CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS – CCSA CENTRO DE CIÊNCIAS DA EDUCAÇÃO - CCE
MESTRADO PROFISSIONAL EM GESTÃO DE ORGANIZAÇÕES APRENDENTES - MPGOA
PABLO LINCOLN SHERLOCK DE AQUINO
SEGURANÇA DO PACIENTE NA GESTÃO DE PRONTUÁRIOS
SEGURANÇA DO PACIENTE NA GESTÃO DE PRONTUÁRIOS
Dissertação apresentada ao Mestrado Profissional em Gestão em Organizações Aprendentes da Universidade Federal da Paraíba, como requisito para a obtenção do título de Mestre em Gestão em Organizações Aprendentes. Área de concentração: Gestão Hospitalar.
Orientador: Prof. Dr. Carlo Gabriel Porto Bellini
A657s Aquino, Pablo Lincoln Sherlock de.
Segurança do paciente na gestão de prontuários / Pablo Lincoln Sherlock de Aquino.- João Pessoa, 2015. 110f. : il.
Orientador: Carlo Gabriel Porto Bellini Dissertação (Mestrado) - UFPB/CE/CCSA 1. Gestão organizacional. 2. Gestão hospitalar. 3.
Gestão de prontuários. 4. Segurança do paciente. 5. Soft Systems Methodology (SSM).
SEGURANÇA DO PACIENTE NA GESTÃO DE PRONTUÁRIOS
Dissertação apresentada ao Mestrado Profissional em Gestão em Organizações Aprendentes da Universidade Federal da Paraíba, como requisito parcial para a obtenção do título de Mestre em Gestão em
Organizações Aprendentes. Área de
concentração: Gestão Hospitalar.
Dissertação aprovada em: 27/02/2015
AGRADECIMENTOS
Agradeço, em primeiro lugar, a Deus – força maior e propulsora de toda vida, que me cuida e
me permite aspirações, trabalho e realizações.
A Antônio Edson Guedes de Aquino (in memoriam) e Verônica Maria Rodrigues de Araújo
Aquino, pais queridos e amáveis, agradeço pelo cuidado, amor, confidência, incentivo e
dedicação. Jamais me esquecerei de suas presenças. Mesmo que fisicamente distantes, o calor
de suas almas me acalenta e acalentará para sempre, orientando-me e ensinando-me. Jamais
deixarei de amá-los e respeitá-los!
À Melissa Lira Sherlock de Aquino, minha amada filha, fonte inspiradora de meus planos,
que me impulsiona a ser uma pessoa melhor neste mundo. Trabalho para que você sempre
tenha orgulho do seu “papaio”.
À Sheila Magali Pires Raposo, querida esposa, com quem compartilho meus momentos
diários. Obrigado por sua compreensão, paciência e apoio, meu amor!
Aos meus irmãos, Pettrus Zerbini Sherlock de Aquino e Paola Marry Sherlock de Aquino, por
quem tenho um sentimento quase paterno, peculiar aos primogênitos distantes, e para quem
procuro ser exemplo de filho e amigo. Agradeço a existência de vocês em minha vida.
Ao meu querido e admirável primo e mentor Prof. Dr. Thiago Antônio Avellar de Aquino, de
quem as palavras de incentivo e confiança são tão frequentes e precisas.
Aos meus amigos-irmãos José Alberto Grisi Dantas e André Joffily Abath, de quem tenho
muita admiração e carinho. Obrigado por nunca terem deixado nossa amizade perecer e por
sempre me ampararem nos momentos difíceis de minha vida. IÊ!
À querida prima torta Larissa Raposo Diniz, pelas palavras de confiança e dicas do universo
acadêmico-científico.
À querida Dra. Berenice Ferreira Ramos, diretora geral do HUAC, agradeço pela confiança,
humildade e maturidade, ao permitir a execução de um trabalho crítico em prol do
crescimento de nossa estimada instituição hospitalar.
Aos queridos colegas Rosa Nina, Assis, Izamara e Ivanise, pelo excelente desempenho como
membros da Equipe de Aplicação da SSM neste trabalho. A dedicação e comprometimento de
vocês são exemplo profissional para todos nós.
Ao meu professor orientador Dr. Carlo Bellini, pela oportunidade e confiança a mim
participar de minha banca examinadora. Especial agradecimento ao Prof. Brivaldo, pela
disponibilidade, sabedoria, ética e polidez. Suas palavras foram essenciais nos momentos
mais difíceis.
À Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), que me acolheu como profissional e
propiciou o fértil campo de pesquisa e constante aprendizado.
À Universidade Federal da Paraíba (UFPB), em especial ao Programa de Mestrado
Profissional em Gestão de Organizações Aprendentes (MPGOA), na figura da Profa. Dra.
Edna Brennand, do Prof. Dr. Miguel Isoni e dos queridos Miro e Cijame Júnior, por todo o
apoio e consideração.
“Se você quer construir um navio, não chame
as pessoas para juntar madeira ou atribua-lhes tarefas e trabalho, mas sim os ensine a desejar
a infinita imensidão do oceano.”
A Segurança do Paciente tem sido, nas últimas décadas, uma temática evidenciada no cenário nacional brasileiro e mundial. São casos que se referem à má prescrição, à administração de medicamentos de forma equivocada, ao estresse e à desilusão profissional. Atrelada à preocupação referente à qualidade dos registros médicos, a Segurança do Paciente é um estudo de suma importância para a Redução de Riscos, tanto para os pacientes quanto para os profissionais e serviços de saúde. Este estudo teve a preocupação de compreender melhor a realidade da gestão de prontuários do Hospital Universitário Alcides Carneiro (HUAC), instituição pública federal da cidade de Campina Grande, na Paraíba. Os anseios por melhorias no serviço de registros hospitalares, aliados às ações iniciais da Gerência de Risco e Núcleo de Segurança do Paciente do HUAC, foram os principais indicadores para que este estudo tivesse início. O foco foi compreender a situação tida como problemática pela Divisão de Registro Hospitalar da instituição e, por meio de observações e avaliações sistêmicas, identificar oportunidades de melhoria. A metodologia utilizada foi a Soft Systems Methodology (SSM), reconhecida mundialmente no âmbito da gestão em serviços de saúde pública, principalmente em estudos realizados pelo National Health Service (NHS), o serviço de saúde pública do Reino Unido. A aplicação da SSM ampliou o entendimento sobre a gestão de prontuários no HUAC, bem como apresentou os principais obstáculos para que sejam atendidas as diretrizes nacionais brasileiras de Gestão de Riscos e Segurança do Paciente. Além do aprendizado organizacional, este estudo propiciou a construção do Programa de Melhorias da Gestão de Prontuários (PMGP), que poderá ser aplicado pela administração do HUAC.
Palavras-chave: Segurança do Paciente; Gestão de Prontuários; Soft Systems Methodology
The Patient Safety has been, in the last decades a thematic evidenced in the Brazilian and world scenario. There are cases that refer to bad prescription, errors in medication administration , stress and professional disillusion. Attached to concerns regarding the quality of medical records, Patient Safety becomes a study of high importance for Risk Reduction, both for patients as for professionals and health services. Therefore, this study concerned to better understand the reality of management of records of Alcides Carneiro University Hospital (ACUH) a federal public institution in the city of Campina Grande, Paraíba. The aspirations for improvements in service hospital records, along with initial actions of ACUH Management Risk and Patient Safety Center, were the main indicators for this study to have its start up. The focus of this work was to understand the situation seen as problematic by the institution Hospital Records Division and, through observations and systemic reviews, identify opportunities for improvement. The methodology used was the Soft Systems Methodology (SSM), recognized worldwide in the management of public health services, especially in studies carried out in National Health Service (NHS) in Britain. The application of SSM had allowed greater understanding of how the records management is conducted in ACUH, and the main obstacles for attendance to Brazilian national guidelines Risk Management and Patient Safety. In addition to organizational learning, this study led to the construction of a project named the Medical Records Management Improvement Program (MRMIP), which may be applied by the administration of ACUH.
