GRANDE DO SUL
CÉSAR VINÍCIUS OSTROSKI
A RELAÇÃO ENTRE A MATRIZ TRIBUTÁRIA BRASILEIRA E A DESIGUALDADE
SOCIAL
Santa Rosa (RS)
2019
CÉSAR VINÍCIUS OSTROSKI
A RELAÇÃO ENTRE A MATRIZ TRIBUTARIA BRASILEIRA E A DESIGUALDADE
SOCIAL
Trabalho de Conclusão do Curso de
Graduação em Direito objetivando a
aprovação no componente curricular
Trabalho de Curso - TC.
UNIJUÍ - Universidade Regional do
Noroeste do Estado do Rio Grande do
Sul.
Departamento de Ciências Jurídicas e
Sociais - DCJS.
Orientadora: MSc. Maristela Gheller Heidemann
Santa Rosa (RS)
2019
Dedico este trabalho à minha família, pelo
incentivo, apoio e confiança em mim
depositados durante toda a minha
jornada.
AGRADECIMENTOS
À minha família, que sempre esteve presente e me incentivou com apoio e
confiança nas batalhas da vida e com quem aprendi que os desafios são as molas
propulsoras para a evolução e o desenvolvimento.
À minha orientadora, com quem eu tive o privilégio de conviver e contar com
sua dedicação e disponibilidade, me guiando pelos caminhos do conhecimento.
Aos meus colegas da faculdade que ficarão para depois do curso, para toda a
vida. Compartilharam momentos de alegria e de cansaço, mas sempre estiveram ao
meu lado.
“o direito deve ser um ativo promotor de
mudança social tanto no domínio material
como no da cultura e das mentalidades.”
Boaventura de Sousa Santos
RESUMO
A pesquisa analisa a matriz tributária brasileira pelo prisma da igualdade social,
ou seja, como o atual sistema causa a desigualdade e de que forma podem haver
mudanças para atingir o objetivo constitucional. A partir de uma análise histórica
evidenciou-se que o Estado Moderno é marcado pelos direitos de segunda geração,
que impõem um agir estatal em prol da sociedade, mas para colocar em prática tais
medidas é fundamental a existência de um sistema tributário forte, pois os gastos
passam a ser de grande monta. A era tributária recente é marcada pela alta
complexidade do sistema e pela má distribuição da riqueza, ficando demonstrado que
a forma de tributar influencia na desigualdade social, sendo necessário que se
proponham mudanças, como a progressividade, a tributação das grandes fortunas e
uma reforma para implementar uma unificação de tributos, diminuindo assim a grande
complexidade existente atualmente são medidas necessárias para que o sistema se
torne mais justo.
Palavras-Chave: Matriz Tributária. Desigualdade Social. Construção Histórica.
Alternativas ao Sistema Atual.
ABSTRACT
This research analyzes the Brazilian taxing matrix considering a social equality point
of view, i.e., how the current system is responsible for inequality and how changes can
be achieved in order to reach a constitutional objective. Having a historical analysis as
a starting point, it has become clear that the Modern State is characterized by second
generation’s rights which demand government acts towards society, however, to
accomplish that is of high importance the existence of a strong taxing system, due to
high expenditures. The recent taxing age is pinpointed by the heavily complex system
and inequal wealth distribution, showing that the way taxes are being held supports
the social inequality, therefore in the need of changes as progressivity, high fortune
taxing and a full scale renovation bringing up a taxing unique system, so diminishing
the current complexity, necessary measures in order to make the system fairer.
Keywords: Taxing Matrix, Social Inequality, Historical Construction, Current System
Alternatives.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...
10
1 A CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DA TRIBUTAÇÃO...
12
1.1 Direito Tributário nas Constituições federais brasileiras...
20
1.2 Tributação pós 66
...
27
1.3 Conceito e evolução da desigualdade social
...
30
2
DESIGUALDADE NO SISTEMA TRIBUTÁRIO...
31
2.1 Prisma Social
...
31
2.1.1
Impacto da tributação na sociedade
...
32
2.2 Progressividade vs Regressividade...37
3.0
ALTERNATIVAS AO SISTEMA ATUAL
...
40
3.1 Imposto sobre Grandes Fortunas
...
40
3.2 A Progressividade
...4
1
3.3 Reforma………..………..43
CONCLUSÃO...
45
REFERÊNCIAS...4
6
INTRODUÇÃO
O presente estudo, utilizando a metodologia da pesquisa bibliográfica,
pretende analisar o sistema tributário vigente, como foi construído ao longo do
tempo, e de que maneira influencia sobre a desigualdade social que é tão presente
na nossa sociedade. Além disso, demonstrar quais são as características que levam
a crer que a matriz brasileira é desigual, levando a tecer alternativas viáveis de
reforma e aperfeiçoamento do mesmo.
O primeiro capítulo busca trazer um panorama sobre a tributação, passando
por todo o período antigo, ressaltando o surgimento nas sociedades mais
rudimentares, até o período atual brasileiro, inaugurado com a Constituição de 1988
que transformou o Brasil em um Estado Democrático de Direito. Conceitos básicos
de desigualdade também são trazidos, com o intuito de facilitar a compreensão do
tema.
O segundo capítulo se debruça sobre a questão da desigualdade dentro do
sistema tributário, analisando tributos de incidência direta e indireta, além da
regressividade e progressividade, ficando demonstrado, num viés proporcional que
as classes mais desfavorecidas são as que mais pagam tributos.
O terceiro capítulo busca trazer alternativas viáveis para amenizar as
desigualdades demonstradas no segundo capítulo, como a tributação das grandes
fortunas que mesmo em mais de 30 anos de Constituição ainda não foi implantada.
A progressividade das alíquotas também é uma alternativa que deve ser buscada,
além da reforma do sistema tributário, que parece ser plausível, uma vez que se
tornou muito complexo e burocrático.
1 A CONSTRUÇÃO HISTÓRICA DA TRIBUTAÇÃO
Inicialmente, antes de adentrar ao tema proposto, deve-se ter clareza dos
conceitos básicos para que a discussão possa ser melhor compreendida.
Para Hugo de Brito Machado (2010) para ser possível viver em sociedade de
forma organizada, foi necessária a criação de uma entidade com força superior e
que tivesse os meios para criar o direito positivo, deste modo abriu-se mão da
liberdade total para surgir o que conhecemos hoje como Estado.
Neste sentido Érico Hack (2008 p.11):
Além disso, sociedade pressupõe a existência de direito, já que para a convivência dos homens são necessárias regras de conduta que assegurem direitos e liberdades. Os direitos de todos também impõem deveres a todos, já que o direito de cada um é limitado pelo direito do outro. Não há liberdade plena, mas existe uma liberdade mínima, conjugada com uma gama de direitos que permite uma vida com maior qualidade.
Para garantir os direitos de seus membros, e para verificar se todos estão cumprindo com seus deveres, a sociedade se encontra ligada ao Estado. Este detém o monopólio da força e possui a função de fazer cumprir o direito e garantir a todos seus direitos e deveres.
Mas mesmo antes da criação do Estado já existia o tributo. Quando a
Humanidade começou os primeiros convívios em grupos, o tributo estava presente.
Certo que não da maneira que se conhece hoje, mas de forma embrionária.
Conforme Edson Luís da Silva e Francelena Santos Arruda Piedade (2003) o líder
da tribo era agraciado com presentes de forma espontânea pelos outros membros,
de forma que advêm deste período o conceito de tributo que é aquilo que é entregue
ao chefe.
