ANÁLISE GEO-ARQUEOLÓGICA SOBRE A TERRITORIALIDADE NO SÍTIO ARQUEOLÓGICO FRUXU
1Ailson Barbosa de Oliveira alibarol@yahoo.com.br Bacharel em geografia pela UNESP Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – Faculdade de Ciências e Tecnologia de
Presidente Prudente
Ruth Künzli ruth@fct.unesp.br Professora Doutora do Departamento de Planejamento, Arquitetura e Urbanismo.
Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – Faculdade de Ciências e Tecnologia de Presidente Prudente
RESUMO
Palavras chave: Arqueologia; estudo geográfico e território.
O objetivo do presente trabalho é de aprimorar os conhecimentos sobre o Sítio Arqueológico Fruxu, localizado na margem esquerda do rio Paraná, a aproximadamente 4 km a jusante da barragem de Jupiá, no Município de Castilho, bem como avaliação da sua relação com o meio no qual está inserido. A análise do sítio foi feita através de materiais arqueológicos, tanto cerâmicos quanto líticos, (artefatos de pedra lascada), coletados durante a etapa de campo do “Projeto de Salvamento Arqueológico de Porto Primavera - SP”, desenvolvido de 1998 a 2002 pela equipe de arqueologia do CEMAARQ (Centro de Museologia Antropologia e Arqueologia), da Universidade Estadual Paulista (UNESP), Campus de Presidente Prudente. Foram analisadas 459 peças de cerâmica e 550 peças líticas. Através da análise tecnotipológica dos artefatos líticos e cerâmicos, objetiva-se obter dados que forneçam informações sobre os povos pré-históricos da região e através deste estudo, realizar interpretações para uma melhor compreensão sobre a indústria lítica e cerâmica regionais, enfocando a relação do homem pré-histórico com a sua territorialidade.
INTRODUÇÃO
O presente trabalho foi elaborado tendo em vista o aprimoramento dos conhecimentos sobre o Sítio Arqueológico Fruxu, através da análise de material arqueológico lítico (artefatos de pedra lascada) e cerâmico, material este coletado durante a etapa de campo do “Projeto de Salvamento Arqueológico de Porto Primavera - SP”, desenvolvido de 1998 a 2002, pela equipe multidisciplinar de arqueologia do CEMAARQ (Centro de Museologia Antropologia e Arqueologia), na margem esquerda do Rio Paraná; o sítio se localiza nas seguintes coordenadas UTM: L: 434923 e N: 7698867 a aproximadamente 4 km a jusante da barragem Engenheiro Sousa Dais, no Município de Castilho. A vegetação nos internos do sítio é densa, composta de mata ciliar e com desnível de aproximadamente oito metros do espelho d´água; a área do sítio corresponde a 400 x
1 O presente trabalho se enquadra no eixo temático Geografia do Ambiente e Saúde, pois trabalha com diversas metodologias referentes ao tema.
320m por 0,50m, o acesso ao sítio é pelo Rio Paraná. (Foto 1 e 2), na ocasião em que foi trabalhado. Hoje com a formação do lago as condições certamente são outras.
Foto: 1. Localização do Sítio Fruxu.
Fonte: CEMAARQ.
Foto: 2. Vista geral do Sítio Fruxu.
Fonte: CEMAARQ.
As análises foram realizadas no laboratório de arqueologia do CEMAARQ, onde as peças foram medidas, pesadas e classificadas de acordo com sua matéria-prima, função e técnicas de confecção. Todos esses dados estão sendo informatizados e incorporados ao banco de dados do Grupo de Pesquisa “O Conteúdo Paleoetnográfico da Décima Região - SP”, cadastrado junto ao CNPq desde 1991 e integrado no Departamento de Planejamento, Urbanismo e Ambiente.
Foram analisadas 459 peças cerâmicas (foto 3) e 550 peças líticas (foto 4). Após o término da análise, os objetos são preparados para serem colocados na exposição permanente do Museu ou para acondicionamento na reserva técnica.
