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A INFLUÊNCIA DO CONTEXTO (IR)REALIS NA VARIAÇÃO DO MODO SUBJUNTIVO

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Academic year: 2021

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Revista de Inovação, Tecnologia e Ciências (RITEC), v. 1, n. 1, p. 109-119, 2015. ©Rede de Ensino FTC

A INFLUÊNCIA DO CONTEXTO (IR)REALIS NA VARIAÇÃO

DO MODO SUBJUNTIVO

Vania Raquel Santos Amorim1

Valéria Viana Sousa2,*

1 Faculdade de Tecnologia e Ciências, Jequié, 45204-010, BA-Brasil

2

Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia, Vitória da Conquista, 45083-900, BA-Brasil *E-mail: quelva@hotmail.com; valeriavianasousa@gmail.com

Resumo

Neste trabalho, investiga-se a alternância entre as formas do indicativo e do subjuntivo em orações completivas introduzidas pelo complementador que na língua falada da comunidade conquistense. A pesquisa foi desenvolvida à luz da Sociolinguística, tomando como referência, sobretudo, os teóricos Labov (2008); Weinreich, Labov e Herzog (2006), e do Sociofuncionalismo, tomando como referência, entre outros, Hopper (1991); Neves (1997); Givón (2001, 2011). Os dados para a pesquisa foram extraídos do Corpus do Português Popular de Vitória da Conquista (Corpus PPVC). Nos dados empíricos, verificamos que a variação do modo subjuntivo está relacionada a fatores de ordem linguística e extralinguística e que, do ponto de vista sociolinguístico, sinaliza um processo de mudança em progresso e, do ponto de vista funcionalista, sinaliza um processo de gramaticalização.

Palavras-chave: Modo verbal; modalidade; coocorrência subjuntivo/indicativo; (socio)funcionalismo.

Abstract

In this paper, we investigate the alternation between the indicative and subjunctive forms in dependent clauses introduced by the complementizer que in the spoken language of the community of Vitória da Conquista. The research will be developed in the framework of Sociolinguistics, taking as reference especially the theorists Labov (2008); Weinreich, Labov and Herzog (2006), and Sociofunctionalism with as reference Hopper (1991); Neves (1997) and Givón (2001, 2011) among others. Data for the study were taken from the Corpus of the Português Popular de Vitória da Conquista (Corpus PPVC). Through the empirical data, we found that the subjunctive mood variation is related to linguistic and extralinguistic factors and that it signalizes, from a sociolinguistic point of view, a process of ongoing change and, from the functionalist point of view, a process of grammaticalization.

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1 Introdução

A abordagem simplista da Gramática Normativa, que tem sua centralidade, sobretudo, nos clássicos moldes da escrita, deixa uma grande lacuna em seus fundamentos quando buscamos explicação e interpretação para novos fenômenos que surgem na língua decorrentes da fala.

A alternância entre as formas subjuntivas e formas indicativas tem sido um fenômeno recorrente na Língua Portuguesa. Na tentativa de explicar a ocorrência dessa variação no modo subjuntivo, nos esbarramos nos limites impostos pela Gramática Normativa e na falta de lógica de alguns dos seus fundamentos para explicar tal fenômeno no uso real da língua. Mediante esse fato, propomo-nos investigar essa covariação entre os modos na nossa língua recorrendo as bases teóricas da Sociolinguística e do Funcionalismo para compreendermos esse processo de variação no Português Popular da cidade de Vitória da Conquista.

Sendo assim, tomando como referência, sobretudo, os teóricos Givón (2001); Labov (2008); Weinreich, Herzog e Labov (2006) e Gramáticas Normativas, buscamos: (i) desenvolver uma descrição do modo subjuntivo segundo a Tradição Gramatical; (ii) tratar de conceitos de modalidade e modo verbal; (iii) tratar da articulação entre as teorias Sociolinguística Variacionista e o Funcionalismo, denominada de Sociofuncionalismo, dando ênfase, principalmente, à gramaticalização. (iv) e, por fim, investigar indícios de que a variação do modo subjuntivo em orações subordinadas introduzidas pelo complementador que no Corpus do Popular de Vitória da Conquista esteja passando por um processo de gramaticalização.