Neste mesmo sentido Carlos Gilberto Melchior Rodrigues Sansalone Ferrari
(2018):
Os primeiros registros da cobrança de impostos são do Egito Antigo, cerca de 10.000 A.C., e essa prática é o que sustenta o governo dos países até hoje. Entre o Egito Antigo e o surgimento das nações contemporâneas, a partir de 1700 d.C. (com declaração de independência, constituição e leis para o cidadão), a cobrança de impostos era feita a critério dos reis, nobres e senhores, donos das grandes porções de terra, o que gerava uma taxação impiedosa de
/tributos e a escravização dos trabalhadores, cada vez mais devedores
.
Pode-se perceber que a busca pelas riquezas dominaram a antiguidade, de
forma que as invasões, as guerras e tudo que a sociedade vivia era em busca de
adquirir maiores quantias de ouro e outros bens, conforme Marciano Buffon e Evelyn
Marcolan (2013.p.3):
O mundo antigo viveu em constantes guerras, no objetivo de acumular riquezas. Os saques e a destruição de algumas civilizações pelas outras, promovia, ou o locupletamento pela incorporação do patrimônio, ou o aumento dos recursos de maneira comparativa, pela diminuição do bem alheio. Assim, os tributos permitiam a manutenção dos exércitos, pretendendo a expansão e o zelo contra assíduas invasões territoriais. A religiosidade era manto um tanto quanto atraente e sujeitador das aflições geradas pelo extenuante labor peculiar da época, intensificadas pela larga imposição do pagamento de tributos. Apesar desse escudo sutil, não foram poucas as revoltas iniciadas diante da desvairada cobrança de impostos, da improbidade das lideranças ou da contrastante e seleta abastança conseguida à custa da arrecadação, cujo aproveitamento apenas perfazia os desejos da camada hierárquica tida por nobre.
Com o passar do tempo os líderes da comunidade, ora atribuíam a um poder
sobrenatural, ora a proteção despendida para justificar a cobrança do tributo,
conforme Emanuelle Araújo Correia (2009, p.1):
[...] em outro momento primitivo da história da humanidade líderes tribais governantes procuram legitimar a cobrança de tributos vinculando o caráter divino do poder político ou de outro modo, justificando a necessidade de captação de recursos para fazer face proteção que o soberano oferecia aos seus súditos em caso de conflitos armados com outros povos.
O termo tributo tem origem no latim, e teve inúmeras conotações ao longo do
tempo, até se tornar o conceito que hoje é entendido na sociedade brasileira
,
conforme Correia (2009, p.2):
Tal expressão deriva do latim “tributum” significando dividir ou repartir entre a tribo. Seguindo o curso da história, os tributos também foram impostos aos povos vencidos ou saqueados em consequências das guerras e das conquistas, sofrendo transformações até se tornar, no sistema de impostos, taxas e contribuições da atualidade.
Neste mesmo escopo vêm a calhar os ensinamentos de Júlio César Linck (2009,
p.88):
A exigência tributária é tão antiga como a história da humanidade. No início, manifestava-se como um dever do derrotado para com o vencedor. Era uma imposição decorrente de guerra que tinha por objetivo indenizar o vencedor por suas despesas com a contenda. O tributo tinha o propósito de recomposição do patrimônio dilacerado em decorrência das batalhas, existindo alguns povos que se especializaram em guerrear como meio de custear os seus modos de vida. Durante a República Romana, os exércitos eram formados e custeados pelas famílias patrícias. Com o advento do Império e com o objetivo de centralizar o poder, a cobrança do tributo passou a justificar-se pela necessidade de se formar exércitos vinculados ao Imperador e não mais ao Senado, que era formado pelos chefes de cada família patrícia.
Mais remotamente, na Grécia antiga, conforme Silva e Piedade (2003) o
tributo perdeu o objetivo de atender aos interesses de uma só pessoa: o governante,
e recebe uma característica de atender o povo em geral, a coletividade.
Sobre este mesmo período, transcrevem-se os ensinamentos de Arnaldo
Moraes Godoy (1999, p.5):
Aparentemente não há racionalidade no modelo tributário helênico, que não alcançou objetivamente patrimônio, renda, serviços. Verifica-se uma prática intuitiva. Não há gritantes problemas de aceitação (exceto nas imposições de guerra, bem entendido), o que indica provável sintonia entre a arrecadação e a despesa, embora convém que se lembre tratar de uma sociedade escravocrata. Mesmo na época dos tiranos (cujo conceito diverge do sentindo moderno da expressão), não há claras referências a tributação excessiva. O equilíbrio contábil entre a entrada e a saída parece informar à essência do modelo tributário ateniense. E, a adotarmos uma posição ciceroniana (historia magistra vita est), esse equilíbrio faz às vezes de lição da história, um exemplo a ser seguido
.
No período do Império Romano, houve uma vasta gama de tributos que
incidiam até mesmo sobre janelas, portas e colunas, sendo que oneravam em
demasia a população, conforme Correia (2009, p.4):
A civilização romana notabilizou pelo seu esmerado senso de organização e pelo dinamismo de suas instituições, marcada por inúmeras conquistas e ampliação territorial de seu domínio. Após conquistar os gregos descobriram que poderia conquistar outros povos sem impor a eles sua cultura, crenças e costume, utilizando da instituição e cobrança de impostos para sustentar suas legiões de soldados e conquistar mais terras e povos. Tal atividade expansionista do império romano veio a ocasionar gastos de tal magnitude que, ao serem repassados aos contribuintes tronava a carga tributária excessiva e até certo ponto espoliativa, provocando
significativa rejeição social e estimulando a sonegação, que passo a exigir mecanismos inibitórios.
Ainda, conforme Linck (2009), na Idade Média, com a queda do Império
Romano, o tributo passa por uma transformação, sendo disputado pelo rei (que tinha
pouca força), pelo clero e pelo senhor feudal. A entrega era feita de forma in natura,
através de produtos ou mesmo de serviços dos servos, e a negativa de tal entrega
era punida com violência corporal, podendo chegar até mesmo à morte. Neste
momento surgem os feudos, conglomerados populacionais, que hoje derivam as
cidades. Também o pagamento passou a ser feito em dinheiro em determinados
casos.
Neste mesmo sentido Anderson de Menezes (1967, p.115), conceitua o
sistema feudal vigente na época como:
[...] é um sistema de dependência territorial nas relações entre os homens, associado, na prática, à autoridade política e à influência religiosa. Os homens punham-se debaixo da proteção dos proprietários, ficando, em troca, ligados ao solo e sujeitos à prestação de serviços. Assim faziam camponeses, guerreiros e até nobres e reis, que concediam terras a seus servidores, mediante o cumprimento de certas obrigações, especialmente militares [...]
Vem ao encontro do exposto o ensinamento de Ferrari(2018):
As nações europeias, modelo do mundo ocidental, começaram a apresentar suas leis de Direito Civil e de arrecadação de impostos de forma um pouco mais humana somente depois do período feudal, por volta de 1400 (período negro, marcado por uma exploração desumana da mão de obra agrícola, principalmente); e depois também da Guerra dos 100 Anos, entre França e Inglaterra, com início em 1337 e término em 1453 (mais de cem anos, na verdade).
Neste período, segundo Correia, o rei João Sem Terra instituiu umas das mais
importantes legislações para a época. No ano de 1215, na Carta Magna da
Inglaterra, disciplinou a criação de impostos e vedações ao poder de tributar, sendo
bastante inovador para a época, pois se estava no auge do sistema feudal, onde
havia um intenso embate entre os feudos e os burgueses que viviam nas cidades,
que pagavam aos primeiros pesados tributos, o que causava um grande
descontentamento.
