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Memória, Narrativa, História Oral: um ensaio acerca da identidade e representação entre os jovens luteranos de Imbituva-PR

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Memória, Narrativa, História Oral: um ensaio acerca da identidade e representação entre os jovens luteranos de Imbituva-PR

WANDERLEY MAYCON LANGE1

Este artigo pretende, a partir de entrevistas e aporte teórico, interpretar e compreender a percepção e representação dos jovens acerca da identidade confessional religiosa na Comunidade Evangélica Luterana (Ressurreição), atualmente vinculada à Igreja Evangélica Luterana do Brasil – IELB, no município de Imbituva, situado na região centro-sul do Estado do Paraná. Segue a importância de uma historiografia a partir de alguns autores referenciais bem como da experiência religiosa dos sujeitos, obviamente, recorrendo aos depoimentos orais. Constitui-se numa síntese “ensaística” acerca dos conhecimentos aprendidos de cunho teórico e metodológico dos usos da história oral ao conhecimento histórico, com ênfase na compreensão das dimensões relacionais entre memória e narrativa utilizadas em seu emprego.

Para além dos referenciais teóricos, foram entrevistados cinco jovens luteranos, membros da Comunidade Evangélica Luterana Ressurreição de Imbituva PR, e que participam do grupo (departamento) de jovens da referida comunidade.

História Oral

A História Oral consiste num recurso metodológico de investigação e pesquisa que busca trazer deveras uma constituição de fontes de instrumentalização para o estudo e abordagens históricas. Alguns a consideram uma técnica, outros uma disciplina, e ainda outros, uma metodologia. É uma ferramenta teórica utilizada por diferentes áreas das Ciências Humanas. Isto significa dizer que é interdisciplinar. A História Oral permite ampliar a compreensão das mais diversas experiências nos mais distintos acontecimentos ocorridos.

Surgiu em meados do século passado, em geral, situada na década de 40, após a Segunda Guerra Mundial. O avanço dos recursos tecnológicos, especialmente com o surgimento

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do gravador de áudio, e a utilização dos mesmos em pesquisas científicas trouxe novas possibilidades e horizontes num campo multidisciplinar das Ciências Humanas, mas especialmente para a História.

A partir daí, a História Oral passa ocupar lugar privilegiado nas discussões teórico-metodológicas nos debates historiográficos. Em suma, tais debates suscitaram a relevância e importância do estatuto da História Oral, suas possíveis contribuições, questões e novos desafios na historiografia mais recente. Tornou-se, assim, interconstitutiva dos mais diversos elementos de reflexão para o campo investigativo historiográfico. Apresenta também outros desdobramentos, como por exemplo, a relação da História Oral com a narrativa e a memória.

Narrativa

Segundo Alessandro Portelli, “história e memória toma forma na narração oral”. (PORTELLI, 2010:19) É, por assim dizer, segundo ele, uma arte multivocal. A história oral se volta à produção de narrativas como fontes do conhecimento, mas principalmente do saber. As narrativas possuem uma relação intrínseca com a memória. São traduções e registros de experiências retidas, possuem a força da tradição e expressam o poder das transformações. História e narrativa se retroalimentam. São pessoas, sujeitos, atores em movimento dinâmico, fluído. Narrativas são uma forma de sistematização verbalizada num diálogo entre interlocutores, a saber, fonte e historiador, entrevistado e entrevistador. Esta relação é pautada pela troca, mútua e recíproca, uma bipolaridade dialógica. Sua forma elaborada através da linguagem verbal proporciona um enredo esquemático criativo, por assim dizer, uma arte. Permite abrir novos caminhos e, consequentemente, novas descobertas. Nestes termos, a História Oral proporciona a multivocalidade, trabalho mútuo de um número plural de a(u)tores dialógicos.

As fontes orais históricas são de ordem narrativa. A narrativa aborda a subjetividade no processo de construção do conhecimento histórico. Cabe ao pesquisador/entrevistador determinar as condições históricas na construção da subjetividade. Alessandro Portelli escreve:

A história oral e as memórias, pois, não nos oferecem um esquema de experiências comuns, mas sim um campo de possibilidades compartilhadas,

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reais ou imaginárias. A dificuldade para organizar estas possibilidades em esquemas compreensíveis e rigorosos indica que, a todo momento, na mente das pessoas se apresentam diferentes destinos possíveis. Qualquer sujeito percebe estas possibilidades à sua maneira, e se orienta de modo diferente em relação a elas. Mas esta miríade de diferenças individuais nada mais faz do que lembrar-nos que a sociedade não é uma rede geometricamente uniforme como nos é representada nas necessárias abstrações das ciências sociais, parecendo-se mais com um mosaico, em que cada fragmento (cada pessoa) é diferente dos outros, mesmo tendo muitas coisas em comum com eles, buscando tanto a própria semelhança como a própria diferença. É uma representação do real mais difícil de gerir, porém parece-me ainda muito mais coerente, não só com o reconhecimento da subjetividade, mas também com a realidade objetiva dos fatos. (PORTELLI, 1996:16)

As narrativas também se configuram como instrumentos de preservação, transmissão das heranças de identidade(s) e das tradições. São caracterizadas pela arte de contar, de interpretar em palavras as experiências da memória. As narrativas possuem a função de transmitir, de geração para geração, as vivências desde a vida cotidiana aos grandes acontecimentos que marcaram. Também se traduzem como suportes de identidades coletivas e da constituição do(s) sujeito(s) no mundo. Possui a capacidade de reter o passado e ser suporte para o mesmo. Produzir narrativas não quer dizer tão somente colher informações. As narrativas são “História em construção” e “memórias que falam”. Memória

