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O (anti)-imperialismo de J. A. Hobson na alvorada do séc. XX

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

ÁREA DE LITERATURAS, ARTES E CULTURAS

O (Anti)

MESTRADO EM ESTUDOS INGLESES E AMERICANOS

Área de Especialização de Estudos Ingleses

UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE LETRAS

ÁREA DE LITERATURAS, ARTES E CULTURAS

O (Anti) - Imperialismo de J. A. Hobson

na Alvorada do Séc. XX

Ana Paula Lobato de Jesus

MESTRADO EM ESTUDOS INGLESES E AMERICANOS

Área de Especialização de Estudos Ingleses

2013

ÁREA DE LITERATURAS, ARTES E CULTURAS

MESTRADO EM ESTUDOS INGLESES E AMERICANOS

Área de Especialização de Estudos Ingleses

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

ÁREA DE LITERATURAS, ARTES E CULTURAS

O (Anti)

Ana Paula Lobato de Jesus

Ana Paula Lobato de Jesus

Dissertação orientada pelo Professor Doutor Júlio Carlos Viana Ferreira

MESTRADO EM ESTUDOS INGLESES E AMERICANOS

Área de Especialização

UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE LETRAS

ÁREA DE LITERATURAS, ARTES E CULTURAS

O (Anti) -Imperialismo de J. A. Hobson

na Alvorada do Séc. XX

Ana Paula Lobato de Jesus

Ana Paula Lobato de Jesus

Dissertação orientada pelo Professor Doutor Júlio Carlos Viana Ferreira

MESTRADO EM ESTUDOS INGLESES E AMERICANOS

Área de Especialização de Estudos Ingleses

2013

ÁREA DE LITERATURAS, ARTES E CULTURAS

Imperialismo de J. A. Hobson

Dissertação orientada pelo Professor Doutor Júlio Carlos Viana Ferreira

MESTRADO EM ESTUDOS INGLESES E AMERICANOS

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O (Anti) - Imperialismo de J. A. Hobson na Alvorada do Séc. XX

Copyright © Ana Paula Lobato de Jesus, FLUL, UL 2013

A Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e a Universidade de Lisboa têm licença não exclusiva para arquivar e tornar acessível, nomeadamente através do seu repositório institucional, esta dissertação, no todo ou em parte, em suporte digital, para acesso mundial. A Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e a Universidade de Lisboa estão autorizadas a arquivar e, sem alterar o conteúdo, converter a dissertação entregue, para qualquer formato ou ficheiro, meio ou suporte, nomeadamente através da sua digitalização, para efeitos da sua preservação e acesso.

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Dedicatória

Aos meus pais…

por tanto, sempre!

Aos meus filhos…

com amor e orgulho

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Agradecimentos

Ao meu orientador, Professor Doutor Viana Ferreira, pela imensa paciência e pelo empenho demonstrados. A sua expressão “Nem pensar!” tantas vezes repetida, ecoará por muitos anos na minha cabeça e dar-me-á o estímulo necessário perante as grandes tarefas. Graças ao seu enorme conhecimento, competência e rigor, pude levar a cabo este trabalho tão árduo, que ficava mais fácil a cada um dos nossos muitos encontros. Agradeço também a sua compreensão pelas minhas dificuldades e obstáculos, bem como a sua constante disponibilidade para esclarecer todas as minhas dúvidas e entender as minhas angústias.

A todos os Professores que lecionaram os seminários deste Curso de Mestrado, concorrendo com o seu saber e entusiasmo para que eu o levasse a bom porto.

Ao meu pai, que ao longo da vida me incentivou a estudar e a saber cada vez mais, rejubilando com os meus sucessos e ajudando-me a concretizar os meus sonhos.

Aos meus pais, filhos e nora, pela enorme compreensão pelas minhas ausências e recolhimento, bem como pelo orgulho e interesse manifestados, incentivando-me a nunca desistir.

Às minhas amigas Carla e Cristina por terem tornado os meus dias mais leves com o seu bom humor e amizade quando o cansaço e a ansiedade se instalavam.

Aos meus alunos, pela curiosidade revelada durante a elaboração desta dissertação e pela alegria demonstrada aquando da sua conclusão, também elas um enorme estímulo para o meu trabalho.

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iv

Resumo

Esta dissertação tem como propósito explorar o paradigma de imperialismo de J. A. Hobson, tanto na essência e pressupostos como nas respetivas limitações. Por isso, tornou-se necessário contextualizar Hobson histórica e politicamente nos finais do séc. XIX, período em que fervilhavam as teorias darwinianas, convenientemente utilizadas como justificação para a colonização britânica em África e para o racismo daí resultante, e em que o New Imperialism se impôs como uma fase mais agressiva da política colonial da Grã-Bretanha. Políticos conservadores como Disraeli e Joseph Chamberlain fomentaram no povo o orgulho pelo império e a manifestação de sentimentos patrióticos exacerbados, conhecidos genericamente por jingoísmo, atitudes que Hobson viria a deplorar por moldarem negativamente o carácter britânico.

O presente estudo enquadra ainda Hobson na tradição liberal inglesa e realça o papel da expansão do império britânico e do capital financeiro na evolução do seu pensamento radical e anti-imperialista, bem como a influência que liberais como Cobden exerceram nos seus ideais internacionalistas. Sublinha-se também a importância dos grupos de discussão liberais e radicais, com os quais Hobson colaborou ativamente, e como a sua ida à África do Sul na qualidade de repórter da guerra dos boers constituiu um ponto de viragem fundamental na sua visão do imperialismo britânico e, em particular, das respetivas preocupações relativas ao impacto do imperialismo a nível interno.

A investigação efetuada permite concluir que Hobson, apesar das inconsistências e algum exagero na forma como expôs as suas teorias, foi um homem à frente do seu tempo, com uma visão muito abrangente da realidade, que apresentou propostas muito concretas e viáveis não apenas para a melhoria da qualidade de vida dos britânicos, mas ainda para solucionar a problemática dos impérios.

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v

Abstract

This dissertation aims to explore the paradigm of imperialism of J. A. Hobson, both in its essence, assumptions and limitations. Therefore, it was necessary to contextualize Hobson historically and politically at the end of the19th century, when Darwinist ideas were stirring and being suitably used as a justification for the British colonization in Africa and consequent racism, and when New Imperialism imposed itself as a more aggressive phase of Britain's colonial policy. Conservative politicians such as Disraeli and Joseph Chamberlain encouraged English people to feel proud of the Empire and the expression of nationalist and patriotic feelings, generally known as jingoism, attitudes that Hobson would deplore for shaping British character negatively.

This study places Hobson into the British liberal tradition and emphasizes the role of the expansion of the British Empire and the financial capital in the evolution of its radical and anti-imperialist thought, as well as the influence that liberals like Cobden wielded in his internationalist ideals. It also stresses the importance of liberal and radical discussion groups in which Hobson took an active part and the way his trip to South Africa as a reporter in the Boer War marked a turning point in his vision of British imperialism and, in particular, his concerns regarding the impact of imperialism at home.

The undertaken research led to the conclusion that Hobson, despite inconsistencies and some exaggeration in the way he expressed his theories, was a man ahead of his time, with a far-reaching vision of reality and very specific and feasible proposals, not only for the improvement of the British people, but also to solve the problems of Empires.