Magna Carta, 1215: reconhecida como um grande passo para a criação da Constituição, a carta foi um acordo entre os barões ingleses e o Rei John. Esse acordo determinou que a partir dali um grupo (futuro parlamento) aprovaria a criação de tributos e que haveria liberdades de sucessão (hereditariedade de bens), além de direitos judiciais para todos os súditos. Nobreza, monarquia e clero passavam por um período de instabilidade, devido aos conflitos com a França desde o reinado de Richard I (Ricardo Coração de Leão), que demandavam altas contribuições para custear as batalhas. Nome original do acordo, em latim: Magna Charta Libertatum seu
Concordiam inter regem Johannen at barones pro concessione libertatum ecclesiae et regni angliae.
Bastante proveitoso neste sentido é a lição de Linck (2009, p.88) que vem na
mesma linha que a autora supracitada:
A Idade Moderna tem por característica o surgimento do absolutismo e a crescente centralização do poder nas mãos do príncipe. Ocorre, ainda, o surgimento dos Estados Nacionais. Neste período, o tributo passou a ser exigido exclusivamente de acordo com os interesses dos governantes. Existia uma confusão entre o caixa do Rei e do Estado. Mais do que nunca, o tributo tinha por objetivo enriquecer o monarca. De fato, as razões do Príncipe são as razões do Estado. Contudo, uma evolução importante se havia iniciado ao final da Idade Média, com a Carta Magna inglesa de 1215: a necessidade de representação para haver tributação.
Para André Brugni Aguiar e José Marcos Domingues (2008, p.29), tal sistema
absolutista se tornou insustentável:
A expansão do comércio e, como consequência, as pressões de uma emergente classe social urbana na Europa exigiram, a partir do século XV, a intervenção de um Estado sólido e unificado. Para o pleno desenvolvimento das novas forças produtivas, era necessário um poder político forte e centralizado, capaz de suprimir boa parte das limitações ao trafego interno de pessoas e bens (tais como tributos cobrados pelos inúmeros principados à passagem destes e daqueles) e de patrocinar tanto a exploração colonial como a guerra contra potências estrangeiras, que competiam no cenário comercial.
Com a queda da conhecida como Idade das trevas, ou melhor, com a sua
superação principalmente com a Revolução Industrial na Inglaterra, houve a
separação do Estado e da igreja, surgindo o Estado Moderno, como é conhecido
atualmente.
Para Aguiar e Domingues (2008, p.30) os motivos mais presentes para a
implantação de um Estado Liberal preocupado apenas com o mínimo seria:
Quando a relação custo-benefício da monarquia absoluta começou a se revelar negativa para novas classes urbanas – que não desfrutavam de privilégios fiscais e arcava com boa parte de uma tributação cada vez mais usada para sustentar as excentricidades de um estabelecimento decadente -, teve início o movimento que, ao longo dos séculos XVIII e XIX, varreria o antigo regime e instalaria o modelo do Estado Liberal, supostamente dedicado às funções mínimas de segurança (interna e externa), jurisdição e normatização. Um modelo que permitiria à burguesia maior liberdade para acumular riquezas.
Por certo tal Estado Liberal tentava ser o oposto do que era vivido na época
precedente, ou seja, com um Estado que se influencia de forma mínima tanto a
esfera cível quanto econômica, segundo Correia (2009, p.7):
Instituído o Estado liberal a partir da vitoriosa revolução francesa, surge como um terceiro desdobramento do Estado Moderno, representando um conjunto de ideias éticas, políticas e econômicas da burguesia que resistia ao sistema feudal e ao absolutismo monárquico, buscando a separação entre os assuntos do Restado e os da sociedade civil.
Cabe frisar que para Linck (2009, p.88) com a Declaração dos Direitos do
Homem e do Cidadão o sistema se tornou mais racional e justo:
Na França, no final do século XVIII, em face de a tributação estar centrada sobre os trabalhadores e sobre a burguesia, inicia-se um movimento, exigindo, deste modo, uma distribuição mais uniforme da carga tributária, em que deveriam ser tributados, também, a nobreza e o clero. Em 1789, eclode a Revolução Francesa e, após, é redigida a Declaração dos Diretos do Homem e do Cidadão. A partir de então, o tributo passou também a ser uma matéria discutida por políticos e por economistas, iniciando-se desta maneira a delineação e a construção de um sistema mais racional e justo.
Já com relação ao histórico do direito tributário pátrio, analisa-se desde o
descobrimento até a Constituição Federal de 1988, de uma forma sucinta e sem
esgotar a temática, haja vista a sua complexidade.
Conforme Linck (2009) existem divergências entre os estudiosos de quando
se iniciou o direito tributário, alguns defendendo que apenas existiu após ser
redigida uma legislação específica. Já outros, em maior número, declaram que
desde os primeiros tempos houve um direito tributário. Conforme a história, a quinta
do pau-brasil foi o primeiro imposto instituído em terras coloniais.
É neste sentido o estudo de Francisco Assis Silva (1983), onde a regra geral
da tributação era a quinta parte de tudo que era produzido, e os recursos se
destinavam, em grande quantia, para a manutenção da coroa. A quantia que era
verdadeiramente coletada era muito menor, pois como a entrega era in natura, era
de difícil controle.
Portanto esta época tem-se como a inicial na seara tributária em solo
nacional, ainda que colônia de Portugal. Nos ensinamentos de Fernanda
Monteleone Barros (2012, p. 4):
Em meados de 1530 surgiu o primeiro imposto a ser cobrado no território colonial brasileiro, pertinente à exploração da única riqueza natural disponível na ocasião: o pau-brasil. Este imposto era pago diretamente à coroa portuguesa in natura, ou seja, na forma do produto explorado, o pau-brasil. O percentual tributado naquele momento era de 20% (vinte por cento) do material extraído. Os “rendeiros” ou “cobradores de rendas” eram os responsáveis por separar a parte que competia à coroa. Aos tais cobradores eram conferidos poderes absolutos, inclusive o de prender aqueles que atrasassem ou se recusassem a pagar os impostos fixados pela coroa.
A partir de 1530 passou-se a emitir um documento real, que pode ser
comparado ao Código Tributário, apesar de forma muito mais rudimentar. Tal
documento era a Carta de Foral, segundo ensinamento de José Hermano Saraiva
(1999), este documento trazia as alíquotas de incidência sobre ouro, café, açúcar
etc.
Deste modo, o Rei, no início da colônia, deu poderes aos colonizadores que
estavam explorando e buscou trazer alguma logística a nova aquisição. Desse
modo, conforme Roberto Cochrane Simonsen (1969, p.45):
Portugal, desejando ocupar e colonizar a nova terra e não tendo recursos para fazê-lo, à custa do erário real, outorgou para isso grandes concessões a nobres e fidalgos, alguns deles ricos proprietários, e outros já experimentados nas expedições às Índias. Concedeu-lhes, igualmente, o Rei, vários de seus direitos políticos, indispensáveis ao fortalecimento da autoridade de quem ia correr tão graves riscos. Mas, para estimular a colonização, conservando, para
si, o dízimo das colheitas e do pescado, o monopólio do comércio de pau-brasil, das especiarias e das drogas e o quinto das pedras e dos metais preciosos, o soberano regulou, nos forais, os direitos políticos e a percepção de rendas dos donatários e definiu-lhes também as responsabilidades perante a Coroa.
