AVALIAÇÃO IN VITRO DA INFILTRAÇÃO APICAL DE CANAIS RADICULARES OBTURADOS COM CONES DE GUTA PERCHA DE DIFERENTES CONICIDADES
Evaluation in vitro of apical microleakage in obturated root with different tapers of gutta percha.
BIANCA SALGADO ZAMBON
Aluna do curso de Especialização em Endodontia no Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais – HRAC/USP – Bauru.
RENATA PARDINI HUSSNE
Endodontista do HRAC/USP, Bauru-SP e Doutoranda em Endodontia pela Faculdade de Odontologia da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP) – Araraquara – SP.
CELSO KENJI NISHIYAMA
Endodontista do HRAC/USP, Bauru-SP, Mestre em Endodontia pela Faculdade de Odontologia de Bauru e Doutor em Endodontia pela Faculdade de Odontologia da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP) – Araraquara – SP. MARCO AURÉLIO G. BORGES
Doutorando em Endodontia pela Faculdade de Odontologia da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP)-Araraquara - SP e Especialista em
Endodontia pela APCD-Araraquara.
Rua José Quaggio nº 3-32 F:(14) 3203-8259
CEP 17030-590 Bauru-SP.
Evaluation in vitro of apical microleakage in obturated root with different tapers of gutta percha.
Avaliação in vitro da infiltração apical de canais radiculares obturados com cones de guta percha de diferentes conicidades.
RESUMO
O principal objetivo da obturação é o preenchimento e selamento de todo o sistema de canais radiculares, de maneira mais hermética possível, sem interferir e de preferência estimulando o processo de reparo apical, conduzindo e contribuindo para o êxito definitivo do tratamento. Porém, a falta de adaptação do cone de guta percha principal às paredes do canal faz com que esta obturação não seja tão hermética quanto desejaríamos que fosse. Nesta pesquisa objetivou-se avaliar a infiltração apical de canais radiculares obturados com cones principais de guta percha de diferentes conicidades. Foram utilizados 20 pré-molares inferiores humanos extraídos, divididos em 2 grupos de 10 dentes cada, sendo que em um grupo os canais foram obturados com cones de guta percha principal taper.04 e no outro com cones de guta percha convencional (taper.02). Os canais foram preparados com instrumentos rotatórios Profile 04. Após a obturação, os dentes foram impermeabilizados em toda sua extensão, com exceção do forame apical. As amostras foram imersas em corante azul de metileno a 2% por 72 horas mantidas em estufa a 37º C. Posteriormente, realizou-se a lavagem e o realizou-seccionamento dos elementos no realizou-sentido longitudinal, expondo-realizou-se a obturação. A infiltração foi medida no programa Mocha Image Analysis 1.2.10. Embora no grupo I tenha ocorrido mais infiltração que no grupo II, os resultados, em milímetros, foram submetidos à análise estatística pelo teste de Mann Whitney o qual demonstrou não haver diferença estatisticamente significante entre os grupos.
Unitermos: Obturação; Infiltração Apical.
INTRODUÇÃO
De acordo com os princípios que regem a Endodontia atual todas as etapas do
tratamento endodôntico devem ser encaradas com a mesma atenção e importância por se tratarem de atos operatórios interdependentes. Assim, a intervenção perfeita
seria aquela que se iniciasse com um correto diagnóstico e se finalizasse com uma obturação o mais hermética possível, seguida da proservação14 .
A obturação tem como objetivo o preenchimento do espaço vazio anteriormente ocupado pela polpa, não interferindo e de preferência estimulando o reparo periapical14, utilizando-se um material inerte, que previna a infiltração de fluidos oriundos do periodonto lateral e/ou apical e promova condições à reparação tecidual7.
Dentre os materiais obturadores comumente utilizados para obturação do sistema de canais radiculares, destacamos os cones de guta percha e os cimentos endodônticos, sendo esta associação, a melhor opção para a obtenção da hermeticidade da obturação.
Embora a guta percha seja o material obturador mais utilizado mundialmente, este material em estado plástico, se empregado isoladamente, não promove um adequado selamento do canal radicular, por não se aderir às paredes dentinárias. Sendo assim, a literatura recomenda que para se promover a união dos cones de guta-percha às paredes do canal radicular e entre si, como também para preencher os espaços vazios, melhorando o selamento marginal e impedindo a penetração de fluidos, seja necessário o uso de um material em estado sólido, um cimento obturador9,14.
Como a infiltração geralmente ocorre na interface cimento/ parede do canal ou cimento/ guta-percha a melhor obturação é aquela onde há uma menor quantidade de cimento e maior de guta percha10. Devemos ressaltar que para que a obturação exerça suas funções, impedindo a penetração de fluídos, toda a área instrumentada do canal deverá ser preenchida pelo material obturador.
