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O porquê de uma nova definição de activo

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A necessidade de existir um suporte conceptual que sirva de base à reflexão sobre os problemas que estão na origem da promulgação, alteração ou revogação de normas de contabilidade financeira e à discussão desses problemas e das solu-ções alternativas que relativamente a eles se apresentam é reconhecido pelos princi-pais intervenientes do processo de regula-ção contabilística praticamente desde há várias décadas.

Uma estrutura conceptual da informa-ção financeira é um documento, no qual se desenvolve, formaliza e estrutura um conjunto de conceitos e princípios de contabilidade que subjazem à preparação e comunicação da informação financeira, que tem como propósito constituir-se como tal suporte conceptual.

Apesar do reconhecimento da sua importância, foi só nas últimas quatro décadas que os próprios organismos de regulação contabilística reclamaram para si a tarefa de desenvolver esse tipo de documentos. Foi nos EUA que o primei-ro documento desse tipo foi desenvolvi-do, tendo-se trilhado rapidamente o mesmo caminho noutros países anglo-saxónicos, nomeadamente, na Austrália, no Canadá, na Nova Zelândia e no Reino Unido. Mais recentemente, em países como a França e a Espanha, ocorreram tentativas mais ou menos do mesmo cariz.

Nas estruturas conceptuais tem-se pro-curado responder a questões relacionadas com os objectivos da informação finan-ceira, as suas características qualitativas, as definições dos elementos das demons-trações financeiras (por exemplo, activo, passivo, gasto e rendimento) e os crité-rios para o seu reconhecimento e mensu-ração.

As normas contabilísticas são actual-mente estabelecidas tendo como referên-cia um enquadramento conceptual que é em grande medida partilhado pelos prin-cipais organismos de regulação contabi-lística. Este enquadramento conceptual tem como exemplo paradigmático a

“Estrutura Conceptual para a Preparação e Apresentação das Demonstrações Financeiras” do International Accounting

Standards Board (IASB) (cf. IASB,

1989).

No entanto, este enquadramento conceptual não é algo que se possa defi-nir em determinado momento do tempo e esperar-se que se mantenha actual e ade-quado ao contexto sócio-económico inde-finidamente ou mesmo por períodos de tempo muito prolongados. Ele deve ser permanentemente questionado e pensado, no sentido de o melhorar e adequar à rea-lidade que pretende representar, ela pró-pria em constante mutação.

Por isso, o IASB e o Financial

Accounting Standards Board (FASB)

(dos EUA) decidiram recentemente, em Outubro de 2004, iniciar um projecto conjunto para desenvolver uma estrutura conceptual comum, baseada nas suas estruturas conceptuais já existentes. Este projecto deu já origem a várias propostas, entre as quais se destaca a de uma nova definição de activo como base para tra-balho futuro.

Procura-se neste texto explicar a neces-sidade de uma nova definição de activo através da análise crítica das definições oferecidas naquelas que se considera serem as principais estruturas

concep-tuais propostas até ao momento [a do FASB, a do IASB e a do Accounting

Standards Board (ASB) (do Reino

Unido)]. Argumenta-se nomeadamente que é possível vislumbrar uma evolução nessas definições e reconhecer uma delas como sendo mais apropriada. Assim, na segunda secção, faz-se uma análise da definição de activo nas principais estrutu-ras conceptuais e analisa-se a sua evolu-ção. Na terceira secção, à luz dos argu-mentos apresentados na secção anterior, analisa-se de uma forma crítica a nova proposta de definição de activo. Na últi-ma secção, retiram-se alguúlti-mas conclusões. A importância da definição de activo nas estruturas conceptuais e a sua evolução

Na elaboração das estruturas concep-tuais, uma das questões mais fundamen-tais prende-se com a definição dos ele-mentos das demonstrações financeiras. A selecção dos elementos mais fundamen-tais de cujas definições decorreriam as definições dos demais tem sido fonte de alguns dos mais interessantes debates. Têm sido apresentadas duas visões alter-nativas consoante se opta pela selecção de activos e passivos ou de rendimentos e gastos como elementos fundamentais (cf. FASB, 1976; Sprouse, 1978; Miller,

O porquê de uma nova

definição de activo

por Manuel Castelo Branco

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1990;Storey e Storey, 1998)(1). A atribui-ção do primado conceptual aos activos e passivos ou aos rendimentos e gastos na definição dos elementos das demonstra-ções financeiras tem a ver com a existên-cia de duas perspectivas diferentes sobre o conceito de resultado.