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Índice

1. INTRODUÇÃO ….. ... .1

2. CONTEXTO SOCIOECONÓMICO E POLÍTICO ENTRE 1870 e 1914 2.1. ECONOMIA E SOCIEDADE ... ..5

2.2. POLÍTICA E IMPÉRIO ... 15

2.3. CRÍTICAS AO IMPÉRIO ... 32

3. J. A. HOBSON E O ESTUDO DO IMPERIALISMO 3.1. VIDA E EVOLUÇÃO IDEOLÓGICA ... 38

3.2. IMPERIALISMO E LIBERALISMO ... 45

3.3. O RADICALISMO SOCIAL ... 49

3.4. O ECONOMISTA HEREGE ... 52

3.5. ESTUDOS HOBSONIANOS ... 56

4. IMPERIALISM: A STUDY DE J. A. HOBSON 4.1. RECEÇÃO E IMPACTO DA OBRA ... 65

4.2. RELEVÂNCIA ECONÓMICA DA OBRA ... 66

4.3. HOBSON E A PAIXÃO IMPERIAL ... 71

4.4. IMPERIALISMO E INTERNACIONALISMO ... 73

4.5. DA GUERRA DOS BOERS À 1ª GUERRA MUNDIAL – AS CONTRADIÇÕES DE HOBSON ... 77

5. CONCLUSÃO ... 83

BIBLIOGRAFIA ... 87

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1 1.

Introdução

Este estudo irá examinar o paradigma de imperialismo formulado por J. A. Hobson no início do séc. XX, quer na sua substância e objetivos, quer nas suas limitações. Enquanto tradicionalmente os académicos se têm dedicado ao impacto do império britânico no mundo, Hobson analisou os efeitos do imperialismo sobre as instituições, a economia e a política britânicas, e ainda a sua influência sobre a mentalidade e o caráter da nação. Tendo o séc. XIX sido tão rico de acontecimentos históricos, sociais e económicos, optámos por limitar este estudo ao período de entre 1870 e 1914, tanto pelas alterações geopolíticas mundiais nele havidas, concretizadas na corrida a África, como por todo o desenvolvimento científico, industrial e económico em que aqueles cerca de cinquenta anos foram férteis. A par da democratização do sistema político e consequente alargamento do universo eleitoral, a emigração para as colónias e a expansão do império nos trópicos inspiraram nessa época inúmeros textos, artigos e discussões públicas. Foi igualmente um período determinante na vida e produção literária de Hobson, com destaque para 1902, ano da publicação de

Imperialism, obra central no nosso trabalho de investigação.

O conceito de império transportou até aos nossos dias uma carga muito negativa, comprovada em obras de ficção recentes em que mundos imaginários são normalmente associados a impérios do mal, caso de trilogias célebres como Star Wars ou The Lord of the

Rings, nas quais as personagens maléficas controlam impérios e as bondosas governam

reinos. Quando o britânico J. R. R. Tolkien escreveu a famosa trilogia, o seu país possuía ainda um vasto império, embora já numa fase decadente, sendo os heróis da obra retratados como aventureiros e trabalhadores incansáveis em prol do bem-estar de outros, metaforicamente considerados “construtores” do império, com uma imagem positiva e suscetível de aprovação generalizada.

Ao longo do século XX a ideia de império perdeu muito do seu sentido heroico, passando de uma quase total aceitação para a rejeição praticamente geral no mundo democrático. Do mesmo modo o termo “imperialismo”, que Howe (2002: 22) distingue de “império”, é considerado um processo, uma atitude, uma ideologia e até uma filosofia de vida, de difícil definição, e que começou a ser amplamente usado apenas na segunda metade do séc. XIX. O imperialismo reproduz não apenas o processo através do qual uns povos são dominados por outros, mas ainda a natureza desse domínio, tendo os historiadores tornado o tema bastante controverso, pelo facto de não chegarem a um consenso quanto à melhor

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2 abordagem a uma análise do fenómeno e, consequentemente, considerarem que é muito difícil estabelecer uma teoria única sobre o imperialismo, que revestiu formas diversas consoante o espeço e o tempo em que ocorreu.

Do ponto de vista britânico, uma vez que o seu domínio colonial era considerado civilizado e benéfico para os povos colonizados, o exemplo mais evidente de governo despótico vinha de França, onde os apoiantes do Imperador Napoleão III eram denominados “imperialistas”, mas muitos conseguiam também ver indícios de imperialismo britânico na administração da Índia. Com o New Imperialism e para os conservadores liderados por Disraeli passou a conotar-se imperialismo com patriotismo e orgulho imperial, enquanto os radicais-liberais do final do séc. XIX recuperaram as conotações mais pejorativas de despotismo e de patriotismo agressivo, substituindo por vezes o termo imperialism por

jingoism, pondo assim a tónica na atitude britânica em relação à posse de um império, e não

tanto no domínio, conquista ou expansão colonial em si, sendo então possível simultaneamente opor-se ao imperialismo e aceitar o império.

O termo latino imperium, que está na origem dos conceitos de “império” e “imperialismo,” denomina em termos gerais todo e qualquer tipo de relação estabelecida entre um estado poderoso e outro menos poderoso. Para os Romanos imperium tinha o duplo significado de fazer guerra e executar as leis, e o imperador era por norma um general vitorioso. Ao longo do império o termo adquiriu nova conotação, passando a designar o governo sobre os territórios distantes de Roma, sentido que se manteve durante séculos, vindo na Inglaterra anglo-saxónica alguns reis a autoproclamarem-se “imperadores” e a vangloriarem-se da sua “soberania absoluta” se não reconheciam a existência de qualquer rival pretendente ao trono. Quando Henrique VIII de Inglaterra proclamou o seu império em 1530,teve como objetivos garantir que não prestaria qualquer vassalagem ao Papa nem permitiria a sua interferência nos assuntos do país.

Embora no reinado da Rainha Vitória, sobretudo por volta de 1840, “império” pudesse designar apenas as Ilhas Britânicas (Koebner & Schmidt1964: xxv), foi ela quem deu respeitabilidade e fortaleceu o vasto império ao tornar-se imperatriz da Índia pela mão de Disraeli. No início do século XX foi o radical liberal J. A. Hobson o primeiro a defender a ideia de que o imperialismo britânico, mas também o europeu, estava associado à procura de mercados e áreas de investimento do capital financeiro, tendo afirmado então que imperialismo e capitalismo eram uma e a mesma coisa, teoria desenvolvida posteriormente por Lénine. Atualmente falar de imperialismo é falar da política externa dos Estados Unidos, que utiliza os mesmos métodos do colonialismo dos séculos XIX e XX, embora não

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3 diretamente, mas antes através de um controlo económico, diplomático e cultural, não hesitando porém em intervir militarmente se considerar que os seus interesses estão ameaçados, como aconteceu no Vietname, Kuwait ou Iraque.

Apesar de o conceito de império se ter alterado ao longo da história e muitas terem sido as formas de o tentar definir, citaremos a definição de Stephen Howe, que nos parece muito concisa (2002: 14):

(…) an empire is a large political body which rules over territories outside its original borders. It has a central power or core territory – whose inhabitants usually continue to form the dominant ethnic or national group in the entire system – and an extensive periphery of dominated areas. In most cases the periphery has been acquired by conquest.

É nosso propósito nesta dissertação analisar o imperialismo britânico do ponto de vista de alguém que, ao contrário de Disraeli, Chamberlain ou Kipling, homens que tanto se orgulharam do “seu” império, o tivesse encarado como algo de intrinsecamente mau e prejudicial ao país e, nesse sentido, Hobson surgiu-nos como a figura ideal.