O tratamento do modo subjuntivo na Tradição Gramatical

Para abordar de que maneira os modos indicativo e subjuntivo são tratados na Tradição Gramatical, retomamos os gramáticos Pereira (1926), Kury (1964), Perini (1998), Sousa e Silva e Koch (1999), Cunha e Cintra (2001), Bechara (2004), Almeida (2009) e Luft (s.d).

Pereira (1926), Sousa e Silva e Koch (1999), Bechara (2004) e Almeida (2009) concordam que, no modo indicativo, a ação exercida pelo verbo expressa algo verossímil. “Ele exprime de modo real e categórico o fato verbal, em um juízo

afirmativo, negativo ou interrogativo, nas diversas épocas do tempo.” (PEREIRA, 1926,

p.343). De outra maneira, Cunha e Cintra (2001) registram que, nesse modo, o verbo expressa um fato real, independente do tempo do verbo, presente, passado ou futuro.

Concernente ao modo subjuntivo, os gramáticos Sousa e Silva e Koch (1999) e Bechara (2004) afirmam que esse modo, em oposição à noção de realidade ou de verossimilhança ao modo indicativo, faz referência a fatos tidos como incertos, ou como define Luft (s.d), “o modo subjetivo”.

Cunha e Cintra (2001, p. 466), por sua vez, acrescentam que o modo subjuntivo indica que uma ação ainda não realizada, “é concebida como dependente de outra”, seja expressa ou subentendida. Sendo, então, essa a justificativa para o seu emprego em orações subordinadas. O termo subjuntivo vem do latim subjunctivus e o próprio nome já traz uma indicação do seu significado: “que serve para ligar, para subordinar”.

É de se notar que a oposição feita entre os modos indicativo e subjuntivo nas Gramáticas Normativas não é precisa. A esse respeito Perini (1998) tece que, a distinção entre “certeza” e “incerteza”, não desempenha um papel fundamental para determinar o emprego do modo subjuntivo e do modo indicativo. Para fundamentar

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esse argumento, apresenta os seguintes exemplos: “Desconfio que Selma fuma Cachimbo. Admito que Selma fume Cachimbo.” (PERINI, 1998, p. 258).

No primeiro exemplo, temos uma frase na sua forma indicativa e, no segundo exemplo, na sua forma subjuntiva, no entanto, o autor expressa que ambas exprimem uma certeza condicionada. Outros exemplos também demonstram essa falta de coerência no tratamento desses modos, como: “Tenho certeza que Selma fuma cachimbo. É trágico que Selma fume cachimbo.” (PERINI, 1998, p. 258).

Nesses casos, o falante expressa através dos verbos a certeza de que Selma fuma cachimbo. Mesmo que, na primeira, a certeza seja categoricamente afirmada e, na segunda, apenas pressuposta, em ambos os exemplos estão presentes a atitude de certeza expressa tanto no modo indicativo quanto no modo subjuntivo.

Diante do exposto, podemos depreender que, na Tradição Gramatical, não há uma definição precisa em relação ao modo verbal no português tendo em vista que a sustentação para a separação entre os modos indicativo e subjuntivo esteja na condição da suposta certeza ou não apresentada nos verbos.

Por ora, nos deparamos com certas construções nas quais não se tem um subsídio coerente e consistente para explicar tais realizações. Por exemplo, Kury (1964) reconhece que a definição de modo verbal tem um valor relativo, pois, ao analisarmos o tempo futuro do indicativo em construções apresentadas por ele: “Ela chegará hoje? Não matarás. Discordarão alguns desta orientação.” (KURY, 1964, p.71), percebemos que o valor de incerteza está presente em construções do modo indicativo e, assim, não é algo restrito ao modo subjuntivo.

No primeiro exemplo, o modo indicativo pode expressar dúvida; na segunda frase, ordem e, na terceira, possibilidade. Como compreender essa fluidez dentro da Tradição Gramatical? Já que não encontramos nos compêndios gramaticais uma razão lógica nos fundamentos ou regras do emprego do modo subjuntivo para explicar algumas situações do seu uso, buscamos entender a variação do emprego desse modo pelo viés da teoria Sociofuncionalista, analisando, assim, fatos reais da língua em pleno uso.

