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Aos inimigos, a lei : Major Vidigal e a dialética da ordem e desordem em Memórias de um sargento de milícias

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Academic year: 2021

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Major Vidigal e a dialética da ordem e desordem

em Memórias de um sargento de milícias

Resumo

O presente ensaio tem como objetivo analisar os aspectos de posição social, ordem e desordem do personagem Major Vidigal na obra Memórias de uma sargento de milícias, de Manuel Antônio de Almeida, sob a ótica da dialética da ordem e desordem examinada por Antônio Cândido em Dialética da Malandragem (1970) e o mecanismo do favor estudado por Roberto Schwarz no artigo As ideias fora do lugar (2000) buscando entender como esses aspectos podem desaguar num Estado ineficiente regado a relações de poder social.

Palavras-chave

Major Vidigal; ordem e desordem; mecanismo do favor.

Erick Alves Heidan

Graduando em Sociologia e Política pela FESPSP (erickheidan@gmail.com)

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Introdução

Memórias de um sargento de milícias é um romance

da literatura brasileira publicado pela primeira vez em folhetins no Correio Mercantil entre os anos de 1852 e

1853, sem nome do autor. Um ano depois, em 1854, a primeira edição em livro é lançada em dois tomos, sendo o tomo II publicado em 18551. É considerado

um dos principais romances da literatura brasileira, e segundo Andrade (1978, p. 303) “estes folhetins iriam constituir um dos romances mais interessantes, umas das produções mais originais e extraordinárias de ficção americana”. Mas se a originalidade de

Memórias de um sargento de milícias é significativa, não

conseguimos dizer o mesmo de sua forma estética, pois “no romance de Manuel d’Almeida nem o fundo nem a forma são admiráveis” (VERÍSSIMO, 1894, p. 294). Assim, o que atrai nesta obra de Almeida é o retrato realista e sarcástico da sociedade brasileira do século XIX, que, destaca Veríssimo (1894, p. 302), “é a sua feição tão profundamente brasileira, o seu nacionalismo não artificialmente procurado, nem intencionalmente estudado, mas natural, fácil, ingênuo”.

Assim, a obra se organiza em torna da figura de Leonardo, “filho de uma pisadela e um beliscão de reinóis imigrantes”, que é enxotado de casa com um pontapé dado pelo pai, Leonardo Pataca, após o romper o casamento com Maria da Hortaliça ao vê-la com outro homem em casa. Logo, o garoto “traquina” e “guloso” foi para os cuidados do padrinho barbeiro (compadre) e da madrinha parteira (comadre), ficando na casa do padrinho de quem nutriu um grande amor. Já na escola Leonardo não levava jeito para os

1 LARA, Cecília de. Introdução. In: Memórias de um sargento de milícias. Edição crítica de Cecília de Lara. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1978.

estudos, mas, ainda assim, o padrinho decide que o melhor para o garoto é a vida religiosa para que tenha um futuro seguro. Com dois anos de escola, Leonardo consegue “ler mal e escrever pior”, mas ainda vendo um futuro eclesiástico para o jovem, o compadre insiste em inseri-lo na vida religiosa. Vislumbrando possibilidade de fazer mais traquinagens, Leonardo vê na vida de coroinha a perceptiva de maiores travessuras e pede para que o compadre o ajude a conquistar o posto na Igreja da Sé. Na igreja não produz mais que “diabruras” com as senhoras que vão participar da missa, além de fazer o padre perder a hora de um sermão e revelar a relação amorosa com a cigana que deveria ser mantida em segredo.

Já adulto, Leonardo se torna um “completo vadio, vaio mestre, vaio tipo” e começa a nutrir uma paixão por Luisinha – menina meio desajeitada –, sobrinha de D. Maria – rica, gorda e de bom coração, era devota e amiga dos pobres. Leonardo começa a querer frequentar mais a casa de D. Maria, que nutria um carinho pelo jovem, para ficar próximo da moça. O compadre e a comadre passam a ajudar Leonardo a conquistar Luisinha e a tirar José Manuel – interessado em casar com a menina para herdar os bens de D. Maria – do caminho. Então a comadre inventa uma história mentirosa para denegrir a imagem de José Manuel perante D. Maria. Esse plano falha, pois, o mestre-de-reza intercede por José Manuel e convence D. Maria que aquela era uma história inventada, desfazendo assim a intriga gerada entre D. Maria e José Manuel.

