadeia que o determina. Este significante pode ser visto como a lei, o inconsciente, a linguagem.

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Freud (1905) ressalta que a sexualidade que ocorre na infância, se apresenta tardiamente na vida adulta, e acaba se confundido com o que foi vivido na primeira infância. Para ele, a sexualidade está ligada ao infantil, e é entendida como um motor para o aparelho psíquico. O aparelho psíquico em que se refere, trata-se de uma constituição que ocorre a partir de sistemas, sendo eles o consciente e o inconsciente, que possuem características diferentes, mas encontram-se articulados. Os textos freudianos ressaltam a constituição da vida sexual infantil, ligado ao auto-erotismo, ou seja, ao prazer através dos próprios órgãos genitais. No primeiro tempo a relação objetal passa a ser estabelecida, e o corpo da criança ainda necessita dos cuidados maternos. A teoria freudiana dá a criança a oportunidade de falar por si, retirando esta do lugar de objeto ideológico (ZORNIG, 2000).

Em relação aos cuidados com essa criança, surge o nascimento do infans, este considerado como objeto de investimento que a família coloca sobre os primeiros cuidados com a criança. O infans irá se extrair do Outro a identificação, fazendo com que a criança se coloque no lugar de objeto. Freud (1905) ressalta que o infans necessita de um outro para sua existência, sendo dependente deste para lhe dar significações, para lhe atribuir um lugar, e para que isso ocorra, a linguagem é um fator essencial (PIZUTTI, 2012).

Quando bebê, a criança ocupa a posição de infans, tempo este que se refere aquele que ainda não fala, que é incapaz de contar a sua história. Não se trata apenas do fato de não ter adquirido a língua, a modulação fonoartuculatoria, mas sim de não ter se inscrito ainda as coordenadas psíquicas para a enunciação do desejo. (JERUSALINSKY, 2002).

Conforme Jerusalinsky (2002) há um tempo para o infans se constituir, ocorrendo por meio do outro. O tempo é antecedido pelo tempo do desejo, é um tempo continuo. Lembrando que, o desejo aparece mesmo antes do nascimento da criança, no momento em que a mãe nomeia esse filho, ela passa a estruturar a criança no mundo simbólico, sendo que estas marcas que a mãe vai deixando na criança, são conhecidos como traços mnêmicos2.

2 Conforme as obras freudianas, os traços mnêmicos designam a forma na qual os estímulos se

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A descoberta de uma gravidez desperta diversos sentimentos nos pais em torno do bebê. Espera-se por parte da função materna e da função paterna um grande investimento narcísico em torno da criança. É fundamental que haja um desejo implicado em torno da criança, sendo que este desejo é sustentado em um primeiro momento pelo Outro encarnado, que se refere a função materna.

O bebê mesmo antes de nascer já é esperado no mundo simbólico pelas pessoas que o rodeiam. Um processo simbólico é elaborado desde o momento da gestação, envolvendo tudo que a mãe pensa a respeito desta criança que está por vir. São processos que se constituem no campo simbólico, não só no biológico, pois não se trata de uma simples conexão orgânica. É importante destacar a constituição da estrutura simbólica para o bebê antes mesmo dele nascer, pois caso a criança chegue ao mundo e não encontre essa estrutura constituída, ele necessitará de um tempo para que essa estrutura simbólica produza inscrições constituintes nele.

No momento do nascimento, o sujeito se encontra com uma estrutura de linguagem já pré-estabelecida, uma organização cultural já o espera. O bebê terá que incorporar esta organização para a mesma atuar na constituição do seu psiquismo.

O psiquismo do bebê surge do encontro do seu corpo, os aspectos biológicos, especialmente do sistema nervoso central, em conjunto com os aspectos culturais, da estrutura simbólica que lhe aguarda, mesmo antes de nascer. No momento em que a criança vai constituindo seu psiquismo, ela passa a se tornar falante e desejante, ocupando a posição de sujeito. Sendo este único e singular mediante a sua história.

A criança irá se introduzindo aos poucos no mundo simbólico a partir das funções essenciais na humanização, que são as funções materna e paterna. Sendo que estas funções devem ser cumpridas, independente de quem exerce, não precisa ser necessariamente a mãe ou pai biológico da criança.

As funções materna e paterna são fundamentais na constituição psíquica da criança, pois são elas que irão introduzir a criança no mundo simbólico. É por essas funções que ocorre o processo de humanização, através da transmissão da cultura, da linguagem e dos costumes.

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Ressalta-se que para Jerusalinsky (2002) a constituição psíquica e o desenvolvimento não ocorrem de puro estímulo sensoriais, mas da sujeição ao crivo simbólico, a rede de significantes do Outro, primeiramente encarnado da mãe.

Segundo Lacan (1964 apud Jerusalinsky, 2002, p.158) o outro é o lugar no qual se situa a cadeia do significante que rege tudo aquilo que, do sujeito, poderá se fazer presente, é o campo desse ser vivente onde o sujeito tem que aparecer.

A criança passa a se questionar em relação ao que esse Outro quer dele, inscrevendo assim o sujeito da lógica desejante. Lacan (1998) ressalta a importância dos cuidados do Outro para com o recém-nascido, sendo que o desejo que esse Outro investe, não deve aparecer como anônimo e sim endereçado a criança, ou seja, cabe a mãe investir no infans, mesmo que seja através das faltas que aparecem nela.

Jerusalinsky (2002) explica que o desenvolvimento da criança está ligado a constituição psíquica, ao laço que o bebê estabelece com o Outro. Os primeiros tempos de vida são essenciais para a configuração na vida psíquica, ressaltando que o Eu não se trata de uma estrutura originaria e biologicamente determinada, mas de uma instancia psíquica que vai se constituindo através dos investimentos libidinais do outro.

Inconscientemente, o lugar do filho se constitui para os pais através de uma possibilidade narcísica de transmissão de seus próprios ideiais. Esta inscrição na filiação, assim como o endereçamento às ideiais parentais e sociais, são aspectos fundamentais para a constituição do sujeito.

Ferranti (2002) ressalta que para ocorrer a função materna não basta apenas a maternagem, ou seja, os cuidados essenciais para a sobrevivência, mas se faz necessário que o bebê ocupe o lugar de objeto deste Outro cuidador, que ele seja capturado por ele. A criança torna-se dependente deste Outro, que lhe proporcionará significações.

Através das significações, a criança faz a passagem de um corpo que antes era visto apenas pelos aparatos biológicos, para um corpo inserido na linguagem, que possui representações e significações. Constituindo assim, um sujeito único e singular, que se apoia em vínculos em que faz trocas com o meio, através dos objetos parciais, passa a ser considerado como um sujeito autônomo do seu desejo.