De acordo com a perspectiva que se traduz na atribuição do primado concep-tual aos rendimentos e gastos, a determi-nação do resultado de um período faz-se através da identificação dos rendimentos e gastos desse período e do seu correcto balanceamento. Nesta perspectiva, acti-vos e passiacti-vos são considerados como resíduos que devem ser transportados para períodos futuros, podendo incluir elementos que não são verdadeiros recur-sos económicos e obrigações, se a consi-deração desses elementos no balanço é necessária para assegurar um balancea-mento adequado e evitar distorção dos resultados.

De acordo com a perspectiva que se traduz na atribuição do primado concep-tual aos activos e passivos, o resultado é visto como a alteração no valor obtido pela subtracção dos passivos aos activos no início e no fim do período e os rendi-mentos e gastos são vistos como resultan-do de alterações no valor resultan-dos activos e passivos.

Os principais organismos de regulação contabilística que elaboraram estruturas conceptuais, nomeadamente o IASB, o FASB e o ASB, optaram por atribuir o primado conceptual a activos e passivos, ou seja, “as definições da todos os outros elementos das demonstrações financeiras são derivadas das definições de activos e passivos” (Storey e Storey, 1998: 123).

No entanto, como refere Scott (2002: 165), embora todas atribuam o primado conceptual a activos e passivos, as defini-ções de tais elementos são “surpreenden-temente diferentes”. Na verdade, as maiores diferenças entre as várias estru-turas conceptuais têm a ver com as

defi-nições dos elementos das demonstrações financeiras (op. cit.: 170). Neste texto, analisam-se apenas as definições de acti-vo oferecidas naquelas que se considera serem as mais importantes estruturas conceptuais desenvolvidas até ao momento (cf. Quadro 1), argumentando-se que é possível obargumentando-servar uma evolução nelas e optar por uma em particular.

Enquanto na definição do FASB o acti-vo é o benefício, na definição do IASB o activo é o recurso que dá origem ao bene-fício e na definição do ASB o activo é o direito ou acesso ao benefício. É de salientar o facto de que nas três estruturas conceptuais se considera que o activo deve estar sob o controlo da entidade e ter origem em transacções ou acontecimen-tos passados. Além disso, em nenhuma delas se referem a tangibilidade e a pro-priedade legal como requisito para a qua-lificação de um item como activo nem se considera que um activo deve ser separá-vel do resto da entidade.

Samuelson (1996: 150) aponta algu-mas deficiências da definição de activo do FASB, relacionadas com:

„o termo “benefícios económicos” poder ser entendido seja num sentido financeiro ou num sentido não--financeiro, o que confunde a definição de activos com a medida dos activos;

„faltar-lhe conteúdo empírico, porque confunde stocks e fluxos ao definir activos, que são stocks, em termos de benefícios económicos futuros, que são fluxos;

„enfatizar mais as características econó-micas dos activos (os benefícios da riqueza) do que as suas características legais (os direitos a usar a riqueza). Ao definir os activos como benefícios económicos futuros prováveis e associar tais benefícios com fluxos de caixa futu-ros quando se afirma que eles “eventual-mente resultam em influxos líquidos de caixa para a empresa” (FASB, 1985: § 28), parece dar-se a entender que “os acti-vos são influxos de caixa esperados ou custos que se espera serem recuperados através de influxos de caixa futuros (ou rendimentos)” (Samuelson, 1996: 148). Ora, essa perspectiva parece ligar a defi-nição de activos ao conceito de balancea-mento de rendibalancea-mentos e gastos, o qual está associado à perspectiva que atribui o primado conceptual aos rendimentos e gastos. Essa última perspectiva faz depen-der a definição dos activos e passivos da definição dos rendimentos e gastos.