Atualmente, grande parte dos preparos endodônticos é realizada com instrumentos rotatórios de níquel-titânio, os quais apresentam como princípio básico, diferentes conicidades, como 0.4, 0.6, até 0.12. Como conseqüência desse aumento de conicidade, apenas uma porção da parte ativa do instrumento entra em contato com as paredes dentinárias. Essa maior conicidade proporciona um desgaste mais efetivo do canal radicular, por ação de alargamento, com menor risco de fratura.
Um exemplo de sistema rotatório é o Profile 04 (Dentsply – Maillefer). Composto por instrumentos de taper.04, apresenta-se na seqüência de 15 a 45, acrescida dos instrumentos 60 e 90, nos comprimentos de 21, 25 e 31 mm15. Estes instrumentos diferem dos convencionais pelo fato de apresentarem um aumento de conicidade de 0,04mm por milímetro, da ponta para a base da parte ativa15.
Segundo Alves2 , seria necessário que houvesse estandardização em relação às limas e cones de guta percha utilizados no tratamento endodôntico. Como nem sempre isto acontece, algumas vezes há dificuldade de adaptação dos cones principais de guta percha nos preparos apicais.
Com o advento dos instrumentos com conicidade.04 e buscando promover uma melhor adaptação da guta-percha às paredes do canal, foi introduzido recentemente no mercado o cone principal de guta-percha com tapers .04 e .06 cuja indicação de uso está vinculada à instrumentação do canal radicular com sistemas rotatórios que apresentem essa variação de conicidade. Presume-se que se a guta percha for da mesma conicidade do instrumento rotatório, a infiltração apical será menor, devido a sua melhor adaptação às paredes do canal radicular, principalmente em nível apical.
O objetivo do presente trabalho foi avaliar “in vitro”, através da infiltração linear de corante, o selamento apical de canais radiculares instrumentados com Profile.04 e obturados com guta percha de diferentes conicidades.
MATERIAL E MÉTODOS
Foram utilizados 20 pré-molares inferiores humanos unirradiculados extraídos e conservados em soro fisiológico.
A abertura coronária dos dentes foi realizada com pontas diamantadas esféricas nº 1014 (KG Sorensen Indústria e Comércio LTDA) e complementada com ponta inativa 3082 (KG Sorensen Indústria e Comércio LTDA).
Procedeu-se a padronização do forame apical até a lima nº 25. O comprimento do dente foi estabelecido através da introdução de uma lima nº 10 passada através do forame apical. A seguir, o comprimento de trabalho foi determinado subtraindo-se 1,0 mm do comprimento total do dente.
O preparo dos canais foi realizado com instrumentos rotatórios do Sistema Profile (Dentsply-Maillefer), utilizando-se primeiramente o Orifice Shaper (Dentsply-Maillefer), no sentido coroa – ápice para ampliar o segmento cervical do canal radicular, na seqüência dos números nº 6, nº 5, nº 4, nº 3, nº 2, nº 1. A seguir, o batente apical foi confeccionado 1mm aquém do comprimento do dente, com instrumentos Profile .04 de números #25, #30 e #35, sendo este último, o Instrumento Memória. Após a confecção do batente, realizou-se a instrumentação regressiva até o instrumento #50, com diminuição de 1mm para cada aumento de diâmetro. O motor utilizado foi o Endo Mate 2 (NSK Japão) com velocidade de 350rpm e torque de aproximadamente 5N/cm.
Durante todo o preparo biomecânico realizou-se uma copiosa irrigação com hipoclorito de sódio a 1,0% (Cloro Rio – Indústria Farmacêutica Rioquímica LTDA). Para a limpeza final, os canais foram preenchidos com EDTA (Biodinâmica Quim. e Farm. LTDA) durante 3 minutos e neutralizados com soro fisiológico. A secagem dos canais foi realizada com pontas de papel absorvente nº 35 taper.04 (Dentsply-Maillefer). Após essa etapa inicial de preparo biomecânico, os dentes foram divididos em 2 grupos.
No grupo I foram utilizados cones de guta percha nº 35, taper.02 (Dentsply-Maillefer) e no grupo II cones de guta percha nº 35, taper.04 (Dentsply-Maillefer).
A obturação dos dois grupos foi realizada pela Técnica Biológica Controlada com Condensação Lateral Ativa empregando lima tipo K nº 30 de 21mm, cones de guta percha secundários B7 Tanari (Tanariman Industrial LTDA) e cimento obturador Endofill (Dentsply).
