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Evolução da Síndrome de Alport em Crianças Brasileiras The Evolution of Alport Syndrome in Brazilian Children

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Academic year: 2021

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RESUMO

Objetivo: Apresentar a evolução de crianças com Síndrome de Alport e determinar manifestações preditivas de Insuficiência renal crônica. Material e Métodos: Revisão dos prontuários de todas as crianças com diagnóstico confirmado de S. Alport por biópsia com microscopia eletrônica. Resultados: Vinte e dois pacientes, de vinte diferentes famílias, com idade inicial de 7 ± 6.5 anos, com tempo médio de acompanhamento de 8 ± 8 anos foram estudados. A queixa mais freqüente foi de hematúria macroscópica com antecedente familiar de insuficiência renal crônica (IRC), seguida da de hematúria microscópica e antecedente familiar de hematúria . Dezenove casos tiveram evolução pôndero-estatural dentro do canal de crescimento. Hipertensão arterial e anemia somente foram detectadas nos casos com evolução para IRC e após a sua instalação. Perda auditiva neuro-sensorial foi encontrada aos 10 ± 4 anos em 09/22, sendo que todos evoluíram para IRC (p= 0,002). Proteinúria nefrótica surgiu entre oito e 12 anos de idade e somente nos casos com evolução para IRC (p= 0,002). A média do clearance de creatinina nas faixas etárias de 4 a < 8; 8 a <12; 12 a <16 e nos >= 16 anos foram respectivamente de 123,0; 107,1; 84,8 e 69,7 ml/min/1.73 m2. Doze pacientes (seis de cada sexo) evoluíram para IRC classe IV, com idade média de

15 ± 4 anos. Conclusões: A presença de hematúria macroscópica e o aparecimento de perda auditiva neuro-sensorial e proteinúria nefrótica foram preditivos de evolução para IRC terminal. (J Bras Nefrol 2006; 28(4):192-8)

Descritores: Nefrite hereditária. Alport. Crianças.

ABSTRACT

Objective: To present the clinical course of children with Alport Syndrome and determine predictive factors for end stage renal failure. Material e Methods: Revision of charts of patients with Alport Syndrome diagnosed by electronic microscopy of kidney biopsies. Results: Twenty-two patients, from twenty different families, mean age of 7± 6.5 years, mean follow-up of 8±8 years were studied. The most frequent finding was macroscopic hematuria in association with familiar history of chronic renal failure followed by microscopic hematuria in conjunction with familiar history of hematuria. Nineteen patients had weight and stature inside growth channel. Hypertension and anemia only were detected in patients that already had chronic renal failure. Neuro-sensorial hearing loss appeared at the mean age of 10 ± 4 years in 9/22, and all of them developed chronic renal failure (p=0.002). Nephrotic proteinuria appeared when children were between 8 and 12 year-old, and only in patients that developed chronic renal failure (p=0.002). The mean of creatinine clearance in ages from 4 to < 8 years, 8 to <12 years,12 to <16 years, and >= 16 yearswere respectively 123.0, 107.1, 84.8, and 69.7 ml/min/1.73 m2. Twelve patients (six of each sex) developed class IV chronic renal failure, at a mean age of 15 ± 4 years. Conclusion: Macroscopic hematuria, neuro-sensorial hearing loss and nephrotic proteinuria were predictable of progression to chronic renal failure in childhood. (J Bras Nefrol 2006; 28(4):192-8) Keywords: Nephritis Hereditary. Alport. Children.

Evolução da Síndrome de Alport em Crianças Brasileiras

The Evolution of Alport Syndrome in Brazilian Children

Vera Maria Santoro Belangero

1

, Liliane Cury Prattes

1

, Anna Cristina Gervásio Britto

1

, Eliana Mello

Barison

1

, Sumara Zuanazi Pinto Rigatto

1

, Maria Almerinda Ribeiro Alves

2

1Departamento de Pediatria – FCM – UNICAMP; 2Departamento de Clínica Médica – FCM – UNICAMP, Trabalho

apresentado no Congresso Brasileiro de Nefrologia, em Salvador, em setembro de 2004.