A relação entre História (Oral) e memória promoveu importantes estudos e reflexões sobre o conceito de memória “Em uma palavra, muito se fala e se pratica a ‘memória’ histórica (...), mas pouquíssimo se reflete sobre ela”. (SEIXAS, 2004:38) Dentre os estudiosos destaca-se Maurice Halbwachs que, em 1925, pensou um tipo de “sociologia da memória coletiva”; Les Lieux de Mémoire do historiador Pierre Nora (1984); e ainda Memória, Esquecimento, Silêncio (1989) e Memória e Identidade Social (1992) do historiador Michael Pollak.

A História Oral e memória se constituem elementos fundamentais intercambiáveis na produção de sentidos. Memória é produção de imagens, fonte e linguagem. Fontes orais não são somente documentos, pois também são linguagem. Imagem e linguagem se fundem na memória. A memória se processa em imagens conscientes e inconscientes. Produzem a realidade. A fonte é imagética, Oral, enfim múltipla. Não é somente informação, senão também linguagem mesmo que produzida involuntariamente. Para

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Margarida Neves, o conceito de memória é abarcante e possui vários sentidos em suas potencialidades:

O conceito de memória é crucial porque na memória se cruzam passado, presente e futuro; temporalidades e espacialidades; monumentalização e documentação; dimensões materiais e simbólicas; identidades e projetos. É crucial porque na memória se entrecruzam a lembrança e o esquecimento; o pessoal e o coletivo; o individuo e a sociedade, o público e o privado; o sagrado e o profano. Crucial porque na memória se entrelaçam registro e invenção; fidelidade e mobilidade; dado e construção; história e ficção; revelação e ocultação. (NEVES, 1998:34)

A memória, na História Oral, possui uma relação intrínseca com o tempo. Constituem-se, assim, em elementos de um processo único, são lhames, interligados, que se conectam e integram as mais variadas extensões da própria temporalidade e seus movimentos. É na memória que se fundem o tempo presente e passado. Não ocorre tão somente o ato de recordar. A memória revela a dimensão existencial do(s) sujeito(s). Como afirma Lucena, “a história oral fornece ao historiador oportunidades de reconstruir aspectos de personalidades individuais inscritas na existência coletiva, pelo fato de as fontes orais dizerem respeito à memória”.(LUCENA, 1999:23) A arte de lembrar é sempre um ato individual, mas que está moldado pela formação de um grupo e de um meio social. Por isso que as representações são muito importantes também quando se utiliza da história oral, pois elas vão trazer à tona a experiência das pessoas comuns, o modo como em diferentes tempos e espaços uma determinada realidade social é construída. Memória também é representação. É um processo ativo da realidade. Refere-se ao tempo enquanto ser. A historicização do sujeito é um movimento crítico em diálogo com a memória. Memória e Identidade

Um dos elementos fundamentais para o processo de construção da identidade individual ou social, conforme Michel Pollak, é a memória. Em “Memória e Identidade Social”, afirma

A ‘priori’, a memória parece ser um fenômeno individual, algo relativamente íntimo, próprio da pessoa. Mas Maurice Halbwachs, nos anos 20-30, já havia sublinhado que a memória deve ser entendida também, ou sobretudo, como um fenômeno coletivo e social, ou seja, como um fenômeno construído coletivamente e submetido a flutuações, transformações, mudanças constantes.(POLLAK, 1992:201)

Numa referência ao pensamento de Maurice Halbwachs, Pollak concorda de que a memória individual existe sempre a partir de uma memória coletiva, posto que todas as

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lembranças são constituídas no interior de um determinado grupo. Ideias, pensamentos, reflexões, intenções, sentimentos, paixões que, geralmente, atribuímos a nós são, na verdade, inspiradas e delineadas pelo grupo. Halbwachs, quando trata da memória individual, refere-se à existência de uma “intuição sensível”. A partir de entrevistas a jovens luteranos que participam no seu grupo, perguntamos

O que você entende por “identidade luterana”? Vitor Kretschmer, 20 anos, Imbituva PR. (Pensativo) acho que tudo começa com Martinho Lutero na Reforma, ali ele criou uma identidade luterana. Ele colocou como base a justificação pela fé. E até hoje, eu vejo isso, que essa e uma mensagem, essa pureza de doutrina se mantém após 500 anos. Com todo esse tempo, acho que a identidade da igreja esta vinculada a isso. Visto que hoje em dia, muitas igrejas evangélicas, eu penso isso, voltam ao grande problema que existia na igreja católica. E uma nova verdade de carta de indulgências que acontece hoje. Eu acredito que a igreja luterana se manteve fiel a proposta da reforma de Lutero, isso criou uma identidade pra ela, né.2

A identidade é um dos elementos constitutivos nos seres humanos que os difere entre si e os constituem como sujeitos, indivíduos. São nossas especificidades em meio à grande multidão dos seres. A memória é definidora na construção da identidade, ou ainda, na (re)construção das experiências e particularidades de cada indivíduo: sua história de vida. Numa vivência coletiva, gregária, grupal, cada história de vida peculiar atua diretamente na edificação de uma memória “coletiva”. Em sua dimensão pessoal, a memória surge como uma espécie de garantia de nossa identidade e, consequentemente, da identidade do povo que pertencemos.