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O tempo de ser bebê está ligado as fantasias materna, sendo estas fundamentais para sua constituição. O primeiro tempo da constituição psíquica, implica na constituição desta criança, desta alienação que ocorre por parte da função materna, em que o bebê passa a “ser no Outro”.

Conforme Jerusalinsky (1999), na constituição do sujeito, o que se desenvolve é capacidade da criança em se apropriar da instancia psíquica, do uso dos sistemas simbólicos. Sendo esses sistemas responsáveis pela organização das relações de objeto no campo fantasmático, por consequência, no campo da realidade.

Conforme a teoria Lacaniana, o sujeito aparece como o estatuto do falasser3 (Lacan, 1975), ou seja, ele se submete à uma experiência ligada a instância de um suposto saber, sendo este inconsciente. Desta forma, entende-se que para a psicanálise o sujeito é visto a partir da concepção do inconsciente. Sendo que a estrutura do inconsciente é levada em conta, através dos significantes que marcam a história e constituem este. A teoria lacaniana ressalta o sujeito para além da consciência, reconhecendo este enquanto sujeito da linguagem no inconsciente.

Para a teoria freudiana, o inconsciente é um sistema que contém conteúdos recalcados, sendo conteúdos que são recusados pelo pré-consciente quando ocorre o recalque. Pizutti (2012, p. 8) conceitua como “As representações psíquicas não suportadas pelo Ego (consciente) são recalcadas, passando então ao Id (inconsciente) e pelo crivo do superego (regulador moral)”.

Conforme Pizutti (2012), entende-se que para ocorrer a constituição do sujeito, alguns aspectos são necessários, sendo eles: a noção do inconsciente, assim como a sexualidade, vista como organizadora da vida psíquica, do corpo pulsional, e a estrutura da linguagem. Para ocorrer a constituição do sujeito é fundamental a construção psíquica pela criança.

Para a estruturação do sujeito, a falta é necessária, sendo que está também é imposta pela mãe, em que ela deixa marcas no corpo desta criança. De certa forma, para que ocorra o desenvolvimento da gestação, é preciso que haja um desejo por parte dos pais com a criança, e para ocorrer isso, a falta se faz necessária.

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Termo que condensa o sujeito do significante com a substância gozante, e inclui na noção de sujeito o corpo (LACAN, 1975).

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Para a criança, esta falta também é essencial, pois irá provoca-la em relação a sua pulsão, enquanto representante do biológico. Sendo que está falta pode ser aliviada através do outro (objeto). A marca que fica inscrita pelo objeto que falta, é o que irá desenhar o inconsciente, ou seja, o objeto do desejo. Entende-se que, a pulsão é a promotora do desejo.

Conforme Pizutti (2012), o significante que causa a falta estará sempre no imaginário do recém-nascido, cabe ressaltar que o real do vazio é o responsável por lhe causar o desejo. Durante os primeiros tempos de vida do recém-nascido, a mãe se faz presente com o seu desejo de suprir as primeiras necessidades desta criança. É através da ação do suprir, que o infans constrói a demanda, sendo que está se apresenta como um atrelamento, um pedido tanto do filho para a mãe, como vice e versa.

A relação do objeto do ser humano está sempre atravessada pela linguagem. O ser humano carece do saber que permita encontrar o objeto certo para sua satisfação, mas o único modo em que o sujeito tem acesso a qualquer saber, passa pelo Outro. É a partir do “tesouro do significante” do Outro, que este Outro constrói a demanda do bebê.

A mãe não só estabelece a demanda, como coloca em cena o saber inconsciente para significar, por exemplo, o choro da criança. Ocorre uma sustentação de uma suposição do sujeito já quando nasce, em que a mãe busca responder a sua demanda. Ela formula uma reposta à demanda do bebê, certificando-se que a significação que atribui à essa demanda estava certa (PIZUTTI, 2012).

Essa sustentação por parte da mãe, da suposição do sujeito, ocorre desde muito cedo, sendo que muitas vezes as reações do bebê são apenas reflexos involuntários, sem intenção. Mas a partir desse momento, nota-se a suposição de um desejo no recém-nascido.

Conforme Jerusalinsky (2002), a mãe no movimento de articulação do seu saber inconsciente, com a demanda do bebê e da rede significante passa a dar sentido a esse bebê. Articulação ligada à pulsão pela demanda, assim como a dimensão do desejo, pois cabe ressaltar que a pulsão não fica toda articulada na

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demanda, o desejo sempre escapa, busca ir atrás do que foi inscrito como satisfação.

Busca insistente de um objeto ao outro, um reencontro com um objeto perdido. Desta forma, entende-se que a demanda acaba articulando o sujeito em relação ao objeto, e já o desejo é algo inarticulável, pois o objeto neste caso é mítico e nunca corresponde com os objetos da realidade, assim como ele é o efeito de uma articulação da pulsão ligado ao Outro. Ou seja, o desejo será sempre irrealizável, pois sempre estará buscando pela satisfação, sendo que isso é o que move o sujeito. (JERUSALINSKY, 2002).

A criança deposita na mãe todos os seus desejos, esperando que a mesma realize.

Para Lacan (1999, p. 96) o desejo é: [...] uma defasagem essencial em relação a tudo o que é, pura e simplesmente, da ordem da direção imaginária da necessidade – necessidade que a demanda introduz numa ordem outra, a ordem simbólica, com tudo o que ela pode introduzir aqui de perturbações.

Desta forma, entende-se que a demanda é responsável por despertar o desejo em que o filho responda conforme a mãe desejou. Cabe ressaltar que é um processo importante que esta mãe não responda sempre a demanda deste bebê, que ocorra uma alternância nos cuidados do bebê, que essa mãe se faça presente, mas também ausente. Assim sendo, vai se produzindo para o bebê a inscrição psíquica de satisfação e insatisfação.

A satisfação faz com que o sujeito procure reencontrar esta situação. É através da experiência de satisfação, que o sujeito busca o desejo. Jerusalinsky (2002) já dizia que no momento em que ele busca reestabelecer a situação de satisfação original, este impulso é o que chamamos de “desejo”.

Segundo Lacan (1964 apud Jerusalinsky, 2002, p 138) “[...] O desejo situa-se na dependência da demanda- demanda que, por aticular-situa-se com significantes, deixa um resto metonímico que desliza sob ela, um elemento que não é indeterminado, que é a condição, ao mesmo tempo absoluta e inapreensível, um elemento que está necessariamente em impasse, um elemento insatisfeito, impossível, não reconhecido, que se chama desejo[...]”.

Através desse desejo, a mãe permite que o filho esteja atrelado ao corpo dela, constituindo assim os dois, um só corpo. Desta relação se inauguram as zonas erógenas da criança, através dos laços libidinais, que são manuseadas pela mãe.