Após a morte do compadre barbeiro, Leonardo volta para a casa do pai, Leonardo Pataca (agora conhecido como Pataca para não confundir o leitor) e com Chiquinha, filha da comadre e nova esposa do Pataca. A paz dura pouco e após um

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desentendimento entre Leonardo (filho) e Chiquinha, Pataca toma partido da esposa e saca o “espadim em riste” contra Leonardo que foge “pondo dez léguas por hora”. Como andarilho, Leonardo encontra seu antigo companheiro de travessuras da Igreja da Sé, Tomas da Sé, e conhece Vidinha, com quem se apaixona. Leonardo se agrega a família de Vidinha e Tomas da Sé e provoca a ira dos primos que chamam o Major Vidigal para prendê-lo por vadiagem. Simultaneamente, Luisinha casa-se com José Manuel enquanto Leonardo foge do major e volta para a casa de Vidinha.

Agora empregado na Ucharia Real, emprego que a comadre consegue para Leonardo, o jovem se interessa pela mulher do toma-largura, que expulsa Leonardo ao flagrá-lo tomando caldo com sua mulher. Com isso Leonardo perde o emprego e gera os ciúmes de Vidinha, que por sua vez vai tomar satisfações com a mulher de toma-largura. Ele fica encantado por Vidinha e começa a cortejá-la. Com o consentimento e aprovação das tias, toma-largura passa a frequentar a casa e os festejos da família.

Leonardo, enquanto fugia da fúria de Vidinha, é pego pelo M. Vidigal e desaparece por um tempo e quando volta está fardado e transformado em granadeiro. Recebe ordem de prender toma-largura que está embriagado e causando problemas em uma festa na casa das tias de Vidinha. Leonardo concretiza sua vingança contra toma-largura, mas não deixa a vida de vadio por completo. Mesmo com farda, enganava o M. Vidigal, desobedecendo ordens. Numa dessas traquinagens, M. Vidigal descobre e manda prender Leonardo que será chibatado como punição.

Neste momento entra a figura de Maria Regalada, que junto com D. Maria e a comadre vão tentar convencer M. Vidigal de não cumprir essa

punição. As três senhoras procuram convencê-lo, mas o major se mostra irredutível. Contudo, Maria-Regalada chama o M. Vidigal de lado e propõe algo em segredo. Logo após, Leonardo estava solto e de volta a corporação como sargento da Companhia de Granadeiros, sendo promovido. Enquanto isso, José Manuel, marido de Luisinha morre e Leonardo vê renascer a admiração que tinha pela moça. Luisinha se tornou “uma moça espigada, airosa mesmo, olhos e cabelos pretos”.

Depois da missa de sétimo dia de José Manuel, Luisinha e Leonardo decidem se casar, entretanto, o posto de sargento da Companhia de Granadeiros não possibilita que Leonardo constitua família, então, levado o problema para M. Vidigal, que agora vivia com Maria-Regalada – essa foi a promessa que ela fez para que Leonardo fosse solto e absolvido das chibatas –, que promoveu o rapaz a sargento de Milícias, podendo, assim, se casar com Luisinha. Depois de um final feliz, morrem D. Maria e Leonardo Pataca e “uma enfiada de acontecimentos tristes que pouparemos aos leitores, fazendo aqui um ponto final”.