Foto: 3. Exemplos de cerâmica Foto: 4. Exemplo de líticos lascados Fonte: ESTEVAM, A. E., 2003 Fonte: CEMAARQ.
A maior parte do material coletado nos poços de sondagem, nas trincheiras e nas quadrículas é de líticos lascados, de cerâmica e malacológico; a análise laboratorial, foi feita com os materiais líticos e cerâmicos.
Através da análise tecnotipológica dos artefatos líticos e cerâmicos, objetivou-se obter dados que forneçam informações sobre os povos pré-históricos da região e através deste estudo, realizar interpretações para uma melhor compreensão sobre a indústria lítica e cerâmica regionais, enfocando a relação do homem pré-histórico com a sua territorialidade e o espaço onde habitou.
Os trabalhos que vêm sendo realizadas fazem com que se possa conhecer a
importância histórica dos homens que viveram no Brasil antes da chegada dos portugueses
e a divulgação dos resultados desses trabalhos objetiva que muitas pessoas possam ter
acesso a essas informações e, deste modo, conhecer um pouco da história e da cultura
indígena pretérita.
DESENVOLVIMENTO
A arqueologia inspira uma fascinação nos homens porque é através de materiais líticos, restos de ossos, utensílios, ferramentas, materiais cerâmicos, restos de fogueira, enfim, de todos os tipos de instrumentos e vestígios, que é possível definir o estilo de vida do homem pré-histórico, construindo um quebra-cabeça para chegar perto de como era a vida dos grupos humanos, fazendo emergir respostas sobre os tempos mais remotos da humanidade. É com esses aspectos materiais que o arqueólogo lida o tempo todo, na busca de localizar, analisar e interpretar tais vestígios. Deste modo é possível definir a arqueologia como uma ciência que se preocupa primordialmente com os aspectos da cultura material e com a dependência do homem em relação aos ritmos da natureza e com as questões geográficas, que são as estações do ano, clima, disponibilidade de recursos (matéria-prima) e o território.
Tendo em vista a grande importância da ciência arqueológica, juntamente com a geográfica, que não se prendem apenas em escalas, mas sim, contribuem para a interpretação e compreensão de diferentes realidades e em diferentes tempos, esse trabalho se justifica cientificamente, pois procura interpretar dados arqueológicos e relacioná-los à geografia na discussão da territorialidade.
Essa visão integradora e complementar de diferentes relações passa a ser de fundamental importância para a compreensão dos fenômenos sociais e a sua articulação com várias dimensões de análise.
Com o desenvolvimento do presente trabalho, é possível ampliar os conhecimentos nas áreas de Arqueologia e de Geografia, contemplando também outra vertente, ou seja, a de análise laboratorial dos artefatos líticos e cerâmicos, podendo, deste modo, interpretar os dados obtidos através da análise tecnotipológica do material arqueológico, contextualizando o homem pré-histórico com o seu modo de vida, e, através dessas interpretações, conhecer como era a organização espacial e como era a sua relação com o território.
Mas, analisando o conceito de território, foi possível se pensar a questão arqueológica na evolução das sucessivas ocupações na região oeste do Estado de São Paulo, fazendo da Geografia um importante contribuinte para esse debate, que foi de fundamental importância no desenvolvimento do trabalho e se insere em um dos objetos principais, que é mostrar que a questão territorial foi um fator importante na fixação e sedentarização do homem.
Esse trabalho é o resultado, além de um trabalho em laboratório, que constituiu a sua
segunda etapa, já que a primeira foi o embasamento bibliográfico e cartográfico envolvendo
a análise tecnotipológica do material lítico e cerâmico, também um trabalho de gabinete,
devido ao seu caráter histórico, ficando a discussão da questão do território para depois da descrição dos materiais arqueológicos do sítio Fruxu, buscando contextualizá-lo melhor.