Evita-se que a experiência religiosa seja captada fora dos indivíduos que a vivem. Pois pretende-se captá-la a partir dos argumentos, da perspectiva, dos significados e das representações dos indivíduos que a vivem, a reelaboram e a inscrevem em seus grupos de referência. Com isto, valoriza-se a experiência religiosa assim como ela é vivida pelos sujeitos desta experiência, e como é articulada na dinâmica dos grupos em que se inscreve. (WIRTH, 2001:27)

Segundo Pollak, na construção das memórias (individuais/coletivas), há três elementos que são tidos por essenciais: a unidade física, a continuidade dentro do tempo e o sentimento de coerência. Eis as características fundamentais à composição do conceito de “identidade”. Ao longo do tempo, da história, o binômio memória-identidade são elementos continuamente construídos e negociados.

Luteranismo

2 Entrevista concedida a Wanderley Maycon Lange por Vitor Kretschmer, 20 anos, no dia 23/01/2015, na

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No que tange, entretanto, especificamente à constituição de um campo de pesquisas a respeito das religiões de matriz protestante, bem como das práticas e costumes desenvolvidos por seus fiéis no Brasil, deparamo-nos com um fenômeno historiográfico mais recente. Uma das explicações para essa característica estaria na própria trajetória dos protestantes no país, a qual se intensificou apenas a partir de meados do século XIX. É preciso considerar, ainda, que cada uma destas religiões de matriz protestante, tal como ocorre em outras crenças, acabam se desdobrando em diferentes vertentes, necessárias à perpetuação do culto em condições específicas dos lugares e tempos em que vivem os fiéis. Em particular, o luteranismo no Brasil se manifesta a partir de diversas denominações. A IELB – Igreja Evangélica Luterana do Brasil – e a IECLB – Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil – constituem-se nas duas principais vertentes. De acordo com Lauri Emílio (WIRTH, 2005:68-77), o protestantismo brasileiro é classificado em três grupos distintos: Protestantismo de Imigração ou Étnico, Protestantismo de Missão e Pentecostalismo. As vertentes protestantes são assim classificadas de acordo com o caráter do trabalho realizado pela instituição religiosa, ou pela forma como esta se estabeleceu no país. Nesse caso, o luteranismo praticado no Brasil, classifica-se como “Protestantismo de Imigração” pelo fato de ter se estabelecido no Brasil como uma comunidade fechada, e tendo o foco dos seus trabalhos nas famílias de imigração alemã.

Segundo Rene Gertz “os historiadores apontam para a presença dos primeiros protestantes no Brasil a partir de 1555, com as invasões francesas. No século XVII retornaram com os holandeses, mas nenhuma dessas duas vindas deixou marcas significativas.”(GERTZ, 2001:9)

O primeiro grupo massivo de protestantes a entrar no Brasil e estabelecer-se definitivamente foram os luteranos, que, a partir de 1819, e em especial depois de 1824, vieram como imigrantes alemães. Várias são as razões para a imigração. Segundo Dreher

Os imigrantes entraram no país como: soldados, povoador, abastecedor de centros urbanos, produtor de pequena propriedade, além de ser usado contra o negro. Foi tido como mão-de-obra barata, esperando-se também de que com ele viesse a ser branqueada a raça.

(DREHER, 1993:7)

A imigração trouxe consigo uma série de questões na nova configuração histórica, política, social, religiosa, dentre as quais: Qual o regime de trabalho para o imigrante?

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Deve ser parceiro ou arrendatário? Deve receber terras ou as terras devem ser doadas aos naturais do país? Não se deveria reciclar os indígenas? Deveriam os estrangeiros serem naturalizados ou não? Poderiam ser funcionários públicos ou deputados? Seus matrimônios poderiam ser considerados válidos ou eram concubinatos? Poderiam ser sepultados nos cemitério existentes? Os imigrantes poderiam vir para as cidades ou deveriam ficar nos campos? Quem os recrutaria e financiaria suas viagens? Cabe-nos lançar um olhar crítico para as profundas transformações sociais, políticas, religiosas, econômicas a partir do seu contexto histórico e suas influências na adesão às diferentes mudanças de identidade e confessionalidade.

Nestes termos, podemos perceber como esta relação “germanismo e religião” se constitui para os participantes do grupo de jovens luteranos.

O que acha da expressão: “igreja dos alemães” atribuída à igreja luterana? Vera Lucia Schneider, 38 anos, Imbituva PR Essa expressão! A gente cresce ouvindo isso que é a igreja dos alemães. Pra nós que somos lá de dentro é normal, né, mas assusta um pouquinho porque o alemão já é um pouco mais frio, mais tradicional. Eu acho que isso espanta! Deveria ter ficado lá atrás essa expressão da igreja dos alemães porque ela não traz assim: Ah, que legal! Pelo menos os que me falam que a igreja dos alemães é uma igreja mais fria, assim, que o pessoal fica cada um mais no seu canto. É o que a gente ouve de fora. Já chegaram a me falar muitas vezes: mas lá são todos assim, os alemães são mais frios, mais grossos, mais na deles.3