Uma das atividades mais exploradas pela tributação do Brasil colônia foi a
mineração, pois diferente de outras atividades era mais fácil o controle e também o
retorno era bem maior, conforme Caio Prado Jr.(1981, p.38):
Em resumo, o sistema estabelecido era o seguinte: para dirigir a mineração, fiscalizá-la e cobrar tributo (o quinto, como ficou denominado), criava-se uma administração especial, a Intendência de Minas, sob a direção de um superintendente; em cada capitania em que se descobrisse ouro, seria organizada uma destas intendências que independia inteiramente de governadores e quaisquer outras autoridades da colônia, e se subordinava única e diretamente ao governo metropolitano de Lisboa. O descobrimento de jazidas era, obrigatoriamente e sob penas severas, comunicado à intendência da capitania em que se fizera. Os funcionários competentes (os guardas-mores) se transportavam então ao local, faziam a demarcação dos terrenos auríferos, e em dia e hora marcados e previamente anunciados, realizava-se a distribuição entre os mineradores presentes. Entregues as datas aos contemplados, deviam eles dar início à exploração no prazo de quarenta dias, sob pena de devolução. Transações com as datas não eram permitidas, e somente se autorizava a venda na hipótese devidamente comprovada da perda de todos os escravos. Neste caso o minerador só podia receber nova data quando provasse que adquirira outros trabalhadores. Mas isto somente uma vez, pois da segunda que alienasse sua propriedade perdia definitivamente o direito de receber outra.
Conforme José Hermano Saraiva (1999), a mudança na estrutura de
cobrança de tributos no Brasil mudou com a vinda da coroa, neste momento deixou
de existir a figura do “rendeiro”, também atendendo os anseios da sociedade houve
a criação do Tesouro Nacional e do Banco do Brasil.
Neste período conturbado da história do Brasil passa-se por várias fases,
conforme Pablo Dutra Martuscelli (2010, p. 4213):
Durante o período denominado Primeiro Reinado, evento de significativa importância marca a história nacional. Em função das inspirações liberais e libertárias transmitidas pelas recentes revoluções francesa e americana, cogita-se acerca da promulgação de uma constituição para o Brasil. A despeito da sua estruturação moderna, seguindo a fórmula clássica da tripartição dos Poderes proposta por Montesquieu, a primeira constituição brasileira foi marcada, em sua origem, por um golpe contra o legislativo e, em seu texto, pelo ranço autoritário e colonial, mediante a previsão de um
chamado “Poder Moderador”. Junto dela, um sentimento de frustração coletivo veio à tona.
Findando este período, adentra-se no estudo da era das Constituições do
século XX no Brasil, até chegar à Constituição de 1988.
Antes de findar esta primeira parte do estudo, é mister mostrar qual o conceito
utilizado no país.
O conceito modernamente usado no Brasil está contido no Código Tributário
Nacional (CTN) artigo 3º:
Art.3.º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.
Tal conceito será aprofundado mais adiante quando será estudado o tributo
na esfera brasileira atual.
1.1 Direito Tributário nas Constituições Federais Brasileiras
O tópico abordará o tributo nas Cartas Magnas brasileiras, iniciando
primeiramente com a CF de 1824, perpassando por períodos ditatoriais até o
advento da CF de 1988, que vige até a data de hoje e que trouxe inúmeros avanços,
principalmente na seara social, mas na área tributária também como uma visão mais
humana e finalística do tributo como forma de levar a uma justiça social.
A primeira Constituição brasileira é a de 1824. Cabe destacar que nesse
período ainda existia um quarto poder, chamado Moderador, além dos que existem
atualmente (Judiciário, Legislativo e Executivo), o qual era exercido pelo Imperador e
que realmente era o único com autonomia, pois os outros ficavam subordinados a
ele. Conforme Correia (2009. p. 10):
Em março de 1824 a primeira Constituição Brasileira foi outorgada, Sob a denominação de Constituição Política do Império do Brasil, influenciada pela Constituição Francesa de 1791 e pela Espanhola de 1812, consagrava o império do Brasil, uma nação livre e independente, a forma de governo estabelecida era monárquica, hereditária constitucional e representativa, e o poder político era
exercido por quatro unidades de poder: o poder Legislativo, Executivo, Judiciário e Moderador
.
Na seara tributária, no mesmo diploma cabe se destacar que os tributos
seriam instituídos pela câmara dos deputados e também que ninguém ficaria isento
de contribuir para a manutenção do Império, colabora com tal entendimento o
ensinamento de Maria Lucia Bastos Saraiva Matos (2007):
Mais especificamente em Direito Tributário, destaca-se a letra da carta magna que ninguém será isento de contribuir com as despesas do Estado e definia também que: a iniciativa sobre impostos era privativa da Câmara dos Deputados, que as contribuições diretas seriam estabelecidas anualmente pela Assembleia Geral, o Tesouro Nacional administraria a área e cuidaria da arrecadação e da contabilidade, cada província teria a sua Assembleia Legislativa para legislar sobre a repartição da contribuição direta pelos municípios, bem como a fiscalização do uso de suas rendas.
A segunda Constituição brasileira foi a de 1891, escrita após a
Proclamação da República, que ocorreu em 1889. Referida Carta trouxe a
desvinculação do Estado com a igreja e na área tributário alguns avanços, de
acordo com Fernanda Monteleone Barros (2012), como a repartição dos tributos
entre a União e os Estados, sendo que os municípios ainda não entravam nesta
partilha.
Ainda, dois pontos que existem no Direito Tributário Nacional e que são de
grande importância datam de tal documento: a criação de impostos somente por
lei (o que se denominou como princípio da legalidade), e a imunidade recíproca
(vedação de um ente público cobrar impostos de bens e rendas de outro). Tais
dispositivos são ainda hoje elencados na CF de 1988 e trazem segurança, este
para os entes da federação e aquele para o contribuinte que não será
surpreendido por um novo imposto sem o devido processo legal (aqui utilizado o
processo legislativo de produção de normas).
A Constituição de 1934, conforme Baleeiro (1995), foi um documento que teve
por base a Constituição alemã de Weimar, e tinha no seu bojo o objetivo de
balancear um Estado intervencionista e um Estado liberal. Ocorre que o contexto
histórico de sua promulgação ocorreu logo após o crush da bolsa americana, em
1929, e por esse motivo já não se podia uma Constituição ser tão liberal a ponto de
o Estado não intervir na economia como um todo.
Outro avanço trazido por esta norma foi a vedação de bitributação, ou seja, a
proibição de ser cobrado mais de um tributo sobre um mesmo fato gerador. Neste
sentido Correia (2009, p.11):
A Constituição de 1934 que aperfeiçoou a discriminação de tributos por competência, ampliando o elenco dos tributos da União e contemplando os Estados com impostos de vendas e consignações e os municípios com impostos privativos definidos, vedando a bi-tributação e a impossibilidade do exercício cumulativo de competências.
Cabe trazer a transcrição literal da norma para poder observar os termos
utilizados pela mesma quanto a esse sentido:
Art 11 - É vedada a bitributação, prevalecendo o imposto decretado pela União quando a competência for concorrente. Sem prejuízo do recurso judicial que couber, incumbe ao Senado Federal, ex officio ou mediante provocação de qualquer contribuinte, declarar a existência da bitributação e determinar a qual dos dois tributos cabe a prevalência.
Neste período ficou assim definida a competência tributária entre os entes: A
União instituiria impostos sobre a importação, imposto de renda e proventos, taxas
telegráficas, postais, taxa de entrada e saída, dentre outros enumerados pela CF. Os
Estados tributariam a propriedade rural, a transmissão tanto causa mortis quanto
inter vivos e sobre a exportação. E aos Municípios legislavam sobre impostos de
licença e sobre imposto predial e territorial urbano.