1 INTRODUÇÃO ... 15
2 A SEGURANÇA DO PACIENTE: PROBLEMÁTICA E OBJETIVOS ... 19
3 FUNDAMENTOS TEÓRICOS ... 22
3.1 Direcionamentos Conceituais ... 22
3.2 A Gestão de Prontuários e a Redução de Riscos ... 23
3.3 Aspectos Éticos e Legais... 27
4 ASPECTOS METODOLÓGICOS E APLICAÇÕES ... 30
4.1 Apresentação do Projeto e da Metodologia aos Stakeholders ... 35
4.1.1 Estágio 1 – Exploração da Situação Problemática ... 36
4.1.2 Estágio 2 – Expressão da Situação Problemática (figuras ricas) ... 40
4.1.3 Estágio 3 – Construção de Definições Sucintas de Sistemas Relevantes - CATOWE ... 41
4.1.4 Estágio 4 – Elaboração de Modelos Conceituais ... 42
4.1.5 Estágio 5 – Comparação Entre Modelo Conceitual e Realidade (Estágios 4 e 2) ... 44
4.1.6 Estágio 6 – Seleção de Mudanças Possíveis e Desejáveis ... 45
4.1.7 Estágio 7 – Sugestão de Ações para Transformação da Situação Problemática. ... 48
4.1.7.1 Projeto 1 – Normas e Rotinas Operacionais de Gestão de Prontuários (NRGPs) .... 49
4.1.7.2 Projeto 2 – Digitalização de Prontuários com Base em Gestão Eletrônica de Documentos (GED) ... 56
4.1.7.3 Projeto 3 – Setor de Admissão e Alta ... 63
4.1.7.4 Projeto 4 – Alocação de Prontuários nos Postos de Enfermagem ... 65
4.1.7.5 Encerramento Geral do Projeto ... 68
5 APROFUNDAMENTOS DAS QUESTÕES DO PMGP ... 70
5.1 Análise da Percepção da Equipe de Aplicação Frente à Situação Real de Possíveis Ações de Melhoria. ... 70
5.2 Atendimento dos Objetivos do PSP pelas Práticas Atuais e Melhorias Possíveis ou já Iniciadas. ... 76
CONSIDERAÇÕES FINAIS ... 90
PROFISSIONAL DO FATURAMENTO ... 102 ANEXO C – EXPLORAÇÃO DA SITUAÇÃO PROBLEMÁTICA PELO CHEFE DO ARQUIVO CENTRAL ... 103 ANEXO D – EXPLORAÇÃO DA SITUAÇÃO PROBLEMÁTICA PELA COORDENADORA ADJUNTA DE ENFERMAGEM ... 104 ANEXO E – EXPLORAÇÃO DA SITUAÇÃO PROBLEMÁTICA PELA COORDENADORA DO SAME ... 106 ANEXO F – ELABORAÇÃO DA FIGURA RICA PELA PROFISSIONAL DO FATURAMENTO ... 107 ANEXO G – ELABORAÇÃO DA FIGURA RICA PELA COORDENADORA DO SAME 108
Figura 1 – Estágios da Soft Systems Methodology... 32 Figura 2 – Exemplo de figura rica em estudo sobre eficiência energética... 33
Figura 3 – Programa de Melhorias na Gestão de Prontuários – PMGP (Estágio
7)... 45
Figura 4 – Programa de Melhorias na Gestão de Prontuários – PMGP (Estágio 7)
– com coluna de predecessoras EDT... 52 Figura 5 – Projeto 1 (Normas e Rotinas de Gestão de Prontuários – NRGPs) –
Geral... 52
Figura 6 –PMGP – Projeto 1 (Normas e Rotinas de Gestão de Prontuários –
NRGPs) - Fase 1... 52
Figura 7 – PMGP – Projeto 1 (Normas e Rotinas de Gestão de Prontuários –
NRGPs) - Fase 2... 53
Figura 8 – PMGP – Projeto 1 (Normas e Rotinas de Gestão de Prontuários –
NRGPs) - Fase 3... 54
Figura 9 – PMGP – Projeto 1 (Normas e Rotinas de Gestão de Prontuários –
NRGPs) - Fase 4... 55
Figura 10 – PMGP – Projeto 1 (Normas e Rotinas de Gestão de Prontuários –
NRGPs) - Fase 5... 55
Figura 11 – PMGP – Projeto 1 (Normas e Rotinas de Gestão de Prontuários –
NRGPs) - Fase 6... 56
Figura 12 – PMGP – Projeto 1 (Normas e Rotinas de Gestão de Prontuários –
NRGPs) - Fase 7... 57
Figura 13 – Projeto 2 (Prontuários em Gestão Eletrônica de Documentos - GED) – Geral... 59
Figura 14 –PMGP – Projeto 2 (Prontuários em Gestão Eletrônica de Documentos - GED) - Fase 1... 61
Figura 15 – PMGP – Projeto 2 (Prontuários em Gestão Eletrônica de Documentos - GED) - Fase 2... 62
Figura 16 – PMGP – Projeto 2 (Prontuários em Gestão Eletrônica de Documentos - GED) - Fase 3... 62
Figura 18 – Processo de Certificação SBIS/CFM... 65
Figura 19 – PMGP – Projeto 2 (Prontuários em Gestão Eletrônica de Documentos - GED) - Fase 5... 65
Figura 20 – Projeto Melhorias na Gestão de Prontuários – PMGP – Etapa 2.5 - Fase 6... 66
Figura 21 – Projeto 3 (Setor de Admissão e Alta) – Geral... 67 Figura 22 – PMGP – Projeto 3 (Setor de Admissão e Alta) - Fase 2... 68 Figura 23 – Projeto 4 (Alocação dos Prontuários nos Postos de Enfermagem) –
Geral... 69
Figura 24 –PMGP – Projeto 4 (Alocação de Prontuários nos Postos de
Enfermagem) - Fase 2 ... 70
Figura 25 – PMGP – Projeto 4 (Alocação de Prontuários nos Postos de
Enfermagem) - Fase 3... 71
Figura 26 – PMGP – Projeto 4 (Alocação de Prontuários nos Postos de
Enfermagem) - Fase 4... 71
Figura 27 – Encerramento Geral do PMGP... 72
LISTAS DE QUADROS
Quadro 1
Quadro 2
Quadro 3
– Categorias das Mudanças a serem implementadas...
– Síntese da Primeira Parte dos Aprofundamentos das Questões do PMGP...
– Síntese da Segunda Parte dos Aprofundamentos das Questões do PMGP...