Para levarmos a cabo este estudo, propomo-nos caracterizar primeiro o contexto socioeconómico e político em que Hobson viveu e no qual desenvolveu as suas teses sobre o imperialismo, com relevância para a revolução industrial, a expansão da alta finança e da City como centro mundial dos negócios, e a luta política entre conservadores e liberais, liderados respetivamente por Disraeli e Gladston. Discordando embora da importância e da administração do império bem como da expansão colonial, liberais e conservadores praticaram o New Imperialism que conduziu à partilha de África e à guerra dos boers, que acabou por despertar algumas consciências e, no caso de Hobson, muito contribuiu para a alteração da sua perspetiva sobre o império. Em segundo lugar, abordaremos a vida, obra e evolução ideológica de Hobson, realçando o papel das sociedades éticas nas quais se reuniam os grupos de intelectuais que nos finais do séc. XIX refletiam sobre a sociedade da época, exigindo reformas sociais, e que tiveram um papel fundamental no radicalismo das suas visões sobre o império e na sua relação com o imperialismo liberal. Dedicaremos ainda parte importante desta dissertação ao estudo de Imperialism, obra na qual Hobson reuniu os textos que escreveu enquanto correspondente na guerra dos boers, referindo a forma como a obra foi recebida pela sociedade e pelos críticos, e analisando pormenorizadamente o seu conteúdo e a questão da sua atualidade. Na parte final do trabalho e porque ele abarca ainda um período de cerca de uma década após a publicação de Imperialism, destacaremos a evolução de Hobson e

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4 as ligeiras alterações efetuadas na 2ª edição da obra, publicada em 1905, mas An Economic

Interpretation of Investment, de 1911, merecer-nos-á particular atenção, visto que nele

Hobson contradisse algumas das suas anteriores posições sobre o imperialismo, certamente fruto de alterações políticas na Grã-Bretanha e ainda da natural evolução ideológica de um pensador tão fecundo.

Dado que Hobson publicou cinquenta e duas obras e centenas de artigos e cartas, para além de Imperialism, destacaremos também a sua autobiografia, Confessions of an

economic heretic, fundamental para perceber a sua evolução como pensador político e

económico, bem como The Psychology of Jingoism, no qual desmonta e analisa a influência que o império teve no carácter dos britânicos, muito conseguida através da cooperação de uma imprensa “amiga” dos que defendiam a manutenção e exploração económica das colónias, inflamando as emoções e o fervor patriótico do povo e levando-o ao rubro com os sucessos dos soldados do império.

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5 2.

Contexto Socioeconómico e Político entre 1870 e 1914

2. 1. Economia e Sociedade

A história da Grã - Bretanha do séc. XIX ficou marcada por duas realidades que contribuíram de forma decisiva para uma modificação profunda da estrutura económica e social do país e para o seu desenvolvimento interno, bem como para um claro domínio externo: o Império e a sua expansão, sobretudo a partir da década de 1870, e a Revolução Industrial, ambos numa relação de dependência, na qual a industrialização usou o Império como forma de encontrar mercados para os novos produtos manufacturados em série e o Império utilizou o dinheiro acumulado pelos magnatas da indústria para se expandir e autojustificar. A Revolução Industrial levou a Grã- Bretanha a alterar o seu modo de vida tradicional e a adaptar-se ao progresso trazido pela industrialização que, para o bem e para o mal, transformou decisivamente a sociedade, contribuindo de igual forma para estimular o debate intelectual e político.

Hobsbawm (1999: 12) escreveu: “the Industrial Revolution is not merely an acceleration of economic growth, but an acceleration of growth because of and through, economic and social transformation.” O aparecimento de novas máquinas, sobretudo têxteis, contribuiu para a mudança de hábitos laborais, com implicações na vida económica e social do país e da população. A partir dos finais do século XVIII até à segunda metade do XIX, todo o sistema económico e social britânico se transformou, sobretudo nos setores industrial, comercial e financeiro. Do mesmo modo, a tecnologia utilizada, toda a organização e práticas laborais e novos modos de produção, bem como o crescimento demográfico e a deslocação de parte da população das áreas rurais e do setor agrícola para as cidades, muitas delas transformadas em grandes centros industriais, foram alterações evidentes e de grande relevância social na época.

A indústria têxtil, sobretudo a do algodão, sofreu enorme expansão e, a par de fábricas que empregavam centenas de trabalhadores em instalações pouco adequadas, proliferavam muitas outras de menores dimensões, com menos trabalhadores, e uma produção artesanal, em pequena escala, que apenas satisfazia o mercado interno. Tratava-se de pequenas indústrias familiares, que controlavam o comércio local, instaladas em ruas escondidas e operando de forma quase clandestina, que recorriam às poupanças familiares, mais do que aos bancos, para se capitalizarem e para fazerem novos investimentos. (Hobsbawm, 1999: 50)

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6 competitiva, dominaram o comércio mundial. O enorme crescimento da produção teve como consequência uma queda acentuada dos preços e um aumento da procura interna e externa que estimularam de forma decisiva a economia vitoriana, levando a que nenhum outro país no mundo tivesse possibilidades de competir com a Grã- Bretanha, tornando-se esta a oficina do mundo.

Mais determinante do que os têxteis para o desenvolvimento económico foi, sem dúvida, a indústria pesada. A este propósito escreveu Hobsbawm (1999: 87): “Fortunately a new phase of industrialization was about to take over, and to provide a much firmer foundation for economic growth: that based on capital goods industries, on coal, iron and steel.” A produção de energia a vapor, a construção de navios mais modernos e, sobretudo, do caminho-de-ferro, impulsionaram de forma decisiva as comunicações e as deslocações de pessoas e cargas. Segundo Anthony Wood (2002: 175) entre 1850 e 1870 construíram-se 62.700 Km de linha férrea e, em 1869, exportaram-se 300.000 toneladas de ferro para os EUA, para a construção do caminho-de-ferro naquele país, correspondendo a um terço das exportações anuais daquele minério. Na década de 70 a produção de aço atingiu as 486.000 toneladas por ano, passando a utilizar-se mais do que o ferro, por ser menos quebradiço.

A construção naval sofreu, de igual modo, enorme expansão neste período. Construíram-se navios de cinco toneladas e desenvolveram-se caldeiras de aço e motores de expansão tripla, para um consumo mais económico de combustível e uma navegabilidade mais rápida do a que as velas permitiam. A abertura do Canal do Suez, em 1869, reduziu em muito a duração das viagens para oriente, contribuindo para o aumento das exportações dos bens que se produziam em grande escala. Apesar disso, segundo Anthony Wood, em 1875 as importações suplantaram as exportações em 60 milhões de libras: “Thus the workshop of the world never entirely paid its way.” (2002: 177)

Com o centro da atividade económica a transferir-se da agricultura para a indústria e para o comércio, verificaram-se alterações significativas a nível social, com consequências em todas as classes. A velha aristocracia rural continuou com peso institucional na sociedade, mas com o declínio da agricultura por volta de 1870, perdeu influência, prestígio e poder económico. Cain e Hopkins (2002: 115) escreveram a este propósito:

The landed aristocracy could mitigate their economic difficulties after 1870 only by reaching an accommodation with other forms of wealth. (…) And, insofar as their political and social power was on the wane, their successors were gentlemen from the service sector or from finance rather than

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7 manufacturers from the industrial provinces.

As famílias proprietárias de estaleiros navais, empresas de navegação, campos de minas e bancos contavam-se entre as mais abastadas do país mas, ao longo do século, viram-se forçadas a formar sociedades, que elegiam órgãos diretivos para gerir as empresas. A clasviram-se média foi, sem dúvida, a que mais cresceu e prosperou naquela época. Aumentou, de forma significativa, o número de profissionais com um elevado rendimento, como advogados, contabilistas, engenheiros, arquitetos ou médicos. Abaixo destes na escala social, surgiam empregados bancários e de seguros, prósperos donos de lojas e de pequenas fábricas. As mulheres passaram também a fazer parte da força de trabalho e, de acordo com Wood (1982: 182), havia em 1871 mais de 1.200.000 de empregadas domésticas.