Para seleção desse sítio foram utilizados os seguintes critérios: tipo de ocupação, quantidade de material lítico e cerâmico e as características morfológicas dos artefatos. Já que um sítio arqueológico apresenta características tais que permitam ao arqueólogo fazer uma abstração do comportamento de um grupo e seu habitat, essa abstração baseia-se nas características ambientais somadas ao material cultural encontrado (RODRIGUES, 2001).
Na análise tecnotipológica lítica, constatou-se o tipo de matéria prima, sinais de utilização, dimensões e peso das peças e morfologia dos retoques, já na cerâmica constatou-se o tipo de antiplástico, tipos de decoração, técnica de manufatura e tipos de queima.
Um sítio arqueológico não é formado apenas pelos materiais encontrados durante as escavações, mas também pelo solo, clima, vegetação, relevo, hidrografia e tudo que possa estar relacionado com a vida de um grupo humano, logo todos esses fatores fazem parte da territorialidade.
E deste modo, o trabalha procurou entender o sítio Fruxu no contexto geoarqueológico, através do meio ambiente e da análise tecnotipológica dos artefatos líticos e cerâmicos, através de obtenção de dados que forneçam informações sobre os povos pré- históricos da região, bem como, por intermédio deste estudo, realizar a interpretação dos dados para maior compreensão sobre a indústria lítica e cerâmica regional, enfocando a relação do homem pré-histórico com a sua territorialidade.
Tendo sido definido o sítio arqueológico a ser estudado, foi feito o estudo da localização e da inserção do sítio no contexto arqueológico e geográfico em relação aos demais sítios conhecidos. A metodologia do trabalho consistiu na análise tecnotipológica das peças líticas e cerâmicas e os métodos utilizados foram, sobretudo, o analítico e o comparativo, acompanhado das referências bibliográficas e sempre relacionando o contexto arqueológico com a geografia e a territorialidade.
Através da análise tecnotipológica foi constatado que a matéria-prima mais utilizada
para a produção dos artefatos líticos era o arenito silicificado (gráfico 1 e tabela 1) esse fator
deve-se ao fato de esse material é encontrado em maior abundância em relação a rochas.
Gráfico: 1. Matéria-Prima do Sítio Fruxu
Tabela: 1. Matéria-prima
Foram o conhecimento e o aproveitamento de rochas aflorantes, aptas para a confecção de utensílios líticos, fatores essenciais que garantiram ao homem pré-histórico amplo e crescente domínio do seu território.
O domínio das técnicas de manipulação da matéria-prima permitiu a exploração do território circundante garantindo a sua sobrevivência.
Segundo Pallestrini e Morais, as pesquisas arqueológicas na bacia do Paranapanema paulista já permitiram o estabelecimento de um panorama suficientemente claro das características do aproveitamento dos afloramentos litológicos pelo homem pré- histórico, através do aproveitamento imediato das reservas litológicas aptas ao lascamento, iniciado pela instalação de populações pré-históricas ao redor de afloramentos rochosos e a existência de técnicas de lascamento, que permitiram o domínio da matéria-prima pelo
Matéria-prima
Arenito Silicificado 337
Basalto 1
Calcedônia 89
Diabásio 1
Quartzo 39
Silex 83
Total 550
homem pré-histórico que viveu entre 5.000 e 2.000 anos antes do presente; esse domínio redundou na elaboração de uma indústria lítica de características tecnológicas altamente requintadas (PALLESTRINI e MORAIS, 1982).
Através da análise tecnotipológica pode ser constatado que a forma básica dos artefatos líticos encontrados no sítio é composta por fragmentos de lascas, raspadores, blocos, lascas, furadores e percutores.
A tecnotipologia dá sentido ao utensílio: ela restitui a história desde a descoberta do bloco de pedra, passando por seu lascamento até a confecção definida; a tecnotipologia ilustra a luta que o homem travou para dominar a matéria e explorar cada vez melhor seu meio. As experimentações de lascamento e a descrição precisa dos artefatos dá uma compreensão quase completa de como era o modo de vida do homem pré-histórico.