A Constituição outorgada por Getúlio Vargas em 1937, após seu golpe militar,
não trouxe mudanças significativas na seara tributária. Portanto, não cabe nenhum
destaque que seja relevante para a recapitulação histórica.
Após a queda de Getúlio, foi promulgada a Constituição de 1946, a qual era
novamente democrática e tinha como destaque, segundo Bernardo Ribeiro de
Moraes (1984. 73-74) que o sistema era subdivido em três esferas e não havia
harmonia entre as mesmas:
O sistema tributário estava fundamentado nas três premissas seguintes: coexistência de três sistemas tributários autônomos, um para cada unidade política da Federação (União, Estados-membros e municípios), originando três campos supostamente estanques, separados, sem o necessário e indispensável entrosamento; adoção de uma classificação jurídica dos impostos, citados apenas pelo seu nome jurídico; autonomia financeira das três entidades políticas da Federação, outorgada através dos impostos privativos, embora houvesse participações financeiras no produto da arrecadação de impostos de outro poder tributante.
Destaca-se do texto constitucional o artigo 21, que dispunha de regras acerca
da competência remanescente, estando assim previsto:
Art 21 - A União e os Estados poderão decretar outros tributos além dos que lhe são atribuídos por esta Constituição, mas o imposto federal excluirá o estadual idêntico. Os Estados farão a arrecadação de tais impostos e, à medida que ela se efetuar, entregarão vinte por cento do produto à União e quarenta por cento aos Municípios onde se tiver realizado a cobrança.
Evidencia-se que tanto a União quanto os Estados poderiam criar tributos,
mas em ocorrendo um choque de competências, o da União prevaleceria sobre o
dos Estados.
Neste contexto surge o princípio da anualidade, ou seja, um tributo criado em
determinado ano somente poderia ser cobrado no ano seguinte, como forma de
evitar surpresas ao contribuinte. Percebe-se que o sistema passa a ser mais racional
e organizado, conforme Barros (2012.p.18):
Pois bem, a partir de então o Sistema Tributário se estabeleceu de forma mais institucionalizada, de modo que foram definidas as competências de cada uma das pessoas jurídicas de Direito Público e seu espaço de atuação.
É relevante demonstrar como ficou a distribuição dos impostos nas três
esferas políticas para poder melhor situar. Com isso, é imperativo suscitar as
palavras de Ricardo Varsano (1996, p.8):
A Constituição de 18 de setembro de 1946 trouxe poucas modificações no que concerne ao elenco de tributos utilizados no país. Ela mostra, entretanto, a intenção de aumentar a dotação de recursos dos municípios. Dois novos impostos são adicionados à sua
área de competência: o imposto sobre atos de sua economia ou assuntos de sua competência (imposto do selo municipal) e o imposto de indústrias e profissões, o último pertencente anteriormente aos estados mas já arrecadado em parte pelos municípios. Estas unidades de governo passam também a participar (excluídos os municípios de capitais) de 10% da arrecadação do IR e de 30% do excesso sobre a arrecadação municipal da arrecadação estadual (exclusive imposto de exportação) no território do município, bem como do imposto único sobre combustíveis e lubrificantes, energia elétrica e minerais do país, de competência da União.
Conforme o texto citado, percebe-se com a Constituição de 1946 uma
tentativa de aumentar a quantia de recursos que ficariam com os municípios e uma
diminuição do que ficaria com os Estados, visto que, o imposto de indústrias e
profissões que lhe pertencia agora era competência daquele.
Em 1964, ocorreu uma emenda na Constituição Federal de 1946,
alterando-lhe inúmeros dispositivos, entre os quais diversos concernentes ao sistema
tributário, conforme os ensinamentos de Moraes (1984. p.75-76):
Em 1964, examinando-se o sistema tributário da Constituição Federal de 1946, sentia-se a necessidade de sua racionalização e de um melhor aproveitamento econômico dos impostos. O sistema então existente apresentava-se com diversas lacunas: com uma tributação ampla e variada, sem sentido econômico algum (os impostos eram classificados por denominações jurídicas, sem conteúdo econômico); uma discriminação de rendas tributárias fundamentada numa divisão de impostos meramente jurídica, não econômica e nem decorrente de análise econômica dos encargos das entidades tributantes; […] vários impostos eram destituídos de finalidade econômica, podendo, pois, ser suprimidos; excesso de leis – e leis casuísticas - provocavam a perplexidade dos contribuintes; excessiva proliferação de obrigações de caráter acessório, mais dirigidos para facilitar o trabalho da fiscalização; parte considerável da receita tributária federal é vinculada a fins específicos etc.”
Na década de 60, ocorreram inúmeras mudanças no cenário tributário, muito
em função do pacto federativo e dos crescentes conflitos entre normas dos três
níveis: Federal, Estadual e Municipal, pois os três possuíam muita liberdade para
criar normas nesse ramo do Direito, portanto era necessário que mudanças viessem
para organizar melhor tais pontos. Neste sentido o estudo de Ubaldo Cesar
Balthazar (2005.p.137):
A EC 18/1965 efetivou profundas mudanças, alterando as discriminações de competência e classificando os impostos sob uma
visão econômica e não jurídica, facilitando e tornando prática a discriminação de rendas tributárias. Procurou um maior entrosamento entre sistemas tributários federal, estadual e municipal, com a finalidade de instituir um sistema tributário nacional integrado. A reforma trouxe várias inovações, tais como a centralização dos impostos na esfera da União; distribuição da arrecadação da receita tributária da União aos Estados e Municípios; nova ordem hierárquica para atos normativos tributários, evitando choques locais e regionais; tripartição dos tributos: impostos, taxas e contribuição de melhoria; conceito mais objetivo de taxas, além da manutenção de alguns princípios constitucionais tributários, presentes nas Cartas anteriores. Em linhas gerais, podemos afirmar que a reforma foi vasta, mas trouxe uma sensível redução das autonomias locais. Seu texto, porém, denota uma visível preocupação comas desigualdades econômicas das diversas regiões do país.
Finalizando a análise histórica do estudo, é mister trazer as palavras do de
Ives Gandra da Silva Martins (2000.p.1-3), o qual praticamente traz um resumo
muito rico desde a CF/46 até a Emenda Constitucional nº 18/65, a qual trouxe
grande mudança de paradigma para esta matéria:
O Direito Tributário Brasileiro principiou a ganhar consistência sistêmica a partir da Emenda Constitucional nº 18/65. Anteriormente, apesar de já se ter desenvolvido, com razoável densidade, a técnica impositiva no concernente a alguns tributos, o certo é que faltava arcabouço capaz de harmonizar as diversas tendências, aspirações e necessidades dos diversos entes com competência para tributar. Os conflitos se sucediam, as formas tributárias eram utilizadas com imperfeições notórias, as garantias se diluíam em casuísmos surgidos da melancólica vocação da Federação brasileira em transforma os governantes em criadores de despesas úteis e inúteis a serem –apenas após sua projeção—cobertas pelas receitas fiscais. Nesta linha de raciocínio, os abusos e ilegalidades geravam choques contínuos, com soluções penosas, quando não se consagrava o arbítrio e a impunidade, pelas poucas forças dos contribuintes em enfrentar os Erários, levando suas divergências às barras dos tribunais. Os pagadores de tributos, sem fôlego ou recursos para as grandes discussões judiciais recolhiam o injusto, incentivando ainda mais o espocar de ilegalidades por parte dos governos, visto que poucos eram os que discutiam. Por outro lado, a própria lentidão da justiça dificultava aos poderes impositivos a cobrança judicial dos tributos legais em atraso ou sonegados, criando-se área de permanente e generalizada insatisfação. A tudo se acrescia o fato de que, à falta de um sistema constitucional tributário, os problemas se multiplicavam para contínuo desassossego entre fiscais e contribuintes, abrindo-se campo fértil aos ajustes entre eles, à margem do interesse nacional e de uma máquina fiscalizadora ainda não modernizada.