Contudo, a nova riqueza nacional teve pouco impacto nas classes trabalhadoras. Em 1867 um trabalhador especializado ganhava £ 3 por semana e os aumentos salariais eram sempre diminutos. Apesar de as condições de trabalho irem gradualmente melhorando, graças às leis sucessivas que o Parlamento aprovava com esse objetivo, ainda assim, de acordo com Wood (1982: 185), em 1875 morreram cerca de 800 trabalhadores do caminho-de-ferro e anualmente morriam mais de mil mineiros, devido à dureza e ao perigo das suas profissões. A análise que Rubinstein (1998: 296) faz desta classe é crua:

Apart from being crime-ridden (…) and full of disease, the East End and other deprived areas were inhabited by tens of thousands of people who spoke English with a different accent and were, to the wealthy, often physically repellent. (…) Workers indeed often wore the same clothes for months on end; (…) Drink and drunken behaviour, signs of domestic violence, foul language and shouting, would also be unavoidable features of any venture into the slums.

Até ao início da Primeira Guerra Mundial cerca de 10% da população londrina, sobretudo desempregados ou operários indiferenciados, vivia na mais completa miséria, e no final do séc. XIX 30% da população britânica vivia em pobreza crónica, segundo Rubinstein

(1998: 294).

No entanto, face à vasta oferta de produtos a preços mais baixos, as classes média e trabalhadora puderam aceder ao consumo de tecidos, calçado, artigos para o lar, como porcelanas, espelhos, relógios, mobiliário, e ainda diversos acessórios para vestuário. Passaram, de igual modo, a comprar fruta, legumes, carne, leite e muitos outros alimentos,

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8 que agora já não produziam. Com a vinda para as cidades à procura de trabalho e de melhores condições de vida, muita gente que vivia da agricultura saiu das terras que antes cultivava, perdeu os hábitos da vida rural e adaptou-se, como pode, à vida urbana. Foi, então, visível o aumento do número de lojas, o uso de montras, o aparecimento de grandes armazéns a partir de 1880, com a consequente utilização de publicidade em cartazes e nos jornais.

No período entre 1880 e 1900 o progresso social foi notório. Como afirmou Richard Shannon(1976: 202): “Evidence of increasing well-being was indeed impressive.” O nível de vida das classes trabalhadoras melhorou, muito devido aos aumentos de salários e à descida dos preços dos bens de consumo. Ainda segundo Shannon (1976: 202): “Probably the gain in real wages for the average worker in the period 1860-1900 was about 60%.” As condições higiénicas melhoraram e as doenças contagiosas deixaram de ser uma ameaça social constante. Nesse período muitos lares passaram a ter eletricidade, inventou-se o cinematógrafo e massificou-se a cultura, até então privilégio de gente abastada e confinada a salões privados. A taxa de mortalidade baixou, bem como a de natalidade, sobretudo no seio das classes altas, o que alarmou alguns setores da sociedade, que encararam esse facto como um sinal de decadência nacional, sugerindo que os filhos das classes baixas, menos capazes, acabariam por ultrapassar os das classes superiores, considerados mais competentes para gerir o país.

No entanto, e paradoxalmente, enquanto a sociedade progredia a economia desacelerava. A partir de 1870, com o desenvolvimento da Alemanha e dos Estados Unidos, que possuíam reservas abundantes e mais baratas de energia e matérias-primas, setores como a agricultura, os têxteis, o ferro, o aço e alguns bens de consumo entraram numa fase difícil. O caminho-de-ferro chegava agora aos enormes silos da Rússia e a Europa era inundada pelos cereais oriundos dos Estados Unidos. Para Hobsbawm (1999: 164-166) a tendência continuada de redução de preços internacionais, por força das novas condições de concorrência, exigiam que a economia britânica se reestruturasse. Para entrarem no jogo do mercado, os industriais britânicos teriam de aumentar a produtividade e baixar os preços, o que implicava a existência de grandes unidades fabris, ou aceder ao crédito fácil para financiarem o desenvolvimento e a comercialização dos bens de consumo. Porém, o carácter obsoleto da indústria britânica e alguma inércia do setor financeiro conduziram à perda de competitividade da economia, face a atitudes mais arrojadas por parte dos Estados Unidos e da Alemanha. Além disso, as políticas liberais da época impediam a intervenção estatal e o protecionismo económico à agricultura e à indústria. Consequentemente, a economia britânica sofreu, no último quartel do séc. XIX, uma recessão que ficou registada na História como

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9

Great Depression, caracterizada por uma queda acentuada nos preços dos produtos agrícolas,

devido às importações de outros países e ainda a períodos de más colheitas, que conduziram ao abandono das quintas por parte de muitos agricultores, que não retiravam qualquer proveito da sua atividade. Da mesma forma, a indústria e o comércio sofreram quedas acentuadas nas taxas de crescimento, nos lucros e no investimento estrangeiro. Hobsbawm (1988: 70) sintetizou desta forma os mais de vinte anos de recessão económica mundial: “A depressão da década de 1870 inaugurou uma nova era histórica, política e económica. (…) Essa depressão minou ou destruiu as bases do liberalismo de meados do século XIX, que parecera tão firmemente implantado.”

Para além dos motivos já referidos, pode também apontar-se o avanço tecnológico como causa da queda dos preços de produção e distribuição mas, na época, as classes mais altas recusavam qualquer ligação ao comércio e à tecnologia; no ensino destacava-se a ausência de formação científica, se comparado com o de países como a França, Áustria, Prússia, Bélgica ou Suíça, que ministravam cursos de gestão aos industriais, ou da Alemanha, com o dobro dos estudantes universitários. (Wood, 1982: 279)

Apesar da industrialização e consequente modernização do país, a aristocracia rural continuou a dominar os centros de decisão e o governo. Os interesses financeiros dos que viviam de rendimentos, mais do que os dos novos empresários industriais, guiavam a política nacional, muitas vezes às custas da indústria. Mesmo os magnatas industriais aspiravam ainda a um estilo de vida rural. As segundas e terceiras gerações das dinastias industriais estudavam em colégios privados e buscavam carreiras na lei ou na administração imperial, mais do que nos negócios. Atitudes pouco entusiásticas em relação ao espírito empreendedor industrial foram os calcanhares de Aquiles do sucesso britânico. Hobsbawn (1999: 166) apontou algumas das falhas do sistema industrial britânico: incapacidade de modernização por parte dos empresários, que não adotaram métodos mais avançados, persistindo em padrões obsoletos e evitando investir os lucros em novas tecnologias. A desaceleração do crescimento da economia no final da era vitoriana e a crescente competição dos concorrentes estrangeiros, sobretudo a Alemanha e os Estados Unidos, podem ser considerados como o preço inevitável a pagar pelo uso pioneiro de novas tecnologias, nunca antes experimentadas. As indústrias rivais dos outros países aprenderam com o exemplo e os erros britânicos e receberam, provavelmente, maior ajuda financeira e proteção por parte dos seus estados. A política de seguir a liderança britânica tornou a sua industrialização mais vigorosa e rápida, para conseguirem acompanhar o passo, já avançado, do rival. Segundo Porter (1984: 119-20):

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10 falling back in the world in the 1890s, as she had in the 1880s. (...)Year by

year the gap narrowed between Britain and her industrial competitors. In foreign trade Britain was having to struggle to maintain even a moderate rate of growth, while her rivals bounded ahead on theirs.