Após a obturação dos canais radiculares dos 2 grupos, as aberturas coronárias foram seladas com cimento temporário Cimpat (Septodont) e impermeabilizadas com cera utilidade derretida.
Em seguida, os dentes foram impermeabilizados nas superfícies externas da coroa e da raiz, exceto nas proximidades do forame apical, numa extensão média de um milímetro ao redor do mesmo. A impermeabilização foi realizada, inicialmente, com uma camada de Araldite (Brascola LTDA) seguida pela aplicação de duas camadas de esmalte vermelho para
unhas (Colorama LTDA). Esperou-se um intervalo de 24 horas entre a aplicação de cada camada impermeabilizadora.
Decorrido este período, os dentes foram imersos em solução aquosa de azul de metileno a 2%, ficando os elementos de cada grupo acondicionados em recipientes de vidro distintos, previamente identificados. As amostras permaneceram na solução corante durante 72 horas, a 37ºC, armazenados em estufa. A seguir, os dentes foram lavados em água corrente por 12 horas e raspados com um instrumento tipo Lecron (Duflex LTDA) para remoção da camada impermeabilizadora da superfície externa do dente.
Para serem seccionados, os dentes foram fixados em um suporte de madeira com godiva de baixa fusão, e então seccionados no sentido longitudinal pelo aparelho Isomet 1000 (Buehler) com auxílio de um disco diamantado, de vestibular para lingual obtendo-se duas hemi-partes para avaliação da infiltração apical do corante.
Para que se pudesse fazer a análise da infiltração em um programa de computador, uma hemiparte de cada dente recebeu um adesivo codificado pelas letras B (grupo I) e S (grupo II) aplicados diretamente sobre os mesmos, sendo que todos os adesivos apresentavam-se com o comprimento de 1,5 mm, para a calibração de pixels em milímetros.
Os dentes foram fotografados com uma câmera digital Sony F707, na resolução de 1280 x 960, obtendo-se imagens no formato JPG.
A avaliação da infiltração apical foi realizada através do programa Mocha Analysis 1.2.10, sendo considerada a interface obturação/canal radicular que apresentava maior extensão de corante. Sendo este software direcionado para medições, estas imagens foram convertidas do formato JPG para o formato PCX, utilizando o programa Adobe Photoshop 6.0.
As imagens foram então inseridas no programa para as devidas medições. Cada imagem foi calibrada através do adesivo empregado anteriormente. Para isso, foi acionado no menu principal o item “Measure” e dentro do item foi acionado o sub-item “Spatial Calibration”. Uma vez aberta a janela do sub-item, foi selecionada a calibração de dois pontos, que é feita diretamente sobre a imagem. Para tanto, foi clicado na base inferior do adesivo e depois na base superior do mesmo e neste momento foi informado ao programa que esta distância era de 1,5 milímetros. Conseqüentemente, a imagem neste momento já se apresentava calibrada em milímetros para o software.
Posteriormente, as medidas foram tabuladas e submetidas à análise estatística, através dos testes de Mann Whitney.
RESULTADOS
Os resultados obtidos através da avaliação da infiltração apical dos grupos demonstraram que no Grupo I houve maior infiltração apical do que no Grupo II, como descrito na Tabela I. Devido às amostras serem independentes, optamos pela realização do teste estatístico não paramétrico de Mann-Whitney, obtendo-se a média e desvio padrão das amostras. Neste teste, detectou-se não existir diferença significante na infiltração apical apresentada pelos dois grupos, devido ao p>0,05.
GRUPOS Nº de amostras Média Desvio Padrão
Grupo I (B) 10 5,2222 1,428
Grupo II (S) 10 4,618 1,970
Tabela I –Infiltração apical (em milímetros) dos grupos avaliados.
DISCUSSÃO
O objetivo final do tratamento endodôntico é o de realizar uma completa obturação, buscando um selamento apical o mais hermético possível dos canais radiculares. Esta constante busca gera novas pesquisas para o desenvolvimento de materiais e técnicas que consistam em um completo selamento do sistema de canais radiculares.
INGLE12 demonstrou ser a permeabilidade apical das obturações responsável por 56,65% dos fracassos dos tratamentos endodônticos, enquanto que ALLEN1 atribuiu mais de 90% dos fracassos a selamentos incompletos.
O inadequado selamento apical da obturação favorecerá a ocorrência da infiltração apical, que se caracteriza pela passagem de bactérias e seus produtos e dos fluidos teciduais na interface entre o material obturador e as paredes do canal radicular. A passagem de microrganismos e toxinas para os tecidos periapicais poderá induzir à inflamação desses tecidos e, conseqüentemente, reduzir o sucesso da terapia endodôntica, segundo KYTRIDOU; GUTMANN; NUNN13.