Recebido em 20/07/06 / Aprovado em 18/09/06

Endereço para correspondência: Vera MS Belangero

Rua Emílio Ribas 800, 1ºandar 13025-141, Campinas, SP Tel.: (19) 32540220

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INTRODUÇÃO

A descrição inicial da Síndrome de Alport foi feita em 1927 por A. Cecil Alport, em base a dados clínicos e epidemiológicos, estudando famílias com hematúria, insuficiência renal crônica (IRC) e surdez1. Dentre os

vários estudos sobre patogênese da SA, deve-se ressaltar o de Gerald S Spear, em 1975, que concluiu que a doença seria provavelmente causada por mutações em um gene estrutural que atuaria na composição da membrana basal do glomérulo, cristalino e ouvido médio2. Esta idéia foi

recentemente confirmada, com estudos de biologia molecular, demonstrando o envolvimento dos genes do colágeno 4 (col4). Kashtan & Michael em 1996 definiram a SA como uma alteração difusa de membranas basais3

onde o col4 estaria envolvido e, Jais JP et al mais

recentemente (2000) a caracterizaram como uma nefrite hereditária progressiva, com alterações imuno-histoquí-micas e ultraestruturais de membranas basais, associada à hipoacusia neuro-sensorial, envolvendo múltiplas mutações dos genes responsáveis pela formação das cadeias alfa 4,5. Cada molécula de col4é formada por um

trímero de cadeias alfa, conhecendo-se 06 tipos de cadeia alfa, cujos genes se localizam no cromossomo 03 (cadeias 1 e 2); no cromossomo 02 (cadeias 3 e alfa-4) e no cromossomo X (cadeias alfa-5 e alfa-6)3-6.

Como todos os aspectos da molécula de colágeno são essenciais para que a membrana basal (mb) desem-penhe suas funções adequadamente, a formação defei-tuosa do colágeno irá modificar a interação da mb com a rede de laminina, entactina, heparan sulfato e com outras glicoproteínas, promovendo defeitos de permeabilidade e estrutura da mb que podem levar à proteinúria intensa e perda da função renal6,7.

O tipo de herança mais freqüente na SA é o domi-nante ligado ao X (SALX), com mutações no gene da cadeia alfa 5, correspondendo de 65 a 90% dos casos em estatís-ticas internacionais 8 - 1 0. Desde a primeira mutação descrita

na SALX em 1990, até recentemente, mais de 300 tipos de mutações foram encontradas. Tanto a porcentagem de casos de SA com mutações diagnosticadas como a distribuição dos tipos de mutações têm variado bastante entre os estudos, refletindo provavelmente, características regionais, varie-dade na seleção dos casos, ou utilização de técnicas diversas na demonstração das mutações4 , 5 , 1 1.

Na SA autossômica-recessiva, as mutações ocor-rem nos genes das cadeias alfa-3 e alfa-4. Deve-se sus-peitar desta situação quando não existe história familiar de IRC e quando se observa acometimento grave e preco-ce no sexo feminino6,11,12. As alterações moleculares na

SA autossômica dominante ainda não estão bem escla-recidas, mas provavelmente sejam também nas cadeias alfa-3 e alfa-46.

Clinicamente a SA se manifesta como hematúria dismórfica, macro ou microscópica associada ou não à síndrome nefrótica, insuficiência renal e com acometi-mento visual e auditivo, devendo-se suspeitar da doença pelos antecedentes familiares de insuficiência renal crô-nica e/ou hemátúria, havendo a confirmação do diagnós-tico, em nosso meio, pela biópsia renal, que revela afila-mento ou laminação da membrana basal glomerular na microscopia eletrônica6,13. Fazer o diagnóstico da SA é

importante não somente para a conduta do caso como para se indicar o aconselhamento genético familiar4,5,8-10.