Para Samuelson (1996: 149), uma defi-nição de activos que seja consistente com a atribuição do primado conceptual aos activos e passivos deve desassociar os activos dos rendimentos ou influxos de caixa esperados, devendo antes identifi-cá-los com “as suas características não-financeiras, legais e económicas”. Para esse autor, “a interpretação dos benefí-cios económicos como influxos de caixa significa uma confusão de definição e medida” (op. cit.: 151).

O IASB também identifica o benefício económico futuro com o “potencial de contribuir, directa ou indirectamente, para o fluxo de caixa e de equivalentes de caixa para a empresa” (IASB, 1989: § 53). No entanto, ao definir o activo como o recurso que dá origem aos benefícios económicos, o IASB não só não é tão

vul-Quadro 1 – A definição de activo(s)

Activo(s)

FASB (1986: § 25)

Benefícios económicos futu-ros prováveis obtidos ou con-trolados por uma entidade particular como resultado de transacções ou acontecimen-tos passados.

IASB (1989: § 49)

Recurso controlado pela em-presa como resultado de acon-tecimentos passados e do qual se espera que fluam para a empresa benefícios económi-cos futuros.

ASB (1999: § 4.6)

ASB (1999: § 4.6)Direitos ou outro acesso a benefícios eco-nómicos futuros controlados por uma entidade como resul-tado de transacções ou acon-tecimentos passados.

“...ao definir o activo como

o recurso que dá origem aos

benefícios económicos,

o IASB não só não é tão

vulnerável à crítica da

confusão entre definicão

e medida como também

escapa à crítica da confusão

entre

stocks

e fluxos.”

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nerável à crítica da confusão entre defini-ção e medida como também escapa à crí-tica da confusão entre stocks e fluxos.

Vários autores criticam a definição de activo apresentada pelo FASB pelo facto de não ser muito claro que se refira a algo real (Kam, 1990; Schuetze, 2001; Williams, 2003). Kam (1990: 104) considera que a definição de activo do FASB não torna claro que “um activo se refira a algo real” e que “embora serviços futuros possam ser a essência de um activo, devemos ser cautelosos em o definir em termos reais”, preferindo por isso a referência aos acti-vos como recursos económicos. Embora considere que, nas definições de activos, passivos e capital próprio do FASB, “todos os elementos essenciais são men-cionados”, Kam não concorda com a “sua sintaxe, a forma como as palavras são juntadas” (op. cit.: 127). Kam justifica a esta sua opinião argumentando que é necessário “assegurar que os conceitos estão baseados em objectos do mundo real” (ibid.). Nesta perspectiva, a ção proposta pelo IASB melhora a defini-ção proposta pelo FASB.

Outra das principais fraquezas aponta-das à definição de activo do FASB rela-ciona-se com o facto de enfatizar mais as características económicas dos activos (os benefícios da riqueza) do que as suas características legais (os direitos a usar a riqueza) (Samuelson, 1996). Baseando-se numa tipologia de activos onde se consi-deram recursos produtivos (incluindo direitos contratuais sobre recursos produ-tivos), produtos, dinheiro, direitos a rece-ber dinheiro e direitos de propriedade

sobre outras empresas, Samuelson (op. cit.: 152) considera que “o que distingue todas estas coisas como activos não é o serem recursos económicos, mas o serem direitos a usar riqueza”.

Samuelson argumenta no sentido de definir activos como direitos de proprie-dade, não estando esse conceito limitado, apenas, a interpretações legais de pro-priedade (op. cit.: 153). Além disso, ao contrário de Schuetze (2001), Samuelson não considera que a venalidade de um elemento seja condição necessária para que seja considerado como um activo, embora seja condição suficiente (Samuelson, 1996: 154).

Nesta perspectiva, a análise do ASB é a que vai mais longe na correcção da defi-ciência em análise. De facto, é claramen-te enfatizado que “um activo não é o pró-prio item de propriedade, mas antes os direitos ou outro acesso a alguns ou todos os benefícios económicos futuros deriva-dos do item de propriedade” (ASB, 1999: § 4.8). Sublinha-se que o termo “item de propriedade” é usado para estabelecer a diferença entre “o controlo de direitos ou outro acesso a benefícios económicos futuros (o activo) e a coisa a partir da qual esses benefícios económicos futuros são derivados (o item de propriedade)” (op. cit.: 48n).