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Isso ocorre através de um saber que ela supõe, quando responde por exemplo, ao choro da criança supondo saber o motivo deste. Com este saber, ela investe no corpo desta criança, mapeando as zonas erógenas deste, assim como amarrando os significantes que até então se encontravam solto. Na significação do corpo, a mãe irá nomear e dar lugar a criança no seu discurso.

Na constituição do sujeito, através do viés psicanalítico, ressalta-se o quanto o discurso familiar, principalmente o discurso materno, assim como a contraposição da criança ao imaginário são aspectos fundamentais na constituição da imagem, assim como do lugar deste sujeito. Outro fator determinante na constituição são os processos fantasmáticos, assim como os aspectos instrumentais do sujeito.

Cabe ao sujeito lidar com os significantes que a estrutura parental ira lhe “colocar”, pois por mais que o sujeito esteja interligado com a estrutura que antecede, ele pode tecer nela através da “subversão do desejo”, dando diferentes significações a estes significantes que lhe foi concebido. Mesmo inconsciente, neste momento ocorre uma escolha, a implicação de um sujeito, como pode-se observar quando as crianças surpreendem aos pais com suas próprias versões, “suas tiradas”.

O discurso inconsciente materno, acaba apresentando as expressões consciente da mãe, no que diz a respeito as necessidades do filho, sendo que estas manifestações ocorrem através de diversas ações significantes, que inicialmente são registradas pelo bebê, desde a peneira de seu código genético. Essa série de ações significantes ocorrem de acordo com a atividade materna e as suas necessidades. Este código que começa a se transcrever no mundo das imagens e das palavras, passa a guiar a criança pelos caminhos que preexistem, através do discurso parental.

O caminho pelo qual a criança segue está guiado pelo discurso parental, pois o sujeito emerge através de um desejo parental, que reflete no sistema nervoso, que o possibilita, mas não o contém, reflete no corpo. No processo de desenvolvimento utiliza-se do corpo, para poder realizar seu desejo, sendo este corpo em um primeiro momento, está ligado ao Outro.

Quando a estrutura psíquica vai se inscrevendo no bebê, ressalta-se que isso não ocorre apenas por herança filogenética, nem por um efeito cronológico da sua

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constituição. O tempo que se considera importante no desenvolvimento infantil se refere cronologicamente ao momento que deve ocorrer as inscrições simbólicas nas operações logicas da criança, pois estas influenciam na constituição do sujeito.

Para que ocorra essa constituição psíquica do sujeito, o recém-nascido depende da forma em que é tomado pelo Outro. Da rede simbólica que o antecede, assim como do desejo do agente materno, este que acaba por tirar essa criança do anonimato, fazendo com que ele passe a ser reconhecido como o bebê de alguém. Essa estrutura que antecede o recém-nascido, de certa forma sobre determina a sua existência, de modo inconsciente, pois irá se manifestar no primeiro momento no discurso parental, discurso inconsciente materno.

A relação entre a criança e seus pais delineiam o lugar deste filho, sendo que esse lugar é o que permite a criança ser sujeito, assim como inscreve-se no sistema nervoso central que o possibilita. O sujeito enquanto ser desejante passa a se interessar por coisas, pessoas, torna-se objeto de interrogação, passando a realizar intercâmbios organizados, apresentando-o de forma mais independente e singular.

Entende-se que, a estruturação psíquica irá ocorrer somente quando a criança estiver inscrita no desejo da mãe, e na linguagem, afinal, desta forma, a criança tem a oportunidade de existir enquanto sujeito.

A constituição do sujeito exige a inscrição de diferentes momentos lógicos que não estão garantidos pela passagem do tempo, por uma simples cronologia. No entanto, continua sendo necessária uma diacronia para que se precipitem os efeitos de inscrição que constituirão o sujeito psíquico. É preciso o transcurso de um tempo para que as inscrições que nele se precipitaram possam ser por ele postas à prova por meio de uma experiência que o implique subjetivamente (JERUSALINSKY, 2009, p. 9). Em relação ao processo evolutivo da criança, três perspectivas diferentes são importantes, sendo elas: o crescimento, a maturação e o desenvolvimento. O crescimento se refere as mudanças pondero-estaturais, o aumento físico do corpo, em que é possível perceber o aumento de peso, tamanho, volume, sendo que estes podem ser medidos em centímetros ou gramas.

Já a maturação se refere às estruturas biológicas, ao conjunto de transformações que ocorrem no organismo, no processo de aperfeiçoamento do sistema nervoso central e das estruturas neuromusculares. A organização das estruturas, englobando os processos de crescimento, assim como o

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aperfeiçoamento dos sistemas que conduzem às coordenações, para melhor possibilitar o exercício de suas funções.

O desenvolvimento remete às transformações globais que incluem o crescimento, a maturação, os aspectos psicológicos e sociais do sujeito, ou seja, não se reduz apenas à aspectos orgânicos. Implica no processo das aquisições instrumentais, assim como articula o modo no qual a criança se apropria psiquicamente do funcionamento das funções orgânicas.

O desenvolvimento psicossocial possui extrema importância, pois ele se refere ao processo de humanização relacionado aos aspectos cognitivos, psíquicos, ambientais, culturais, que a criança vai adquirindo. O sujeito passa a coordenar de forma mais explícita, o sentir, o pensar, o mover e o interagir com as pessoas com as quais convive. Este desenvolvimento permite a criança agir de forma ativa e transformadora no meio em que vive. Para Winnicott (1985, p.141) “O desenvolvimento do ser humano é um processo continuo, tanto no aspecto corporal como no da personalidade e a capacidade para as relações”.

No aspecto psicológico, uma criança privada de algumas coisas bastantes comuns, mas necessárias, como o contato afetuoso, inevitavelmente resultara perturbada, em certa medida, em seu desenvolvimento emocional e isso se manifestará como uma dificuldade pessoal a medida que cresça (WINNICOTT, 1985, p.141).

O desenvolvimento do bebê não se organiza pelo simples aparato biológico do corpo, das suas funções musculares, dos estímulos externos. Mas sim, pelas marcas simbólicas que o afetam, dos significantes que lhe representam. Jerusalinsky (1999) afirma que cada criança possui um ritmo variado de desenvolvimento. Sendo que o que marca esse ritmo é o “desejo do Outro” que opera neste sujeito, através do discurso que este apresenta.

O sistema nervoso central do ser humano possui tanta flexibilidade (quando não está profunda e gravissimamente danificado) que resulta quase impossível introduzir uma estimulação sistemática e não obter algum resultado no comportamento. Porém medir o progresso de uma certa discriminação perceptiva, ou o aumento da velocidade e precisão de uma atividade de motricidade fina, nada nos diz acerca de como esses elementos estão ou não integrados no sistema de significação e, portanto, de articulação do desejo, que é o que constitui o núcleo fundamental desse sujeito (JERUSALINSKY, 1999 apud Jerusalinsky 2002, p. 42).

