Uma Aplicação do Teorema dos Resíduos
Miguel Moreira
Escola Superior de Tecnologia de Setúbal DMAT
José Vieira Antunes
Instituto Tecnológico e Nuclear LDA
Heitor Pina
Instituto Superior Técnico DEM
Resumo
O movimento rotativo de um rotor numa região con…nada determi-na o escoamento do ‡uído envolvente e o desenvolvimento de forças de interacção ‡uído-estrutura, cujo conhecimento é essencial na previsão do comportamento dinâmico deste sistema. A determinação explícita das força referidas a partir das equações de Navier-Stokes conduz à necessidade de resolução de integrais de…nidos do tipo,
Gijk (H; X; Y ) = Z 2¼
0
siniµ cosjµ
(H¡ X cos µ ¡ Y sin µ)kdµ;
em que H; X; e Y são constantes tais que X2+ Y2< H2e i; j e k são
parâmetros inteiros que podem variar entre zero e quatro.
A aplicação de uma forma particular do teorema dos resíduos da análise complexa constitui a solução natural do problema anterior, con-cretizada recorrendo ao auxílio de um manipulador simbólico para fazer face à extensão das manipulações algébricas necessárias.
1 Introdução
1.1 Formulação do Problema
Consideremos as forças resultantes do escoamento de ‡uído na região anu-lar representada na …gura 1, determinado pela rotação - do veio circuanu-lar interno de raio R. A determinação destas forças (também designadas ‡uí-do-elásticas) é essencial no estudo do comportamento vibratório dos veios e rotores de equipamentos rotativos em geral. Em Antunes et al. [1], por exemplo, pode encontrar-se uma completa discussão teórica e a motivação para o estudo deste assunto.
No apêndice B faz-se referência ao signi…cado da simbologia utilizada. De referir que a folga h (µ; t) ; representada na …gura indicada, pode ser bem
.
X t( ) Y t( )Y
X
R θΩ
h( , )θt( )
uθ,tFigura 1: Geometria do escoamento aproximada recorrendo à seguinte equação,
h(µ; t) = H¡ X(t) cos µ ¡ Y (t) sin µ; (1) em que X e Y representam factores associados à excentricidade do sistema (posição do centro do veio interior) e H representa a folga que existiria se a excentricidade instantânea referida fosse nula. Naturalmente e para que o veio interior não entre em contacto com a superfície do estator supõe-se que, X (t)2+ Y (t)2< H2.
As equações de conservação da massa e do momento que permitem mo-delar (simpli…cadamente) o escoamento referido são (ver Antunes et al. [1]):
@h @t + 1 R @ (hu) @µ = 0; (2) ½ ( @ (hu) @t + 1 R @¡hu2¢ @µ ) + ¿ + h R @p @µ = 0; (3) em que u (µ; t) representa uma velocidade tangencial do ‡uído (valor médio na folga) e ¿ (µ; t) as tensões de natureza dissipativa. Estas últimas podem ser descritas recorrendo à formulação semi-empírica
¿ (u) = ¿r(u) + ¿s(u)
= ¡1 2½f (-R¡ u) 2+1 2½fu 2 = ½f-Ru¡12½f-2R2 (4) onde f representa um apropriado coe…ciente de fricção.
Observe-se que reescrevendo a equação da continuidade (2) como, @u @µ + u h@h@µ =¡Rh @h@t deduz-se, u(µ; t) = R h µ ¡ Z µ @h @t ¶ dµ ¶ = R ³² X sin µ¡Y cos µ + C² ´ H¡ X cos µ ¡ Y sin µ ; (5)
tendo em conta (1). De assinalar a presença da constante de integração, C(t), na expressão da velocidade (5),assim obtida.