49
90
AIH Autorização de Internação Hospitalar
ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária
CABP Controle de Acesso Baseado em Papéis
CATOWE Definições Chaves de Sistemas Relevantes
CFM Conselho Federal de Medicina
CONDEL Conselho Deliberativo
DI Document Imaging
DICOM Digital Imaging and Communications in Medicine
EDT Estrutura de Divisão de Trabalho
EMTNs Equipes Multidisciplinares de Terapia Nutricional
GED Gestão Eletrônica de Documentos
HUAC Hospital Universitário Alcides Carneiro
InCor Instituto do Coração
MACA Middleware para Autorização e Controle e Acesso
MPGOA Mestrado Profissional em Gestão de Organizações Aprendentes
NCs Não-Conformidades
NGS1/NGS2 Níveis 1 ou 2 de Garantia de Segurança
NHS National Health Service
NRGPs Normas e Rotinas Operacionais de Gestão de Prontuários
NSPs Núcleos de Segurança do Paciente
OMS Organização Mundial da Saúde
PASCS Picture Archiving and Comunication Systems
PEP Prontuário Eletrônico do Paciente
PMGP Programa de Melhorias na Gestão de Prontuários
PNSP Programa Nacional de Segurança do Paciente
RDC 36 Resolução da Diretoria Colegiada – RDC N°36/2013 SAME Serviço de Arquivo Médico e Estatísticas
SBIS Sociedade Brasileira de Informática em Saúde
SGQ Sistema de Gestão da Qualidade
SSM Soft Systems Methodology
UPPs Úlceras Por Pressão
1 INTRODUÇÃO
A Segurança do Paciente foi uma temática negligenciada durante muito tempo,
conforme atesta a Organização Mundial da Saúde (OMS, 2002a). Segundo essa organização,
estudos da década de 1950 relatam eventos adversos à segurança do paciente em serviços de
saúde, e evidências mais concretas emergiram no início da década de 1990, com a publicação
dos resultados do Estudo de Prática Médica da Universidade Harvard, além de pesquisas na
Austrália, Reino Unido e Estados Unidos da América – em particular, com a publicação de Errar é Humano: construindo um novo sistema de saúde, em 1999, do Instituto de Medicina
dos EUA. A partir de 2002, no entanto, a segurança do paciente passou a ser pauta de
discussões no âmbito da saúde mundial.
Estudos mostram que a gestão de serviços públicos, especialmente em saúde, tem
passado por transformações nas últimas décadas, o que leva a crer que estamos respirando
novos ares na gestão pública brasileira e mundial (FERREIRA et al., 2009; DOMINGOS,
2013; FACCHINI et al., 2013; MIDGLEY, 2006; TROCHIM et al., 2006). A preocupação
com a qualidade nos serviços e a consideração de que a sociedade anseia por melhorias
podem ser identificadas em pesquisas que vêm sendo realizadas nesse sentido. É fato que as
“organizações do setor público em todo o mundo estão sob pressão para aumentar a eficiência
ao entregar serviços melhorados e integrados” (CRAWFORD et al., 2003).
Além dos estudos que mostram a preocupação da gestão no setor público em geral,
há olhares pontuais para os serviços públicos de saúde. Midgley (2006) aponta que os
serviços de saúde requerem abordagens sistêmicas em suas gestões, tanto pelo grau de
complexidade, em que inúmeras variáveis interagem paralelamente, quanto pelo próprio
conceito de saúde pública, que se apoia na percepção de que a saúde e a doença têm causas e
condições que vão além da biologia e do comportamento do ser humano individual. Ao
mencionar metodologias como a Soft Systems Methodology (SSM), que será apresentada
adiante, ele caracteriza a intervenção sistêmica como “ação intencional por um agente para
criar uma mudança em relação à reflexão sobre os limites” (MIDGLEY, 2006). Considera-se, portanto, que os limites citados recaem sobre os valores organizacionais, que, de certa forma,
moldam o desenho dos sistemas e seus processos, causando divisas distintas entre suas
interligações sistêmicas.
Para exemplificar a importância de valores organizacionais, cultura e pensamento
sistêmico na busca da qualidade, pode-se citar a adoção da gestão de prontuários em meio
Todavia, é necessário envolvimento e maturidade dos profissionais em saúde, no intuito de
haver cooperação entre eles para o propósito de implantação e utilização desse tipo de
tecnologia (PEREZ & ZWICKER, 2010).
Essa maturidade está relacionada com a cultura organizacional de cada serviço de
saúde. Segundo Pires & Macêdo (2006), a cultura organizacional em instituições públicas
atingiu, no Brasil, um patamar de burocratizações complexas e centralizadoras, imersas em
estruturas rígidas não orientadas para a eficácia e a efetividade, nem tampouco para atender as
necessidades do cidadão. Esses moldes reverberam nos profissionais que associam sua prática
ao descompromisso, à desmotivação e ao mau desempenho, gerando um ciclo vicioso de
insatisfação e frustração entre eles e os usuários.
Herzberg (1968) já embasava essa visão quando apresentou sua Teoria dos Dois
Fatores. Conforme essa teoria, o comportamento motivacional do profissional pode ser
categorizado entre fatores higiênicos e motivacionais. Nos primeiros, ele elencou diversos
eventos que não promovem a motivação, contudo, sustentam a percepção de aceitabilidade do
profissional em seu trabalho. Ou seja, mantêm a satisfação do profissional estática, a partir do
atendimento de prerrogativas básicas para o desempenho de suas funções, como, por
exemplo, salário, condições físicas e de segurança, relações pessoais e estilo da liderança. Os
segundos fatores, por sua vez, promovem satisfação além daquilo que é básico e/ou
suportável para o exercício das funções, como a possibilidade de aprendizado e crescimento, o
exercício da responsabilidade, o trabalho em si e a possibilidade de realizar algo importante.
Ferreira et al. (2009) destaca que aspectos relacionados à motivação, à cultura
organizacional e ao pensamento sistêmico podem ser relacionados à temática da qualidade de
vida no trabalho, e que seus desdobramentos têm encontrado espaço de discussão e produção
científica na esfera da gestão pública, sobretudo nos anos 90 do século passado, com destaque
para as áreas da administração e da psicologia. Todavia, segundo seu estudo, as práticas de
qualidade de vida no trabalho em órgãos públicos federais são caracterizadas por um
descompasso entre os problemas reais e as atividades realizadas, caracterizadas por um viés
assistencialista. Para ele, “as mudanças que ocorrem no mundo do trabalho produzem
impactos nos aparelhos de Estado, colocando na agenda das inovações novos desafios
relativos ao papel dos órgãos públicos, suas finalidades, suas estruturas e seu próprio
funcionamento” (FERREIRA et al., 2009).
Mais especificamente, a gestão de serviços de saúde, seja pública ou não, tem se
voltado para a administração dos registros clínicos ou prontuários dos pacientes, antes
considerados poderosas ferramentas para a geração de indicadores assistenciais no
monitoramento do desempenho e da garantia da qualidade na assistência, apesar de não existir
padrões pré-estabelecidos para a gestão da informação nos hospitais (RODRIGUES et al.,
2004; SCHOUT; NOVAES, 2007). Segundo Schout e Novaes (2007), a produção de registros
e dados nos serviços de saúde é uma questão ainda ignorada, sendo essa negligência um fator
que dificulta a construção de uma base de dados fidedigna para o cálculo de indicadores
gerenciais e que emperra a evolução da qualidade da gestão como um todo.
Preocupado com a gestão da qualidade, o Ministério da Saúde lançou, em 2004, o
Programa Nacional de Avaliação dos Serviços de Saúde (PNASS), como fruto da
reformulação do Programa Nacional de Avaliação de Serviços Hospitalares (PNASH),
desenvolvido desde 1998 por esse mesmo órgão. O PNASS tem como objetivo principal
avaliar os serviços de saúde do Sistema Único de Saúde (SUS) para a compreensão mais
acurada da realidade desses serviços em suas diferentes dimensões. “A avaliação em saúde
tem como pressuposto a avaliação da eficiência, eficácia e efetividade das estruturas,
processos e resultados relacionados ao risco, acesso e satisfação dos cidadãos frente aos
serviços públicos de saúde, na busca da resolubilidade e qualidade” (BRASIL, 2004).
No tocante à gestão de prontuários, especificamente, o PNASS contempla critérios
de avaliação inseridos em padrões de conformidade. Tais padrões são divididos em três
blocos, a saber: Bloco I (Gestão Organizacional); Bloco II (Apoio Técnico e Logístico); e
Bloco III (Gestão da Atenção a Saúde). O terceiro critério do bloco referente à Gestão
Organizacional traz padrões de conformidade diretamente referentes à gestão de prontuários.