Tanto a técnica empregada na obturação, quanto o material obturador podem interferir no êxito do tratamento endodôntico.
Dentre todas as técnicas de obturação relatadas na literatura, a técnica da condensação lateral, é a mais utilizada universalmente, devido à sua simplicidade, baixo custo, boa compactação ao nível do terço apical e ótima qualidade final5,16,19 além de oferecer uma colocação controlada do material obturador, diminuindo as chances de sobreobturação18 .
Os resultados das pesquisas científicas comparando a técnica de condensação lateral com outras técnicas obturadoras, muitas vezes são contraditórios. Alguns trabalhos apresentaram resultados muito variáveis na média da infiltração apical de dentes obturados pela técnica da condensação lateral. WU; WESSELINK20, fazendo um levantamento de canais radiculares obturados por essa técnica, em diferentes estudos, verificaram que a infiltração apical média variou de 0,12 a 9,25 milímetros.
Em um trabalho realizado por GATEWOOD; PARSELL; RUSHING8, a técnica da condensação lateral foi a que apresentou melhor selamento apical quando comparada ao Thermafil e ao Microseal. Os autores ressaltam também que os resultados das pesquisas de infiltração marginal são afetados pelas diferenças entre dentes extraídos e dentes in vivo.
BONETTI FILHO et al.4 e PALLARÉS; FAUS17, trabalhando com a técnica da condensação lateral, encontraram menores médias de infiltração, enquanto BEATTY et al.3 e GREENE; WONG; INGRAM11 verificaram valores maiores, confirmando a diversificação dos resultados que existem em relação à técnica.
Segundo BROSCO6 existe na literatura uma grande variabilidade nos resultados encontrados nos estudos sobre infiltração apical, pois, vários fatores como remoção da “smear layer”, técnica de obturação, cimento obturador, tipo de corante, método de avaliação da infiltração apical, dentre inúmeros outros, podem influenciar nos resultados obtidos.
Com a introdução dos instrumentos rotatórios de níquel-titânio, apresentando variações de conicidade, surgiram também os cones de guta percha com diferentes tapers, cuja proposta é a de uma melhor adaptação dos mesmos no interior dos canais, fato este, que poderia contribuir para uma diminuição da infiltração marginal.
No presente estudo, como os canais foram biomecanizados com o sistema Profile 0.4, realizamos uma comparação entre cones de guta percha de conicidades 0.2 e 0.4, esta última sendo da mesma conicidade dos instrumentos empregados no preparo. Os resultados demonstraram que no grupo I, onde empregamos a guta percha de taper 0.2, houve maior infiltração que no grupo II, onde utilizamos a guta do mesmo taper do instrumento. Embora tenha sido constatada diferença entre os grupos, quando lançamos os dados em um programa estatístico, observamos que essa diferença não foi estatisticamente significante.
Como o advento de cones de guta percha apresentando conicidades variadas ainda é recente, sugerimos que novas pesquisas sejam realizadas com o intuito de verificar a aplicabilidade clínica do referido material, bem como a obtenção de uma obturação endodôntica o mais hermética possível.
CONCLUSÃO
Os canais radiculares obturados com cones de guta-percha taper.02 apresentou índice de infiltração maior que os canais obturados com guta-percha taper.04. No entanto, quando os resultados foram submetidos a análise estatística não houve diferença estatísticamente significante entre os grupos.
ABSTRACT
The main purpose of root canal obturation is the filling and the sealling of all root canal system, as such as obscure as possible, without disrupting and preferably for stimulus the process of periapical repair, taking and contributing for the treatment successful. However, the incorrect adaptation of principal cone to the root walls makes that this filling isn’t so obscure as we wish that it was. The purpose of this study is evaluate in vitro the apical microleakage in obturated root with different tapers of gutta percha. 20 extracted human pre molar roots were used and divided into two groups of ten. In group 1, the roots were obtured with gutta percha principal taper.04 and in the other group with gutta percha principal taper.02. The roots were instrumented by the com instrumentos rotatórios Profile 04. After that, the specimes were dipped in a 2% methylene blue due stored at 37ºC for 72 hours., os dentes foram impermeabilizados em toda sua extensão, com exceção do forame apical. Afterwards, a rinse was carried out and the elements were cut along their axis until exposing the fillings. The microleakage was measured through the program Mocha Image Analysis 1.2.10. Although in the group I there was more microleakage than in the group II, the results, in millímeters, were statistically analysed by the Mann Whitney test showing there is no a significant difference between the groups.
UNITERMS: Filling; Apical Microleakage.
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