No que se refere ao desenvolvimento cabe ressaltar a distinção entre o que constitui o sujeito e os instrumentos necessários para a realização das trocas com o

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meio, sendo que estes se dividem em aspectos estruturais e aspectos instrumentais. Os aspectos estruturais se referem ao aparelho biológico, mais especificamente o sistema nervoso central. Esse é o aparelho que permite a existência do sujeito, possibilitando os intercâmbios com o meio, assim como a inscrição dos processos simbólicos e virtuais. É com este suporte e com a presença da estrutura familiar, que vai se constituindo o sujeito psíquico.

Coriat e Jerusalinsky (1996) explica que os aspectos estruturais, que são divididos em três elementos: o sistema nervoso, o afetivo e o psíquico-cognitivo. Sendo que estes definem e situam o lugar do sujeito, assim como mostram a forma em que o sujeito irá se manifestar. Os aspectos instrumentais se referem às ferramentas para efetuar os intercâmbios, estas ferramentas facilitam a construção de cada sujeito, assim como do mundo. Sua ausência ocasiona transtornos ou atrasos importantes na constituição.

Tudo o que o sujeito desde a sua estruturação, demanda, se refere aos aspectos instrumentais, como a linguagem, a psicomotricidade, os hábitos, os processos práticos de sociabilização. Estes são instrumentos para dizer, experimentar, expressar, entender e necessários para a constituição do sujeito.

Nos primeiros tempos de vida, a distinção dos aspectos estruturais e instrumentais é possível, mas mais difícil. Como exemplo, a sucção de um bebê de um mês, surge uma demanda biológica, no que se refere a alimentação, assim como ao mesmo tempo são aspectos da comunicação, linguagem, do cognitivo, da socialização. É possível notar estes aspectos durante o desenvolvimento da criança, sendo que esses estão interligados, se por um lado um completa o ciclo, o outo aspecto acaba executando.

Conforme M. Mannoni (1967-1976 apud Coriat; Jerusalinsky, 1996, p.71) cita a seguinte síntese: Freud mostrou a importância dos primeiros anos da vida no ser humano. A criança tem que passar por conflitos que são necessários para ela. São conflitos identificatório e não conflitos com o “real”, e muito embora o mundo exterior seja sentido pela criança alternativamente como benévolo ou como hostil, sabemos com certeza que não se trata de uma situação biológica ou animal de “luta pela vida”, e sim de uma situação “imaginária” que, pouco a pouco, tem que chegar a simbolizar-se. Em suas relações com seus pais, a criança tem que aprender a deixar uma situação dual (fascinação imaginária) para introduzir-se numa ordem, isto é, estruturar o Édipo, o que só pode fazer quando entra na ordem da linguagem.

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No momento que ocorre a estruturação do psiquismo, o sujeito passa a organizar os aspectos neurológicos, psicológicos e motores de forma mais concreta. Cabe ressaltar, que os aspectos psíquicos que vão se constituindo, ocorrem através do contato familiar e esta organização se faz necessária para a constituição do “eu”, da singularidade de cada sujeito.

Entende-se que, para a psicanalise, a subjetividade está ligada a dois aspectos no funcionamento, sendo eles: o consciente e o inconsciente. Desta forma, entende-se que o sujeito da psicanálise, baseado na noção de inconsciente, é o sujeito do desejo, que se move através da falta. O sujeito se constitui através da inserção na ordem simbólica, assim como da linguagem e pelo desejo em que o Outro deposita na criança.

O sujeito para a psicanálise se caracteriza como um sujeito do inconsciente, representado pelo significante, ou seja, pela letra que demarca o registro do inconsciente na linguagem. Os significantes que até então se encontravam soltos, se amarram e dão a significação, sendo que o sujeito é representado por uma cadeia de significantes.

Conforme Jerusalinsky (2002), todos os gestos e movimentos que o bebê faz, a mãe supõe uma significação. Ela cria uma suposta série de elementos para argumentar a atitude deste. Se considerarmos quando a criança chora, ela cita que esse tem fome, e está chamando por ela. Essa suposta série do falar que a mãe cria, vem acompanhada de interpretações, suposições, que aparecem para justificar os fatos que ocorrem com essa criança, relacionando os acontecimentos, com sequências de séries que ocorrem durante o dia.

Cabe ressaltar que todos os fatos que ocorrem com o bebê são colocados em uma série, no discurso da mãe ou de quem cuida essa criança. Sendo que essa série já possui um percurso no tempo, o momento que acontece ou que vai ocorrer a situação, o caminho que deve seguir, são séries de significações. Desta forma, entende-se que o que se faz com o bebê, a rede de significantes que se constrói, é produto de uma série de interpretações. Sendo este, o campo da linguagem.

São esses significantes impostos à criança que o distinguem do campo animal, pois o que o bebê faz é tomado como um significante. Já no campo animal é com o signo, como algo fixo. Com o bebê, esse significante varia, dependendo do

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lugar da série que esteja colocado, ou seja, ele passará a significar coisas diferentes conforme espaço inserido.

O que nos permite distinguir que os bebês estão inseridos no campo da linguagem, não é através da fala da criança, mas sim, desse momento de significações que a mãe lhe dá, ou seja, desde o nascimento, o bebê já é submetido a esta clivagem da linguagem.

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2. A RELAÇÃO DUAL E A ENTRADA DO TERCEIRO 2.1. Função Materna

A função materna é responsável pelos primeiros cuidados do bebê, buscando preencher as necessidades da criança, com todos os cuidados básicos, principalmente no que se refere ao carinho, o olhar, as palavras, dando o suporte que este recém-nascido demanda. São estas inscrições psíquicas das experiências que a criança passa, que irão orientar o seu desenvolvimento e a constituição do psiquismo.

Esta função é sustentada por quem exerce os cuidados primordiais desta criança, não sendo necessariamente pela mãe biológica, mas sim quem assume tal função. É essencial que a mãe deseje esta criança, que ela sinta prazer com essa troca de olhar, com esses cuidados, e principalmente que ela esteja em uma presença psíquica em relação à essa criança, para transmitir não só seus desejos, mas também os seus valores simbólicos e culturais. É este agente que dá significações para as expressões do bebê.

Conforme Jerusalinsky (2002), é a mãe que irá tomar o choro como um apelo da criança pela posição de desamparo em que se encontra. Este agente materno acaba se situando em relação a este apelo, respondendo através do oferecimento da ação que produzirá a satisfação deste bebê.

No processo de amamentação, o leite materno não é um efeito de satisfação somente orgânico da necessidade, pois é através desta experiência de satisfação que ocorre um registro psíquico. Esta experiência da satisfação produz traços mnêmicos, sendo que estes são inscritos pelo agente materno. Tais inscrições que ocorrem vão constituindo a estrutura psíquica da criança (JERUSALINSKY, 2002).