Esses padrões condizem com:
a) A sistemática dos registros dos atendimentos, evoluções e intercorrências nas
fichas ou prontuários dos pacientes;
b) A segurança do armazenamento e alocação dos prontuários, inclusive os de
arquivo morto; o bom estado de conservação, organização e acessibilidade,
observando o fluxo dos prontuários; e a garantia da confiabilidade das
informações ali contidas;
c) A verificação, por meio de documento, das ações da comissão de revisão de
prontuário e/ou óbito, quando existir.
Percebe-se, portanto, que o PNASS não exige um protocolo a ser seguido, porém, o
serviço de saúde deve atender aos padrões e critérios, garantindo, de alguma forma, os
Segundo a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), tudo aquilo que vai
de encontro à conformidade dos requisitos regulamentares esperados, ou que não a garantem,
são chamados de não-conformidades (NCs). Na NBR ISO9001, a ABNT apresenta a
metodologia conhecida como “Plan-Do-Check-Act”1, ou Ciclo PDCA, em prol da garantia das conformidades dos processos. Essa metodologia norteia toda a ISO9001, pois, na primeira
etapa do ciclo, a instituição deve estabelecer os objetivos e processos necessários para o
alcance dos resultados; na segunda, os processos devem ser implementados; em seguida, na
terceira etapa, a organização deve monitorar e medir o alcance daquilo que foi planejado na
primeira etapa; e, finalmente, como última etapa do ciclo, deve executar ações de melhoria do
desempenho do processo.
Como forma de contemplar a medição, análise e melhoria dos processos, a norma
prescreve a realização de auditorias internas para determinar se o sistema de gestão da
qualidade está conforme os requisitos estabelecidos pela organização e se está sendo mantido
e implementado eficazmente.
As auditorias na gestão pública têm ganhado importância nos últimos anos. Em
2009, o Tribunal de Contas da União (TCU), por meio da Diretoria de Métodos de
Procedimentos e Controle, publicou um estudo de modelos e normas disciplinadoras
intitulado Critérios Gerais de Controle Interno da Administração Pública. Segundo esse
estudo, a auditoria interna é entendida como “um controle da própria gestão, que tem por
atribuição medir e avaliar a eficiência e eficácia de outros controles” (TCU, 2009).
Poucos anos adiante, em 2011, o Ministério da Saúde lança a cartilha Auditoria do SUS:
Orientações Básicas, que busca catalisar as práticas de auditoria de forma descentralizada e
sistêmica. As orientações presentes na publicação procuram contribuir com a promoção de
práticas inovadoras, distanciando-se das práticas ultrapassadas e engessadas do trabalho de
auditoria do SUS. “A partir da sistematização dos processos relativos à auditoria no âmbito do SUS, vislumbra-se a unicidade no que tange às questões centrais que permeiam o processo, o
que aprimora, sem dúvidas, a qualidade do trabalho desempenhado” (BRASIL, 2011).
1
2 A SEGURANÇA DO PACIENTE: PROBLEMÁTICA E OBJETIVOS
A partir do relatório da 55ª Assembleia Mundial de Saúde, em março de 2002, as
atenções foram voltadas para a questão da segurança do paciente. Naquele documento, foram
compilados estudos de diversos países com dados preocupantes quanto ao índice de eventos
adversos causadores de óbitos (como os erros médicos, por exemplo) que chegavam a
ultrapassar os índices de acidentes automobilísticos, câncer de mama e AIDS.
Segundo o relatório supramencionado,
“A segurança é um princípio fundamental da assistência ao paciente e um
componente crítico da gestão da qualidade. Sua melhoria exige um esforço de todo o
sistema complexo, envolvendo uma ampla gama de ações na melhoria de
desempenho, segurança ambiental e gestão de risco, incluindo o controle de
infecção, uso seguro de medicamentos, equipamentos de segurança, a prática clínica
segura e ambiente seguro de cuidados” (OMS, 2002a, p.3).
Com base no Relatório 55/13 da 55ª Assembleia Mundial de Saúde Pública, em 18
de maio de 2002, a Resolução 55/18 reconhece a necessidade de promover a segurança do
paciente como princípio fundamental de todos os sistemas de saúde no mundo. Nesse
documento, são lançadas as diretrizes para que todos os estados-membros prestem a devida
atenção ao problema da segurança do paciente, bem como o estabelecimento e fortalecimento
de sistemas de base científica necessários à melhoria da segurança do paciente e à qualidade
da assistência à saúde, incluindo o monitoramento de drogas, equipamento médico e
tecnologia. Também foram requisitos, entre outros, o desenvolvimento de normas, padrões e
diretrizes globais para a qualidade na assistência e segurança do paciente, provendo suporte a
ações preventivas e implementação de medidas para a redução de riscos, a promoção de uma
cultura de segurança e o desenvolvimento de mecanismos por meio de acreditações, entre
outras formas, de acordo com as condições e requerimentos de cada nação (OMS, 2002b).
Em abril de 2013, considerando a prioridade dada pela Organização Mundial de
Saúde (OMS) à temática da Segurança do Paciente em 2002, o governo brasileiro lança a
Portaria 529, que institui o Programa Nacional de Segurança do Paciente (PNSP), que tem o
objetivo geral de contribuir para a qualificação do cuidado em saúde em todos os
estabelecimentos do território nacional. Entre os objetivos específicos, destaca-se, para este
paciente em diferentes áreas da atenção, organização e gestão de serviços de saúde, por meio
da gestão de risco e de Núcleos de Segurança do Paciente nos estabelecimentos de saúde”
(BRASIL, 2013).
No mesmo sentido, em julho de 2013, a Diretoria Colegiada da Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (Anvisa) lança a Resolução da Diretoria Colegiada N°36 (RDC 36), que
institui ações para a segurança do paciente em serviços de saúde, bem como a criação dos
Núcleos de Segurança do Paciente (NSPs) nos serviços de saúde, com as diretrizes e
definições segundo as quais os núcleos devem embasar suas práticas.
Dentre as competências dos NSPs, estão: a promoção de “ações para a gestão de risco no serviço de saúde”; o desenvolvimento de “ações para a integração e a articulação multiprofissional no serviço de saúde”; e a promoção de “mecanismos para identificar e avaliar a existência de não conformidades nos processos e procedimentos realizados e na
utilização de equipamentos, medicamentos e insumos propondo ações preventivas e corretivas
[...]” (ANVISA, 2013).
Com um total de 176 leitos, distribuídos em 12 alas de internação, e contando com
quase mil profissionais, entre efetivos, temporários, terceirizados e docentes (dados de 2013),
o Hospital Universitário Alcides Carneio (HUAC) foi, em 2002, vinculado à Rede Sentinela,
projeto criado pelo setor de Vigilância em Serviços Sentinela, integrante da área de Vigilância
em Eventos Adversos e Queixas Técnicas da Anvisa. A Rede Sentinela tem o objetivo de
construir uma rede de serviços preparada para notificar eventos adversos e queixas técnicas de
produtos de saúde; insumos, materiais e medicamentos, saneantes, kits para provas
laboratoriais e equipamentos médico-hospitalares em uso no Brasil. Desta forma, busca-se
garantir melhores produtos no mercado e mais segurança e qualidade para pacientes e
profissionais de saúde. Atualmente, a Paraíba conta com seis hospitais cadastrados na Rede
Sentinela, sendo o HUAC o único localizado fora da capital do Estado, João Pessoa.
A condição de Hospital Sentinela propiciou ao HUAC a vanguarda na criação de seu
NSP, instaurado em novembro de 2013, sob a coordenação do autor deste trabalho. Tão logo
se deu a apresentação do núcleo ao corpo de lideranças da instituição, as demandas surgiram
espontaneamente – entre elas, de forma mais específica e contundente, a do Serviço de Arquivo Médico e Estatísticas/Divisão de Registro Hospitalar (SAME), responsável pela
gestão dos registros clínicos de todo o HUAC e que, segundo sua coordenadora, carece de
novas estratégias para a percepção de gargalos no processo de registro do hospital. (ANEXO
A partir de então, o NSP/HUAC, em consonância com o propósito de promoção de
mecanismos para identificar e avaliar a existência de não conformidades nos processos e
procedimentos realizados em sua gestão, busca apurar a situação da administração de seus
prontuários. Tais documentos guardam informações valiosas sobre aos pacientes e seus
tratamentos, portanto, as falhas em seu processo (seja na comunicação ou na sistemática de
ações) potencializam os riscos e eventos adversos referentes à segurança dos pacientes.