A Constituição de 1946 trazia alguns princípios constitucionais, porém veiculados de forma esparsa e inconsistente, em nível de sistema.
Uma reforma da Carta Magna era, portanto, necessidade imperiosa, imposta pelo crescimento nacional e pela complexidade decorrencial que a Economia brasileira ganhava.
Os fundamentos básicos da referida reforma surgiram a partir da percepção do fenômeno federativo, que no Brasil, por outorgar competência impositiva aos Municípios, criava tríplice ordem de atuação autônoma, experiência inexistente no Direito Constitucional dos demais países com idêntica forma de Estado.
A Federação, portanto, constitui-se no primeiro elemento escultor do sistema. Objetivando regulá-la, assim como permitir que suas virtualidades crescessem e fossem corretamente aproveitadas, nasceu a Emenda Constitucional nº 18/65.
A reforma teve como maior objetivo o aumento da arrecadação em detrimento
de ter um sistema mais justo ou que funcionasse de forma adequada. Deste modo,
abriu-se mão da equidade e privilegiou-se a arrecadação. Neste sentido, Varsano
(1996, p.12):
Além de bem-sucedida quanto ao objetivo de reabilitar rapidamente as finanças federais -- a receita do Tesouro Nacional, que atingira o mínimo de 8,6% do PIB em 1962, recuperou-se e, em 1965, já chegava aos 12% --, a reforma da década de 60 teve os méritos de ousar eliminar os impostos cumulativos, adotando, em substituição, o imposto sobre o valor adicionado -- hoje de uso generalizado na Europa e na América Latina, mas, na época, em vigor apenas na França --, e de, pela primeira vez no Brasil, conceber um sistema tributário que era, de fato, um sistema – e não apenas um conjunto de fontes de arrecadação -- com objetivos econômicos, ou, mais precisamente, que era instrumento da estratégia de crescimento acelerado traçada pelos detentores do poder.
Assim, o objetivo fundamental do sistema tributário foi elevar o nível de esforço fiscal da sociedade de modo que não só se alcançasse o equilíbrio orçamentário como se dispusesse de recursos que pudessem ser dispensados, através de incentivos fiscais à acumulação de capital, para impulsionar o processo de crescimento econômico. Ao privilegiar o estímulo ao crescimento acelerado e à acumulação privada -- e, portanto, os detentores da riqueza -- a reforma praticamente desprezou o objetivo de equidade.
Para a análise, faz-se necessário a criação de um tópico específico para
estudar o sistema tributário após o ano de 1966, quando entrou em vigor o Código
Tributário Nacional-CTN, até os dias atuais, perpassando pelas mudanças trazidas
com a Constituição de 1988, até os dias atuais.
1.2 Tributação pós 66
Neste item será abordado o CTN, Lei nº 5.172, de 25/10/66, lei ordinária
recepcionada pela CF/1988 com status de lei complementar, pois é expressa a
exigência, na Carta Magna, que normas gerais pertinentes a tributos sejam
disciplinados por lei complementar.
Cabe trazer um retrospecto de como foi criado o CTN em 1966, quais foram
os anseios e objetivos que se buscavam com tal dispositivo. No ensinamento de
Martins (2000, p.6-7):
Desde a década de 50 que eram preparados, no país, estudos para a conformação de um estatuto nacional do direito tributário. Rubens Gomes de Sousa, de início, redigira anteprojeto de espectro abrangente, que foi gradativamente analisado por eminentes mestres, à época, tendo o IBDF, hoje ABDF, examinado artigo por artigo do esboço legislativo elaborado pelo saudoso mestre. Gilberto de Ulhôa Canto, Tito Rezende e Carlos Rocha Guimarães exerceram essa função revisora, com especial percuciência, a tal ponto que as anotações dos três juristas foram preservadas até o presente, continuando, em face da publicação editada pelo IBDF, a serem citadas.
O trabalho dos quatro eminentes tributaristas, que se louvaram também na experiência de Amílcar de Araújo Falcão, serviu de base para ofertar o perfil da Emenda nº 18/65, assim como da Lei 5.172/66, que constitui o atual CTN.
Da Emenda nº 18/65 para o CTN houve acentuado processo de depuração do projeto original, já, a essa altura, com a colaboração de Gerson Augusto da Silva e Aliomar Baleeiro, este sendo o principal artífice de sua veiculação pelo Congresso Nacional.
O projeto, que surgiu da intensa discussão e elaboração legislativa, em grande parte alterou o esboço de Rubens Gomes de Sousa, inclusive destruindo o capítulo das infrações tributárias, tão meticulosamente tratado por Rubens, reduzido a dois artigos no atual texto.
A linguagem, todavia, foi revisada, visto que a genialidade de Rubens levava-o, muitas vezes, a um discurso legislativo mais prolixo e menos técnico, na busca de esclarecimentos para o maior números possível de problemas que a realidade pudesse suscitar. O Código, portanto, escoimado de muitas das imperfeições de seu período de gestação, mantendo, todavia, outras, permaneceu até hoje, com poucas alterações no livro dedicado ao sistema, e nenhuma, naquele, ofertado às normas gerais.
É, portanto, o Código elemento de estabilização do Direito Tributário, posto que serve de “colchão legislativo aparador” entre a Constituição e a legislação ordinária.
Percebe-se que houve um intenso debate e várias reformas no projeto inicial,
para adequar o vocabulário e não abarcar temas que ficariam para normas
ordinárias. A expressão “Colchão legislativo”, refere-se a uma norma que serve para
estabilizar o ordenamento, não sendo tão mutável como as normas abaixo dele e
traduzindo os anseios constitucionais.
Conforme Martins (2000), o Código foi estruturado em dois grandes blocos, o
primeiro mais conceitual, denominado constitucional, que traz a estrutura, as
imunidades e demais conceitos iniciais. Já o segundo livro trouxe inúmeros
institutos, primeiramente ampliando o primeiro, depois inovando na questão de
sujeito ativo e passivo, vigência, aplicação e interpretação das normas o que de fato
estabilizou o sistema e por esse motivo foi recepcionado nas outras Constituições
que foram produzidas, pois foi eficiente na área de atuação do mesmo.
Com o CTN vigente, as Constituições seguintes não alteraram
significativamente o sistema não sendo relevante seu estudo, até chegar a
Constituição de 1988, que trouxe inúmeras modificações, principalmente a mudança
de paradigma. Passou-se a ter a dignidade humana como princípio fundamental, a
busca pela igualdade tornou-se o vetor de toda sociedade, tanto pública e
alcançando até a privada, podendo-se perceber a mudança até na propriedade, que
não é mais absoluta, pois a função social passou a ser levada em consideração.
No momento da constituinte existiram dois anteprojetos, um desenvolvido
pela IPEA e outro pela IASP, que conforme Martins (2000.p.13-14):
Os dois projetos tinham contextura clássica de um sistema rígido, embora fosse o do IASP mais conservador e o do IPEA mais federalizado, no pressuposto de que a uma maior descentralização de receitas corresponderia uma maior descentralização de atribuições. No projeto do IASP, a descrença de que os constituintes e o modelo federativo brasileiro voltar-se-iam para a dupla descentralização de receitas fosse mais tímida, visto que o projeto não hospedava matéria pertinente à descentralização de atribuições, como, de resto, também não hospedava o do IPEA.