A incidência da SA não é conhecida em nosso meio, mas dados indiretos sugerem que ela deva ser signi-ficativa, a ponto de ocorrer como causa não desprezível de IRC. A grande miscigenação, característica da for-mação da população brasileira, torna impredizível uma avaliação teórica.

Assim, tendo em conta a falta de dados da Síndrome de Alport em nosso meio e a relevância destes encontros na prevenção da doença, o objetivo deste estudo é descrever a evolução de alguns aspectos clínicos e laboratoriais que norteiam a suspeita e o diagnóstico da síndrome, deter-minando os fatores de risco para a evolução para IRC.

MATERIAIS E MÉTODOS

Revisão de dados clínicos e laboratoriais dos pron-tuários de todos os pacientes com idade inicial de acompa-nhamento menor de 18 anos e com diagnóstico confirmado de S. Alport por biópsia com microscopia eletrônica, e que tivessem acompanhamento mínimo, no serviço, de 2 anos. Todos os pa-cientes foram seguidos de forma regular, com pelo menos três consultas por ano e pelo menos 2 avaliações laboratoriais por ano, com exceção da ultrassonografia abdominal para avaliação dos tamanhos renais que foi realizada de rotina, após o início da diminuição da função renal. Os dados antropométricos foram obtidos das consultas de rotina, sendo considerado para análise a evolução individual da curva de peso e estatura.

Os dados laboratoriais seguiram a rotina estabelecida pelo Laboratório de Patologia Clínica do Hospital das Clínicas da FCM-Unicamp e incluíram:

- Clearance de Creatinina – amostra urinária de 24h e amostra sanguínea no final da coleta. A creatinina foi medida pela reação de Jaffé no Aparelho Hitachi 917 que realiza automaticamente as dosagens.

- Proteinúria de 24h – amostra urinária de 24h, com Método de Vermelho Pirogallol no Aparelho Cobas Mira Plus:

Padrões utilizados:

Proteinúria anormal – maior que 150 mg/dia Proteinúria nefrótica – maior que 50 mg/kg/dia As avaliações de audiometria foram realizadas pelo Departamento de Otorrinolaringologia da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp, seguindo metodologia clássica, anual-mente. Foi considerado como sugestivo de lesão da Síndrome de Alport somente as perdas auditivas do tipo neuro-sensorial.

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O tipo de herança foi determinado através da história clínica, pela realização do heredograma.

As medidas da pressão arterial foram realizadas durante as consultas médicas, sendo a interpretação das medidas adequa-das às proposições do Task Force de 200414.

A Insuficiência Renal Crônica, classe IV é definida como aquela cujo clearance de creatinina está entre 15 e 29 ml/min/1.73m2.

O tamanho renal foi considerado pelo laudo da ultrassonografia.

O projeto de pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências Médicas da Unicamp. Análise estatística

Foram aplicados testes não paramétricos, sendo a Prova U de Mann-Whitney utilizada para a comparação entre os casos com e sem IRC e o teste de Wilcoxon-Gehan para as curvas de sobrevivência. Para todas as estatísticas o valor de alfa consi-derado foi de 0.05.

RESULTADOS

Foram acompanhados 22 pacientes, correspon-dendo a 20 diferentes famílias, com idade inicial de 7 ±

6.5 anos, com tempo médio de acompanhamento de 8 ± 8 anos. Na tabela 1 são apresentadas as características gerais dos casos:

Apresentação clínica e desenvolvimento pôndero-estatural

A queixa mais freqüente foi de hematúria ma-croscópica com antecedente familiar de IRC, seguida da de hematúria microscópica e antecedente familiar de hematúria, totalizando 86% de casos com antecedente familiar positivo. Todos os casos tiveram evolução pôndero-estatural dentro dos percentis de normalidade com exceção de duas meninas e um menino (protocolo 17, 18, e 19, todos com evolução precoce para IRC). (Figura 1) Evolução da função renal

