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A CANÇÃO RÓDIA DA ANDORINHA (CARMINA POPULARIA, FR. 848 PMG)

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Academic year: 2021

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A

C

ANÇÃO

R

ÓDIA DA

A

NDORINHA

(CARMINA POPULARIA,

FR

.

848

PMG

)

mensageiro famoso da Primavera de doces aromas preta andorinha!

Simónides, fr. 597 PMG

Nesta brevíssima referência à andorinha, o grande lírico de Ceos (556-468 a.C.) conciliou, como era próprio do seu estilo, a inovação linguística1 com a tradição, ao retomar dois temas que estão presentes na abertura da canção ródia da andorinha: o anúncio do bom tempo e a plumagem predominantemente negra da ave.

Segundo informa Ateneu (8. 360b-d)2, a quem devemos a preservação do canto popular, era costume na ilha de Rodes, ‘no mês de Boedromion’3, ‘entoar a canção da andorinha’ (celidonivzein) enquanto se andava de casa em casa a pedir (fr. 848 PMG):

h\lq! h\lqe celidw;n kala;∫ w{ra∫ a[gousa kai; kalou;" ejniautouv", ejpi; gastevra leukav

kajpi; nw'ta mevlaina. 5 palavqan ouj prokuklei'"

ejk pivono" oi[kou oi[nou te devpastron turou' te kavnustron kai; purw'n; aJ celidwvn 10 _________________

1 No emprego de um termo raro, hJduvodmo∫

,

‘de doce odor’, que tem neste

passo a atestação mais antiga.

2 Ateneu cita como fonte Teógnis de Rodes, um historiador pouco conhecido,

autor de uma obra intitulada Festivais de Rodes (FGrHist 526 F 1).

3 O passo suscita dúvidas. Provavelmente Fevereiro-Março. Cf. E. J.

(2)

kai; lekiqivtan oujk ajpwqei'tai. povter! ajpivwme∫ h] labwvmeqa;

eij mevn ti dwvsei": eij de; mhv, oujk ejavsome": h] ta;n quvran fevrwme" h] to; uJpevrquron h] ta;n gunai'ka ta;n e[sw kaqhmevnan:

mikra; mevn ejsti, rJa/divw" nin oi[some". 15 a]n dhv ti fevrh/", mevga dhv ti fevroi":

a[noig! a[noige ta;n quvran celidovni: ouj ga;r gevrontev" ejsmen, ajlla; paidiva. Já chegou, já chegou a andorinha! Traz a estação boa

e o bom tempo do ano, no peito branca

no dorso preta. 5

Não fazes rolar um bolo de fruta seca da tua casa opulenta

e uma taça de vinho e uma cesta de queijo

e trigo? A andorinha 10

também não rejeita um pão de legumes. Vamos embora ou levamos alguma coisa? Se alguma coisa nos deres; se não deres,

[não te largamos: ou levamos a porta ou o lintel

ou a mulher que está lá dentro sentada. 15 É pequena, é fácil levá-la.

Se nos vais dar alguma coisa, que seja grande! Abre, abre a porta à andorinha:

não somos velhos, somos meninos!

Ateneu acrescenta que o canto popular fora introduzido na ilha de Rodes por Cleobulo, tirano da cidade de Lindos c. 600 a.C.4, numa altura em

que houve necessidade de recolher dinheiro. Apesar do tom anedótico desta _________________

4 Cleobulo de Lindos figura na lista dos Sete Sábios de Platão (Prt. 343a) e de

Pausânias (10. 24. 1), mas Plutarco não o considerava digno desta distinção (de E

(3)

última informação, ela sugere que a canção ródia da andorinha pode remontar à época arcaica, ao séc. VII ou VI a.C5.

O último verso indica que o canto popular era entoado por crianças, à semelhança dos que ainda hoje se ouvem em algumas regiões de Portugal nas vésperas do Dia de Todos os Santos, como aquele que é cantado em Coimbra:

Bolinhos e bolinhós para mim e para vós, para dar aos finados

que estão mortos e enterrados.