A experiência propiciada pelo agente materno, acolhendo o choro e lhe proporcionando significações, demonstrará o saber consciente e inconsciente da

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mãe em relação a criança. Segundo Jerusalinsky (2002), as experiências de satisfação passam pela tela de significante, sendo que estes significantes possui uma significação através do Outro, ou seja, a criança em um primeiro momento é dependente deste Outro.

O bebê encontra-se absolutamente incapacitado de realizar a ação especifica que cause satisfação- não só por sua dependência física, mas pela falta de um saber previamente inscrito acerca do que lhe convém. Ele requer a ação de um agente externo, que, como indica Freud, não é um outro qualquer, mas um agente que se coloca em posição bastante “prestativa” para esse bebê. Somente num segundo momento a partir da experiência propiciada pelo agente externo, o bebê poderá alucinar um objeto de satisfação. (JERUSALINSKY, 2002, p.57).

Conforme Jerusalinsky (2002), a mãe é responsável pelos significantes dos quais a criança irá inaugurar sua constituição psíquica, supondo um sujeito nesse bebê. Ou seja, é ela quem articula a demanda desta criança, através do seu saber inconsciente, da sua rede de significantes.

A função materna sustenta uma imagem que serve de referência para a criança se subjetivar. De certa forma, o corpo desta criança, em um primeiro momento, está “preso” ao corpo dessa mãe. Na concepção Lacaniana, esse seria o momento de alienação do bebê, ligado pelo desejo materno.

O Outro primordial, que está representado neste primeiro momento pela função materna, é o responsável pela construção das primeiras referências simbólicas em torno desta criança, buscando traduzir as manifestações deste bebê, supondo saber a demanda deste.

O Outro primordial, a mãe, faz, nesse sentido, um verdadeiro esforço: toma o peito como dom, cocô como presente, a voz como chamado, o olhar como interpelação. Costura e recobre o que incessantemente aparece como abertura: a insuficiência (normal) de sua criança, a queda incessante dos buracos que no corpo se oferecem e a chamam para serem preenchidos. Esses buracos, lugares de entrada e saída, portam as marcas simbólicas que a mãe inscreve neles, desenhando, assim, a borda do objeto que essencialmente permanecerá vazio (ao menos que a psicose o preencha), precisamente oferecendo seu lugar à interminável busca que nele se inaugura (JERUSALINSKY, 1999, p.26-27).

Para a psicanálise, a função materna é fundamental para estruturação do psiquismo e o desenvolvimento das funções do corpo. Teperman (2005) explica que esta função implica em algumas considerações que marcam a inscrição desta criança na constituição psíquica, assim como na linguagem, sendo que um dos

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principais fatores se refere ao desejo desta mãe pelo filho e o lugar que esta criança ocupa no desejo dos pais.

Lacan (1999) cita que é através do desejo materno que a criança passa a reconhecer o seu desejo, sendo que esse reconhecimento não ocorre apenas através da imagem especular, mas também por meio do corpo do Outro. A mãe passa a investir no corpo da criança, amarrando os seus significantes, assim como mapeando uma zona erógena do corpo. Desse modo, ela passa a nomear, investindo e dando um lugar para esse sujeito no discurso.

Esse Outro, que exerce a função materna, vai lhe proporcionar significantes que irão dizer de sua história, assim como o lugar que este bebê ocupa para a família. Ressalta-se que, ao realizar todas essas ações, a mãe sustentará o lugar do Outro primordial para este recém-nascido.

Jerusalinsky (2002) ressalta que, em relação ao conceito do Outro, este se refere àquilo anterior ao sujeito, o que determina a constituição: a linguagem, visto que esta inscrição do sujeito no campo da linguagem ocorre através do agente materno, quando este deixa marcas significantes para esse bebê, inscrevendo-o no campo da linguagem. O Outro é o lugar do significante no qual o sujeito precisa se situar, sendo que este conceito remete à ordem e à lei da linguagem.

Essa relação dual que a criança desenvolve com a mãe, em que nos primeiros tempos de vida se torna dependente desta, é caracterizada por cuidados que vão além de um simples auxílio para sobreviver. É nesse processo que ocorre a estruturação da imagem da criança, da constituição do eu. Conforme Freud (1914), tal processo ocorre através da identificação da criança com o seu semelhante, a mãe, sendo que este processo é denominado como narcisismo.

Freud (1914) apresentou o tema do narcisismo como um estágio normal da evolução da libido, entre outras concepções. O termo libido se refere à energia sexual que parte do corpo, investida nos objetos. Como se trata de um fenômeno libidinal, o narcisismo ocupa um lugar significativo na teoria do desenvolvimento psíquico do sujeito.

O narcisismo se caracteriza pela forma com que as pessoas tratam o próprio corpo, no toque e no olhar que dirigem a este, como se fosse um objeto sexual, buscando uma plena satisfação. Pode-se considerar o narcisismo através dos

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investimentos libidinais que o sujeito passa para o seu eu, que antes eram feitos para os objetos do mundo externo (FREUD,1914).

Para melhor situar esse processo, os textos freudianos apresentam uma divisão do narcisismo em primário e secundário. O narcisismo primário se refere ao momento de satisfação da libido no próprio corpo, o prazer que um órgão retira de si mesmo, no seu corpo, ou seja, o auto-erostimo. Cabe ressaltar que nesta fase “o eu” ainda não se constituiu.

Freud (1914) ressalta a importância dos pais na constituição do narcisismo primário, em que ele retoma que o amor dos pais com seu filho, se refere ao narcisismo recém-nascido. De certa forma, ocorre uma revivescência, uma reprodução do narcisismo dos pais, em que eles atribuem ao filho as perfeições, assim como projetam neles os sonhos que tiveram de renunciar. A teoria freudiana chama de “sua majestade o bebê” o momento em que a criança realiza os sonhos que os pais não conseguiram concretizar. Entende-se que o narcisismo primário é um encontro entre o narcisismo do bebê e o narcisismo renascente dos pais.

Já o narcisismo secundário se refere ao narcisismo do eu, que faz necessário um investimento em torno dos objetos, para que este retorne investindo no eu. A criança sai do narcisismo primário quando seu eu se confronta com um ideal, ao qual tem que se comparar, e que se encontra fora dela. Afinal, o mundo acaba impondo exigências a esta criança, exigências essas simbólicas, que ocorrem através da linguagem. Como por exemplo, quando a mãe fala com a criança, mas também conversa com outras pessoas, o filho passa a perceber que essa mãe deseja algo fora dele, neste momento, surge uma ferida no narcisismo primário desta criança.