Willian Ressai Baskoski, 22 anos, Imbituva PR Bom, eu vejo que a igreja luterana tem essa titulação por ter muitos imigrantes da Alemanha, principalmente do sul, do sul do Brasil e daí do sul saindo pra outros estados: Espírito Santo, Rondônia, então creio que a massa alemã é o que trouxe a igreja pros Estados Unidos e dos Estados Unidos como missões pro Brasil. Então Eu creio que isso é por ter muitos alemães na nossa igreja mas não é que ela seja somente dos alemães, né? Por mim não faz tanta diferença (a expressão: igreja dos alemães). Porque com o passar do tempo ela vai se misturando, né? O Brasil é um país de muita mistura né? Então com o tempo ela não vai ser mais dos alemães, vai ser dos japoneses, dos brasileiros, dos americanos, então ela vai mudar muito, né?4

É preciso pontuar uma questão fundamental no processo de constituição da identidade confessional luterana. De 1580 até 1830 começou a aparecer entre os adeptos da Reforma, muitos pastores e teólogos que fizeram parte de um movimento teológico chamado de Racionalismo. Motivado pelo racionalismo, o rei Frederico Guilherme III, calvinista,

3 Entrevista concedida a Wanderley Maycon Lange por Vera Lucia Schneider, 38 anos, no dia 23/01/2015,

na cidade de Cacoal RO. Áudio 2. Duração 16min32seg.

4 Entrevista concedida a Wanderley Maycon Lange por Willian Ressai Baskoski, 22 anos, no dia

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decidiu que os “evangélicos” deveriam se unir e formar uma só Igreja Evangélica Unida. A Alemanha era um território que fazia parte da antiga Prússia e em geral era luterana, mas havia também calvinistas e reformados de outras confissões. Assim, com o decreto do Rei em 1830, os luteranos eram obrigados a realizar suas atividades eclesiásticas (fazer cultos, batizar, dar Santa Ceia, etc) junto com calvinistas. Isso gerou um “estranhamento confessional”. Um grupo de pastores e leigos luteranos não aceitou esse decreto. Procuraram, então, se organizar numa igreja luterana independente. Essa situação perdurou até 1840, quando o Rei Guilherme III morreu. O novo Rei Guilherme IV foi mais tolerante e consentiu na existência de uma igreja luterana independente. Esses luteranos que se autodenominavam de “confessionais”, com o racionalismo reinante na Alemanha e muitos também em situação econômica precária, resolverem migrar para os Estados Unidos. Assim, poderiam levar adiante a sua religiosidade (entendida aqui como luteranismo confessional) e conservar seus filhos nestas convicções. Essa imigração aconteceu principalmente entre 1840 e 1880.

Em 1847, depois de muitas reuniões, esses alemães residentes nos EUA, formaram uma organização que, mais tarde, veio a se chamar Igreja Luterana – Sínodo de Missouri (Lutheran Church – Missouri Synod). Com o espírito de manter o chamado “luteranismo confessional”, o Sínodo de Missouri, muito cedo se preocupou em fazer missão em outros lugares, principalmente na América do Sul. Já no final do séc. XIX (por volta de 1850), havia no RS cerca de 100.000 luteranos alemães que começaram a ser atendidos por pastores vindos da Alemanha (da Igreja Evangélica Unida da Alemanha) e denominados de “pseudo-pastores”5.

Em 1899, o “Sínodo de Missouri” colocou em pauta a discussão sobre enviar para pastores para a missão no Brasil. E já em 1900, depois de uma doação anônima no valor de dois mil dólares, foi possível enviar o primeiro pastor do “Sínodo de Missouri” para o Brasil: Christian J. Broders. Em 1903 foi fundado o primeiro Seminário Luterano em Bom Jesus (São Lourenço do Sul) e no dia 24 de junho de 1904 foi fundada a Igreja Evangélica Luterana do Brasil, de forte cunho confessional.

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A IELB – Igreja Evangélica Luterana do Brasil – nasceu como uma missão desenvolvida pela Igreja Luterana – Sínodo de Missouri, dos Estados Unidos da América, entre imigrantes alemães residentes no Rio Grande do Sul. A decisão de iniciar esta missão foi tomada em 1899 e, nos primórdios de 1900, o Rev. Christian J. Broders chegou ao Brasil, para colher informações sobre a situação religiosa e sobre as possibilidades de ser iniciada a missão no Brasil. Sua data de fundação oficial ocorre em 24 de junho de 1904.

Esta história tem sua origem na confluência dos seguintes fatores: 1) o assentamento de famílias alemãs (e luteranas) como parte do programa de colonização criado pelo Império em meados do século XIX; 2) o zelo missionário e a preocupação da Igreja Luterana dos Estados Unidos por estas famílias vindas ao Brasil e por toda sociedade em que estavam sendo inseridas: e 3) a necessidade premente e urgente de escolas e igrejas que atendessem tantas famílias no sentido de lhes minorar as carências, também as de ordem espirituais.

O Sínodo Luterano – atual Igreja Evangélica Luterana do Brasil (IELB) – foi fruto das atividades de outro grupo luterano, teuto-estadunidense, o Sínodo de Missouri, fundado por imigrantes saxões nos Estados Unidos em meados do século XIX. A partir de 1900, os luteranos do Sínodo de Missouri passaram a enviar pastores missionários para trabalhar entre os imigrantes alemães no sul do Brasil. (WARTH, 1979)

O processo de imigração dos saxões e a fundação do Sínodo de Missouri ocorreram no contexto de um movimento de despertamento religioso que representou uma reação da antiga fé cristã diante dos desenvolvimentos da racionalidade moderna e de sua influência no seio da religião.