1. A ordem relativa do Major: o público e

o privado

Major Vidigal era o chefe da polícia no Rio de Janeiro no romance de Manuel Antônio de Almeida. Sua fama era de que “não havia beco, nem travessa, nem praça onde não se tivesse passado uma façanha do Sr. major para pilhar um maroto ou dar caça a um vagabundo” (ALMEIDA, 1978, p. 21). Ele é o personagem que está no âmbito da ordem, como vai definir Antônio Cândido. A ordem, nesse contexto, são as “normas estabelecidas” (CÂNDIDO, 1970, p. 330) que tem como grande representante o

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M. Vidigal. Contudo, a ordem da sociedade carioca retratada no romance está subordinada as vontades do mesmo, levando há um questionamento do direito positivo perante a figura do M. Vidigal: “Ora, a lei… que é a lei, se o sr. Major quiser?” (ALMEIDA, 1978, p. 201). Esse questionamento da comadre representa o caráter autoritário de como é vista uma posição social na época do romance, principalmente de um agente que preza pelo cumprimento das leis, pois “o autoritarismo de Vidigal […] diz respeito a uma marca da polícia, naquele tempo. Nesse sentido, o major acumula o papel de simbolizar os desmandos que os senhores da lei estavam autorizados a executar com a roupagem da manutenção da ordem” (CHAUVIN, 2006, p. 53).

O M. Vidigal, por ser o “rei absoluto [… neste] ramo da administração” (ALMEIDA, 1978, p. 21), se apropria das leis e da organização da cidade. Seu papel ultrapassa o de mantedor da ordem. Suas ações superam esta alçada, num movimento que podemos identificar como “encarnação da ordem”, que Cândido explorará, pois

[…] o Major Vidigal, que no livro é a encarnação da ordem, sendo manifestação de uma consciência exterior, única prevista no seu universo. De fato, a ordem convencional a que obedecem os comportamentos, mas a que no fundo permanecem indiferentes as consciências, é aqui mais do que em qualquer outro lugar o policial na esquina, isto é, Vidigal, com a sua sisudez, seus guardas, sua chibata e seu relativo fair-play” (CÂNDIDO,

1970, p. 333-334).

E ainda:

Ele prende Leonardo Pai na casa do Caboclo e o Mestre de Cerimônias na da Cigana. Ele ronda o baile do batizado de Leonardo

Filho e intervém muitos anos depois na festa de aniversário de seu irmão, consequência de novos amores do pai. Ele persegue Teotoninho Sabiá, desmancha o piquenique de Vidinha, atropela o toma-largura, persegue e depois prende Leonardo Filho, fazendo-o sentar na praça tropa. O seu nome faz tremer e fugir. (Ibid, 1970, p. 334)

É um conceito difundido na sociedade que a “repressão policial […] atua como forma de conter as desordens internas, por meio do cuidado com bens, pessoas e lugares” (AUGUSTO, 2013, p. 33), contudo não há uma ideia clara do que é a ordem na sociedade abordada no livro. Na leitura observamos sempre uma tensão do que se pode fazer ou não. A relatividade da lei chega ao ponto de não se reconhecer a culpa, pois ela depende de uma significação que a autoridade indicará, isso criou “um universo sem culpabilidade e mesmo sem repressão, a não ser a repressão exterior que pesa o tempo todo por meio do Vidigal” (CÂNDIDO, 1970, p. 337), pois não há culpa onde não é crime, o que há é apenas o medo de uma punição arbitrária: “O Vidigal! Disseram todos a um tempo, tomados do maior susto” (ALMEIDA, 1978, p. 20).

Essa posição nos mostra uma linha tênue entre o que entendemos como público e como privado. A falta de um Estado regulador da ordem abre espaço para uma “regulação frouxa” da ação privada: “Não era fácil aos detentores das posições públicas de responsabilidade, formados por tal ambiente, compreenderem a distinção fundamental entre os domínios do privado e do público” (HOLANDA, 1995, p. 145). Esta dialética público-privado levou as relações domésticas a um estágio elevado na ação pública, em que Duarte nos mostra como:

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A administração portuguesa não criou o Brasil dirigindo-lhe a colonização, limitou-se em regulá-la deixando que a iniciativa particular espontânea suprisse as deficiências do Estado pobre, oberado de dificuldade externas, vencido pelas suas preocupações religiosas, pelos desastres do oriente, pelo comércio inglês e pela incômoda vizinhança de Espanha. (DUARTE, 1997, p. 39 apud