2 Aporte Teórico

A Sociolinguística e o Funcionalismo constituem teorias que se unem por reconhecerem a heterogeneidade da língua e priorizarem seu uso real como ponto basilar para explicar processos de variação e mudança. A interface entre essas teorias e a articulação dos seus princípios são estudadas por alguns pesquisadores com a denominação de Sociofuncionalismo.

Resgatando Tavares (2003), podemos encontrar algumas semelhanças entre os aportes teóricos e metodológicos do Funcionalismo e da Sociolinguística que nos possibilitam um diálogo, a saber: (i) A língua é dinâmica e não estática, característica que condiciona, então à variação ou à mudança no sistema linguístico; (ii) Há uma relação entre os fenômenos linguísticos e a sociedade que faz uso dessa língua. (iii) A mudança linguística ocupa uma oposição de destaque e pode ser compreendida como um fenômeno contínuo e gradual; (iv) O fenômeno linguístico é analisado em uma situação interativa de uso real da língua e (v) Os dados sincrônicos e diacrônicos não são tomados de maneira indissociáveis no estudo linguístico.

Apesar de tantos pontos em comum entre o Funcionalismo e a Sociolinguística, a autora, deixa claro que, as semelhanças entre elas podem acontecer, apenas, de maneira superficial. Reconhecemos que alguns tópicos são inconciliáveis quando se trata de teorias distintas. Nesse caso, aspiramos das palavras de Pires de Oliveira (1999) quando expressa ser possível a construção de coerências diante das

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diferenças, porque podemos compreender “os termos de uma teoria na linguagem da outra”, (PIRES DE OLIVEIRA, 1999, p. 11), surgindo, então, uma linguagem comum.

Consideramos as suas palavras quando exprime que é possível uma conversa entre as teorias distintas. E, para essa realização, não se faz necessário anular as diretrizes que emana de cada pacote teórico. Seria uma conversa, um diálogo entre as diferenças existentes entre alguns conceitos incompatíveis entre elas. A autora ainda expressa que

[...] A melhor metáfora não é, portanto, a do projeto único, nem a dos caminhos isolados, mas de uma conversa na diferença; quanto mais conversamos, mais os conceitos circulam, mais revisões são necessárias, mais conhecimento comum é gerado. (PIRES DE OLIVEIRA, 1999, p. 12).

Esse novo olhar gerado, o Sociofuncionalismo, nascido do hibridismo entre a Sociolinguística e o Funcionalismo, é constituído do resultado de muita conversa. E, como Tavares (2003) expressa, nesse processo de diálogo, ocorrerá uma espécie de negociação, interpretação e adaptação entre os pressupostos teórico-metodológicos até se tecer uma conversa compreensível, na qual cada teoria terá clareza do seu lugar, ou seja, da diferença existente em relação ao outro, para, por fim, o casamento ser constituído de fato.

A respeito dessa conciliação entre teorias distintas, encontramos, em Lyons (2011), o reconhecimento de pontos afins entre as teorias Funcionalista e Sociolinguística expressa nas seguintes palavras:

[...] o funcionalismo em linguística tendeu a enfatizar o caráter instrumental da linguagem. Há, portanto, uma afinidade natural entre o ponto de vista funcionalista e do sociolinguista [...]. (LYONS, 2011, p. 169).

Diante dessa aliança entre as teorias, os seguintes pressupostos serão integrados nessa pesquisa, a saber: na perspectiva funcionalista, as noções de marcação, a modalidade na visão givoniana e os princípios de gramaticalização – estratificação, divergência e persistência - estabelecidos por Hopper (1991). Já na visão Sociolinguística, nossa análise se centra em fatores de ordem extralinguístico (variáveis gênero/sexo, faixa etária e nível de escolaridade) e nos fatores de ordem linguística (modalidade verbal e verbo na oração matriz).