De acordo com o ASB, um determina-do item de propriedade pode dar origem a activos de mais do que uma entidade. Se duas entidades controlam os direitos a diferentes benefícios económicos futuros derivados do mesmo item de proprieda-de, ambas as entidades terão activos. No

entanto, embora o item de propriedade subjacente ao activo seja o mesmo, os activos serão diferentes porque os benefí-cios económicos futuros são diferentes. (ASB, 1999: § 4.20)

O que provoca alguma perplexidade é o facto de se referir que os activos podem ou não ser tangíveis (op. cit.: § 4.7), uma vez que os direitos são por natureza intangíveis. Na verdade, de acordo com a perspectiva que e encontra na base da definição de activo apresentada pelo ASB, os activos nunca são algo de tangí-vel, o que pode ser ou não tangível é o elemento a partir do qual poderão ser obtidos benefícios económicos futuros.

O ASB (op. cit.: § 4.12) afirma clara-mente que um activo pode existir mesmo quando não existe um direito legal, dando o exemplo de uma invenção não paten-teada. Mais ainda, o controlo exercido não necessita de ser legalmente sanciona-do, o que significa que sanções de nature-za económica ou social podem ser consi-deradas quando elas são eficazes em induzir as entidades a cumprir promessas ou agir de acordo com práticas ou costu-mes de aceitação generalizada (op. cit.: § 4.18).

Para além disso, afirma-se claramente que embora os benefícios económicos futuros resultem eventualmente em influxos líquidos de caixa para a entida-de, os activos não são “sempre represen-tações directas dos fluxos de caixa: eles são direitos e outro acesso aos benefícios económicos futuros que podem gerar ou ser usados para gerar fluxos de caixa futuros” (op. cit.: § 4.15)

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Como se vê, é a definição do ASB aquela que mais se aproxima de uma definição que corrija as três fraquezas fundamentais apontadas por Samuelson (1996) à definição do FASB e que, do ponto de vista da definição dos elementos das demonstrações financeiras, mais parece afastar-se da abordagem mais tra-dicional que dá lugar a uma perspectiva que atribui o primado conceptual aos pro-veitos e custos.

Do ponto de vista que se defende neste texto, considera-se que as críticas de Samuelson (1996) à definição do FASB são, na sua generalidade, pertinentes e que as deficiências apontadas foram sendo, progressivamente, corrigidas nas estruturas conceptuais do IASB e do ASB.

A nova proposta de definição de activo

O IASB e o FASB decidiram recente-mente, em Outubro de 2004, iniciar um projecto conjunto para desenvolver uma estrutura conceptual comum, baseada nas suas estruturas conceptuais já existentes (cf. Bullen e Crook, 2005). Este projecto deu já origem a várias propostas, entre as quais se destaca a de uma nova definição de activo que servirá como base para futuro trabalho (cf. IASB, 2005).

Bullen e Crook (2005), respectivamen-te FASB Senior Project Manager e IASB

Senior Project Manager, escreveram um

texto em que se reconhecia a diferença relativa ao facto de a estrutura do FASB se referir ao activo como prováveis futu-ros benefícios económicos e a do IASB o definir como recurso, colocando a ques-tão de o activo ser o recurso ou o

benefí-cio futuro. Estes autores reconheciam que para que fosse possível fazer convergir as duas estruturas, seria necessário resolver as diferenças sobre os elementos das demonstrações financeiras, nomeada-mente “refinar e clarificar” as definições de activo e passivo. Entre as questões mais importantes a resolver relativamen-te à definição de activo, Bullen e Crook referiam as de saber se deveria o termo “controlo” permanecer na definição de activo ou tornar-se parte dos critérios de reconhecimento e qual o seu significado,

o que seria o acontecimento que resulta-ria numa entidade “obter ou controlar” um activo e se seria essa a questão cor-recta.

Entre 13 e 16 de Dezembro, numa reu-nião do IASB ocorrida em Londres discu-tiu-se, entre outros assuntos, a estrutura conceptual comum do IASB e do FASB. Nessa reunião, foi apresentada e discuti-da uma definição de activo de acordo com a qual um activo de uma entidade é considerado como “um direito presente, ou outro acesso, a um recurso económico existente com a capacidade de gerar benefícios económicos para a entidade” (cf. IASB, 2005).