1.2 Determinação das Forças Fluído-elásticas
Denotando por FX(t) e FY(t) as componentes segundo X e Y da força
resultante que o ‡uído exerce no rotor, pode mostrar-se que FX(t) = ¡LR Z 2¼ 0 p(µ; t) cos µdµ = LR Z 2¼ 0 @p(µ; t) @µ sin µdµ; (6) FY(t) = ¡LR Z 2¼ 0 p(µ; t) sin µdµ =¡LR Z 2¼ 0 @p(µ; t) @µ cos µdµ; (7) em que R e L representam o raio e o comprimento do rotor. Assim, inte-grando entre 0 e 2¼, as seguintes formas equivalentes da equação (3),
¡@p@µsin µ = ½ ½ ½ R@(hu)h@t +@(h@µhu2) ¾ + R¿ (u)h ¾ sin µ; (8) ¡@p@µcos µ = ½ ½ ½ R@(hu)h@t +@(h@µhu2) ¾ + R¿ (u)h ¾ cos µ; (9) deduz-se, FX(t) = ¡½R2L Z 2¼ 0 @ (hu) h@t sin µdµ¡ ½RL Z 2¼ 0 @¡hu2¢ h@µ sin µdµ (10) ¡R2L Z 2¼ 0 ¿ (u) h sin µdµ; FY(t) = ½R2L Z 2¼ 0 @ (hu) h@t cos µdµ + ½RL Z 2¼ 0 @¡hu2¢ h@µ cos µdµ (11) +R2L Z 2¼ 0 ¿ (u) h cos µdµ:
Tendo em conta a expressão conhecida da velocidade (5), facilmente se veri…ca que cada um dos integrais de…nidos representados nas equações (10) e (11), pode ser descrito com base em integrais de…nidos elementares do tipo, Gijk (H; X; Y ) = Z 2¼ 0 siniµ cosjµ (H¡ X cos µ ¡ Y sin µ)kdµ; 0 i; j; k 4: (12) A título de exemplo apresentamos a representação de um dos integrais
de…nidos indicados: R2¼ 0 @(hu2) h@µ sin µdµ = 2R2 µµ³² X ´2 ¡³Y² ´2¶ G21 2 + ² 2XY G² 302 ¶ +2R2³¡X²Y G² 102 + C ³² X G112 + ² Y G202 ´´ ¡R2µ³X² ´2 XG403 + X³Y² ´2 G223 ¡ 2X X²Y G² 313 ¶ ¡R2³C2XG20 3 + 2CX ³² X G303 ¡ ² Y G213 ´´ ¡R2 µ ¡³X² ´2 Y G313 ¡ Y ³Y² ´2 G133 + 2X Y² Y G² 223 ¶ ¡R2³¡C2Y G113 ¡ 2CY ³² X G213 ¡ ² Y G123 ´´ :
Torna-se assim claro que a obtenção de expressões analíticas que descre-vam FX(t) e FY (t) está dependente do cálculo dos integrais de…nidos do
tipo (12) em função dos parâmetros H, X e Y .
Re…ra-se que o seu cálculo recorrendo às técnicas da análise real depen-dente da computação prévia das primitivas envolvidas não é uma tarefa fácil, conduzindo frequentemente a expressões muito pesadas.
2 A aplicação do Teorema dos Resíduos
O procedimento natural para calcular estes integrais de…nidos (12) consiste na utilização do resultado elementar (consequência do teorema dos resíduos) da análise complexa (proposição 1) que seguidamente se expõe.
Proposition 1 Seja R (x; y) uma função racional em x e y cujo denomi-nador não se anula na circunferência centrada na origem e de raio unitário. Então
Z 2¼ 0
R (cos µ; sin µ) dµ = 2¼iX[resíduos de f (z) no interior de D] (13) em que f (z) = R ¡1 2 ¡ z +1z¢;2i1 ¡z¡ 1z¢¢ iz (14)
e D representa o interior do círculo unitário centrado na origem. Proof. Consultar Marsden [2], pg 302, por exemplo.
Pode encontrar-se também em Marsden [2] a de…nição dos conceitos de resíduo, polo e ordem de um polo de utilização necessária. A proposição 2 apresenta um resultado a partir do qual se torna possível a determinação de resíduos associados a polos de ordem arbitrária.
Proposition 2 Suponha-se que f tem um polo de ordem k em z0. Então Res (f; z0) = lim z!z0 ©(k¡1)(z) (k¡ 1)! ; em que © (z) = (z ¡ z0)kf (z).
Proof. Consultar Marsden [2], pg 272.
2.1 Exemplo de Aplicação
Ilustremos a aplicação destes resultados no cálculo de G003 (H; X; Y ) =
Z 2¼ 0
1
(H¡ X cos µ ¡ Y sin µ)3dµ; supondo naturalmente que H > 0 e X2+ Y2 < H2.