Este estudo se insere entre as ações de relevância do Plano de Segurança do Paciente
(PSP) do Hospital Universitário Alcides Carneiro, com foco na melhoria de seus serviços para
os usuários e a sociedade, e está alinhado com as tendências globais de assistência à saúde e
segurança do paciente.
Seus objetivos são a elaboração de um programa para a promoção de melhorias na
gestão de prontuários no HUAC, além de:
a) Conhecer como a gestão de risco é aplicada pela Divisão de Registro Hospitalar;
b) Evidenciar, entre os profissionais responsáveis pela alimentação e manipulação de
prontuários, práticas que condigam com a cultura de segurança;
3 FUNDAMENTOS TEÓRICOS
3.1 Direcionamentos Conceituais
A RDC 36 aborda conceitos basilares para o gerenciamento de risco e a execução das
atividades dos NSPs. Alguns deles serviram de condutores para as questões desta pesquisa.
São eles: boas práticas de funcionamento do serviço de saúde; cultura de segurança;
tecnologias em saúde; garantia da qualidade; e gestão de risco.
As boas práticas de funcionamento do serviço de saúde são definidas como
“componentes da garantia da qualidade que asseguram que os serviços são ofertados com
padrões de qualidade adequados”. A cultura de segurança refere-se ao “conjunto de valores, atitudes, competências e comportamentos que determinam o comprometimento com a gestão
da saúde e da segurança, substituindo a culpa e a punição pela oportunidade de aprender com
as falhas e melhorar a atenção à saúde”. As tecnologias em saúde são descritas como “o
conjunto de equipamentos, medicamentos, insumos e procedimentos utilizados na atenção à
saúde, bem como os processos de trabalho, a infraestrutura e a organização do serviço de
saúde”. A garantia da qualidade é conceituada como a “totalidade das ações sistemáticas
necessárias para garantir que os serviços prestados estejam dentro dos padrões de qualidade
exigidos para os fins a que se propõem”. (ANVISA, 2013). Por fim, a gestão de risco é descrita como:
“(...) a aplicação sistêmica e contínua de políticas, procedimentos, condutas e
recursos na identificação, análise, avaliação, comunicação e controle de riscos e
eventos adversos que afetam a segurança, a saúde humana, a integridade
profissional, o meio ambiente e a imagem institucional” (ANVISA, 2013).
Nesse sentido, considerando que tais conceitos são orientadores do trabalho em
Segurança do Paciente preconizados pelo Ministério da Saúde/Anvisa, é natural e coerente
averiguar como ocorre a administração de prontuários no HUAC, tendo como base para tal 1)
o atendimento às boas práticas de funcionamento do serviço de saúde, 2) de que forma a
gerência de risco é aplicada no setor de Registro Hospitalar e 3) como a cultura de segurança
acontece na prática laboral daqueles que são responsáveis pela alimentação e manuseio dos
3.2 A Gestão de Prontuários e a Redução de Riscos
Os registros clínicos, conforme ensinado ao estudante de medicina, são uma atividade
de caráter obrigatório, envolvendo informações acerca do “problema que motivou a busca
pelo serviço de saúde, história clínica, exame físico, resultados dos procedimentos,
diagnósticos, terapêuticas e respostas clínicas do paciente, e assim sucessivamente, durante
toda a internação” (SCHOUT; NOVAES, 2007).
Todavia, no estudo citado, observa-se que há grande dificuldade na produção e
operacionalização dos prontuários por parte dos médicos, principalmente em relação ao
resumo de alta, que é um documento final posterior à conclusão dos cuidados na assistência
de internação. Segundo as autoras, há discrepância entre o cuidado em si e o registro desse
cuidado, negligenciando a importância da existência e da qualidade desses documentos para o
tratamento abrangente – ou seja, futuras intercorrências, internações e tratamentos.
O ambiente hospitalar é caracterizado pela complexidade de ações e a vasta gama de
saberes, tecnologias e infraestrutura suportados pelas especificidades das áreas de atuação
profissional e seus processos produtivos. Dessa diversidade, nasce outra justificativa para a
produção e o acompanhamento dos registros produzidos na assistência à saúde: a necessidade
de comunicação. Além da comunicação oral, os relatórios intra e interequipes são importantes
para garantir o desenvolvimento da ação terapêutica. Em um ambiente complexo como um
hospital, é desafiador, porém essencial, harmonizar a comunicação entre seus diversos
profissionais para a compreensão dos casos e históricos de cada paciente. “Essas informações
são articuladas por estratégias diferenciadas, segundo a função do profissional, com vistas a
atingir um objetivo comum: o atendimento ao paciente” (PINHO et al., 2003).
Esses mesmos autores sugerem que a qualidade na gestão dessas informações pode
evitar disfuncionamentos – que vão desde a troca de pacientes ao erro no preparo e na administração de medicamentos, além de procedimentos equivocados. Tais disfunções
agravam o estado de saúde do paciente (atraso na recuperação e risco de morte), compromete
o bem-estar dos profissionais e repercute negativamente na sociedade. Os itens relacionados
pelo estudo de Pinho et al. (2003) harmonizam-se com os objetivos da qualidade em
assistência expostos no artigo 8º da Resolução da Diretoria Colegiada da Anvisa
(RDC36/2013) para a criação de um Plano de Segurança do Paciente (PSP) por parte de cada
serviço de saúde.
Aprofundar o entendimento dos conceitos em segurança do paciente é imprescindível
saúde são “componentes da garantia da qualidade que asseguram que os serviços são
ofertados com padrões de qualidade adequados” (ANVISA, 2013). Conforme essa resolução,
os NSPs devem elaborar um plano que estabeleça estratégias e ações de gestão de risco para o
cumprimento de alguns objetivos, considerando-se, portanto, que a realização de tais
objetivos é desejável a todo e qualquer serviço de saúde para a segurança do paciente.
Para estudar a segurança do paciente na gestão de prontuários, alguns dos objetivos
citados para a elaboração do PSP são os instrumentos balizadores que mais se aproximam da
temática em questão. Os objetivos são:
a) Identificação, análise, avaliação, monitoramento e comunicação dos riscos no
serviço de saúde, de forma sistemática;
b) Identificação do paciente;
c) Segurança cirúrgica;
d) Segurança na prescrição, uso e administração de medicamentos, sangue e
hemocomponentes;
e) Prevenção de quedas dos pacientes;
f) Prevenção de úlceras por pressão;
g) Segurança nas terapias nutricionais enteral e parenteral;
h) Comunicação efetiva entre profissionais do serviço de saúde e entre serviços de
saúde;
i) Estimular a participação do paciente e dos familiares na assistência prestada;
j) Promoção do ambiente seguro.
Percebe-se, portanto, que há uma preocupação com a qualidade da assistência no
tocante à aplicação de padrões e sistemáticas de trabalho em prol da redução de riscos e da
segurança ao paciente. Em relação estrita e direta à gestão de prontuários, a Fundação
Oswaldo Cruz, em parceria com a Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, elaborou
uma série de textos de apoio em registros de saúde (FIOCRUZ, 1999). Nesse trabalho, que se
tornou referência nacional desde sua publicação, são destacados dois enfoques: um mais
específico, que abrange os registros em saúde efetuados com base na assistência prestada ao
paciente, compreendendo tanto a existência de prontuários únicos com formulários adequados
e ordenados, como também a utilização de outros sistemas de arquivamento e acesso a esses
documentos; e o outro que abrange as informações em saúde, ressaltando o seu conteúdo
estratégico para os níveis gerenciais e operacionais, tendo sido importante para a implantação
e consolidação do SUS. Conta também com diversos pareceres e resoluções que norteiam a
esse último, pontua que “para que o serviço de internação funcione de forma organizada e atinja o objetivo de tramitar correta e rapidamente a admissão dos pacientes, é necessário
estabelecer normas e procedimentos claros e concisos” (FIOCRUZ, 1999).