Nesse contexto, o Sínodo, bem como suas instituições afiliadas, construiu desde seus primórdios uma identidade oficial ao redor do que chamo de luteranismo confessional: um modelo de luteranismo que tem oficialmente como normas incondicionais de fé e prática: 1) a Bíblia, considerada como a palavra de Deus inspirada e infalível e 2) as Confissões Luteranas agrupadas no Livro de Concórdia de 1580, consideradas como a verdadeira exposição de tal palavra de Deus. A assunção de que a única interpretação correta da Bíblia, a infalível revelação de Deus, está apresentada no Livro de Concórdia é o critério oficial principal para pertença individual e grupal às instituições do

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luteranismo de tipo ortodoxo-confessional, bem como um fator central na busca pela manutenção da unidade de igrejas e organizações.

Podemos perceber como esta expressão de identidade confessional religiosa se expressa na fala dos entrevistados:

O que significa para você “ser luterano”?

Vitor Kretschmer, 20 anos, Imbituva PR. Ser luterano é uma identidade confessional na minha vida cristã, na minha vida espiritual que tem compromisso com a verdade baseada nas Escrituras Sagradas. Sou luterano por causa disso, né. Significa isso....6

Willian Ressai Baskoski, 22 anos, Imbituva PR Bom, ser luterano pra mim é... creio que nome e titularidade não é o que faz a gente crer, né? Então pra mim o centro é Jesus Cristo. Então independente da igreja luterana ou de qualquer outra igreja o centro pra mim é Jesus Cristo. Mas a igreja luterana, como eu nasci dentro da igreja, isso se torna muito forte, um amor que a gente tem pela igreja, né? Pela nossa igreja e que nos proporciona grandes momentos, grandes encontros por esse meio, por essa instituição. Então a igreja luterana é, digamos, a base da minha vida, por nascer e sempre estar na liderança, de um tempo pra frente, sempre na liderança, e meus pais me ensinaram sempre isso, né? E que a gente tá crescendo dentro da igreja e como a igreja também deve crescer e fazendo ela crescer. É isso.7

Para Arnaldo Érico Huff Junior, o núcleo duro e aglutinador da identidade confessional do “Sínodo de Missouri” e de seu Distrito afiliado no Brasil, o coração de seu sistema religioso oficial e herança forte da reforma do século dezesseis era o dogma que o ser humano é salvo somente pela fé por meio de Jesus, e não por qualquer tipo de boas obras. A salvação eterna, nessa visão, é fruto exclusivo da graça e compaixão de Deus, ao passo que as obras tornam-se uma consequência da vida cristã, não uma necessidade para alcançar a Deus. De acordo com tal concepção, é Deus quem vem aos homens, e não os homens que a ele chegam. A sustentação dessas crenças é garantida pelo entendimento de que elas próprias estão reveladas na Bíblia diretamente por Deus, em sua palavra inspirada e infalível, a qual foi, por sua vez, exposta corretamente apenas nas Confissões Luteranas de 1580. A verdadeira Igreja de Cristo na terra é, por conseguinte, somente aquela que assim se posicionar. Em tais doutrinas não são admitidas alterações de nenhum tipo e os pastores do grupo devem atender ao chamado divino de atalaias e propagadores

6 Entrevista concedida a Wanderley Maycon Lange por Vitor Kretschmer, 20 anos, no dia 23/01/2015, na

cidade de Cacoal RO. Áudio 1. Duração 18min27seg.

7 Entrevista concedida a Wanderley Maycon Lange por Willian Ressai Baskoski, 22 anos, no dia

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dessa verdade. Rejeita-se fortemente qualquer tipo de unionismo ou ecumenismo, o que colocaria em risco a verdade da revelação, e sublinha-se a centralidade do ofício pastoral na condução da doutrina da Igreja em sua pureza. Ao redor desse núcleo duro são derivadas e elaboradas doutrinas, discursos, memórias e identidades que fundamentam ações e políticas individuais e grupais, e que ao mesmo tempo constituem outros núcleos, relativos, por exemplo, às esferas da educação, da missão, da diaconia, entre outras.(HUFF JUNIOR, 2006)

Imigração e Igreja Luterana no Paraná

Assim como outros territórios paranaenses, o Estado do Paraná recebeu, durante várias décadas do século XIX, imigrantes oriundos de distintos países e regiões do continente europeu. Diferentes pesquisadores — em sua maioria diletantes — que se dedicaram ao estudo do processo de povoamento do Estado do Paraná afirmam que essa região foi marcada pelo estabelecimento, a partir do ano de 1876, de colônias de imigrantes alemães originários da região do rio Volga, território da atual Rússia. Tendo em vista que após a verificação dos resultados satisfatórios alcançados na colonização das cercanias de Curitiba houve o estímulo para a expansão dos núcleos colonizatórios para o litoral e para a região dos Campos Gerais.