1. Comecemos por determinar a função f (z) nos termos da proposição 1, f(z) = R ¡1 2 ¡ z +1z¢;2i1 ¡z¡1 z ¢¢ iz = 1 iz¡H¡ X12¡z +1z¢¡ Y2i1 ¡z¡1z¢¢3 = ¡8z 2 i ((X¡ iY ) z2¡ 2Hz + X + iY )3 = ¡8z 2 i (X¡ iY )3(z¡ z1)3(z¡ z2)3 ; em que z1= 1 (X¡ iY ) ³ H +pH2¡ X2¡ Y2´ e z2= 1 (X¡ iY ) ³ H¡pH2¡ X2¡ Y2´
são polos de ordem 3.
2. Repare-se que z2 é o único polo que se localiza no interior do
cír-culo unitário. Calculemos então o resíduo de f em z2 com base na
proposição 2. Seja,
© (z) = ¡8z
2
i (X¡ iY )3(z¡ z1)3
então Res(f; z2) =1 2zlim!z2© 00(z) : Concluíndo-se, Res(f; z2) = i¡16z 2 2 ¡ 16z12¡ 64z1z2 2 (X¡ iY )3(z1¡ z2)5 :
3. Substituindo em (13) e simpli…cando obtemos …nalmente o resultado desejado: Z 2¼ 0 1 (H¡ X cos µ ¡ Y sin µ)3dµ = ¼ 16z2 2+ 16z21+ 64z1z2 (X¡ iY )3(z1¡ z2)5 = ¼ ¡ 2H2+ X2+ Y2¢ ³p H2¡ X2¡ Y2´5 : (15)
3 Conclusões
No apêndice A podem encontrar-se os integrais de…nidos do tipo Gij k
calcu-lados pela via apresentada.
De referir que a metodologia referida se bem que conceptualmente sim-ples exige a realização de computações algébricas extensas e pesadas que só puderam ser facilmente ultrapassadas com o recurso a um manipulador simbólico.
Este trabalho reforça a ideia da importância de se considerar na for-mação do Engenheiro uma sólida preparação matemática (nomeadamente e em particular o conhecimento de alguns resultados elementares da análise complexa) e a familiaridade na utilização das ferramentas computacionais de manipulação simbólica actualmente disponíveis.
Referências
[1] Antunes, J., Axisa, F. and Grunenwald, T., Dynamics of rotors im-mersed in eccentric annular ‡ow. Part1:Theory, Journal of Fluid and Structures (1996), 10, 893-918.
[2] Marsden, J. E. and Ho¤man, M. J., Basic Complex Analysis, Second Edition, Freeman, 1987.
A Integrais Azimutais
G001 = p 2¼ H2¡ X2¡ Y2 (16) G011 = 8 < : 0 se X = Y = 0 2¼X H¡ p (H2¡X2¡Y2) (X2+Y2)p(H2¡X2¡Y2) c.c. (17) G10 1 = 8 < : 0 se X = Y = 0 2¼Y H¡ p (H2¡X2¡Y2) (X2+Y2)p(H2¡X2¡Y2); c.c. (18) G111 = 8 < : 0 se X = Y = 0¡2¼Y XX2+Y(X22¡2H+Y2)22+2pp(H(H2¡X2¡X2¡Y2¡Y2)2)H; c.c.