De acordo com Rodrigues et al. (2004), apesar das críticas que os registros em
prontuários gerados por profissionais de enfermagem recebem (por meio de questionamentos
que levantam uma preocupação exacerbada com os registros, negligenciando o cuidado em
si), pode-se afirmar que há uma correlação positiva entre o registro e a qualidade da
assistência prestada, pois os cuidados devem ser avaliados por meio de auditorias realizadas
com base neles. Dessa forma, haverá a garantia de monitoramento da qualidade da assistência.
Além das dificuldades na produção do registro clínico, há outro fator complicador
nos serviços de urgência/emergência: a abundância de condições clínicas, fator que dificulta a
padronização das condutas e, por consequência, da forma de registro. Apesar de o HUAC ser
um hospital cujos pacientes são referenciados de outros serviços, diferentemente da realidade
de um hospital de urgência/emergência, se faz necessária, com o auxílio do SAME, a
averiguação da padronização das condutas nas enfermarias, cuja rotatividade de pacientes é
consideravelmente maior que a das Unidades de Terapia Intensiva (UTIs).
Conforme exposto anteriormente, o SAME é o setor responsável pela organização
dos prontuários em todo o Hospital Universitário Alcides Carneiro. Embora seja comum a
todos os hospitais, esse serviço, ainda segundo Schout e Novaes (2007), não tem sido
devidamente valorizado pelas gestões hospitalares. Em uma avaliação sistêmica, pode-se
identificar que o monitoramento dos registros também está atrelado à forma de alocação
desses documentos, que é fator determinante para a sua triagem e para a segurança do
paciente, principalmente quando se considera a possibilidade de extravio desse conjunto de
informações – falha da qual decorre a duplicidade de numeração dos registros.
Durante estudo realizado em um grupo hospitalar na região metropolitana de Porto
Alegre, no Rio Grande do Sul (SILVA 2010), foram observadas dificuldades no controle de
abertura de prontuários, o que levava à criação de vários prontuários para um mesmo
paciente, além de problemas em relação à identificação errada dos usuários, gerando incerteza
quanto aos cuidados que são prescritos nos registros e sua aplicação no paciente correto.
“É comum, nas pesquisas médicas e reinternações, os profissionais identificarem
que um paciente com número novo, na verdade, já possui número de internação
uma rotina escrita que padronize com exatidão os procedimentos adotados por parte
dos serviços administrativos para esse fim” (SILVA, 2010, p.8).
Considerando as peculiaridades acerca da administração de prontuários nos serviços
de saúde brasileiros (públicos, principalmente), além de sua importância para desenvolver a
qualidade da assistência e romper os obstáculos de gestão, este trabalho também se propõe a
apurar, por meio de uma avaliação sistêmica dos processos de registros e gerenciamento das
informações clínicas, a situação do HUAC no cenário nacional. Para tanto, usará como base
as diretrizes e orientações do gerenciamento de risco da Anvisa.
Conforme já pontuado, a complexidade do ambiente hospitalar exige que diversas
perspectivas sejam consideradas quando se trata de segurança do paciente e redução de riscos
à sua integridade física e psicológica. Portanto, não se deve contemplar apenas a clareza e a
completude dos registros do paciente, mas também garantir a segurança em relação ao seu
acesso. Segundo Motta et al. (2001), a autorização e controle de acesso ao prontuário
eletrônico do paciente (PEP) tem sido importante objeto de estudo nos últimos anos.
Entretanto, “não existe um modelo claro sobre a política de autorização e controle de acesso a
ser adotada para o PEP, isto é, como determinar quem tem direito a acessar certas
informações, com quais privilégios e em quais condições” (MOTTA et al., 2001). Por isso, Motta & Furuie (2002) apresentam o Middleware para Autorização e Controle e Acesso
(MACA), uma ferramenta que implementa um modelo de autorização contextual para o
Controle de Acesso Baseado em Papéis (CABP), que regula o acesso do solicitante ao PEP.
É importante ressaltar que a ferramenta MACA foi desenvolvida para aplicação em
um ambiente de gestão eletrônica de prontuários, sendo atualmente aplicada no Hospital das
Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), mais
especificamente, no Instituto do Coração (InCor). Muito embora o HUAC não disponha de
PEP, utilizando ainda o modelo físico, a lógica processual do CABP poderá ser de grande
valia para uma possível implantação de protocolos de acesso ao prontuário do paciente,
mesmo que em meio físico. O CABP regula o acesso dos profissionais com base nos papeis
que eles exercem no serviço hospitalar. Para sua efetividade, o CABP considera Autorizações
Contextuais (como variáveis ambientais e data, hora e local do acesso); Papéis Hierárquicos; e
descrevem a autoridade e a responsabilidade concedidas a um usuário2 para o qual o papel foi
associado” (MOTA & FURUIE, 2002).
3.3 Aspectos Éticos e Legais
A temática da gestão de prontuários traz consigo diversos aspectos éticos e legais que
devem ser considerados. Eles têm a função de balizar a gestão, fazendo com que sejam
garantidos tanto os direitos da instituição de saúde como os dos pacientes e profissionais.
Segundo Gauderer (1998), já acontece uma mudança radical na relação do indivíduo com sua
doença e seu corpo. Essa postura faz com que a o paciente esteja mais compromissado e alerta
sobre os seus deveres e direitos, pois “os conhecimentos médicos foram e estão sendo cada
vez mais democratizados, tornados públicos e divulgados” (GAUDERER, 1998).
Nesse sentido, o autor citado ressalta a diferença entre reivindicar e reclamar, pois
considera que a capacidade para o exercício livre de questionar direta e objetivamente ainda
não está adequadamente desenvolvida. Há apenas desabafos que não levam a uma construção
objetiva e palpável para o entendimento da situação, aumentando a angústia e o sofrimento do
indivíduo. Entende-se que o prontuário é um importante instrumento de comunicação, que
permite levar ao paciente e aos seus familiares as informações necessárias referentes a seu
estado de saúde. O Código de Ética Médica, Resolução1931/2009, veda ao médico, em seu
artigo 88, negar o acesso do paciente, bem como deixar de lhe fornecer cópia do prontuário
quando solicitada e também deixar de prestar explicações necessárias a sua compreensão, a
não ser quando tais informações promovam risco ao próprio paciente ou a outra pessoa.
Percebe-se, assim, que o registro completo e claro dos prontuários é uma tarefa
essencial não apenas ao profissional médico, mas a qualquer profissional de saúde que seja
responsável pelo manuseio e inserção de informações nesse documento. A Resolução
429/2012 do Conselho Federal de Enfermagem (Cofen) estabelece o seguinte:
“CONSIDERANDO o prontuário do paciente e outros documentos próprios da
Enfermagem, independente do meio de suporte – tradicional (papel) ou eletrônico-,
como uma fonte de informações clínicas e administrativas para tomada de decisão, e
um meio de comunicação compartilhado entre os profissionais da equipe de saúde;
(...).
RESOLVE
Art.1º É responsabilidade e dever dos profissionais da Enfermagem registrar, no
prontuário do paciente e em outros documentos próprios da área, seja em meio de
suporte tradicional (papel) ou eletrônico, as informações inerentes ao processo de
cuidar e ao gerenciamento dos processos de trabalho, necessárias para assegurar a
continuidade e qualidade da assistência.