De acordo com Luiz Fernando Saffraider, o maior contingente desses imigrantes foi alocado em três grandes colônias situadas nos municípios de Ponta Grossa, Palmeira e Lapa. Por diversas razões, o estabelecimento da colônia nos Campos Gerais fracassou, e muitos desses imigrantes acabaram se dirigindo mais ao interior da Província. Localizado na região da cidade de Ponta Grossa, o município de Imbituva (inicialmente conhecido como Cupim) também recebeu um significativo contingente de russos-alemães vindos da região do Volga. (SAFFRAIDER, 2010) De acordo com Cleusi Bobato Stadler,

os retirantes da década de oitenta fixaram-se em outras regiões do Estado, muitos deles no município de Imbituva. [...] Os colonos alemães fixaram residência na direção da estrada que mais tarde ligaria Imbituva a Guarapuava. Ao todo eram 50 famílias mais ou menos. (STADLER, 2005:54)

Os imigrantes (alemães) russos que se estabeleceram em Imbituva professavam a religião evangélica luterana. Segundo Wilhelm Fugmann, a organização de uma comunidade evangélica no município só foi efetuada a partir de 1886 em decorrência de um

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falecimento. Como não era permitido o sepultamento de protestantes em cemitério católico, algumas famílias que professavam as religiões luterana e presbiteriana, uniram-se para a construção de um cemitério protestante na cidade. A partir dessa união, formou-se também a Comunidade Evangélica. Inicialmente, a comunidade não possuía uma identidade confessional religiosa definida, sendo atendida durante os dez primeiros anos por pastores presbiterianos. (FUGMANN, 2008)

Segundo Cleusi T. B. Stadler, de 1886 até 1895 a comunidade era atendida por ministros presbiterianos, sendo que, somente no final deste período, por pastores luteranos de Curitiba, Ponta Grossa e da Colônia Guaraúna. Somente em 1895 um pastor luterano passou a atender a comunidade, o pastor Johannes Dehmlow – da Igreja Luterana da Rússia –, foi o primeiro pastor residente em Imbituva. Este por sua vez foi responsável pela fundação da Escola Paroquial na cidade, hoje denominado Colégio Luterano Rui Barbosa. Dehmlow permaneceu na comunidade até o ano de 1905. Com a saída deste, os luteranos mudaram sua filiação então a um sínodo confessional luterano que tinha seus trabalhos voltados para as regiões do Paraná e Santa Catarina.

Neste período a comunidade de Imbituva foi atendida por pastores alemães filiados a Associação Evangélica de Comunidades de Santa Catarina e Paraná, que em conjunto com outros três Sínodos — Sínodo Riograndense (1886), Sínodo Evangélico-Luterano de Santa Catarina, Paraná e outros Estados do Brasil (1905) e Sínodo das Comunidades Evangélicas do Brasil Central (1912) perfaziam o luteranismo brasileiro. Outros pastores atenderam a comunidade.

De 1938 a 1942 o pastor Bachimont trabalhou nesta comunidade e, em consequência da Segunda Guerra Mundial teve que deixar a comunidade luterana. “Por dois anos o grande rebanho ficou sem pastor.” (STADLER, 2005:92) Foram atendidos pelo Pastor Nilo Strelow da Paróquia vizinha de Bom Jardim do Sul. A Comunidade foi visitada pelo presidente da IELB, Dr. Rodolpho Hasse, e assim se filiou à Igreja Evangélica Luterana do Brasil – IELB conforme o livro de ata nº 1, ata nº 7, com data de 18 de junho de 1943. Devido às imposições ocasionadas pela deflagração da Segunda Guerra Mundial e às então novas políticas do Estado Novo de Getúlio Vargas, filiou-se a outra vertente do luteranismo, neste ano de 1943, o Sínodo Evangélico Luterano do Brasil, atual IELB.

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Este último, criado a partir de uma opção missionária do luteranismo desenvolvida nos Estados Unidos da América, a Deutsche Evangelische Luterische Synode von Missouri,

Ohio und anderen Staaten (Sínodo Evangélico Luterano de Missouri, Ohio e outros

Estados) que, a partir de 1947, passou a denominar-se The Luteran Church-Missouri

Synod (Igreja Evangélica Luterana – Sínodo de Missouri). De acordo com a historiadora

Cleusi Bobato Stadler,

Por causa da Guerra, os alemães passaram a ser perseguidos e os papéis da paróquia foram quase todos extraviados. A língua russo-alemã foi proibida na época, a Igreja fechada e o pastor Adolph Bachimont, desde 1938 em Imbituva, teve que deixar a Comunidade. (STADLER, 2005: 93)

A autora aponta ainda que a solução encontrada pela comunidade, após perder seu pastor, foi a filiação ao Sínodo Evangélico Brasileiro, pois este “tinha seminário próprio e pastores nascidos e formados no Brasil”.(STADLER, 2005:92) Todavia, esses novos pastores, bem como todos os outros que vieram posteriormente, eram de origem teuto-germânica, ou seja, podemos inferir que não houve uma mudança muito significativa, do ponto de vista étnico, na comunidade, uma vez que os novos pastores tinham, em tese, a mesma origem dos membros. Assim sendo, a Comunidade Luterana em Imbituva torna-se uma possibilidade interpretativa que permite empreender estudos sobre cultura e identidades.