A respeito do princípio da marcação, Givón (2011) estabelece os seguintes critérios: (1) A variante mais marcada tende a exibir maior complexidade estrutural em relação ao padrão neutro.1 (critério da complexidade estrutural ou complexidade

sintática). Ainda no tocante a esse critério, Givón (2011, p. 115) depreende que

“Uma construção será considerada sintaticamente mais complexa se ela se afasta da rotina da estratégia de processamento de fala estabelecida pela norma, ou seja, o padrão neutro.” (2) A estrutura marcada apresenta uma distribuição de frequência menor em relação ao padrão neutro. (critério da restrição distribucional ou distribuição

de frequência). (3) A variante mais marcada é cognitivamente considerada mais

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complexa em relação ao padrão neutro. (critério da complexidade cognitiva ou

complexidade psicológica).

Concernente à modalidade, o conceito é baseado na visão givoniana e entendido como a atitude do falante no que se refere à proposição epistêmica (certeza, evidência, probabilidade, verdade) e deôntica (obrigação, manipulação, utilidade, permissão).

Em relação aos princípios de gramaticalização estabelecidos por Hopper (1991), a estratificação se torna relevante para a pesquisa porque se relaciona à concomitância de formas que codificam uma função semelhante e que expressam um só significado, podendo se tornar estáveis ou não. Podemos reconhecer esse princípio no estudo do modo subjuntivo quando ocorre a alternância das formas indicativas e subjuntivas em contexto de subjuntivo.

Contamos, ainda, com o princípio da divergência como relação ao processo de gramaticalização da forma variante que é o modo indicativo com a permanência na língua de sua forma primeira, a forma subjuntiva. E com o princípio da persistência, no valor de subjuntivo permanece mesmo ocorrendo a alternância com a forma indicativa.

Referente à modalidade, Givón(2001) faz uma divisão bipartida da modalidade

irrealis nos domínios deôntico e epistêmico. De acordo com o autor, o modo subjuntivo

tem maior domínio de realização quando ocupa esses dois loci distintos (deôntico/epistêmico). Isso porque o submodo epistêmico associa-se ao eixo semântico de baixa certeza e o submodo deôntico relaciona-se ao de fraca manipulação.

Ainda sobre o irrealis2, Givón (2001) diz que nessa categoria

A asserção é fracamente asserida como possível, provável ou incerta (sub-modos epistêmicos), ou necessária, desejável ou indesejada (sub-modos avaliativo- deôntico). Mas, o falante não está pronto a comprovar sua asserção com evidências ou outros fundamentos fortes; e uma contestação pelo ouvinte é recebida ou esperada. (GIVÓN, 2001, p. 302).

Na visão givoniana, compreender os aspectos gramaticais e funcionais do subjuntivo depende, tão somente, dessa distribuição no contexto irrealis no âmbito dos submodos epistêmico e deôntico. Sobre esses submodos, Pimpão (2012) afirma que eles

[...] não apenas indicam atitudes, mas essas atitudes são negociadas na interação comunicativa, envolvendo contestação do ouvinte, apresentação de evidências pelo falante, a partir da premissa de que a modalidade se instaura na relação interpessoal. (PIMPÃO, 2012, p.88)

Mediante a junção dos preceitos supramencionados entre as vertentes teóricas, não temos dúvida que isso nos permitirá a ampliação na compreensão e análise do nosso fenômeno linguístico. Diante disso, assumimos a possibilidade da associação entre essas teorias, mostrando isso a partir de algumas semelhanças entre os seus aportes teóricos e metodológicos, como também, através do diálogo entre estudiosos na linha sociofuncionalista e, sobretudo, Tavares (2003, 2013), que

2 Cf. (GIVÓN, 2001, p. 301): “c. Irrealis assertion -The proposition is weakly asserted to be either possible, likely or uncertain (epistemic sub-modes), or necessary, desired or undesired (valuative-deon- tic sub-modes). But the speaker is not ready to back up the assertion with evidence or other strong grounds; and challenge from the hearer is readily entertained, expected or even solicited.”

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dedicou, em sua tese, um capítulo sobre o que ela denomina de casamento entre a Sociolinguística e o Funcionalismo.