A média do clearance de creatinina nas faixas etárias de 4 a < 8; 8 a <12; 12 a <16 e em >= 16 anos foram respectivamente de 123.0; 107.1; 84.8 e 69.7 ml/min/1.73 m2. Estes dados demonstram uma fase de

hiperfiltração seguida de queda significativa da função

Tabela 1. Apresentação dos casos de Síndrome de Alport, de acordo com o sexo, idade no início dos sintomas, queixa inicial, tipo da hematúria, tempo de seguimento, evolução para Insuficiência Renal crônica, anormalidade neuro-sensorial na audiometria e desenvolvimento de proteinúria nefrótica

Paciente N°do Sexo Idade de Queixa inicial Tipo de Seguimento IRC Audio-

Protei-protocolo M/F início hematúria (anos) (s/n) metria núria

(anos) Nl/Anl nefrótica

(s/n)

AS 1 M 2 hema+afirc macro 13 S Nl S

FL 2 F 3 hema saf macro 09 S Anl S

SM 3 F 4 hemi+afhe micro 10 N Nl N

LA 4 M 10 hema+afirc micro 05 S Anl S

DA 5 F 4 hema+afirc micro 10 S Anl S

AL 6 M 5 hema+afirc micro 14 S Anl S

MS 7 F 11 hema+afhe micro 06 S Nl S

FS 8 M 6 hemi+afirc macro 08 N Nl S

JM 9 F 3 hemi saf macro 14 S Nl N

LL 10 F 2 hemi+afirc macro 10 N Nl N

JC 11 M 6 hemi+afhe macro 07 N Nl N

CA 12 M 13 hemi+afhe macro 05 N Nl N

FC 13 M 7 hema+afirc micro 11 S Anl S

FO 14 M 3 hema saf micro 17 S Anl S

SA 15 F 11 hemi+afhe macro 04 N Nl N

CM 16 M 10 afhe macro 06 N Nl N

RN 17 F 10 ed+hema+afirc macro 08 S Anl S

SR 18 F 8 hema+afirc macro 09 S Anl S

FL 19 M 9 ed hipoac +afir sem 11 S Anl S

JS 20 M 1 hema+afirc macro 10 N Nl N

AA 21 F 14 hemi+afhe micro 03 N Nl S

CR 22 M 12 hemi+afirc micro 04 n Nl N

Média ± SD 7 ± 6.5 8 ± 8

M=masculino; F= Feminino; hema= hematúria macroscópica; hemi= hematúria microscópica; afir = antecedente familiar de insuficiência renal; afhe= antecedente familiar de hematúria; hema saf= hematúria sem antecedente familiar;

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após os 12 anos. A idade média de evolução para IRC classe IV foi de 15 ± 4 anos. A diminuição da função renal, presente somente durante a puberdade, foi corroborada pelo encontro de tamanho renal dentro dos parâmetros da normalidade, na ultrassonografia, até a instalação da IRC classe IV.

Aparecimento de proteinúria

Proteinúria anormal surgiu após os quatro anos de idade, mas de nível nefrótico somente acima dos 10 anos de idade e somente nos casos com evolução para IRC. Aparecimento da perda auditiva neuro-sensorial

Perda auditiva neuro-sensorial foi encontrada ao longo do tempo em 09/22 casos, na idade de 10 ± 4 anos e somente nos casos com evolução para IRC.

Aparecimento de Hipertensão arterial e Anemia Hipertensão arterial e anemia somente foram detectadas nos casos com evolução para IRC classe IV, e, somente após a sua instalação.

Dados associados à evolução para IRC

Dos casos que evoluíram para IRC (12/22), havia seis casos de cada sexo, não se demonstrando predomínio do sexo masculino.

Aparecimento de proteinúria nefrótica, hematúria macroscópica e perda auditiva neuro-sensorial, foram significativamente associados à evolução para IRC.