O texto final da nova Constituição veio a demonstrar que os temores do nosso grupo eram mais fundados que a profissão de fé apresentada pelo IPEA na dupla descentralização federativa: de receitas e de atribuições.
Na Constituição, o tema foi tratado nos artigos 145 a 156, o qual é dividido em
cinco partes. O primeiro, referente aos princípios, dentre os quais o da capacidade
contributiva, que põe a salvo os interesses do contribuinte na medida em que limita a
tributação a capacidade de cada cidadão de forma a não onerar de forma mais
acentuada quem tem uma menor capacidade. Outro princípio é o da lei
complementar, ou seja, somente por este tipo normativo é que se pode estabelecer
princípios gerais sobre tributação, outra vez sendo garantido os interesses, pois
garante um processo legislativo mais amplo, com um rito mais complexo para se
alterar tais normas.
Na segunda parte estão previstas as limitações ao poder de tributar,
compreendendo os princípios e imunidades. Como um exemplo são as instituições
religiosas que não podem ser tributadas por atividades e bens inerentes aos seus
cultos. Nestes princípios tem-se alguns de suma importância, como o da legalidade,
da anterioridade, do não confisco, entre outros, mas na sua maioria são replicados
do CTN que já possui tais dispositivos.
Neste ponto, pode-se tecer algumas considerações sobre o sistema tributário
brasileiro vigente, não adentrando a tecer críticas, pois o assunto será abordado em
capítulo próprio. Portanto, encerra-se a contextualização histórica da tributação, a
qual perpassou por inúmeros períodos da história até chegar ao que está posto
atualmente, tendo, sem sombra de dúvidas, vários progressos nos últimos tempos a
fim de garantir um desenvolvimento social um pouco mais justo.
1.3 Conceito e evolução da desigualdade social
O tópico foi criado para trazer uma breve contextualização desse conceito e
como esse fenômeno foi gerado ao longo da história, há de ser breve, pois o intuito
do presente estudo é na seara jurídica, mais precisamente quanto ao sistema
tributário nacional. Mas para alcançar o objetivo geral que seria o de analisar como o
esse sistema gera desigualdades é necessário estudar tais institutos.
Historicamente, a desigualdade social começou a ter uma atenção maior com
a revolução francesa, onde uma população extremamente pobre via no rei uma
riqueza muito significativa, e assim um dos pontos de tal revolução foi a busca da
igualdade. Conforme Francisco Mesquita de Oliveira (2015.p.2):
O fenômeno desigualdade social, na realidade prática e conceitualmente, como categoria analítica, não é novo. Na Revolução Francesa de 1789, por exemplo, o lema “Liberdade, Igualdade e Fraternidade” impulsionou o movimento revolucionário numa cabal demonstração de que à época, na França, não existia igualdade política, econômica e social entre os indivíduos.
O conceito de desigualdade social, segundo o site Dicio (2018), seria um
fenômeno social que põe alguns indivíduos em vantajosas condições que não são
disponibilizadas para os demais. Existem diversas faces da mesma, podendo ser
econômica, social, intelectual e até mesmo de gênero e raça. Ou seja, para o
estudo, será interessante a desigualdade, principalmente a de renda, que é a mais
atingida pela tributação e que seria a concentração de riquezas em uma parcela
pequena da população.
Conforme Débora Silva (2018), o contexto do surgimento da desigualdade é
decorrente das disputas de poder e do mesmo mantido nas mãos de poucas
pessoas, o que se consolidou ao longo dos séculos e somente cresceu com o
passar do tempo, como se desprende do texto:
Os primórdios da desigualdade social na história da humanidade nos remetem às relações de poder, estabelecidas desde o início dos tempos. Com o passar dos anos e a evolução da humanidade, as relações de desigualdades também se modificaram à medida que se davam as mudanças no mundo. As relações comerciais, a consolidação do capitalismo e a expansão da industrialização podem ser apontadas como fatores que contribuíram para o desenvolvimento dos tipos de desigualdades sociais
Segundo Oliveira (2015) existem duas formas modernas de encarar a
superação da desigualdade social, uma de forma absoluta, que nas suas palavras
seria uma utopia já que é impossível que todos vivam de forma totalmente
igualitária. Já a outra perspectiva seria relativa, onde as oportunidades seriam
oferecidas de forma igual a todas as pessoas, dessa forma, podendo ser realizada
por meios tangíveis.
Ao se analisar a obra de Jean-Jacques Rousseau percebe-se que o mesmo
classifica a desigualdade em dois grupos: o primeiro é natural, decorrente da força
física, saúde, entre outras. Já o segundo está relacionado a moral ou política, onde
seria uma convenção da sociedade.
No segundo capítulo se aprofundará o estudo a cerca da desigualdade dentro
do sistema tributário de forma mais detalhada.
2. DESIGUALDADE NO SISTEMA TRIBUTÁRIO
Ao adentrar neste capítulo, inicialmente far-se-á um apanhado sob o prisma
social, ou seja, a forma como a sociedade percebe a tributação, para, em seguida,
buscar demonstrar como o sistema atual é regressivo.
2.1 Prisma Social
A tributação como um todo pode ocorrer de duas formas diferentes: a primeira
é a progressiva, e se contrapondo, a regressiva, que em termos práticos são
completamente diferentes.
Outras faces contrapostas são a fiscalidade e extrafiscalidade do tributo, que
demostram os objetivos principais quando da criação de um novo imposto,
contribuição social etc.
Dentro deste segundo capítulo serão abordado tais conteúdos, mas
inicialmente serão trazidos dados e estudos sobre como a sociedade é afetada com
a carga tributária, e posteriormente o que são analisados para se chegar aos
principais motivos causadores da desigualdade dentro da matriz, que conforme
estudado anteriormente vem sendo construída sobre um prisma muito liberal em
detrimento de buscar uma justiça social.
2.1.1 Impacto da tributação na sociedade
Ao adentrar nesta temática deve-se ter claro que um Estado não vive sem
arrecadar recursos para a manutenção de suas atividades básicas, nem mesmo
países que se intitulam liberais não fogem a regra, diferindo dos intervencionistas
apenas na quantidade e aplicação dos recursos levantados.
Além disto, a gestão destes recursos deve ser profissional, conforme Vinicius
Chechinel de Moraes (2011). Tal gestão deve ser responsável, buscando garantir ao
povo os direitos fundamentais, mas como recebe influências políticas e culturais o
sistema tornou-se complexo e oneroso para a economia.
Conforme, Igor Gabriel de Lima (2013.p.55):
A parte mais afetada pelo impacto dos tributos é a população, pois cerca de 40% da renda com tributos é comprometida e, além disso, devido às péssimas qualidades dos serviços prestados pelo governo, os contribuintes pagam dobrados.
Verificamos que os estímulos econômicos não são corretos, quando se trata do volume de impostos pagos pelas empresas no Brasil. Se comparamos o Brasil com os países desenvolvidos, notamos que: os países desenvolvidos priorizam o incentivo a geração de emprego e renda, enquanto que no Brasil, empresas de alguns setores tem a necessidade de destinar 17% do seu faturamento, e não do lucro, para poder cumprir com suas obrigações tributárias.
A insatisfação popular sobre a alta carga tributária que vem sendo cobrado nos últimos tempos, só começará a amenizar a partir do momento que existir transparência nos gastos públicos.