Art. 2º Relativo ao processo de cuidar, e em atenção ao disposto na Resolução nº
358/2009, deve ser registrado no prontuário do paciente:
a) um resumo dos dados coletados sobre a pessoa, família ou coletividade humana
em um dado momento do processo saúde e doença;
b) os diagnósticos de enfermagem acerca das respostas da pessoa, família ou
coletividade humana em um dado momento do processo saúde e doença;
c) as ações ou intervenções de enfermagem realizadas face aos diagnósticos de
enfermagem identificados;
d) os resultados alcançados como consequência das ações ou intervenções de
enfermagem realizadas.” (COFEN, 2012).
Prestes & Rangel (2007) consideram fundamental a observância do CFM de que
“sendo o atendimento prestado ao paciente uma ação multidisciplinar, todos os envolvidos
ficarão informados sobre as condições clínicas, evolução, resultados de exames e
procedimentos realizados nos pacientes” (PRESTES & RANGEL, 2007). Eles dizem que o
prontuário é uma ferramenta legal de suma importância na suspeita do chamado “erro médico”. Contudo, em virtude da intensa pressão sob a qual os médicos trabalham, essa
relevância não é por eles percebida.
Os autores citados no parágrafo anterior citam o Código de Ética Médica quando
ressaltam que, entre os direitos do paciente, está o de ser informado sobre seu estado de saúde
por escrito, se assim for solicitado. Por isso, os serviços de saúde devem ter o cuidado de
manter o prontuário atualizado e seguro, para que não seja surpreendido por uma solicitação
do paciente. Segundo os autores, o Código Civil de 2003 prevê que as ações judiciais que
datam de depois de 01/01/2013 só serão prescritas após três anos. No entanto, se os fatos
geradores tiverem ocorrido nos últimos 20 anos, o prazo de arquivamento dos prontuários
deve ser também de 20 anos. Tornando, assim, uma regra para todos os prontuários,
indiscriminadamente.
No tocante aos prontuários informatizados, sua validade tem sido questionada no
RANGEL, 2007). Por isso, o Conselho Federal de Medicina (CFM) expediu, em 2002, a
Resolução 1639, que aprovou as Normas Técnicas para o Uso de Sistemas Informatizados
para a Guarda e Manuseio do Prontuário Médico, sendo posteriormente revogada pela
Resolução 1821, de 2007, que aprova as normas técnicas que dizem respeito à digitalização e
uso dos sistemas informatizados para a guarda e manuseio do conteúdo de prontuários dos
pacientes, autorizando a eliminação do papel.
A Resolução 1821/2007 aprova o Manual de Certificação para Sistemas de Registro
Eletrônico em Saúde, autorizando a digitalização de prontuários de pacientes. Todavia, tal
procedimento deve obedecer às normas de reprodução de todas as informações dos
documentos originais e ser controlado por sistema especializado (Gerenciamento Eletrônico
de Documentos – GED) que tenha capacidade adequada ao volume de dados e que permita a organização dos documentos, facilitando a pesquisa de maneira simples e eficiente, de acordo
com os requisitos do Nível de Garantia de Segurança 2 (NGS2) do referido Manual. Assim,
para que tal procedimento seja completamente legalizado, tanto o CFM quanto o a Sociedade
Brasileira de Informática em Saúde deverão expedir um selo de qualidade dos sistemas
4 ASPECTOS METODOLÓGICOS E APLICAÇÕES
Tomando por base os propósitos deste trabalho, diversas metodologias de avaliação de
problemas complexos foram consideradas, a exemplo da Metodologia de Análise e Solução
de Problemas (MASP); Metodologia Kepner e Tregoe de Solução de Problemas (KT);
Método das 8 Disciplinas (8D); e Diagrama de Causa e Efeito, também conhecido por
Diagrama de Ishikawa ou Espinha de Peixe.
Contudo, buscou-se uma abordagem que, além de coesa, não se isolasse no
pragmatismo, valorizasse o pensamento e o aprendizado sistêmicos, tivesse credibilidade no
meio científico e pudesse envolver diversas visões e personagens da organização, mesmo que
indiretamente. Para atender a tais requisitos, foi utilizada a Soft Systems Methodology (SSM).
Elaborada por Peter Checkland3 no início da década de 1970, a partir de experiências
gerenciais pessoais, a Soft Systems Methodology caracteriza-se pela consideração das
idiossincrasias de cunho humano de problemas organizacionais. A percepção de Checkland
era de que a engenharia convencional – hard systems – deveria sofrer adaptações para “ser capaz de lidar com o aspecto humano e, em particular, dar destaque à importância da
irracionalidade e criatividade” (MINGERS, 2000).
Após refinamentos realizados na década de 1980, na Universidade de Lancaster, a
SSM ganhou um modelo peculiar de sete estágios de aplicação, divididos em dois campos:
um de análise cultural do mundo, ou situação real, e outro do mundo sistêmico em que são
realizadas as análises lógicas e ideais, conforme a Figura 1.
Enfatiza-se que as avaliações entre o mundo real e o sistêmico (ideal) são
prosseguidas de um comparativo entre tais componentes para que, enfim, sejam definidas as
medidas mais plausíveis de aplicabilidade para a resolução da situação problema. (BELLINI
et al., 2004).
Os sete estágios da SSM são detalhados a seguir:
Estágios 1 e 2: Em relação ao estágio 1, Venturi et al. (2005) ressaltam que é
importante observar a situação problemática com o objetivo de buscar o máximo de
informações sobre ela, levando em consideração: a estrutura organizacional; as características
funcionais e de clima organizacional; os fluxos de autoridade; comunicação; atividade e
decisões formais e informais; a percepção da própria função e de outros dentro da
organização bem como no contexto em estudo; os problemas percebidos; e qualquer
informação que ajude a compor uma “pintura” detalhada da situação problemática. No campo
da análise cultural real (FIGURA 1), os estágios iniciais têm características de identificação
da situação problema com base na percepção dos envolvidos, incluindo os pesquisadores.
Figura 1 – Estágios da Soft Systems Methodology
Fonte: Bellini et al. (2004)
Para Checkland (1981 apud CÓRDOBA; FARQUHARSON, 2008), o
desenvolvimento dessa metodologia conta com a colaboração de pessoas relevantes na
situação problema, considerando a situação como um todo, sem que o foco esteja voltado
apenas para o problema. Nessas etapas, a metodologia orienta para a elaboração de figuras
ricas, que são “representações gráficas livres com o objetivo de serem evidenciados os entendimentos individuais a respeito de problemas”. Busca-se, com isso, clarear os gargalos a partir do fluxo dos processos em questão. Tais desenhos devem ser autênticos e espontâneos,
sem a necessidade de padrões predeterminados. Contudo, algumas questões devem ser
consideradas, como o layout físico, as relações formais e informais de hierarquia e os sistemas
de comunicação (aspectos estruturais); o entendimento de como o processo acontece e quem
são os executores de cada ação (processo da situação); e a relação entre os aspectos físicos e
processuais. Ou seja, uma compreensão da cultura organizacional vigente, conforme
Figura 2 - Exemplo de figura rica em estudo sobre eficiência energética:
Fonte: Neves et al. (2009)
Estágio 3: As atividades que antecedem este estágio permitem entender melhor a
situação e possibilitam a elaboração de definições sucintas de sistemas relevantes, pelos
envolvidos no contexto laboral (PIDD, 1998). Essas definições se traduzem na percepção de
cada profissional acerca de componentes de tal contexto. Para identificar melhor esses
componentes, é adotado o mnemônico CATWOE, que expressa seis instâncias a serem
avaliadas pelo grupo de trabalho. Essas instâncias serão apresentadas abaixo, em forma
sequencial – entretanto, não há sequência na atividade, uma vez que se trata da descrição de um contexto organizacional.