História Social do Brasil, Tomo I, p. 223)

Compreendendo essa ideia da “encarnação da ordem” que se dá por meio de um Estado ineficiente, levando relações privadas para a vida pública e transformando a ordem em uma ação relativa e individual não conhecida pelos cidadãos, exercendo força quase que exclusivamente em uma classe social com baixo poder de reação, conseguiremos entender melhor a mecânica do favor e como ele se enraíza na sociedade brasileira observada no romance de Almeida. A partir deste aprofundamento, “preferimos utilizar o domínio das relações pessoais” (DAMATTA, 1997, p. 201) para alcançar nossas demandas sociais, porque “[…] as relações que se criam na vida doméstica sempre forneceram o modelo obrigatório de qualquer composição social entre nós” (HOLANDA, 1995, p. 146).

2. O mecanismo do favor

Como vimos anteriormente, a figura do M. Vidigal é a encarnação da ordem na sociedade retratada no romance de Almeida. Ordem essa que se relativiza de acordo com as vontades das autoridades e, principalmente, do próprio major. Vemos muitos exemplos dessa relação de ordem relativa nas ações de Vidigal, uma delas é o episódio em que os primos de Vidinha, injuriados dos gracejos de Leonardo para

com a moça, denunciam o jovem, por vadiagem, ao M. Vidigal que já queria há muito pegar Leonardo. Então Vidinha pergunta: “que mal é que ele fez?”, “Ele não fez nem faz nada; mas é mesmo por não fazer nada

que é que isto lhe sucede” (ALMEIDA, 1978, p. 151) responde o M. Vidigal. DaMatta abordará essa ideia de relativização da lei, em que afirma:

Como diz o velho e querido ditado brasileiro: ‘Aos inimigos a lei, aos amigos, tudo!’ Ou seja, para os adversários, basta o tratamento generalizante sem nenhuma distinção e consideração, isto é, sem atenuantes. Mas, para os amigos, tudo, inclusive a possibilidade de tornar a lei irracional por não se aplicar evidentemente a eles. (1997, p. 217)

“Aos inimigos a lei, aos amigos, tudo!” é o tom deste trecho. Pois todos ali, naquela roda de piquenique, eram vadios, por que justo Leonardo será denunciado e, como podemos observar na frase de Vidigal, condenado?

No episódio da prisão de Leonardo Pataca, que estava participando de uma cerimônia de feitiçaria e é pego pelo major. Após ser preso, Pataca é absolvido por intervenção do Sr. tenente-coronel, que recebeu a visita da comadre com o objetivo de interceder por Pataca: “Agora eu queria que V.S fizesse o favor de falar por ele [Leonardo Pataca] ao Sr. major Vidigal, que foi quem o prendeu” (ALMEIDA, 1978, p. 34). Neste sentido a “ordem e desordem […] extremamente relativas, se comunicam por caminhos inumeráveis, que fazem do oficial de justiça [Vidigal] um empreiteiro de arruaças” (CÂNDIDO, 1970, p. 333). Assim como personagem da ordem, M. Vidigal transita pela desordem por não conseguir manter uma punição, pois sempre há uma súplica e uma força para que a ordem não seja estabelecida, pois

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O mundo hierarquizado na aparência se revela essencialmente subvertido, quando os extremos se tocam e a labilidade geral dos personagens é justificada pelo escorregão que traz o Major das alturas sancionadas da lei para complacências duvidosas com as camadas que ele reprime sem parar. (CÂNDIDO, 1970, p. 335)

Esta “hierarquia subvertida” é consequência da ação do que podemos chamar de “mecanismo do favor” em que o cumprimento (ou não) das normas se consolidam por meio de favores, pois, segundo Schwarz (2000, p. 17), “o favor é a nossa mediação quase universal”. Contudo, a “hierarquia subvertida” não fica mais branda para a classe baixa e os marginalizados quanto podemos imaginar, pois “os casos se passam todos entre gente operária, de baixa burguesia, ciganos, suciantes e os granadeiros do Vidigal” e M. Vidigal era “habilíssimo nas diligências, perverso e ditatorial nos castigos, era o horror das classes desprotegidas do Rio de Janeiro” (ANDRADE, 1978, p. 306). Isso intensifica a relação do favor, porque “o favor é […] o mecanismo através do qual se reproduz uma das grandes classes da sociedade” (SCHWARZ, 2000, p. 16).