Não houve associação do tipo de herança com a evolução para IRC, visto que em um grande número de casos este dado não pode ser determinado (8/22): em um não havia conhecimento dos antecedentes (criança ado-tada); em outro não havia antecedentes sugestivos de SA e nos seis restantes poderia ser aventada a possibilidade de mais de um tipo de herança. (Figuras 3, 4 e 5)

DISCUSSÃO

A Síndrome de Alport não é patologia comum e os dados de incidência variam bastante na literatura inter-nacional. Na Finlândia ocorre em 1: 53000 nascidos vivos8,

cifra bem menor que a referida em Utah onde a frequên-cia do gene é de 1:5000 e na Suéfrequên-cia, de 1/17000 nasci-dos vivos para a SALX9,10. A SA foi etiologia da IRC em

1 a 2% dos transplantes renais (Tx) na Europa; em 2.3% dos realizados nos EUA1 5e correspondeu a 2% de Tx

pediátricos na Índia1 6. Não foram encontrados dados na

literatura nacional, mas a SA foi a causa da hematúria em 7% de uma casuística de 250 crianças investigadas para etiologia de hematúria1 7. Nos registros de etiologia de

transplantes renais realizados em nosso serviço no Hos-pital das Clínicas da FCM - Unicamp, correspondeu res-pectivamente a 7% e a 3% (3/76) dos transplantes renais em pacientes adultos e pediátricos, valores mais elevados

4 6 8 10 12 14 16 4 6 8 10 12 14 16

Figura 1. À esquerda curva de evolução pôndero-estatural em crianças e adolescentes com S. de Alport, no sexo feminino e à direita para o sexo masculino, sendo que o círculo inclui os casos com menores percentis de estatura, utilizando-se como referências curvas de Marcondes RM, Marcondes E, Berquio R, Yunes J, 1982

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Figura 2. Evolução da proteinúria – à esquerda início de proteinúria acima de 150 mg/dia e à direita, aparecimento de proteinúria nefrótica (> 50 mg/Kg/dia) em crianças e adolescentes com S. Alport, com e sem evolução para Insuficiência Renal Crônica.

Figura 3. Distribuição dos casos de crianças e adolescentes com S. de Alport, de acordo com o tipo de hematúria na apresentação clínica da doença e evolução para Insuficiência Renal Crônica

Figura 4. Distribuição dos casos de crianças e adolescentes com S. de Alport, de acordo com o aparecimento de perda neuro-sensorial e evolução para Insuficiência Renal Crônica

que os relatados em outros países9 , 1 5 , 1 6. Isto poderia ser

justificado pela rotina do serviço em realizar microscopia eletrônica em biópsias renais, ou refletir uma incidência realmente maior da síndrome em nosso meio.

É conhecido que as manifestações clínicas da SA variam desde casos com hematúria oligossintomática, mais comumente presente no sexo feminino, até casos com evolução para IRC terminal, mais freqüente no sexo masculino, devido a maior prevalência da doença com herança ligada ao cromossomo X4-6,9-13. Na presente

casuística, 12/22 casos evoluíram para IRC classe IV até a idade de 18 anos, não se observando a predominância do sexo masculino. De acordo com Jais et al o risco de haver IRC, na SA, no sexo feminino, antes da quarta década é

de 12% e para o sexo masculino de 90%4,5. No entanto

estes últimos autores também salientam as grandes diferenças nos tipos de mutações e na relação fenótipo-genótipo que existem entre os estudos realizados na Europa, nos EUA e no Japão, fortalecendo a idéia das diferenças regionais nas manifestações da SA. Desta forma, poder-se-ia levantar a hipótese de que em nosso meio possa existir um número menor de casos com he-rança ligada ao cromossomo X.