É possível considerar que esta propos-ta de definição de activo se baseou não só nas definições apresentadas pelo IASB e pelo FASB, mas também na definição apresentada pelo ASB, podendo assim assumir-se que foi reconhecida a evolu-ção de que se deu conta na secevolu-ção ante-rior e a utilidade da definição do ASB. No entanto, relativamente à definição pro-posta pelo ASB e atrás analisada, é possí-vel detectar três diferenças:

„o activo é o direito, ou outro acesso, à coisa (o recurso económico) a partir da qual benefícios económicos poderão ser obtidos e não aos benefícios económicos;

„ausência de referência à necessidade de ter ocorrido uma transacção ou acon-tecimento que proporciona o direito, ou outro acesso, ao recurso económico;

„ausência de referência explícita à no-ção de controlo.

Com base numa perspectiva que enfa-tiza o aspecto da troca de direitos mais do que de objectos, considera-se neste texto que a definição de activo enquan-to direienquan-to ou outro acesso a um recurso que tem a capacidade de gerar bene-fícios económicos ou aos benebene-fícios económicos dele derivados é mais apro-priada do que aquela que o considera como sendo o próprio recurso. A nova definição representa, assim, uma evo-lução relativamente às definições exis-tentes do IASB e do FASB. Todavia, considera-se também que seria preferí-vel considerar um activo como um direito, ou outro acesso, aos benefícios económicos que poderão ser obtidos a partir de um determinado elemento e não ao próprio elemento. Na verdade, considera-se que é o direito ou outro acesso aos benefícios económicos gera-dos a partir de um determinado elemen-to o que está verdadeiramente em causa. Prefere-se, portanto, a terminologia uti-lizada pelo ASB.

“Como se vê, é a definicão do

ASB aquela que mais se

aproxima de uma definicão

que corrija as três fraquezas

fundamentais apontadas por

Samuelson (1996) à definição

do FASB e que, do ponto de

vista da definicão dos

elementos das

demonstracões financeiras,

mais parece afastar-se da

abordagem mais tradicional

que dá lugar a uma

perspectiva que atribui o

primado conceptual aos

proveitos e custos.”

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Relativamente à ausência de referência à necessidade de já ter ocorrido uma transacção ou acontecimento que propor-ciona o direito aos benefícios económicos futuros, é interessante notar que tal refe-rência era contestada nomeadamente por Hendriksen e Van Breda (1992: 456) e Solomons (1997: 29). Estes autores con-sideravam que se existem benefícios eco-nómicos e se encontram sob controlo da empresa é porque decorrem de algum acon-tecimento passado, não devendo a defini-ção de activo incluir aquela referência.

A referência à necessidade da transac-ção ou acontecimento que proporciona o direito aos benefícios económicos futuros já ter ocorrido é importante para que não se tenha uma definição excessivamente abrangente e se possa, por exemplo, considerar que a mera intenção de adqui-rir um bem no futuro conduza à sua consideração como activo (cf. AECA, 1999; Kam, 1990). Nesta perspectiva, o facto de se referir na definição agora pro-posta que se trata de um recurso econó-mico “existente” pode ser entendido como o reconhecimento de tal necessida-de. Portanto, apesar de não haver referên-cia à necessidade da transacção ou acon-tecimento que proporciona o direito aos benefícios económicos futuros já ter ocorrido, esta noção encontra-se implici-tamente considerada na definição apre-sentada.

Relativamente à ausência da noção de controlo da definição de activo, poderão ser aqui pertinentes as críticas que Colasse (1996) apontava às definição de activos e passivos da Ordre des Experts Comptables (OEC) francesa (cf. OEC, 1996). O argumento de Colasse (1996) era o de que ao dizer-se apenas que um activo (passivo) é um elemento que tem um valor económico positivo (negativo) para a empresa e que deve poder ser representado pela sua potencialidade de transformação em dinheiro excluindo qualquer referência à noção de patrimó-nio, estaria a dar-se uma definição “extre-mamente vaga porque existe uma infini-dade de elementos susceptíveis de ter um valor económico positivo (ou negativo) para a empresa, o ar por exemplo” (Colasse, 1996: 32).

