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O USO DOS JORNAIS PARA O CONHECIMENTO HISTORICO: TEORIA E METODOLOGIA

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O USO DOS JORNAIS PARA O CONHECIMENTO HISTORICO: TEORIA E METODOLOGIA

Carlos Henrique Ferreira Leite

Profo Dro José Miguel Arias Neto

(Mestrando em História Social – UEL) Bolsista CAPES DS 2015/2016

Palavras-chave: Historiografia, Imprensa, Jornal.

A disseminação dos meios de comunicação nos últimos trinta anos, particularmente em relação à imprensa, difundiu-se rapidamente nos campos de pesquisa interdisciplinares das ciências sociais e humanas, e seu uso como fonte, objeto de pesquisa histórica e suporte pedagógico tem contribuído para diversas possibilidades de estudo, dentre eles, projetos de pesquisa, trabalhos de conclusão de curso, dissertações de mestrado e teses de doutorado, e consequentemente, fornecido novas problemáticas para os debates teórico-metodológicos no interior destas disciplinas. As fontes da imprensa variam entre jornais locais, regionais, diários, revistas especializadas, militantes, alternativos ou de humor, que podem ser analisados em seus editoriais, colunas sociais, artigos, cartas aos leitores, crônicas, noticias, fotografias e uma infinidade de outras possibilidades.

Assim, ao elaborarmos uma reflexão acerca das contribuições e do papel dos jornais impressos no fazer histórico, torna-se necessário compreender, aprofundar e problematizar os recentes debates entre os historiadores da imprensa nas últimas décadas do século XX e início do século XXI, que abrangem a revolução historiográfica marcada pela “Nova História”. O olhar aprofundado dos historiadores para a imprensa como fonte e objeto de pesquisa histórica tem como marco inicial a década de 1970.

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Segundo a historiadora Tania Regina de Luca (2005), o início deste período apresenta um número escasso de trabalhos que tinham como fonte jornais e revistas para o conhecimento da história do Brasil:

Na década de 1970, ainda era relativamente pequeno o número de trabalhos que se valia de jornais e revistas como fonte para o conhecimento da história do Brasil. A introdução e difusão da imprensa no país e o itinerário de jornais e jornalistas já contava com bibliografia significativa, além de amiudarem-se as edições fac-símiles e os catálogos dando conta de diários e revistas que haviam circulado em diferentes partes do território nacional. (DE LUCA, 2005, p. 111)

Embora houvesse um reconhecimento da importância dos impressos, devido a sua introdução e difusão no país desde o século XIX, e uma vasta produção bibliografia, destaca a resistência dos historiadores em escrever a História por meio da imprensa1.

Assim:

Não se pode desprezar o peso de certa tradição, dominante durante o século XIX e as décadas iniciais do século XX, associada ao ideal de busca da verdade dos fatos, que se julgava atingível por intermédio dos documentos, cuja natureza estava longe de ser irrelevante. Para trazer à luz o acontecido, o historiador, livre de qualquer envolvimento com seu objeto de estudo e senhor de métodos de crítica textual, precisa, deveria valer-se de fontes marcadas pela

objetividade, neutralidade, fidedignidade, credibilidade, além de

suficientemente distanciadas de seu próprio tempo. Estabeleceu-se uma hierarquia qualitativa dos documentos para a qual o especialista deveria estar atento. Nesse contexto, os jornais pareciam pouco adequados para a recuperação do passado, uma vez que essas “enciclopédias do cotidiano” continham registros fragmentários do presente, realizados sob o influxo de interesses, compromissos e paixões. Em vez permitirem captar o ocorrido, dele forneciam imagens parciais, distorcidas e subjetivas (DE LUCA, 2005, p. 112).

No Brasil, a historiadora Maria Helena Rolim Capelato (1988), identificou que na primeira metade do século XX, os historiadores brasileiros se posicionaram de duas formas em relação ao documento-jornal: Com desprezo, ao considerar os periódicos como fontes suspeitas, portanto sem validade; ou com enaltecimento, ao encarar o jornal como repositório da verdade, considerando as notícias como relatos fidedignos dos acontecimentos registrados.

1 Para Tânia Regina de Luca, a crítica feita pela Escola dos Annales a Escola Metódica sobre a concepção de documento na década 30, não significou o reconhecimento dos jornais como fonte histórica.