Em seguida, o sujeito busca reconquistar o amor do outro, sendo que isso pode ser feito através da satisfação em que o ideal do eu estabelece. Freud (1914) designa o ideal do eu como um modelo de referência do eu, sendo este substituto do narcisismo perdido na infância, que se apresenta com a identificação com as figuras parentais, assim como da transmissão social e cultural que os pais lhe passam. Ressaltando que para ocorrer a idealidade, a libido deve ser tomada como objeto amoroso, mas que não seja unicamente objetal, desta forma, irá se desenhar a perspectiva de uma relação de sujeito.

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A criança em um primeiro momento era considerada como seu próprio ideal, sendo que através da renúncia a onipotência infantil, assim como o delírio da grandeza, ambos característicos do narcisismo infantil, possibilitam assim o surgimento de um outro ideal.

Foi em 1917 que Freud, nas conferências introdutórias sobre psicanálise modificou sua concepção, identificando o ideal do eu, como a instância do eu, que é responsável pela consciência moral, que irá permitir o eu a avaliar sua relação com seu ideal. Além da função da auto-observação, da consciência moral, da censura onírica, é nesse lugar do ideal do eu que o sujeito instala o objeto de fascinação amorosa, que lhe hipnotiza. Desta forma, entende-se que para ocorrer o desenvolvimento “do eu” necessita-se de um distanciamento do narcisismo primário. O eu busca intensamente reencontrar e recuperar o amor e a perfeição narcísica do amor.

No narcisismo primário ocorre uma dependência do outro para experimentar, sendo que o outro é si mesmo. O elemento que perturba o narcisismo é o “complexo de castração”, sendo que é através dele que se reconhece e se desperta o desejo de recuperar a perfeição narcísica.

Entende-se que o narcisismo está relacionado com a imagem do eu e com a imagem do objeto, sendo que o eu representa um reflexo do objeto, ou seja, o narcisismo está ligado com o investimento sexual que a criança faz em relação a essas imagens.

Freud (1917) chama o amor a si mesmo, que ocorre através de um semelhante, de “escolha objetal narcísica”, em que ele ressalta que o amor objetal sempre comporta uma parcela de narcisismo. Salienta-se que essa imagem amada que a criança investe e vê constitui uma imagem sexualmente investida. Nasio (1997) contribui para concluir que o narcisismo é o investimento que o sujeito faz na própria imagem, sob a forma de um falo.

Na formação do eu, as transformações dos investimentos dos objetos em identificações é um fator relevante e que influencia na sua constituição. Nasio (1997, p.55) reforça que “O eu resulta, pois, da sedimentação dos investimentos de objetos abandonados, contém, de certa maneira, a história de suas escolhas objetais”. Desta forma, há o entendimento de que o eu assume os traços que ficaram do

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objeto que se inscreveu e que pode representar o eu como uma rosa, que é formada por diferentes camadas de identificação com o outro.

A leitura Lacaniana sobre o narcisismo de Freud refere-se ao estádio do espelho. Trata da constituição tanto da imagem, como do corpo, assim como da estruturação do eu. Lacan (1953) apresenta este como um momento de identificação com o discurso do Outro, do nascimento do eu da criança, ligado com a imagem do corpo.

Conforme Garcia-Roza (1998), a fase do espelho se caracteriza como uma forma de representação do corpo da criança, que ocorre através da identificação com a imagem do Outro. Contudo é importante ressaltar que isso só é possível caso o Outro sustente esta imagem que a criança enxerga frente ao espelho. Esta fase inicia em torno dos seis meses de idade e vai até aproximadamente os dezoito meses.

Esta experiência que a criança passa se caracteriza pelo modo em que ela percebe sua própria imagem num espelho, sendo fundamental para a constituição da imagem do sujeito. Conforme a teoria lacaniana, neste momento, o bebê terá um primeiro esboço do ego. Nesta fase, que é dominada pelo imaginário, o que se produz é um ego especular. Entende-se que a criança só poderá ser considerada sujeito quando ocorrer a passagem do imaginário ao simbólico, ou seja, através da linguagem (GARZIA-ROSA, 1998).

Garzia-Roza (1998) explica que o estágio do espelho não se refere necessariamente à experiência de uma criança frente ao espelho, pois este momento pode ocorrer também com face de uma outra pessoa para com a criança. Afinal, esta experiência se refere a uma relação da criança com seu semelhante, na qual ela constitui uma demarcação do seu corpo.

A partir da fase do espelho, o corpo que antes era despedaçado passa a ter as suas primeiras demarcações de si, através do processo de identificação ao outro. Buscando a realidade de si, a criança encontra apenas a imagem do outro, da mãe, na qual ela se identifica e se aliena.

A teoria Lacaniana ressalta que a imagem do semelhante ocorre pela identificação, resultando na produção de um eu especular, correspondendo ao narcisismo primário. O Narcisismo, então, se refere à relação com si mesmo, de

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amor à sua imagem, que ocorre através de um outro com quem ele se identifica e se aliena. A identificação, então, ao mesmo tempo que constitui o esboço do eu, de certa forma também marca a perda de si mesmo, afinal, uma série de alienações ocorrem com a criança, sendo que está, no momento que procura a si, acaba encontrando a imagem do outro (Garzia-Roza, 1998).

Lacan (1953) fala em três tempos no Estádio do Espelho, sendo que no primeiro momento a criança ainda não possui os recursos simbólicos suficientes, ou seja, ela ainda não se prende à imagem do seu corpo, apenas introduz uma antecipação imaginária.

A criança, ao ver sua imagem refletida no espelho, de certa forma discorda dessa visão da forma do seu corpo, precipitando assim a formação do eu. Lacan cita que essa discordância faz com que a criança fique em uma posição de impotência em relação à sua imagem, sendo alienada imaginariamente com a imagem no espelho.

Esta imagem mostra à criança como ela se antecipa em relação ao domínio do seu corpo, que antes se deparava com ele despedaçado, e a partir desta experiência passa a apreciar o seu corpo, se fascina com essa imagem do espelho, uma imagem ideal dela, com a qual ela não conseguirá se unir. Essa identificação que a criança tem com a imagem de certa forma fixa-se numa estrutura, concluindo que, por mais que a imagem esteja externa e ela, esta imagem é ela. Nasio (1997, p.57) confirma quando cita a teoria lacaniana, designa “esta identificação primordial como uma imagem ideal de si mesmo”.

A formação do eu ocorre através da imagem do outro, sendo que esse outro representa igualmente um espelho. Em um primeiro momento, a criança se confronta com a sua imagem no espelho, esta que o outro sustenta para ela. Essa identificação com o semelhante é o que irá fazer a criança rivalizar com essa imagem do outro, sendo que o outro é quem possui sua imagem. Conforme Nasio (1997, p.59) “O eu encontra-se dentro do narcisismo, afinal, ele é responsável pela captação imaginária que caracteriza o narcisismo. O estádio do espelho está situado no próprio nascimento do eu”.