À porta da velha: truz, truz, truz! A senhora está lá dentro

sentada num banquinho. Faz favor de vir cá fora

para nos dar um tostãozinho ou um bolinho.

Esta casa cheira a vinho,

aqui mora algum santinho (ou anjinho).

Esta casa cheira a broa, aqui mora gente boa. ou

Esta casa cheira a alho aqui mora algum espantalho.

Esta casa cheira a truta aqui mora algum filho da p...

Embora digam respeito a momentos diferentes do ano, estas canções de crianças têm um objectivo comum – recolher alimentos ou outras ofertas – e partilham o mesmo tipo de persuasão. Num primeiro momento, o pedido é apresentado de forma simpática e em nome de outras figuras (da andorinha ou _________________

5 No entanto, a datação do poema e o estabelecimento do texto suscitam

discussão. Sobre estas questões controversas, vide especialmente Lambin 1992 e Martín Vázquez 1999.

(4)

dos finados). Num segundo momento, o dono da casa é confrontado com as consequências da sua decisão e, na canção ródia, é literalmente ameaçado (v. 13): caso nada dê, arrisca-se a perder uma parte da habitação ou da família (a mulher, é de supor). Curiosamente, as duas canções sublinham que uma senhora se encontra dentro de casa, sentada, decerto porque se tivesse vindo à porta não recusaria o pedido das crianças. Na canção portuguesa não há propriamente ameaça, mas geralmente o ouvinte sabe que será brindado com elogios, ditos trocistas ou insultos, conforme a sua resposta. Note-se ainda que se o emprego do vocábulo ‘tostãozinho’ pode ser um indício da antiguidade do canto, a menção do vinho e da broa atesta o seu cunho popular e reforça o confronto temático com a canção ródia da andorinha (cf. vv. 6-11).

Por conseguinte, não obstante a distância geográfica e temporal, os dois cantos populares têm vários aspectos em comum e confirmam que algumas tradições não conhecem fronteiras.

Citamos, para concluir, a bela versão de Marguerite Yourcenar, publicada em La Couronne et la Lyre (Paris, 1979, 139-140), que respeita o ritmo e a rima característicos das canções populares e que também estão presentes no poema original:

CHANSON DE RHODES

L'hirondelle, l'hirondelle, Ramenant la saison belle, Et la bonne année avec elle!

Pour l'hirondelle au ventre blanc, Pour l'hirondelle au dos tout noir, Donne à manger et donne à boire!

Donne du fromage et du flan, Du pain blanc et du raisin sec, Pour l'hirondelle au joli bec!

Donne! Nous te remercierons! Mais autrement nous resterons, Ta porte nous démolirons! Autrement, nous emporterons

(5)

Ta femme assise auprès du feu! Elle est menue et pèse peu!

Donne! Donne et grande bien te fasse! L'hirondelle aussi te rend grâce! Nous ne sommes pas des méchants, Mais rien que des petits enfants!

Referências bibliográficas

Caballero López, J. A.1989. “Canciones de niños en la Grecia clasica”, in Actas del Congreso Español de Estudios Clasicos. Madrid: 83-90. Campbell, David A. 1993. Greek Lyric. Vol. V: The new school of poetry and

anonymous songs and hymns. Cambridge, Mass.

Lambin, G. 1992. La chanson grecque dans l'Antiquité. Paris: 361-366. Martin Vázquez, L. 1999. “The Song of the Swallow”, CFC: egi 9: 23-39. Page, D. L. 1962. Poetae Melici Graeci. Oxford. [PMG]

Rodríguez Adrados, F. 1980. Lírica griega arcaica (poemas corales y monódicos, 700-300 a.C.). Madrid: 46-47.

Rodríguez Adrados, F. 1981. “La canción ródia de la golondrina y la cerámica de Tera”, in El mundo de la lírica griega antigua. Madrid: 311-331.

Thompson, D'Arcy W. 1936. A Glossary of Greek Birds. London: 319-320.

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