Atualmente podemos notar, uma população que trabalha durante meses para pagar tributos, o que sacrifica uma parte da renda familiar para o sustento da máquina pública, que a contrapartida, não garante serviços públicos de boa qualidade, mas serviços precários, que até mesmo nem existem.
Podemos dizer que, pior do que o citado acima é vermos que mesmo com um país que possui uma das maiores cargas tributárias do mundo, não conseguimos visualizar um crescimento econômico adequado para a sociedade que também é causado devido a falta de transparência no destino dos impostos arrecadados pelo Estado.
Percebe-se que a parte produtiva é a mais afetada pela carga de tributos,
uma vez que contribui com uma grande parcela da sua renda e não recebe em
benefício tais valores.
Para colaborar com o estudo, se torna pertinente apresentar alguns dados
coletados pelo Sistema FIRJAN que foram coletados no ano de 2010, que trazem a
percepção da população sobre a tributação.
O primeiro gráfico mostra a distribuição da amostra pelas principais capitais
do país e o número total de entrevistados.
Fonte: Sistema FIRJAN (2010)
O segundo gráfico é um dos mais importantes, pois ao responder a pergunta
quanto a percepção sobre a carga tributária, a maioria esmagadora dos
entrevistados declarou que a considera alta ou muito alta.
É necessário que se analisem tais dados para que se possa perceber que ao
contribuir para o fisco, a população cria uma expectativa de receber benefícios em
troca. Porém, uma vez que não se percebe o retorno, tal expectativa se torna
frustrada e, do mesmo modo, a percepção se altera.
FONTE: SISTEMA FIRJAN (2010)
Fica claro, conforme dados acima, que a população aumenta sua visão
negativa quando o Estado não consegue entregar nem os serviços básicos que a
população necessita, como saúde, transporte e educação.
O maior problema que se enfrenta quando não se acredita em um sistema
tributário justo é a sonegação, ou seja, o uso de artifícios ilegais para evitar pagar os
tributos devidos, causando uma diminuição na arrecadação e obrigando o governo a
estabelecer um aumento na carga tributária, causando um círculo vicioso.
A tabela a seguir foi elaborada, mostrando o quantitativo de indícios de
sonegadores por quantidade de empresas no ano de 2009.
Parece ficar nítido que se não houvesse um número tão alarmante de
sonegação, a carga tributária sobre os demais contribuintes não seria tão grande e o
valor revertido para o governo poderia ser mais paritário.
Colabora, neste sentido, reflexão de Jucilaine A. de Andrade (2015.p.833):
Além disso, passou-se a questionar o baixo retorno social proporcionalmente às altas cargas tributárias suportadas pela população. Em diversas ocasiões nota-se pessoas em busca de serviços privados, em razão da baixa qualidade e disponibilidade dos serviços públicos oferecidos. Nesse contexto, cabe tecer uma breve reflexão acerca da discussão sobre a adoção predominante de políticas sociais focalizadas ou universalistas. As primeiras são aquelas direcionadas exclusivamente a um público específico, normalmente a população de baixa renda; diferentemente das políticas universalistas. A defesa das políticas focalizadas se pauta principalmente no fato de que elas podem ser mais eficazes na distribuição de recursos e na promoção da igualdade de acessos. Por outro lado, a focalização também pode excluir populações que necessitam dos serviços em questão, fato que pode levá-las a pagar por esses serviços na iniciativa privada, a despeito da alta carga tributária suportada.
O problema da sonegação é estudada por Paula de Abreu Machado Derzi
Botelho (2005.p.99):
A resistência ao pagamento de tributos um problema persistente, contemporâneo à própria existência da sociedade organizada politicamente. Inicialmente essa resistência apresentava-se como
revoltas fiscais, ameaçando até mesmo a continuidade do poder vigente e desencadeando reações diversas dos governos, variáveis conforme a época e as condições econômicas, políticas e sociais de cada País.
Segundo a divulgação no site impostômetro (2019), o brasileiro em média
trabalha 153 dias do ano para pagar a carga tributária, percebendo-se que há uma
crescente evolução, uma vez que no ano de 2010 era necessário trabalhar 5 dias a
menos que neste último dado de 2018.
A questão da desigualdade não é um tema de compreensão simples, nem de
respostas prontas, mas críticos do sistema a atribuem em parte ao direito tributário,
conforme Salvador Weneck Vianna (2001.p.43):
Em síntese, o que se apreende da evidência empírica obtida é que é possível estabelecer uma associação entre a estrutura tributária e os índices de extrema desigualdade que se verificam no Brasil. Não se trata em absoluto de determinar uma relação de causalidade, nem de afirmar categoricamente que a tributação vem a se constituir no principal fator a explicar a concentração de renda no país, mesmo porque isto foge aos objetivos do estudo. As causas do perfil distributivo brasileiro são bem mais complexas, possuindo raízes profundas e diversos aspectos tão ou mais importantes – entre os quais certamente se deve destacar a questão fundiária. O que se sugere apenas, na verdade, é que muito provavelmente o sistema tributário brasileiro, da forma como está estruturado, é um dos fatores a contribuir para a manutenção do quadro de distribuição desigual da renda, e, portanto, dos níveis de pobreza e de
indigência.
Desta forma, parece ficar nítido que com uma carga alta de tributos, além de
uma má distribuição dos valores arrecadados cria-se um sentimento de que a
tributação serve apenas de freio para o progresso pessoal da população. Desta
maneira, facilita-se o crescimento da sonegação e diminui-se a igualdade de
contribuição.
2.2 Progressividade x Regressividade
O tema da progressividade e da regressividade da tributação é recente no
estudo do Direito Tributário, uma vez que inicialmente a forma que o contribuinte era
atingido pela carga de tributos não tinha importância para a área.
A progressividade nada mais é que a adequação do tributo a capacidade
contributiva, onerando-se mais aquele que possui maior capacidade de contribuir,
como o que ocorre com a tributação do Imposto de Renda, que possui alíquotas
estabelecidas conforme o valor recebido anualmente.
A capacidade de contribuição vem sendo debatida por teóricos atuais, pois
com o aprofundamento do tema uma gama de outros assuntos podem ser
abordados de forma mais clara, conforme preceitua Ricardo Pires Calciolari (2011,
p.833):
A capacidade contributiva tem se mostrado, na doutrina tributária moderna, um dos temas de maior repercussão. No bojo desta discussão, toma relevo ainda maior a possibilidade de aplicação de alíquotas progressivas, e também qual a medida adequada dessa progressividade, seu efetivo alcance e seus efeitos sobre a igualdade na tributação. Por fim, como qualquer outra discussão jurídica em que não se furte o exegeta de uma boa análise, o desenlace da questão retomará bases teóricas do valor justiça e os possíveis meios de efetivá-lo a contento.
Muitas vezes a progressividade é tida como apenas mais um instituto a ser
estudado, mas conforme Octaviano Padovese de Arruda (2013, p.69):
Quando tratamos do tema “progressividade” não estamos apenas apontando a diferença entre alíquotas que um tributo possui. Por detrás dessa temática existem assuntos políticos e econômicos que devem ser levados em consideração. A doutrina tributária brasileira tem apenas descrito o conceito de progressividade e apontado em quais tributos é possível empregar a progressividade de alíquotas. Surge a vaga impressão de que a progressividade é relevante unicamente para o sistema financeiro e para os contadores. Mas não é. Conhecer e aplicar a teoria encoberta pela progressividade se trata de uma questão de debater com densidade a justiça tributária.