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Já no segundo tempo, ocorre o processo identificatório, em que a criança descobre que o outro do espelho não é real, mas sim uma imagem, desta forma, a criança acaba não procurando mais essa imagem para si.

Cabe ressaltar que, no processo de identificação narcísica com o outro, o semelhante, o desejo da criança aparece como desejo do outro. Ou seja, a imagem narcísica se constitui como condição do aparecimento do desejo, assim como do seu reconhecimento.

Na relação com esse semelhante, ou seja, em um primeiro momento, na relação dual da criança com essa mãe, o bebê é capturado pela imagem do outro, vendo seu domínio e desejo sendo realizados no outro, levando assim, a criança “pirar” e desejar a morte do outro.

Tal relação dual torna-se efetivamente impossível de viver, não havendo saída satisfatória nessa relação entre um eu e um eu ideal, pois não há subjetivação; o sujeito não se reconhece ali, porque está apenas capturado ali. De fato, é o ideal do eu – simbólico – que pode regular as relações entre um eu e um eu ideal (NASIO, 1997, p. 60).

Desta forma, entende-se que o ideal do eu se refere a um conjunto de traços simbólicos, relacionados a linguagem. Sendo que estes traços são responsáveis por fazer a mediação da relação dual imaginária da criança, em que ela busca um lugar para si em um ponto, passando se ver como passível de ser amada, desde que satisfaça suas exigências. Desse modo, o simbólico acaba prevalecendo e organizando o imaginário. Lacan (1954) cita que o ideal do eu é o que sustenta o narcisismo (NASIO,1997).

Conclui-se que o eu se origina no espelho, sendo que esse outro é um espelho. Evidencia-se que, a linguagem, da ordem simbólica, é o que sustenta o narcisismo, afinal, é através dela que ocorre uma mediação entre o eu e o semelhante.

Dos três registros os quais Lacan apresenta - o imaginário, o real e o simbólico, ele ressalta que este último é determinante na constituição. Ressalta-se que cada um desses registros corresponde a uma ordem de distribuição do desejo. O registro real não deve ser entendido como o lado externo, ele é impossível de ser definido, pois não é passível de simbolização, e só é compreendido quando se faz intermediário com o simbólico.

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O simbólico é a ordem, a lei, o que funda o inconsciente, é a condição de sua constituição como sujeito. Sendo que é através do intermediário com o simbólico que o imaginário passa a se constituir. O imaginário tem por função a produção das fantasias, da relação à imagem do outro, sendo essencial no jogo do desejo humano.

Conforme Nasio (1997), as imagens que se constituem, que já preexistem no mundo simbólico para este sujeito, revelam os símbolos que irão ser representados através do suporte corporal. Logo, o eu, assim como a relação imaginária com o outro, são fundamentais para a inserção do sujeito na realidade simbólica, na realidade do sujeito.

Lacan (1955) retoma o narcisismo, ressaltando que para se estabelecer uma relação com o objeto de desejo, é necessária uma relação narcísica do eu com o outro. O narcisismo representa uma condição essencial para que os desejos dos outros, assim como os significantes, se inscrevam. O significante se refere a um elemento de uma cadeia da linguagem, em que o desejo do outro se inscreve e articula essa rede (NASIO, 1997).

A imagem do corpo é responsável pelas inscrições dos significantes do desejo do outro, um ponto de gatilho dos significantes, estes que em um primeiro momento são significantes da mãe. A inscrição deles ocorre através da identificação, da relação imaginária com o semelhante, sendo que cada sujeito possui uma série de significantes e de elementos em que o desejo do outro se inscreve.

Conforme Nasio (1997), no terceiro tempo, a criança está segura que a imagem do espelho é o reflexo da sua imagem, neste momento, a criança passa a olhar para mãe, num pedido que lhe confirme esta imagem. Neste momento, a criança se reconhece, passando assim, a ter um lugar discursivo. Entende-se que o Estádio do Espelho é o processo de subjetivação deste sujeito, em que ele busca a sua identidade.

Em relação à visão da imagem no outro, neste aparece a existência de um furo. O sujeito passa a notar que a imagem que esse outro lhe envia não é completa, afinal, o outro também é ser pulsional.

A criança, frente ao espelho, quando vê sua imagem, recorre a mãe, esperando um retorno dessa, chamando a mãe à sua dimensão simbólica. Mas, ao

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mesmo tempo, ela percebe esse olhar, o desejo desta, e acaba confrontando-se com a mãe pulsional, desejante.

Esse furo que aparece, que mancha sua imagem, existe, afinal, a libido que acaba não sendo recoberta pela imagem, resta e fura essa. Lacan cita que esse furo na imagem é o que chamamos de falo imaginário. Nasio (1997, p.64) conceitua que “a imagem sempre contém uma parte real, uma forma sexual que ela não cobre”. Nesse furo, que se colocam os objetos pulsionais, que vem alojar-se o objeto e a causa do desejo.

Cabe ressaltar que o objeto da pulsão precisa ser revestido de imagens, e que a relação do sujeito com a pulsão se faz necessária, através das imagens que são remetidas pelo semelhante. Desta forma, conclui-se que o eu, assim como o narcisismo são um conjunto de imagens investidas, que circulam em torno de uma falta, uma montagem ao redor de um furo, que se confirma na fala de Nasio (1997, p. 65) “a imagem da criança, assim como a imagem do outro, surgem como única e mesma instância: o eu, enquanto reunião de imagens”.

Cabe ressaltar que a ligação dual que o bebê mantém com a mãe nos primeiros tempos de vida acaba se rompendo no momento em que esta criança ingressa na cultura, faz as trocas simbólicas, sendo que isso ocorre através da linguagem. Neste momento, ocorre também a formação da família, a entrada do pai em cena, ou seja, é o momento do Édipo.

2.2. Função Paterna

A função paterna se apresenta como a representação da estrutura simbólica, das leis, normas e costumes que são transmitidos a criança, sendo está função a referência da interrupção da relação dual da mãe com a criança. Está mediação irá permitir uma nova configuração desta relação, através da entrada do terceiro elemento, que intervém sob a forma de privação.

Está função trata-se de uma referência que ressalta que o bebê é um sujeito diferente desta mãe, que ela não possui posse total desta criança. A função paterna é responsável por dar a abertura para o mundo externo, fazendo com que a criança

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desperte a curiosidade em conhecer novas coisas, não ficando preso desta forma, ao mundo dual com a mãe no universo materno (DOR, 1991).