A relação que o M. Vidigal tem com alguns personagens faz com que mesmo dentro da classe baixa haja hierarquia de beneficiários, pois “as relações pessoais tomam a precedência, por assim dizer, dos serviços necessários à operação do sistema e dele nunca se divorciam” (DAMATTA, 1997, p. 212). Assim, “quando a Comadre resolve obter o perdão do afilhado é a Vidigal que pensa recorrer por meio de uma nova série de mediações muito significativas dessa dialética da ordem e da desordem que se está procurando sugerir” (CÂNDIDO, 1970, p. 334). Essa mediação pelo mecanismo do favor se

torna bastante claro no encaminhamento do fim da história quando Leonardo, depois de virar granadeiro e ter sido condenado a chibatas, a interseção de uma senhora muda todo o destino da história em que “Maria Regalada […] Ao que parece, promete ir viver com ele ou pelo menos estar de novo ao seu dispor. A fortaleza da ordem vem abaixo ato contínuo e não apenas solta Leonardo, mas dá-lhe posto de sargento” (CÂNDIDO, 1970, p. 334-5) e que depois mudará de novo sua patente o promovendo a sargento de milícias, para que pudesse casar com Luisinha. A história se fecha a partir da ação de Vidigal e de seus favores para que Leonardo entre no ramo da ordem: “Vidigal encarna toda a ordem; por isso, na estrutura do livro é um fecho de abóboda e, sob o aspecto dinâmico, a única força reguladora de um mundo solto, pressionando de cima para baixo e atingindo um por um os agentes da desordem” (CÂNDIDO, 1970, p. 334).

Considerações finais

Como conseguimos observar na apresentação da obra, Memórias de um sargento de milícias faz um

recorte muito fiel ao que era a sociedade brasileira em meados do século XIX. Podemos observar, por meio da leitura de diversos autores que estas características citadas no texto acima ainda conduzem nossas interações. As flutuações que vão da ordem a desordem com extrema facilidade ainda estão presentes em nossas ações cotidianas, tanto na vida pública como na vida privada. Cândido (1970, p. 340) dirá que “no Brasil, nunca os grupos ou os indivíduos encontraram efetivamente tais formas; nunca tiveram a obsessão da ordem senão como princípio abstrato, nem da liberdade senão como capricho”. Nossas

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ações estão mais focadas na força em que podemos exercer por meio do reconhecimento.

Podemos ver essa relação no episódio em que toma-largura ou o Reverendo mestre de cerimônia são pegos pelo major, mas suas punições são abrandadas pela relação que estes têm com poderes maiores: “se bem que gente a última classe, sempre era o toma-largura gente da casa real, e nesse tempo tal qualidade trazia consigo não pequenas imunidades” (ALMEIDA, 1978, p. 181).

Como resultado disto, o mecanismo do favor se consolida como um modus operandi da relação com

a ordem, ao mesmo tempo em que a desordem regulamenta a ordem. Podemos observar nisto uma íntima relação que mistura a ordem pública e a ordem privada, constituindo, assim, um Estado frouxo mediado por relações de poder e de favores em que “a escolha dos homens que irão exercer funções públicas faz-se de acordo com a confiança pessoal que mereçam os candidatos, e muito menos de acordo com as suas capacidades” (HOLANDA, 1995, p. 146).

Referências bibliográficas

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Lara. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1978.

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mandonismo, dominação e impotência em três episódios da literatura brasileira. 2006. 151 f. Tese (Doutorado) - Curso de Programa de Pós-graduação em Teoria Literária, Departamento Teoria Literária e Literatura Comparada, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006. Disponível em: <http:// www.teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8151/tde-14052007-153758/publico/TESE.pdf>. Acesso em: 05 out. 2015.

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