Você conhece a história da Comunidade Evangélica Luterana Ressurreição de Imbituva PR?Willian Ressai Baskoski, 22 anos, Imbituva PR Basicamente eu conheço por sempre estar lá e crescer no colégio também. Mas o que eu sei assim é... como ela é uma igreja intitulada como alemã, foram os alemães que trouxeram a igreja, inicialmente pelo que eu sei, ela teve um certo período por causa da guerra, muitos registros foram queimados, foram excluídos. Ela foi uma igreja perseguida. Mas a partir disso, como depois a liberdade de expressão ficou mais evidente, a liberdade religiosa ficou mais evidente então isso aí foi melhorando com o tempo e hoje a igreja luterana é mais forte e mais aberta, não tem problemas quanto a isso. Resumindo, a igreja foi fundada por alemães, a região era muito alemã e com o tempo foi perdido uma parte da história. Eu já fiz trabalho sobre a igreja, sobre o colégio, tentei buscar arquivos e não tive muito sucesso e as informações que eu tive foi que aquilo

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foi, os documentos foram queimados, mas depois foi prosseguido com o trabalho da igreja.8

Identidade e Representação

Nas reflexões sobre memória, Maurice Halbwachs estabeleceu uma clara distinção entre memória individual (interna, pessoal, autobiográfica) e memória coletiva (externa, social e histórica). Conforme ele, o modo de lembrar se constitui, ao mesmo tempo, num fenômeno individual e social. As lembranças são retidas, organizadas e transmitidas, reforçando a memória individual. Tais lembranças coletivas, o indivíduo as lapida conforme sua percepção e consciência particular. Lembrança, dessa maneira, define-se como reconstrução do passado, realizada com a ajuda de informações do presente, e por isso, sujeita a flutuações e mudanças constantes. (HALBWACHS, 1990)

Gostaria que você falasse brevemente sobre você, sua (trajetória de) vida. Vitor Kretschmer, 20 anos, Imbituva PR. Bom, nasci em Imbituva, vivi sempre ali, sempre na mesma escola, escola luterana, Rui Barbosa, me formei no ensino médio la... com o convívio familiar muito forte . Desde criança fui participante dentro da igreja, através do incentivo de meus pais e dos exemplos que tive dos mesmos. Passei por momentos marcantes na minha vida. Um deles foi momento de doença na vida de minha mãe, quando ela teve câncer. Era muito novo, mas tive grandes aprendizados. Faz 12 anos. Tinha 8 a 10 anos. Quando percebi a força de vontade de minha mãe. Ela superou de maneira tranquila pra nós. Não percebi a gravidade. Hoje eu sei o que e que é. Isso foi importante na minha vida porque tive outra visão de vida. Até mesmo depois que entrei no trabalho da liderança da igreja, foi muito importante, eu era tímido, retraído, depois do convite da banda na juventude passei a me desinibir.9

Uma ação subjetiva, pessoal, a vivência do ser humano lhe mostrou que a relação com o outro é dado fundamental de sua constituição. É através das variadas tipificações que o outro nos advém: homem, mulher, jovem, velho... Tais esquemas de tipificação afetam de modo direto nossas relações, podendo ser correspondidos ou não diante de uma interação real. Assim, novamente se torna a realidade constantemente negociada e construída.

8 Entrevista concedida a Wanderley Maycon Lange por Willian Ressai Baskoski, 22 anos, no dia

24/01/2015, na cidade de Cacoal RO. Áudio 3. Duração 20min05seg.

9 Entrevista concedida a Wanderley Maycon Lange por Vitor Kretschmer, 20 anos, no dia 23/01/2015, na

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Gostaria que você me falasse sobre a igreja luterana. Vera Lucia Schneider, 38 anos, Imbituva PR A igreja luterana é a segunda casa, né!? Você tem a tua educação em casa, como você deve agir, como você deve respeitar as pessoas mas vem o alicerce da segunda igreja, o segundo alicerce é a igreja. Você aprende coisas que escuta em casa e não dá valor, talvez dentro da igreja você valorize, você convivendo dentro dela, não só por dizer que você tá lá, você dizer: eu faço parte da igreja. Não, a igreja luterana é uma família. Você tem que agir como se estivesse na tua casa. Pra mim a igreja luterana é uma segunda casa.10

Temos neste trecho da entrevista falas de pertencimento institucional ativada pela memória. A igreja é uma “extensão da casa”. Esta fala traz implicações de toda uma conjuntura de símbolos, valores, cultura, etc, interrelacionados. A memória é uma operação coletiva de acontecimentos e interpretações do passado que buscam “reforçar sentimentos de pertencimento e fronteiras sociais entre coletividades de tamanhos diferentes: partidos, sindicatos, igrejas, aldeias, regiões, clãs, famílias, nações etc.” (POLLAK, 1989:9) Torna-se, segundo o referido autor, um “enquadramento da memória”.

Para vislumbrarmos alguns aspectos da identidade (social) e representação dos jovens luteranos entrevistados acerca de si mesmos, buscamos qual a percepção deles acerca da relação institucional.

O que a igreja luterana requer de seus membros? Vera Lucia Schneider, 38 anos, Imbituva PR Nós como membros devemos nos dedicar a igreja. A maioria das pessoas vai à igreja procurando algo. Tá com problema, vai lá na igreja procurar a solução. A igreja é a solução, mas a palavra de Deus. Ela requer que a gente se dedique a ela, não só nos cultos, não só nos departamentos, mas tem que ser igreja representando pra fora. Tem que levar o que você aprendeu dentro do seu coração pras outras pessoas verem. Eu acho que a igreja precisa dos membros dedicados com o coração aberto. Eu acho que é isso.11

10 Entrevista concedida a Wanderley Maycon Lange por Vera Lucia Schneider, 38 anos, no dia 23/01/2015,

na cidade de Cacoal RO. Áudio 2. Duração 16min32seg.