Mas o utensílio, por ser produzido pelo homem, insere-se numa realidade, ora concreta, ora complexa, como um elemento de seu cotidiano e sua relação com o habitat, no sentido de sua sobrevivência e domínio do seu território.
Através dos vestígios estudados pode-se afirmar que o sítio Fruxu era um sítio de passagem (acampamento), e, por tanto, que essas populações ficavam na região por um curto espaço de tempo e depois migravam atrás de caça e de alimentos; vegetais; deste modo, pode-se afirmar que a relação que eles tinham com o território era de dependência, pois a sua fixação dependia das possibilidades que encontravam, ou seja, quando o alimento se tornava escasso, eles migravam para outro lugar, não fixando moradia.
Após a análise dos líticos foi feita a análise tecnotipológica dos conjuntos da cerâmica coletada no Sítio Fruxu. Destacaremos os seguintes aspectos: tipos de cerâmica, (gráfico 2 e tabela 2), tipos de antiplástico, técnicas de manufatura e decoração (foto 5).
Classe
378, 83%
19, 4%
3, 1% 43, 9%
4, 1%
7, 2%
Apêndice Base Bolota Borda Lábio Parede
Gráfico 2. Tipos de Cerâmica
Tabela: 2. Quantidade de tipos de cerâmica.
Em seguida foi analisado o antiplástico (gráfico 3 e tabela 3), que é constituído pelos materiais agregados à argila (material colocado na argila para controlar a sua plasticidade), que, no caso estudado são: mineral, caco moído, caco moído e carvão, mineral e caco moído e mineral e madeira, definindo qual era o tamanho dos grãos; dos resultados foram classificados em três categorias: pasta fina, pasta média e pasta grossa. O tamanho dos grãos foi analisado através de lupa e microscópio. Em seguida foi trabalhada a espessura das peças e os tipos de queima, bem como, os tipos de decoração e as técnica de manufatura, se era de acordelamento ou modelagem.
Tipo do Antiplástico
71%
10%
7%
7% 5% Mineral
Caco moído caco moído e carvão
mineral e caco moíodo
mineral e madeira
Gráfico 3 :Tipos de antiplástico.
Tipos de Cerâmica
Base 7
Borda 43
Lábio 19
Parede 378
Bolotas 4
Apêndice 3
Total 454
Tabela: 3 Quantidade de Antiplástico.
Através da análise tecnotipológica do material cerâmico foi possível constatar que existe uma maior quantidade de cerâmicas lisas tanto na parte externa quanto na interna, ou seja, que não receberam tratamento em sua superfície; esse fato pode estar relacionado com a dificuldade que os homens pré-históricos tinham de encontrar matéria-prima para a pintura da cerâmica.
Da análise tecnotipológica consta também o tipo de antiplástico, queima, técnica de manufatura e espessura da parede sendo que para os fragmentos, foram considerados os tipos de borda, tipos de lábios, os diâmetros de boca. No caso específico deste trabalho, a técnica de confecção da cerâmica utilizada foi a de acordelamento em 97%, (gráfico 4 e tabela 4); já a técnica da modelagem aparece somente em quatro peças, demonstrando que a técnica de modelar não era usada com freqüência; em três peças a técnica não foi identificada e elas podem ser consideradas bolotas (massa de argila que não foi usada na confecção da cerâmica) que, através do seu estado, não puderam ser identificadas.
Técnica de Manufatura
97%
3%
Acordelamento Modelagem
Gráfico 4 : Técnica de Manufatura. Quantidade de Antiplástico
Mineral 326
Caco moído 44
Caco moído e carvão 31 Mineral e caco moíodo 31
Mineral e madeira 22
Total 454
Técnica de Manufatura
Acordelamento 439
Modelagem 13
Total 452
Tabela 4: Técnica de Manufatura