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Estas posturas perante o documento começaram a ser criticadas na segunda metade do século XX, e entraram em decadência junto com a noção tradicional de documento como espelho do real, da verdade e da objetividade. Neste sentido:

As duas posturas são contestáveis. O jornal não é um transmissor imparcial e neutro dos acontecimentos e tampouco uma fonte desprezível porque permeada pela subjetividade. A imprensa constitui um instrumento de manipulação de interesses e intervenção na vida social. Partindo desse pressuposto, o historiador procura estuda-lo como agente da história e captar o movimento vivo das idéias e personagens que circulam pelas páginas dos jornais. A categoria abstrata da imprensa se desmistifica quando se faz emergir a figura de seus produtores como sujeitos dotados de consciência determinada na pratica social (CAPELATO, 1988, p. 21).

Estas concepções começaram a ser criticadas na segunda metade do século XX, e entraram em decadência junto com a noção de documento como espelho da realidade, da verdade e da objetividade. Novas concepções e perspectivas sobre a fonte jornalística surgiram a partir da década de 70, período em que as críticas a História tradicional e seus métodos pela Nova História, direcionam os novos rumos da historiografia contemporânea e alteram não apenas o modo de fazer história, mas também os métodos sobre a análise e crítica de novos documentos. Com a terceira geração dos Annales, a renovação marxista e principalmente as contribuições de Michel Focault, a historiografia abre-se a proposta de novos objetos, problemas e abordagens.

O diálogo com outras disciplinas das ciências humanas e o processo de alargamento do campo de preocupação dos historiadores com a renovação temática, segundo de Luca, trouxeram contribuições metodológicas importantes para a História, além de forçar o historiador a repensar as fronteiras de sua própria disciplina, assim como a própria concepção e análise crítica dos documentos. Desta forma “se os historiadores estão mais preocupados do que seus antecessores com uma maior variedade de atividades humanas, devem examinar uma variedade maior de evidências.” (BURKE, 1992, p.14).

A ampliação das temáticas e abordagens contribuiu para a proliferação do universo das fontes, e a imprensa que antes era tida como fonte suspeita e sem

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credibilidade, passou a ser considerada como um material de pesquisa valioso e uma das principais fontes de informação e pesquisa histórica. O estudo da fonte jornalística permitiu ampliar os horizontes para novas reflexões e problemáticas nos conhecimentos sobre as sociedades do passado e para a historiadora Maria Helena Rolim Capelato:

A imprensa oferece amplas possibilidades para isso. A vida cotidiana nela registrada em seus múltiplos aspectos, permite compreender como viveram nossos antepassados – não só os” ilustres” mas também os sujeitos anônimos. O Jornal, como afirma Wilhelm Bauer, é uma verdadeira mina de conhecimento: fonte de sua própria história e das situações mais diversas; meio de expressão de idéias e depósito de cultura. Nele encontramos dados sobre a sociedade, seus usos e costumes, informes sobre questões econômicas e políticas (1988, p.21).

Com a ampliação do conceito de fonte, os estudos históricos passam a incorporar de forma crescente os jornais como fonte e objetos de pesquisa histórica. As fontes da imprensa jornalística variam entre jornais locais, regionais, diários, revistas especializadas, militantes, alternativos ou de humor, que podem ser analisados em seus editoriais, colunas sociais, artigos, cartas aos leitores, crônicas, noticias, fotografias e uma infinidade de outras possibilidades. Dada a importância e a ampliação do uso da imprensa e suas possibilidades como objeto e fonte de pesquisa histórica, novos posicionamentos e metodologias do historiador frente a fonte jornalística tornaram-se necessárias para uma escrita da História por meio da imprensa, reconhecendo sua historicidade e problemáticas.

Com o avanço e a diversificação do uso da imprensa periódica nos campos de pesquisa e ensino, tornou-se necessário um aprofundamento teórico-metodológico por parte dos pesquisadores para o tratamento destas fontes. Em suas análises acerca sobre a História e a Imprensa, as historiadoras Heloisa Cruz e Maria Peixoto (2007), destacam que pouco se tem avançado em uma formação específica que prepare os profissionais para uma analise critica destes materiais. A falta de uma metodologia específica levam os pesquisadores e professores a análises descontextualizadas e superficiais. Dentre os problemas destacados por Cruz e Peixoto, a imprensa muitas vezes aparece como “objeto morto”, analisados e estudados fora de seu contexto e historicidade, ou como fonte secundária, utilizadas meramente como fontes de informação.