Nesta perspectiva, seria também possí-vel dizer-se que a nova definição propos-ta é extremamente vaga. No enpropos-tanto, há que esperar pelo que se irá dizer sobre o que são recursos económicos, uma vez que uma apropriada definição destes poderá resolver esta questão. No entanto, levanta-se aqui a dúvida quanto ao facto

de saber se é mais apropriado fazer com que a noção de “controlo” apareça na definição de activo ou se torne parte dos critérios de reconhecimento (cf. Bullen e Crook, 2005). É bem verdade que a noção de controlo é complexa, mas não a incluir na própria definição, remetendo-a para os critérios de reconhecimento, tal-vez não seja a melhor opção.

Do ponto de vista que se defende neste texto, um activo é um direito, jurídica, económica ou socialmente sancionado, a benefícios económicos futuros controla-do por uma entidade como resultacontrola-do de transacções ou acontecimentos passados. Ou seja, existe um activo se existe algu-ma espécie de protecção do direito do proprietário a obter os benefícios econó-micos futuros derivados da utilização do elemento a partir do qual eles poderão ser obtidos. Nesta perspectiva, os activos nunca são algo de tangível, o que pode ser ou não tangível é o elemento a partir do qual se poderá obter benefícios econó-micos futuros. Por isso, apesar de ser uma evolução relativamente às definições de activo do FASB e do IASB, a nova defi-nição agora proposta não representa uma evolução relativamente à definição que havia sido proposta pelo ASB. Observações conclusivas

As estruturas conceptuais têm sido ela-boradas com o objectivo de fundamentar a elaboração das normas que regulam a prática contabilística, nomeadamente para que essa actividade e a informação

por ela disponibilizada possam contribuir para o melhor funcionamento possível da vida sócio-económica. Um dos principais aspectos com os quais lidam as estruturas conceptuais é o da definição dos elemen-tos das demonstrações financeiras. As principais estruturas conceptuais, nomea-damente as do FASB, do IASB, do ASB, tem seguido uma abordagem de acordo com a qual as definições de todos os outros elementos das demonstrações financeiras são derivadas das definições de activos e passivos. No entanto, embo-ra todas atribuam o primado conceptual a activos e passivos, algumas das princi-pais diferenças entre as várias estruturas conceptuais têm a ver com as definições dos elementos das demonstrações finan-ceiras.

As definições dos principais elementos das demonstrações financeiras são bas-tante semelhantes no que concerne às estruturas conceptuais do FASB, do IASB e do ASB. No entanto, existiu algu-ma evolução de ualgu-mas para as outras com respeito à sua adequação ao primado conceptual atribuído aos activos e passi-vos. A definição do ASB resolve as prin-cipais deficiências que foram apontadas à definição de activo do FASB, que já haviam sido parcialmente resolvidas pela definição do IASB, afigurando-se como a mais adequada no sentido de garantir que ela se refere a algo real. Ela possui conteúdo empírico, não confunde a defi-nição de activo com a sua mensuração e enfatiza os direitos a usar riqueza.

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A nova definição de activo recente-mente proposta pelo IASB e pelo FASB no âmbito do seu projecto conjunto para desenvolver uma estrutura conceptual comum para servir como base para futuro trabalho, baseou-se também na definição proposta pelo ASB. No entanto, argu-mentou-se neste texto que, apesar da nova definição proposta representar uma evolução, designadamente relativamente à definição do FASB, a definição do ASB é mais adequada no sentido de corrigir a deficiências apontadas àquela.

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Notas

(1) Para além destas duas perspectivas fundamentais, é habitualmente referi-da uma terceira perspectiva de acordo com a qual se considera que a articu-lação do balanço e da demonstração dos resultados é desnecessária ou mesmo desvantajosa e que activos e passivos e rendimentos e gastos devem ser definidos e medidos de forma independente. No entanto, trata-se de uma perspectiva com poucos proponentes, não sendo por isso discutida com maior detalhe neste trabalho.

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