Na última década do séc. XIX a Grã-Bretanha era ainda uma das potências mais industrializadas, porém, suplantada já pelos seus dois maiores rivais na produção de aço. Para além disso, era um país com poucos recursos naturais para além do carvão, a sua indústria têxtil dependia muito da importação de algodão e, dado o declínio agrícola, já referido anteriormente, importava, nessa altura, cerca de metade dos bens alimentares e outros, necessários a uma população que aumentava dia a dia. A solução era recorrer aos mercados do Império, mais desprotegidos e de fácil exploração. A Grã- Bretanha tornara-se, não uma economia competitiva, mas antes parasitária, nas palavras de Hobsbawm (1999: 170): “living off the remains of world monopoly, the underdeveloped world, her past accumulations of wealth and the advance of her rivals.” Dotada de bancos com muito capital acumulado, que podia emprestar aos outros países, de boas seguradoras e de serviços financeiros de excelência, para além de uma boa frota mercante, a economia britânica deslocou-se, nos finais do século XIX, da indústria para o comércio e finanças, tornando-se então a City de Londres o centro financeiro mundial. Banca, seguros e bolsa geraram fortunas bem maiores do que as conseguidas na indústria, sendo, na época, os negócios da City conduzidos sob os princípios do que Cain e Hopkins chamam de gentlemanly capitalism, cujos ideais, mais próximos dos da aristocracia rural do que dos dos novos-ricos da indústria, estavam assentes numa rede de contactos pessoais, na confiança mútua e em códigos de honra mais usuais nas zonas rurais ou nos clubes privados da capital.

As atividades financeiras da City originaram elevados rendimentos, não só às empresas já estabelecidas, mas ainda a pequenos negócios familiares, e as suas elites, constituídas maioritariamente por famílias de origem judaica, para além de prestígio, viram abrir-se-lhes as portas da política e do poder mais facilmente do que aos empresários industriais. Da mesma forma banqueiros, financeiros e gente ligada ao comércio ficaram mais reguardados na luta de classes, sendo os industriais forçados a sofrer a hostilidade dos conflitos laborais que foram surgindo ao longo do século XIX, o que, de certa forma, minou a autoridade que a riqueza adquirida, de contrário, lhes daria. Viam-se invariavelmente encurralados entre a cultura cavalheiresca que inundou o mundo capitalista, que simultaneamente desprezava a tecnologia industrial geradora da sua riqueza, e o sindicalismo

(20)

11 radical, que exaltava a produção mas condenava o lucro.

Cain e Hopkins afirmaram (2002: 47): “The Imperial mission was the export version of the gentlemanly order. In some respects, indeed, the gentlemanly code appeared in bolder format abroad in order to counter the lure of an alien environment”. O império foi também o solo fértil para a cultura cavalheiresca gerar o bem, o progresso e os ideais de honra e de cumprimento do dever.

Os financeiros da City, ao invés de apoiarem a indústria, intensificaram a exportação dos capitais excedentários, motivados pelos lucros obtidos, levando a uma política expansionista muito agressiva por parte da Grã-Bretanha que inaugurou uma nova fase da sua política colonial, conhecida por New Imperialism, caracterizada pela divisão do mundo em zonas preferenciais de atuação dos capitais nacionais. Sentindo-se ameaçada pelo crescimento económico e pela crescente concorrência de outras potências europeias, sobretudo França e Alemanha, para além dos Estados Unidos, que a destronaram do lugar de única potência industrial, levando ainda a uma redução drástica do seu comércio mundial, a Grã – Bretanha viu-se forçada a expandir o império formal principalmente em África, Oriente e zona do Pacífico na defesa dos seus interesses económicos (James 1998: 201). Os políticos liberais, nomeadamente Gladstone, habitualmente contrários a mais anexações, foram forçados a reconhecer a importância para o país de esferas de influência ciosamente vigiadas, tal como faziam as outras potências coloniais. Um dos maiores defensores do New Imperialism foi Joseph Chamberlain, empresário de sucesso, mayor de Birmingham e político hábil, cujas funções de Estado incluíram a de ministro de um governo liberal e posteriormente a de Secretário Colonial de um governo conservador. Chamberlain acreditava profundamente na unidade do Império, na figura da Rainha Vitória como símbolo máximo dessa unidade e também na missão civilizadora da raça anglo-saxónica, cujos valores como patriotismo, fair

play, autodisciplina, altruísmo, coragem e ousadia (James 1998: 205-6) que Chamberlain

considerava vitais para o desenvolvimento e felicidade dos povos mais atrasados, eram transmitidos nas escolas às futuras gerações de administradores do Império. Num discurso proferido em Londres em 1987, ano do jubileu da Rainha, Chamberlain afirmou (Boehmer 1998: 213):

We feel now that our rule over these territories can only be justified if we can show that it adds to the happiness and prosperity of the people, and I maintain that our rule does, and has, brought security and peace to countries that never knew these blessings before. In carrying out this work of

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12 civilization we are fulfilling what I believe to be our national mission, and

we are finding scope for the exercise of the faculties and qualities which have made us a great governing race.

A primeira colónia britânica no continente africano foi Cape Colony, na Áfirca do Sul, adquirida em 1815 após o Congresso de Viena, mas a partilha de África (Scramble for

Africa), que caracterizou em grande parte o New Imperialism, começou para os britânicos em

1882 com a ocupação do Egipto, país anteriormente ocupado pela França durante as campanhas napoleónicas e que estava, desde então, sob influência francesa em vários domínios. M. E. Chamberlain (1999: 29) escreveu:

The Egyptian educational system, which was more advanced than that of many parts of Europe, was modelled on the French system and Egyptian law was codified according to Napoleonic practice. Some Egyptians became interested in French philosophy and political thought. (…) At first those Egyptians who wanted to change their country were by no means hostile to European influence. On the contrary they saw Europeans as allies against obscurantist elements in their own society.

Foi um francês, Ferdinand de Lesseps, a levar a cabo a construção do Canal do Suez, inaugurado em 1869, que passou a ligar o Mar Vermelho ao Mediterrâneo, reduzindo para metade o tempo de viagem para a Índia. Apesar da oposição inicial, por temerem que aquela nova passagem fosse objeto da cobiça e de controlo por parte de outros países, o Canal acabou por ser, para os britânicos, de vital importância comercial e militar, dada a sua presença na Índia. Em 1875, o então primeiro-ministro Disraeli, comprou cerca de metade das ações da Companhia do Canal do Suez, para conseguir um certo controlo sobre aquela importante via de comunicação, mas a situação política e económica do Egito deteriorou-se muito no início dos anos 80 e os interesses britânicos no país foram postos em risco. Em 1882 oitenta por cento do tráfego marítimo no Canal era britânico (Chamberlain 1999: 31) e, temendo que o Canal passasse para controlo estrangeiro, o primeiro-ministro Gladstone enviou ao Egito uma expedição militar que em três dias derrotou o exército local, passando o Canal do Suez a ficar sob controlo britânico e assumindo a Grã – Bretanha, quase em seguida, a administração das finanças e do governo egípcios (Hill 1977: 137). Esta ocupação foi considerada desastrosa para o governo britânico, muito criticada na Grã-Bretanha e causadora de atritos com a França, com a qual houvera, até então, um bom entendimento. Ainda segundo Chamberlain

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13 (1999: 39):

It has been contended by some historians, and strenuously denied by others, that the Anglo-French estrangement over Egypt had repercussions all over Africa, that indeed was the trigger that began an unexpected and unintended chain reaction which resulted in the partition of tropical Africa among the European great powers.

A partir de 1880 os britânicos passaram a um controlo mais formal de áreas do sul e oeste do continente africano, sobretudo para salvaguardar as rotas comerciais do Oceano Índico e defender interesses nacionais, postos em causa pela competição de outras poderes europeus, como foi referido anteriormente. A posição dominante da Grã-Bretanha como potência industrial e a prosperidade do país foram tão seriamente ameaçadas, que nem o governo nem a população se sentiram desconfortáveis perante novas anexações, que mais não foram que uma reação de pânico a uma situação de risco económico para o país. (Chamberlain 1999: 57)

Entre 1878 e 1914 as potências coloniais europeias, Grã-Bretanha, Portugal, França, Alemanha, Itália e Bélgica, repartiam entre si cerca de um sexto do mundo, tendo o Império Britânico ganho mais 12,173.000 de quilómetros quadrados de extensão nesse processo. A explicação mais convencional era a económica: o comércio seguia a bandeira. Porém, com o decorrer do tempo, verificou-se que esse não era um motivo válido para explicar o imperialismo expansionista.