Na apresentação clínica da SA houve predomínio da queixa de hematúria acrescida do antecedente familiar de IRC e/ou de hematúria, semelhante ao que é observado na literatura, devendo-se salientar a importância da pesquisa dos antecedentes familiares na investigação

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rotineira de casos de hematúria, visto ser um dos dados de maior correlação com a etiologia, tanto em se tratando de hematúria glomerular como na não-glomerular10,18. Outro

aspecto relevante foi a correlação entre hematúria macroscópica e evolução para IRC, alertando para a gra-vidade deste sintoma, quando em presença de hematúria glomerular. Embora seja citado que hematúria macros-cópica possa ocorrer em até 60% dos pacientes de sexo masculino6, não encontramos dados sobre esta associação

na SA. É importante enfatizar que as hematúrias glo-merulares são frequentemente hereditárias, sendo essen-cial o diagnóstico etiológico para a conduta e acon-selhamento genético19.

Na evolução dos casos chamou a atenção que, diferentemente da maioria das doenças renais hereditá-rias, que levam a retardo do desenvolvimento pôndero-estatural, na SA, a maioria dos pacientes teve preservado o seu desenvolvimento, estando de acordo com a literatura8,10. Duas meninas e um menino alcançaram

valores dos percentis de peso e de estatura próximos ao P3

e, corresponderam aos casos que tiveram IRC terminal antes da puberdade. Vale ressaltar que para os outros casos o desenvolvimento foi adequado, mesmo naqueles com proteinúria de nível nefrótico, semelhante ao observado por alguns autores8.

Proteinúria anormal foi observada em 18/22 pacientes ao longo da observação, sendo que os casos de protocolo nº -s 11, 15, 16 e 22, todos com evolução de mais de 4 anos, nunca apresentaram proteinúria anormal. Proteinúria de nível nefrótico somente foi observada a partir do 10º - ano de vida e correspondeu a um sinal preditivo de IRC. Embora haja escassos dados na

literatura sobre a cronologia do aparecimento da pro-teinúria, proteinúria nefrótica foi associada a lesões histo-patológicas mais graves13 e risco de IRC4-6. O

apare-cimento da deficiência auditiva neuro-sensorial, detectada pela audiometria, foi cronologicamente semelhante ao aparecimento da proteinúria nefrótica, surgindo aos 10 anos e também associada de forma significativa à evolução para IRC. Na literatura a respeito da especi-ficidade da perda auditiva neuro-sensorial em indicar a evolução para IRC há autores que não aceitam esta a s s o c i a ç ã o6 embora autores mais recentes a tenham

citado4,5.

A função renal foi preservada na maioria dos casos até o final da adolescência, sendo que houve indícios de uma fase de hiperfiltração precedendo a IRC terminal (que se desenvolveu de forma abrupta, com queda média de 20 ml/min/ano). Seguindo esta mesma evolução, foi observado que hipertensão arterial e ane-mia somente ocorreram após o aparecimento da IRC, provavelmente como fatores secundários. Estes dados estão de acordo com uma série de casos avaliados na Finlândia por longo tempo, embora a seleção dos casos no estudo citado tenha sido feita sem biópsia renal com microscopia eletrônica7.

Os exames oftalmoscópicos de pesquisa de anormalidades foram realizados de forma muito irregular e por isto não foram computados.

Pode-se concluir que o diagnóstico da SA deve ser sugerido pelos antecedentes familiares conforme é definido na literatura. Na evolução clínica, chama a atenção o elevado número de casos do sexo feminino com evolução para IRC, sugerindo um menor número de casos com herança ligada ao X, com implicações importantes quanto ao aconselhamento genético. Deve-se estar alerta para o aparecimento de hematúria macroscópica, proteinúria nefrótica e diminuição da acuidade auditiva neuro-sensorial, visto que estes sinais foram preditivos de evolução para IRC.

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Figura 5. Distribuição dos casos de crianças e adolescentes com S. de Alport, em função da evolução para IRC e do tipo de herança

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5. Jais JP, Knebelmann B, Giatras I, De Marchi M, et al. X-linked Alport syndrome: natural history and genotype-phenotype correlations in girls and women belonging to 195 families: a “European Community Alport Syndrome Concerted Action” study. J Am Soc Nephrol 2003; 14:2603-10. 6. Grünfeld JP, Knebelmann B, Davison AM, Cameron JS, et al.

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Referências

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