Conforme apresentado por Pidd (1998), a primeira instância ou componente se
relaciona ao cliente (Client), ou o “beneficiário ou vítima do resultado do
sistema”. Quer dizer, o grupo de trabalho deve identificar, sob sua ótica, quem recebe o trabalho em processamento, identificando também o que acontece ao
produto do sistema;
O segundo componente são os atores (Actors). Pessoas que realizam as etapas do
processos sistemáticos ocorrem. Tais atores podem ser pessoas isoladas ou um
grupo de pessoas, setores, departamentos, divisões etc;
O processo de transformação (Transformation) é relevante na análise desse
contexto, pois esse é o âmago do sistema de atividades humanas. Nele, os atores
atuam com seus saberes para produzir o que o cliente espera, de forma que ações
até então confusas tenham um componente sistêmico e ideal. Como uma
atividade, o processo de transformação deve ser descrito com um verbo de ação.
O grupo de trabalho deve focar em um único processo de transformação;
A visão de mundo (Weltanschaaung) representa a razão ou perspectiva que
justifica a execução do processo de transformação (GEORGIOU, 2012). Com
frequência, ela é assumida de forma tácita, e a importância de sua identificação
provém da ideia de que “qualquer definição sistêmica só faz sentido dentro de um contexto definido” (PIDD, 1998);
Em seguida, temos o dono do negócio (Owner), a pessoa ou grupo responsável
pelo sistema, que é capaz de parar ou modificar completamente o processo;
Por fim, as restrições ambientais (Environment) remetem à identificação das
limitações físicas oriundas do meio que comprometem o processo de
transformação.
A escolha da SSM como metodologia para este trabalho se deu por três motivos: a
característica de ser uma ferramenta concebida para aplicação em situações problemáticas;
sua orientação ao aprendizado organizacional por meio da participação de pessoas envolvidas
na situação real; e sua utilização em diversos estudos realizados na gestão de serviços de
saúde em todo o mundo (TROCHIM et al., 2006; VANDENBROECK et al., 2014;
MIDGLEY, 2006; HAIGH; ORMANDY, 2011).
A SSM procura trabalhar com diferentes percepções da realidade, facilitando um
processo sistêmico de aprendizagem em que os diferentes pontos de vista são examinados e
discutidos de forma a desenvolver uma ação intencional voltada ao aperfeiçoamento. A SSM
fornece uma metodologia sistêmica pela qual os participantes aprendem que mudanças são
possíveis e desejáveis, dadas as peculiaridades da situação problema (HARDMAN;
PAUCAR-CACERES, 2011).
Estágio 4: Nesta fase, modelos conceituais devem ser elaborados como resultado da
combinação entre os componentes trabalhados no estágio 3. Os modelos devem ser ideais
acordo com Venturi et al. (2005), além de não serem baseados na realidade, eles devem ser
viáveis. Tal combinação precisa ser feita entre o máximo de componentes, ou seja, é
necessário haver, nos modelos conceituais elaborados, uma interrelação entre eles,
contribuindo para a garantia do pensamento sistêmico na aplicação da metodologia.
Estágio 5: Este estágio se caracteriza pela reflexão sobre a situação real, tendo como
principal objetivo a comparação entre os estágios 4 e 2. Em outras palavras, devem-se avaliar
os aspectos relacionados a uma situação ideal hipotética, expressados pelos modelos
conceituais elaborados no estágio 4, e a situação problemática real, representada pela figura
rica elaborada no estágio 2. Dessa forma, os modelos conceituais servem como base para uma
comparação com a realidade (VENTURI et al., 2005).
Além de utilizar os modelos conceituais como base comparativa para a situação real,
Checkland (1981 apud BELLINI et al., 2004), apresenta outras formas para facilitar a
comparação entre os dois estágios: 1) considerando a aplicação hipotética dos modelos
conceituais aos eventos da situação real e estimulando os participantes a inferirem sobre como
estariam as situações se tais modelos tivessem existido no momento em que os eventos que
acarretaram a situação problemática aconteceram; 2) discutindo o modelo conceitual com os
principais atores da situação problemática; 3) sobrepondo os modelos conceituais à situação
real, de forma a identificar a existência (duplicidade) ou a ausência de tais modelos na
situação real (lacunas).
Estágio 6: O sexto estágio é o momento em que as ações a serem implementadas são
elencadas, considerando que, no estágio anterior, foi tomado o cuidado de não cair no risco do
retrabalho ou da duplicidade de práticas, certificando-se de que as ações escolhidas serão
inéditas ao processo de transformação. Venturi et al. (2005) indicam que as mudanças
propostas no estágio anterior devem ser avaliadas e definidas como viáveis e desejáveis.
Checkland (1981, apud VENTURI et al., 2005) menciona que as mudanças podem ser
categorizadas em três tipos: estruturais, de procedimentos e de atitudes.
Estágio 7: No último estágio, as ações a serem implementadas devem passar por
refinamento, processo essencial para que se decida a forma como tais ações vão acontecer. É
quando são definidas questões como o escopo das ações, as pessoas nelas envolvidas, quando
e onde ocorrerão. Assim, deve-se elaborar um cronograma indicando todos os detalhes para a
execução das melhorias predefinidas.
Conforme visto até agora, a SSM é uma metodologia em que a avaliação sistêmica
da situação problema é promovida, direcionando os participantes para que tenham uma visão
propósitos do Mestrado Profissional em Gestão de Organizações Aprendentes (MPGOA),
uma vez que ambos têm o aprendizado organizacional como foco de estudo, bem como com a
prática profissional do pesquisador, como psicólogo e gerente de risco de uma instituição
hospitalar.
Para que a SSM fosse aplicada no HUAC foram necessárias algumas avaliações
quanto às partes interessadas (stakeholders, a quem também nos referiremos como Equipe de
Aplicação, de agora em diante), indicadas a participar e a se envolver na metodologia.
Considerando que a gestão de prontuários é uma prática que perpassa por diversas áreas,
buscou-se observar os principais setores envolvidos na alimentação, verificação e utilização
dos dados inseridos nos registros hospitalares componentes dos prontuários. Após algumas
observações e averiguações, considerou-se que os setores de Enfermagem e de Faturamento,
além do SAME (também chamado de Registo Hospitalar, incluindo seu subsetor, o Arquivo
Central), seriam os stakeholders de maior relevância para a aplicação da SSM.
O Setor de Enfermagem foi representado pela coordenadora adjunta de Enfermagem,
que também atua como enfermeira da ala de clínica médica e dispõe de conhecimentos
organizacionais gerenciais e operacionais satisfatórios para contribuir nas reuniões. O SAME
foi representado por sua coordenadora, profissional com vasta experiência em registro
hospitalar, mais de 30 anos de atuação como enfermeira do HUAC e diversas atribuições ao
longo de sua carreira, sendo, portanto, figura indispensável às reuniões. Esse setor também foi
representado pelo chefe do Arquivo Central, por sua experiência na função e por trabalhar em
um ambiente crítico para a gestão de prontuários, que é o arquivamento e o armazenamento
das informações. Por fim, o setor de Faturamento foi representado por uma de suas
servidoras, responsável pela avaliação da completude e da coerência das informações contidas
nos prontuários – se esses dois itens não estiverem de acordo, nenhum dos procedimentos realizados ao longo do processo de internação do paciente será faturado pelo SUS.
Os membros da Equipe de Aplicação da SSM foram contatados um a um pelo
pesquisador, contando com a anuência e o apoio da diretoria geral da instituição. Logo após o
contato inicial, foram definidos os horários das reuniões, que ocorreram uma vez por semana,
ao longo dos meses de outubro e novembro de 2014.
4.1 Apresentação do Projeto e da Metodologia aos Stakeholders
Na primeira reunião com os stakeholders, o projeto de aplicação da SSM foi