Lawrence James (1998: 215) escreveu:

Britain entered the twentieth century as the world’s greatest imperial power at least in terms of territory and population. The fact was widely trumpeted by politicians and journalists, along with platitudes about dispensing civilization to those who lacked it. There was also a steady stream of reassuring propaganda which emphasized national greatness and the innate strengths of the Anglo-Saxon character.

O séc. XIX terminou com a morte da Rainha Vitória, após um longo e impressionante reinado, passando o trono ao filho, Eduardo VII, que reinou somente durante nove anos, não tendo tido o tempo necessário para cunhar uma época, como a mãe conseguira. O historiador G.M. Trevelyan (1975: 408) resumiu desta forma os sessenta e quatro anos de época

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14 vitoriana:

(…) in those sixty years past, millions had come out of the house of bondage and misery into which the unregulated advent of the Industrial Revolution had plunged its victims. In the same years our people had spread far over the face of the globe, carrying with them, on the whole, justice, civilization, and prosperity where they went. Great men of genius in literature, science, and thought had adorned an age when civilization seemed for a while to be strong both in quantity and in quality, and had helped to make common during her reign certain standards of intellectual seriousness and freedom.

Apesar da imensidão de acontecimentos que tiveram lugar durante o séc. XIX, verificou-se, ainda assim, uma continuidade ao nível da estrutura das instituições e do governo. Rubinstein (1998: 334) afirmou: “The monarchy, the two Houses of Parliament, the Cabinet government, the Established Church, the titled aristocracy, the common law, and many fundamental British institutions appeared not to have changed in any formal sense during the 19th century.” No entanto, as mudanças sociais e políticas foram evidentes, sobretudo no que diz respeito aos direitos das classes trabalhadoras. O movimento sindical impôs-se e, a partir de 1907 greves gigantescas tiveram lugar em todo o país, devido ao declínio económico já anteriormente analisado. O extremismo e a violência tomaram conta do país e atingiram todas as classes. Apesar disso, durante o breve reinado de Eduardo VII a sociedade refinou-se, muito ao gosto do rei que, ao contrário da mãe, era mundano e apreciava viajar, tendo já ao seu dispor os recursos tecnológicos necessários. Quando morreu, em 1910, era um rei popular, em grande parte devido ao seu apoio às artes, mas o país enfrentava já alguma decadência. Jeremy Paxman resume assim a situação do país no reinado de Eduardo VII (2012: 217):

The Boer War had shown how the mightiest power on earth could be brought low by a bunch of farmers, and recruitment for the army had demonstrated the appalling physical condition of many of the slum-dwellers who were supposed to defend the flag. The nation could no longer feed itself, and the Germans were expanding their naval fleet. The upper classes were infiltrated by arrivistes who cared more for money than for duty: Trades unions were on the rise and industrial productivity was dropping.

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15 O Império agitava-se já em várias frentes e muito rapidamente se viu envolvido em nova guerra, a primeira e uma das maiores do séc. XX, que marcou definitivamente a entrada no novo século. De entre os vários fatores que originaram o conflito, contam-se também os económicos. Como Wood (1982: 415) afirmou:

Russia’s desire to prevent the development of a German economic empire in the Balkans, the growing significance of the Middle East, the clash between British and German business interests – all these were factors that had a considerable bearing on the political scene (…).

2. 2. Política e Império

Se, como foi referiu anteriormente, a Revolução Industrial contribuiu de forma decisiva para o progresso económico e social da Grã-Bretanha e para o reforço da sua posição no mundo, a questão imperial esteve permanentemente no centro do debate político, quer no Parlamento e na imprensa, quer em tertúlias liberais, em que grupos de intelectuais e políticos analisavam à exaustão a legitimidade e o futuro do Império, tanto em termos políticos como económicos.

O pensamento liberal invadira a Grã-Bretanha nos anos 30 do séc. XIX e dominara toda a época vitoriana, englobando ideias, valores e conceitos que se disseminaram por uma realidade política e social complexa e em constante evolução. A independência das colónias americanas e a Revolução Francesa no final do séc. XVIII, e o processo de reformas sociais e económicas na Grã- Bretanha, iniciado com a Lei de Reforma de 1832, a revogação das leis dos cereais ou a adoção do comércio livre na década de 40 contribuíram para moldar o pensamento político do século, sofrendo adaptações, reinvenções e incorporando outras doutrinas, incluindo as teorias evolucionistas e económicas mais revolucionárias.

Para os liberais a sociedade era constituída por indivíduos com identidades e interesses autónomos, que procuravam formar grupos ou organizações com o fim de progredirem nos seus propósitos políticos e sociais. A base do liberalismo era o impulso reformista, dirigido sobretudo contra a concentração e abuso do poder político. Michael Freeden escreveu a este propósito (1986: 5):

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16 The concern of liberals with problems of social reform was of course part of

a general movement of a progressive thought that had existed as an undercurrent in the first half of the nineteenth century and gradually swelled to become a dominant factor in social thought towards the end of the Victorian era.

No centro das suas preocupações estavam problemas sociais como a pobreza, o desemprego ou a doença, que constituíram verdadeiros desafios para os políticos da época e para os quais os intelectuais liberais procuraram dar respostas, passando a encarar as questões sociais do ponto de vista da filosofia, da religião, da ciência e do pensamento político e social (Freeden1986: 6).

Cobden, Mill, Maine, Spencer, Hobson e Hobhouse foram pensadores e ativistas liberais notáveis que influenciaram, de forma marcante, a cena intelectual e política do séc. XIX. O Império era de uma forma geral apoiado, mas a diversidade de ideias expressas e argumentos utilizados conferia ao debate imperial uma multiplicidade de discursos à medida da sua dimensão. No final do século, no auge da expansão colonial, a discussão centrava-se na natureza e objetivos do Império, abandonando as justificações éticas que haviam dominado o discurso imperial do início do século, substituídas agora por um debate sociológico e económico. Peter Cain, num ensaio incluído na coletânea Victorian Visions of Global Order (Bell: 215) afirma:

Within the multiform and sometimes contradictory web of ideas labelled ‘liberalism’ in Victorian England there was an important strand of thinking best described as popular radicalism. It emerged in the eighteenth century, finding its first full expression in the work of Paine, and ended in the early twentieth century, at which point it was subsumed in what passed in Britain for Marxism.

Em 1870 este radicalismo estava, em grande parte, contido num Partido Liberal emergente, uma força política que reunia comerciantes, pequenos industriais e sindicalistas radicais e que teve como uma das principais figuras W. E. Gladstone, eleito primeiro-ministro por quatro vezes. No lado conservador esteve o igualmente distinto Benjamin Disraeli, sendo ambos os protagonistas centrais da cena política dos finais do século XIX, e tendo colocado o Império no topo do debate político e social da época.

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17 quinto do globo e governava, a partir de Londres, cerca de 400 milhões de súbditos de etnias e credos diferentes, para além da Índia, com mais de trezentos milhões de pessoas. O controlo exercido sobre esta enorme dispersão de territórios e povos era bastante flexível: uma certa prepotência nuns locais e a colaboração voluntária dos governantes locais com a coroa britânica noutros. (Johnson, 2003: 2)

O termo ‘império’ teve origem na palavra latina “imperium”, conotada com os conceitos de comando e poder e significava a autoridade exercida por um monarca habitualmente denominado imperador mas, para os britânicos dos finais do séc. XIX, designava os territórios possuídos por um estado para além das suas fronteiras nacionais, cujo governante poderia não ser chamado de “imperador” (Porter 1984: 1). É também este autor que afirma (1994: 2):

Fundamentally the empire – true to its derivation – was a manifestation of British power and influence, and whatever strange individual shapes they took the colonies all shared this common characteristic, that they owed their origins in some way to British economic, political and cultural predominance in the world.