(19) G201 = 8 < : ¼ H se X = Y = 0 2¼X2(X2+Y2)¡H2(X2¡Y2)+H(X2¡Y2) p (H2¡X2¡Y2) (X2+Y2)2p(H2¡X2¡Y2) ; c.c (20) G021 = G001 ¡ G20 1 = = 8 < : ¼ H se X = Y = 0; 2¼X2Y2+Y4+H2X2¡H2Y2¡H p (H2¡X2¡Y2)X2+Hp(H2¡X2¡Y2)Y2 (X2+Y2)2p(H2¡X2¡Y2) ; c.c. (21) G002 = 2¼H p (H2¡ X2¡ Y2) (H2¡ X2¡ Y2)2 (22) G012 = 2¼X p (H2¡ X2¡ Y2) (H2¡ X2¡ Y2)2 (23) G102 = 2¼Y p (H2¡ X2¡ Y2) (H2¡ X2¡ Y2)2 (24)
G202 = 8 > < > : ¼ H2 se X = Y = 0 2¼ ³ HY2(Y2+X2)+(H2(X2¡Y2)¡X4+Y4)³H¡p(H2¡X2¡Y2)´´ (X2+Y2)2³p(H2¡X2¡Y2)´3 ; c.c. (25) G022 = G002 ¡ G202 (26) G112 = 8 < : 0 se X = Y = 0 2¼XY H(¡2H2+3(X2+Y2))+2(H2¡Y2¡X2) p (H2¡X2¡Y2) ³p (H2¡X2¡Y2)´3(X2+Y2)2 ; c.c. (27) G302 = 2¼Y
¡3p(H2¡X2¡Y2)X2¡3HX2¡2HY2+3p(H2¡X2¡Y2)H2+3H3
³p
(H2¡X2¡Y2)´3³H+p(H2¡X2¡Y2)´3 (28)
G032 = 2¼X
¡3p(H2¡X2¡Y2)Y2¡3HY2¡2HX2+3p(H2¡X2¡Y2)H2+3H3
³p (H2¡X2¡Y2)´3³H+p(H2¡X2¡Y2)´3 (29) G122 = G102 ¡ G302 (30) G212 = G012 ¡ G032 (31) G003 =¡2H2+ X2+ Y2¢³p ¼ (H2¡ X2¡ Y2)´5 (32) G203 = ¼ H2¡ X2+ 2Y2 ³p (H2¡ X2¡ Y2)´5 (33) G023 = G003 ¡ G20 3 (34)
G113 = ¼³p 3XY (H2¡ X2¡ Y2)´5 (35) G103 = 3¼³p HY (H2¡ X2¡ Y2)´5 (36) G013 = 3¼³p HX (H2¡ X2¡ Y2)´5 (37) G303 = ¼Y ³
9H4+9p(H2¡X2¡Y2)(H3¡X2H)¡4H2Y2¡15H2X2¡2Y4+4Y2X2+6X4´
³p (H2¡X2¡Y2)´5³H+p(H2¡X2¡Y2)´3 (38) G123 = G103 ¡ G303 (39) G033 = ¼X ³
9H4+9p(H2¡X2¡Y2)(H3¡Y2H)¡4H2X2¡15H2Y2¡2X4+4Y2X2+6Y4´
³p (H2¡X2¡Y2)´5³H+p(H2¡X2¡Y2)´3 (40) G213 = G013 ¡ G033 (41) G403 = 3¼ (2H6¡5H4X2+4H2X4¡X6+3H4Y2¡6H2X2Y2+3X4Y2¡4H2Y4+4X2Y4) ³p (H2¡X2¡Y2)´5³H+p(H2¡X2¡Y2)´4 +3¼2H(H4¡2H2X2+X4+2H2Y2¡2X2Y2¡Y4) (H2¡X2¡Y2)2³H+p(H2¡X2¡Y2)´4 (42) G043 = G003 ¡ 2G203 + G403 (43) G223 = G203 ¡ G403 (44) G313 = 3¼XY 3X 4+X2Y2¡7H2X2¡2Y4¡H2Y2+4H4 ³ H+p(H2¡X2¡Y2)´4³p(H2¡X2¡Y2)´5 +3¼XY ³ 4H(H2¡X2) H+p(H2¡X2¡Y2)´4(H2¡X2¡Y2)2 (45) G133 = G113 ¡ G313 (46)
B Simbologia Utilizada
C (t)¡Constante (dependente do tempo) associada à integração da equação da continuidade;
f¡Coe…ciente de fricção na parede do rotor/parede do estator; FX(t); FY(t)¡Forças ‡uidoelásticas;
h(µ; t)¡Folga local;
L¡Comprimento mergulhado do veio (rotor); p(µ; t)¡Pressão azimutal;
R¡Raio do veio (rotor) imerso; t¡Tempo;
u(µ; t)¡Velocidade tangencial local; X(t); Y (t)¡Posição do veio (rotor); µ¡Ângulo azimutal;
½¡Massa volúmica do ‡uído;
¿ (u)¡Tensão de corte total (como função de u);
¿r(u)¡Tensão de corte na parede do rotor (como função de u);
¿s(u)¡Tensão de corte na parede do estator (como função de u);
-¡Velocidade angular do rotor;