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As questões iniciais que se propõem a análise do periódico são fundamentais para o direcionamento da pesquisa. Quem são os seus proprietários? Quando foi produzido? A qual público é direcionado? Quais seus objetivos e intenções? Como se constitui enquanto força ativa no seu período de circulação? Como se constitui enquanto sujeito? Qual sua relação com as conjunturas de seu tempo e campos de atuação? Quais seus aliados e opositores?

As respostas a esses questionamentos guiam o historiador para a metodologia de análise do jornal em suas diferentes partes, como os editoriais, as colunas sociais, classificados e propagandas, levando em consideração que a imprensa, não é o espelho da realidade, mas uma representação do real, de momentos particulares da realidade. (CAPELATO, 1988, p.24). O pesquisador ao analisar o periódico enquanto fonte deve buscar em um primeiro momento, identificar no periódico seu título, data de publicação, periodicidade, projeto gráfico, processo de produção, tiragem, preço, circulação e distribuição, além dos atores envolvidos em sua constituição como proprietários, produtores, diretores, e redatores.

Como fonte de análise, o jornal pode ser estudado desde o ponto de vista dos editoriais até o das colunas sociais, passando pela diversidade de outros espaços que o compõem. Nesta composição:

O editorial é o texto que expressa a opinião do Jornal, ou seja, dos sujeitos que estão por trás de sua produção, e “os pesquisadores que se dedicam às análises político-ideológicas privilegiam os editoriais e artigos, que constituem, por excelência, a parte opinativa do jornal. [...] Os jornais oferecem vasto material para o estudo da vida cotidiana. Os costumes, as práticas sociais, o folclore, enfim, todos os aspectos do dia-a-dia estão registrados em suas páginas. Neste tipo de abordagem o pesquisador pode recorrer às colunas sociais, aos “faits divers”, às ilustrações, às caricaturas e as diferentes seções de entretenimento (CAPELATO, 1988, p. 20).

Ao iniciar a análise pela publicação, segundo Cruz e Peixoto propõe-se apreender seu espaço de articulação na configuração de uma determinada conjuntura e os laços que a remetem para outras dimensões ligadas a historicidade daquele tempo. O estudo da Imprensa deve estar sempre em dialogo com outras fontes, que colocam em cena outros sujeitos e práticas sociais, a partir de seu contexto e historicidade. Não se

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deve fazer da história da imprensa um campo isolado, mas estabelecer vínculos e conexões com a história social mais ampla.

Questão central é a de enfrentar a reflexão sobre a historicidade da Imprensa, problematizando suas articulações ao movimento geral, mas também a cada uma das conjunturas específicas do longo processo de constituição, de construção, consolidação e reinvenção do poder burguês nas sociedades modernas, e das lutas por hegemonia nos muitos e diferentes momentos históricos do capitalismo. Pensar a imprensa com esta perspectiva implica, em primeiro lugar, tomá-la como uma força ativa da história do capitalismo e não como mero depositário de acontecimentos nos diversos processos e conjunturas. Como indica Darnton, é preciso pensar sua inserção histórica enquanto força ativa da vida moderna, muito mais ingrediente do processo do que registro dos acontecimentos, atuando na constituição de nossos modos de vida, perspectivas e consciência histórica (2007, p. 257).

O historiador deve estabelecer uma postura crítica frente ao documento jornalístico, e como ponto de partida reconhecer sua inserção histórica como força ativa na vida moderna. A imprensa, segundo elas, deve ser entendida como linguagem e prática constitutiva do social, que com sua própria historicidade e peculiaridades próprias, modelam as formas de pensar e agir, definem papeis sociais, generalizam posições e interpretações que pretendem ser compartilhadas e universais, além de delimitar espaços, demarcar temas e mobilizar opiniões.