Para além dos territórios oficiais pertencentes e administrados pela coroa britânica, havia o chamado “império informal”, fruto da expansão económica e do dinamismo vitorianos. O sistema industrial precisava de cada vez mais matérias-primas, logo de locais onde as adquirir, e ao transformá-las em bens transacionáveis, exigia cada vez mais mercados para os vender. É ainda Porter quem afirma (1984: 4): “The way Britain prospered was by manufacturing articles for sale abroad, which her customers paid for in raw materials and food. (…) The ties of dependency therefore between Britain and her trading partners were mutual. (…) ”

Essa forma de controlo informal era porventura mais favorável aos britânicos, já que podiam exercer influência económica, sem custos políticos. Em 1953 John Gallagher e Ronald Robinson escreveram o artigo “The Imperialism of Free Trade”, no qual chamaram a atenção e, em simultâneo, criticaram a posição britânica nesta questão. Para eles a expansão foi uma espécie de imperialismo barato, que se deu através do comércio. Na página 13

1escreveram:

British policy followed the principle of extending control informally if

1

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18 possible and formally if necessary. To label one method ‘anti-imperialist’

and the other ‘imperialist, is to ignore the fact that whatever the method British interests were steadily safeguarded and extended.

A expansão do Império deu-se sobretudo devido a fatores económicos: a necessidade de defender no estrangeiro os interesses económicos e financeiros britânicos, abrir os mercados à exportação dos bens produzidos no país, bem como ainda adquirir, nessas paragens, matéria-prima mais acessível. Sobre estas questões escreveu Hill (1977: 138):

What was the general economic importance of these new lands to Britain? Most obviously they offered new markets for British manufacturers – markets not only for consumers’ goods like cotton clothes, hardware and metal goods, pottery and the like, but also for the heavy equipment (…) rails, steamships, mining machinery and large –scale tools of various kinds. New supplies of well-known materials, (…)

Os novos territórios ofereciam ainda a oportunidade de novos investimentos, outro fator relevante para a economia britânica, muito embora a maior parte do capital investido em negócios pelos empresários britânicos fosse para a Índia e a Austrália e não para as colónias africanas. (Hill 1977: 139)

Outra questão crucial foi a emergência de novas potências, que rivalizavam com a supremacia económica e imperial britânicas, casos da Alemanha, dos Estados Unidos e também da França. Ao ameaçarem os interesses nacionais, aqueles países desenvolveram na Grã- Bretanha um sentimento de insegurança, levando-a à ânsia pela defesa do Império. De acordo com Porter (1984: 74): “In the last quarter of the nineteenth century British interests in the world seemed to be threatened more and more, and people in Britain were becoming more aware of this and more vigilant.”

A partilha da África, levada a cabo por diversos Estados europeus, esteve precisamente relacionada com a necessidade de equilibrar o seu poder no mundo e, no caso britânico, também a de impor ordem em zonas onde uma emergente instabilidade social punha em risco empresas britânicas lucrativas.

O Império sobreviveu e prosperou durante três séculos graças à proteção da armada mais poderosa do mundo, ao mérito de uma vasta marinha mercante, que transportava da Grã- Bretanha para todo o globo, e vice-versa, os bens transacionáveis, e a um sistema financeiro de sucesso, sediado na City de Londres. A sua administração esteve entregue a milhares de

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19 funcionários civis, muitas vezes recrutados nas próprias colónias, e a homens de negócios dinâmicos que, através de uma boa rede de transportes, com relevo para o caminho-de-ferro, providenciavam a distribuição dos produtos manufacturados, com apoio dos bancos, companhias de seguros e de navegação. O Império comunicava em inglês através do telégrafo, correio e telefone. O governo controlava e o exército vigiava, com o apoio de uma boa parte do povo britânico. (Johnson 2003: 5)

Como foi referido anteriormente, os dois políticos mais proeminentes da última fase da época vitoriana foram Gladstone e Disraeli, ambos notáveis primeiros-ministros, de áreas políticas diferentes e com visões completamente distintas da questão imperial. O primeiro, com uma carreira longa ao serviço do Estado, iniciou funções governativas em 1830 num governo conservador para, trinta anos mais tarde, se tornar líder do Partido Liberal, posição que manteve durante um quarto de século e que lhe permitiu ser primeiro-ministro quatro vezes, tendo angariado muito respeito pela forma moralista como abordou a política e pela profunda fé cristã que sempre orientou a sua vida (Goodlad 2000: 14). Antes de aderir ao Partido Liberal, Gladstone comungava das posições pacifistas e internacionalistas de Cobden. Considerava que os gastos em armamento eram um sorvedouro de impostos e um estímulo para uma política externa agressiva (Goodlad 2000: 20). Imperialista relutante, acreditava que a grandiosidade britânica residia no comércio, na indústria e nas instituições parlamentares e não no Império, que aceitava apenas em termos económicos. Demonstrava pouco entusiasmo pela expansão colonial e acreditava na autodeterminação de todos os povos. Num discurso proferido em Edimburgo em 1879, afirmou (Goodlad 2000: 25):

Whatever we may say amidst the clash of arms and amidst the din of preparation for warfare in time of peace – amidst all this yet there is going on a profound mysterious movement, that whether we will or not, is bringing the nations of the civilized world, as well as the uncivillised, morally as well as physically nearer to one another, and making them more and more responsible before God for one another’s welfare.

No entanto, foi obrigado a enviar tropas para zonas do Império fundamentais para os interesses britânicos, caso do Canal do Suez. O imperialismo protecionista levado a cabo pelo liberal Gladstone contrastava com as suas políticas governamentais de redução de despesas (retrenchment).

Uma das questões mais polémicas entre os liberais, que chegou mesmo a dividir o partido em várias fações, foi a do governo autónomo irlandês, que Gladstone sempre defendeu e tudo

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20 fez para conseguir. A Irlanda, única colónia europeia, há séculos oprimida e humilhada pelos britânicos, clamava por mudanças que lhe devolvessem a dignidade perdida. Apesar de algumas reformas levadas a cabo pelos governos liberais, os irlandeses continuavam insatisfeitos e em constante rebelião. Nasceram movimentos nacionalistas e um dos líderes, Charles Stewart Parnell, exigiu um governo autónomo, que Gladstone admitiu conceder em 1886. O receio de contágio a outras colónias, sobretudo à Índia, levou à cisão do Partido Liberal e à formação do Partido Unionista, liderado por Chamberlain, que se uniu aos conservadores, vencendo as eleições seguintes. Em 1895 o Partido Unionista foi absorvido pelo Partido Conservador.

Anthony Wood escreveu sobre Gladstone (1982: 343):

He believed in Free Trade and in democracy. Loathing war, he believed in the Concert of Europe. It is easy to argue that Free Trade eventually involved its own downfall, that democracy unleashed an unreasoning Imperialist spirit, and to ignore the arms race after 1871 was unrealistic. (…) The foundation of modern government was laid during his first great administration.