11 Entrevista concedida a Wanderley Maycon Lange por Vera Lucia Schneider, 38 anos, no dia 23/01/2015,

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Partilhamos a nossa existência com outras pessoas, indivíduos. Convivemos com o outro desde que nascemos. No entanto, a maneira como temos nossas experiências com os outros é variável. Nessa relação construímos ações institucionalizadas. Em suma, são os hábitos, jeitos e costumes de nosso cotidiano, ritualizado ou não, que se tornam perpetuados pelos membros do grupo social que pertencemos.

Algumas características são levantadas como determinantes no modo de “tipificação institucional”. São elas: possuem reciprocidade, caráter típico das ações e atores, surgem como produto de um processo histórico, e, ainda, evidenciam um sistema de controle social com padrões previamente estabelecidos e definidos da conduta humana. Aos poucos os indivíduos vão aderindo passando a viver determinado por este controle social. O processo de institucionalização ganha força própria e, então, passa a existir como exterior e coercitivo (cf. Émile Dürkheim) às ações dos indivíduos. A legitimidade estabelecida implica na construção de uma sociedade imperativa. “Afinal, tudo foi sempre assim.” Homem e mundo social, indivíduo e sociedade, estão num embate pela protagonização da realidade numa constante dialética.

Considerações Finais

O presente artigo pretendeu, a partir de entrevistas e aporte teórico, compreender a percepção e representação dos jovens luteranos como processos de negociação e construção da identidade confessional religiosa na Comunidade Evangélica Luterana em Imbituva, Paraná. É na experiência religiosa dos sujeitos, evidenciados em seus depoimentos orais, que percebemos suas representações e relações estabelecidas com a instituição religiosa. É a memória coletiva de descendentes dos alemães-russos (do Volga) que dá continuidade a essa tradição e fortalece a identidade do grupo. Ela não faz separação entre o passado e o presente. Pois a memória individual se alimenta da memória coletiva e dão continuidade as tradições. A história Oral, nas entrevistas, evidenciou o forte vínculo estabelecido com a igreja (e a germanidade), suas tensões e conflitos.

Referências Bibliográficas

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(17)

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3) GERTZ, René E. “Os luteranos no Brasil.” In: Revista de História Regional. Ponta Grossa, UEPG, 2001,vol. 6, nº 12.

4) HALBWACHS, Maurice. A memória coletiva. São Paulo, Vértice, 1990.

5) HUFF JUNIOR, Arnaldo Érico. Vozes da Ortodoxia. O Sínodo de Missouri e a

Igreja Evangélica Luterana do Brasil: processos de formação e relações nos contextos da I Guerra Mundial e do final do Regime Militar. Tese (Doutorado em

Ciência da Religião). Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF), Juiz de Fora-MG, 2006.

6) LUCENA, Célia Toledo. Artes de lembrar e de inventar: (re) lembranças de

migrantes. São Paulo: Arte & Ciência, 1999.

7) NEVES, Margarida de Souza. “História e Memória: os jogos da memória.” In: MATTOS, Ilmar Rohloff (org.). Ler e escrever para contar: documentação,

historiografia e formação do historiador. Rio de Janeiro: Access, 1998.

8) POLLAK, Michael. “Memória, Esquecimento, Silêncio.” In: Estudos Históricos, 2 (3). Rio de Janeiro, 1989.

9) POLLAK, Michel. “Memória e Identidade Social.” In: Estudos Históricos. Rio de Janeiro, 1992, vol. 5, nº 10.

10) PORTELLI, Alessandro. Ensaios de história oral. São Paulo, Letra e Voz, 2010. 11) PORTELLI, Alessandro. “A Filosofia e os Fatos - Narração, interpretação e

significado nas memórias e nas fontes orais” In: Tempo, Rio de Janeiro,1996, vol. 1, n°. 2.

12) SEIXAS, Jacy Alves de. “Percursos de Memórias em Terras de História: Problemáticas Atuais.” IN: BRESCINI, Stella; NAXARA, Marcia (orgs.). Memoria

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13) SAFFRAIDER, Luiz Fernando. A saga dos alemães do Volga. Curitiba, Juruá, 2010. 14) STADLER, Cleusi Teresinha Bobato. Imbituva – uma cidade dos Campos Gerais.

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15) STEYER, Walter O. Os imigrantes alemães no Rio Grande do Sul e o

Luteranismo: a fundação da Igreja Evangélica Luterana do Brasil e o confronto com o Sínodo Rio-Grandense 1900-1904. Porto Alegre, Singulart, 1999.

16) WARTH, Carlos H. Crônicas da Igreja: fatos históricos da Igreja Evangélica

Luterana do Brasil: 1900-1974. Porto Alegre, Concórdia, 1979.

17) WIRTH, Lauri Emílio. Novas metodologias para a história do cristianismo: em busca da experiência religiosa dos sujeitos religiosos. In: COUTINHO, Sérgio Ricardo (Org.). Religiosidades, misticismo e história no Brasil Central. Brasília: Editora Universa; CEHILA, 2001.

18) WIRTH, Lauri Emílio. “O protestantismo brasileiro de rito luterano.” In: Revista

Referências

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