Assim, Cruz e Peixoto definem que os jornais atuam:

[...] no fomento á adesão ou ao dissenso, mobilizando para a ação; na articulação, divulgação e disseminação de projetos, idéias, valores, comportamentos, etc.; na produção de referências homogêneas e cristalizadas para a memória social; pela repetição e naturalização do inusitado no cotidiano, produzindo o esquecimento; no alinhamento da experiência vivida globalmente num mesmo tempo histórico na sua atividade de produção de informação de atualidade ; na formação de nossa visão imediata de realidade e de mundo; na formação do consumidor, funcionando como vitrine do mundo das mercadoria e produção das marcas (2005, p.257).

Estas características apontam para o campo de ação da imprensa e sua intervenção na vida social, politica e cultural de uma sociedade.

Diversas produções lançadas nas últimas décadas demonstram a centralidade da imprensa periódica nos estudos das sociedades do passado. Na obra intitulada 200 anos de imprensa no Brasil (2009), as historiadoras Silvia Fonseca e Maria Correia,

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destacam por meio de um levantamento historiográfico das principais obras sobre a imprensa nos séculos XIX e XX, a centralidade da imprensa periódica para a pesquisa histórica, como fonte e objeto de estudo, e sua utilização e contribuição em diversos campos da História Política e Econômica.

Dentre elas, a obra do historiador Nelson Werneck Sodré, História da Imprensa no Brasil (1966), que demonstra um inventário surpreendente em relação a quantidade de jornais que surgiram e circularam no país entre os séculos XIX e XX. Além dos periódicos de grande circulação das grandes capitais, é possível identificar um número expressivo de jornais que não ficaram restritos apenas aos grandes centros, mas também nas cidades do interior.

Atualmente, as catalogações e constituições de acervos físicos e digitais de vários periódicos têm colaborado para um número cada vez mais elevado e variado de pesquisas e produções. Além dos acervos constituídos em museus, bibliotecas, centros de pesquisa e documentação, que disponibilizam os jornais para acesso também por meio de microfilmes ou digitalizados. Os jornais como o Estado de São Paulo, Jornal do Brasil, O Globo, dentre outros, disponibilizam seus acervos na internet para o acesso on-line dos usuários.

Esta disseminação dos meios de comunicação nos últimos trinta anos, particularmente em relação à imprensa, difundiu-se rapidamente nos campos de pesquisa interdisciplinares das ciências sociais e humanas, e no campo da História, seu uso como fonte e objeto de pesquisa histórica e suporte pedagógico nas salas de aula tem contribuído para diversas possibilidades de estudos, constatados nos projetos de pesquisa, trabalhos de conclusão de curso, dissertações de mestrado e teses de doutorado, e consequentemente, fornecido novas problemáticas para os debates teórico-metodológicos no interior destas disciplinas.

Assim, a importância da imprensa periódica na historiografia contemporânea torna-se cada vez mais evidente, a relação estreita entre História e Imprensa nas últimas décadas, tem contribuído de forma significativa para o conhecimento histórico das sociedades do passado, o que levou os historiadores a renovar seus olhares e readaptarem seus posicionamentos e métodos frente a fonte jornalística.

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REFERÊNCAISBIBLIOGRÁFICAS

BURKE, Peter (org.). A escrita da História: novas perspectivas. São Paulo: Unesp, 1992

CAPELATO, Maria Helena. Imprensa e História do Brasil. São Paulo: Contexto/Edusp, 1988.

CRUZ, Heloisa de Faria; PEIXOTO, Maria do Rosário Cunha. Na oficina do

historiador: conversas sobre história e imprensa. Projeto História, São Paulo, PUC,

nº 35, pp. 253-270, Disponível em <http:// www4.pucsp.br/ projetohistoria/ series/series3.html>. Acesso em 22 de Fevereiro de 2014.

DARNTON, Robert e ROCHE, Daniel (orgs.). Revolução Impressa: A imprensa na

França, 1775-1800. São Paulo: Editora Universidade de São Paulo, 1996.

FONSECA, Silvia C. P. de Brito e CORRÊA, Maria Letícia (org.) 200 anos de

imprensa no Brasil. Rio de Janeiro, Contracapa, 2009.

LUCA, Tânia Regina. A história dos, nos e por meio dos periódicos. In: PINSKY, Carla Bassanezi (org.). Fontes Históricas. São Paulo: Contexto, 2005.

SODRE, Nelson Werneck. História da Imprensa no Brasil. Rio de Janeiro: Mauad, 1999.

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