Disraeli, pelo contrário, via o Império como um pilar da democracia, capaz de unir as classes sociais sob a bandeira do orgulho imperial. Lawrence James afirmou “The Empire was an asset to be cherished” (1998: 196). Para Disraeli, os britânicos tinham o dever de exercer a sua influência civilizadora sobre os povos nativos, bem mais importante do que a mera defesa de interesses económicos. Colocou a monarquia e o Império acima de tudo, apelando continuamente ao patriotismo do povo britânico contra os ataques dos liberais que, quando no poder, não protegiam convenientemente os interesses nacionais no estrangeiro. Num discurso famoso proferido no Crystal Palace em 1872, sendo então líder da oposição ao primeiro governo de Gladstone, Disraeli explicou a posição do seu partido sobre o Império:

Gentlemen, there is another and second great object of the Tory party. If the first is to maintain the institutions of the country, the second is, in my opinion, to uphold the empire of England. If you look to the history of this country since the advent of Liberalism - forty years ago - you will find that there has been no effort so continuous, so subtle, supported by so much energy, and carried on with so much ability and acumen, as the attempts of

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21 Liberalism to effect the disintegration of the empire of England. (…)

Well, what has been the result of this attempt during the reign of Liberalism for the disintegration of empire? It has entirely failed. But how has it failed? Through the sympathy of the colonies with the mother country. (…) Therefore, gentlemen, with respect to the second great object of the Tory party also - the maintenance of the Empire - public opinion appears to be in favour of our principles.

Disraeli associou e identificou de forma muito clara o partido conservador com o patriotismo, a monarquia e o império. Lawrence James cita um outro excerto daquele discurso (1998: 196):

When I say ‘Conservative’, I use the word in its purest and loftiest sense. I mean that the people of England, and especially the working classes of England, are proud of belonging to a great country, and wish to maintain its greatness – that they are proud of belonging to an Imperial country.

O Partido Conservador venceu as eleições de 1874 e Disraeli tornou-se primeiro-ministro, tendo então a possibilidade de passar à prática a sua tenaz defesa do Império. Nos seis anos que se seguiram, tudo fez para preservar a integridade do Império Otomano e a segurança da Índia e ainda reforçar com vigor o império informal. Comprou ações da Companhia do Canal do Suez para retirar aos franceses parte do controlo daquela via, salvaguardando dessa forma o comércio britânico para o Oriente e em 1876 declarou a Rainha Vitória Imperatriz da Índia, outorgando-lhe um estatuto igual ao dos monarcas da Rússia, Alemanha e Áustria-Hungria, em termos de poder e prestígio. No entanto, a devoção pelo Império levou-o a cometer erros que lhe motivaram críticas acesas, como a defesa da Turquia no massacre dos cristãos búlgaros, situação que os Liberais e a opinião pública não aceitaram. Envolveu ainda o país em hostilidades com os Zulus na África do Sul para proteger o Transvaal e no Afeganistão para defender a fronteira noroeste da Índia contra as investidas da Rússia. (Goodlad, 2000: 6). Nenhuma destas situações favoreceu Disraeli e, pelo contrário, deu armas aos liberais para vencerem as eleições de 1880 e colocarem Gladstone, mais uma vez, no poder. Goodlad escreveu também acerca de Disraeli (2000: 11)

It is not necessary to depict Disraeli as the prophet of a ‘new imperialism’ in order to give him credit for a serious commitment to the British Empire. His

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22 view of his country’s world role was an essentially traditionalist one. He

came to power with a determination to assert what he regarded as Britain’s ‘just position’ in Europe and in the wider world. This did not necessarily entail the annexation of further territory, but it did require a determined defence of existing positions. In that, at least, he remained consistent throughout his career.

Os defensores de Disraeli justificaram a sua política imperialista invocando teorias paternalistas e racistas, baseadas em interpretações erróneas da teoria de evolução de Darwin, que viam o Imperialismo como uma manifestação do que Kipling chamou de “o fardo do homem branco”, que fundamentava a existência do Império, não por uma questão estratégica ou económica, mas para civilizar e cristianizar os povos nativos, inferiores e mais atrasados, logo incapazes de se autogovernarem. Esta doutrina foi amplamente aceite e serviu para legitimar a anexação de zonas da África Central. Homens como Disraeli e Chamberlain eram considerados imperialistas pela constante defesa e apologia que fizeram do governo imperial nas várias funções oficiais que desempenharam ao longo da vida.

O termo “imperialismo” surgiu na Grã-Bretanha associado, segundo os britânicos, ao governo despótico e indigno do Imperador Napoleão III em França, em nada semelhante ao governo imperial britânico que, em sua opinião, colonizava, mas não conquistava. Não descrevia uma realidade objetiva, como “império”, mas antes a relação entre um poder controlador e os que se encontravam sob o seu domínio. (Lichtheim 1971: 12) Foram os romanos que cunharam o termo imperium para designar os conceitos de comando e poder. Em plena República, imperium alargou o seu significado e passou também a ser conotado com grandeza, designando, então, o governo sobre territórios extensos e longínquos, bem distantes da pátria dos governantes. (Howe 2002: 13). O império romano, baseado em conquistas militares, foi o maior império da história no que respeita ao controlo exercido sobre os seus territórios. Para além da enorme força militar utilizada nas conquistas e na vigilância do império, os romanos estabeleceram estruturas políticas, sociais e económicas uniformes, construíram cidades, desenvolveram as artes e a educação, criaram milhares de empregos e legaram à posteridade monumentos, pontes, canais e recintos desportivos admiráveis. Acreditavam que haviam levado a paz aos territórios conquistados e que difundiam uma forma elevada de civilização nesses domínios, considerando bárbaros todos os povos que não aceitavam o poder romano (McDonough 1994: 4). O império britânico, embora estabelecido através de conquistas militares, nunca se impôs aos povos colonizados de forma tão coerciva

(32)

23 como o romano, dependendo sobretudo da sua força naval para defender o comércio, principal atividade económica e uma das justificações para a manutenção das colónias.

No início da época vitoriana o termo empire tinha duas interpretações: designava The

British Isles ou The United Kingdom e a influência natural que um país tão importante tinha

sobre o resto do mundo, mas também o domínio imperial sobre as dependências britânicas (Koebner e Schmidt 1964: 37-8). Na segunda metade do séc. XIX o termo passou a designar o governo imperial britânico, sobretudo na Índia, bem como toda a influência exercida pelos britânicos sobre os povos colonizados. Com Disraeli ser “imperialista” era sentir orgulho no império e na grandiosidade da nação; para os liberais “imperialismo” era sinónimo de poder autocrático e militar, tendo assim sido utilizado como slogan contra Disraeli, e o termo “jingoísmo” usado em sua substituição na propaganda liberal.

O termo surgiu por volta de 1876 para designar o fervor imperialista que dominava o país, patente nas canções populares de music-hall, na imprensa e nas manifestações de apoio ao Império. Howe afirmou (2002: 23):

The stress on attitudes is important here: for most late-Victorian users of the word, imperialism did not mean the facts of dominance, conquest, or overseas expansion, but a policy, a philosophy, or just an emotional attitude of enthusiasm for such things. For some British critics, the label was interchangeable with ‘jingoism’- a word adapted from a belligerent music-hall song and used to mean thoughtlessly aggressive patriotism.

Considerado a fonte do patriotismo britânico, o music-hall foi identificado por Hobson como a primeira forma de imperialismo popular, acusando-o de manipular a opinião das classes trabalhadoras, infetadas pelo “jingoísmo”, favorecendo as políticas de exploração imperialista (Mackenzie 1986: 17). Em The Psychology of Jingoism escreveu (2009: 3):

Among large sections of the middle and the labouring classes, the music-hall, and the recreative public house into which it shades off by imperceptible degrees, is a more potent educator than the church, the school, the political meeting, or even than the press. Into this ‘lighter self’ of the city populace the artist conveys by song or recitation crude notions upon morals and politics, appealing by coarse humour or exaggerated pathos to the animal lusts of an audience stimulated by alcohol into appreciative hilarity.

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