Que o pai possa ser considerado como representando original dessa autoridade da Lei, é algo que exige especificar sob que modo privilegiado de presença se sustenta mais além do sujeito que se vê arrastado a ocupar realmente o lugar do Outro, a saber, a Mãe (Lacan, 1960, p.793).

Conforme Dor (1991), a função paterna é uma representação simbólica, a qual nem sempre é exercida pelo pai genitor, mas sim por quem exerce essa representação, como o pai simbólico, que muitas vezes não está presente no real. Esta dimensão transcende a contingência do homem real, pois não é necessário que haja um homem para que haja um pai. A carência do pai simbólico não é absolutamente coextensiva à carência do pai real.

A introdução do sujeito no mundo dos desejos ocorre quando a figura do pai, este agente da castração, se insere na relação dual da criança com a mãe. Conforme os textos freudianos, o sujeito tem acesso ao mundo simbólico e a cultura através desta função, mediante o corte e a privação deste objeto de gozo que é a mãe, ou seja, esta lei paterna que funda o desejo através de uma interdição. Lembrando que este pai é simbólico, que esta função pode ser representada tanto pelo pai biológico, como por outras pessoas, independente do sexo.

A inserção da função paterna é um processo essencial na constituição psíquica da criança. É um processo complexo que ocorre durante o desenvolvimento da criança, em que é chamado de complexo de Édipo. O Complexo de Édipo se caracteriza como uma passagem, do imaginário ao simbólico, assim como demarca a divisão da subjetividade em dois grandes aparelhos, o inconsciente e o pré-consciente/consciente.

Conforme Nasio (2007), o Complexo de Édipo se caracteriza por uma experiência que a criança irá vivenciar em torno dos quatro anos. Está entrelaçada por um desejo sexual incontrolável, sendo que este dificulta a limitar os impulsos, a ajustar os limites entre o corpo e a consciência. Ao mesmo tempo desperta o medo, e os limites fazem com que a criança pare de tomar os pais como objeto sexual. A questão principal do Édipo se refere a aprender a lidar com o desejo transbordante. Pode-se considerar que, no Édipo, ocorre uma passagem de um desejo selvagem

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para um desejo socializado, em que o sujeito passa a controlar esse desejo, porém, é importante destacar que os desejos jamais irão satisfazer totalmente o sujeito.

O Édipo não deve ser levado em conta somente como uma crise sexual que ocorre durante o crescimento, mas deve ser ressaltada a fantasia que se desenvolve durante essa crise, que é moldada no inconsciente infantil. Desta forma, a experiência vivida durante esse período fica registrada no inconsciente da criança, sendo representada em fantasias que irão definir a identidade sexual e os traços da personalidade. Desta forma, entende-se que é muito mais que uma simples crise sexual, é uma fantasia que se organiza no inconsciente, é a escolha do objeto, do desejo do outro, é o próprio controle para refrear o desejo, o prazer, para que assim, o sujeito consiga se inserir na sociedade (NASIO, 2007).

Enfim o Édipo também é um mito, já que essa crise real e concreta vivida por uma criança de quatro anos é uma explosiva alegoria da luta entre as forças impetuosas do desejo sexual e as forças da civilização que se lhe opõem. O melhor desfecho para essa luta é um compromisso chamado pudor e intimidade (NASIO, 2007, p.13).

Entende-se que para psicanálise, o Édipo é representado através de uma fantasia infantil, que age sobre o inconsciente da criança. Nasio (2007) explica que o complexo de édipo não se trata de uma história de amor e ódio entre os pais e filhos, mas que trata de uma história de corpos que se entrelaçam, sentem prazer, se olham, se acariciam. Isso não se refere a sentimento, e sim ao corpo, o desejo e os seus prazeres, trata-se de uma história de sexo. Na relação de amor e ódio entre os pais e os filhos, o que move, isto é, o desejo sexual.

De certa forma, o Édipo apresenta o desejo sexual do adulto no corpo e na cabeça da criança, ainda quando o objeto dela são os pais. A criança, mesmo com sua inocência, sexualiza seus pais, criando as suas fantasias, como objeto de desejo, imitando assim, os gestos sexuais dos adultos.

Nasio (2007) ressalta que durante o complexo de édipo, a criança passa a observar seu corpo em direção ao corpo do outro. Nesse momento, ela fica feliz ao desejar ter prazer com isso, mas o desejo, assim como o prazer, lhe assustam. O medo de não conseguir controlar seus impulsos, o seu desejo, o perigo de ser punida pelo interdito do incesto. A criança passa a ficar completamente desamparada, pois por mais feliz que esteja com suas fantasias, seus desejos, ela

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sente-se angustiada, sendo que essa crise edipiana ocorre através de um conflito entre o prazer erótico e o medo.

Desta forma, resta à criança esquecer tudo, para sair deste drama, ou seja, recalcar as fantasias e angústias, assim como aprender a lidar com os seus novos objetos de desejo, deixando de ser os pais seus parceiros sexuais. Assim que a criança passa a estabelecer sua identidade sexual, tanto do homem, como da mulher, desenvolve o senso moral, assim como o sentimento de culpa.

Conforme Garzia-Rosa (1998), o Édipo é um drama individual, em que o indivíduo passa a se inscrever no constituinte do social. Sendo que nesse processo ocorrem dois interditos, que não são idênticos. Se por um lado ocorre a interdição do incesto, que são as regras das alianças e das trocas internas do grupo, o complexo de Édipo se refere ao desejo.

Durante as trocas com os sujeitos, encontra-se a regra exogâmica, que impõe uma restrição no momento em que se estabelece as alianças no interior da família biológica. Esta regra tem como objetivo garantir a sobrevivência destes sujeitos. Entende-se então, que esta regra se refere a proibição do incesto, que é um registro individual, e que diz a respeito dos fenômenos de troca e de reciprocidade (GARZIA-ROSA, 1998).

Cabe ressaltar que o Complexo de Édipo e a Interdição do Incesto não se identificam, mas se relacionam, pois ambos se referem as relações de sexo entre os sujeitos, em que a sexualidade se apresenta enquanto desejo. Sendo que estas duas concepções diferem através do desejo.

Nos textos freudianos, apresentam-se dois aspectos importantes do Édipo, um se refere à localização deste no sujeito, ou fora dele. Já o outro aspecto cita a importância do período pré-edipiano. Em relação a localização, cabe salientar que o Édipo é algo do qual o sujeito é portador. Mas caso for considerado como algo externo, este então seria o responsável por determinar o sujeito, pode-se considerar como uma estrutura.

Freud (1910), quando cita sobre a escolha objetal feita pela criança, explica inicialmente que o objeto de seus desejos eróticos são os pais, preferencialmente a mãe. E que a relação destes é constituída de amor e ódio: em que o amor é a mãe e o ódio ao pai. O mito de Édipo se apresenta como uma expressão de desejo infantil.

Referências

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