3 Procedimento metodológico

Os dados para a pesquisa foram extraídos do Corpus do Português Popular de Vitória da Conquista (Corpus PPVC), constituído pelo Grupo de Pesquisa em Linguística Histórica e pelo Grupo de Pesquisa em Sociofuncionalismo-CNPq. A amostra foi constituída por doze (12) informantes estratificados a partir das seguintes dimensões: gênero/sexo (masculino/feminino), faixa etária (Faixa I: de 15 a 25 anos; Faixa II: de 26 a 50 anos; Faixa III: com mais de 50 anos de idade) e grau de escolaridade (sem escolaridade ou até 5 anos de escolarização).

3.1 Os fatores linguísticos e extralinguísticos

Inserir o espectro da variável social em uma pesquisa é buscar resposta da sua influência em uma dada variação linguística, já que se entende que a heterogeneidade na língua é condicionada pelo fator social e é inerente ao sistema linguístico.

No que se refere a esses fatores extralinguísticos, elegemos as variáveis gênero/sexo, faixa etária e nível de escolaridade. O fator gênero/sexo está sendo utilizado nessa pesquisa a fim de compreendermos até que ponto essa variável está relacionada à variação do modo subjuntivo. O uso da variável faixa etária é importante, porque pode indicar em que índice ocorre a variação do modo subjuntivo e se está diretamente relacionada à idade dos falantes. Tratar o fator nível de escolaridade se faz relevante, também, a fim de comprovarmos a hipótese de que o não uso do modo subjuntivo esteja relacionado ao menor índice de nível de escolaridade.

No tocante aos fatores linguísticos, levamos em conta o fator “modalidade verbal”, “noção da marcação” e os “princípios da gramaticalização” para confirmar a hipótese de que essas variáveis influenciam na utilização do modo indicativo em contextos nos quais se prescreve o uso do modo subjuntivo na Tradição Gramatical.

4 Resultados

Nesta subseção, temos o objetivo de apresentar o resultado frequencial do uso variável do modo subjuntivo na fala de Vitória da Conquista, conforme observado na Tabela 1 a seguir.

Formas

Subjuntivo 33 (63, 5%) Indicativo 19 (36, 5 %) Total 52

Os resultados dessa pesquisa mostram que de um total de 52 (cinquenta e duas) ocorrências, detectadas no Corpus PPVC em situações em que se prescreve o

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uso do modo subjuntivo, registraram-se 33 (trinta e três) ocorrências de formas do subjuntivo em contexto de subjuntivo perfazendo um total de 63,5% e 36,5% na forma indicativa em contexto de subjuntivo.

Um ponto pertinente discutido na teoria Funcionalista que pode nos ajudar a entender esse processo de variação/estratificação do modo subjuntivo no Corpus PPVC está atrelado ao reconhecimento de que existem forças internas e externas à língua fazendo com que a gramática não seja autônoma, abrindo, então, espaço para que o falante use uma expressão do tipo:

(01) Ele disse: “[...] eles não qué que eu BANHE aqui no colo. Qué que eu VÔ...VÔ pá casa de seu Hercilo ou pá casa de Amorim.” (E.L.C).

Observamos que, nesse excerto de fala, o uso da forma subjuntiva na primeira estrutura de complementação o que indica, no valor desse modo, incerteza do fato expresso segundo prescreve a Gramática Normativa. No entanto, na segunda oração subordinada, tem-se uma forma inovadora, uma variação do modo subjuntivo em que há o emprego da forma indicativa. O que podemos observar, nessa amostra de fala, é que, na segunda oração completiva, o uso do modo indicativo não revela um fato real, mas mantêm o valor nocional de incerteza mesmo sem o uso da forma subjuntiva.

É a partir dessa primeira observação que adentramos a nossa discussão, mostrando o uso variável do modo subjuntivo e tentando entender a partir dos fatores internos e externos à língua os condicionadores que levam os falantes a escolherem essa forma variante.

Evidenciamos que a forma subjuntiva ainda é a mais frequente e a mais comum no Corpus PPVV, perfazendo um total de 63,5% quando comparada com sua forma variante como mostramos na tabela 1 acima. Na visão givoniana, uma forma quando muito frequente mostra-se inexpressiva no discurso fazendo com que o falante busque novas maneiras para se expressar. Seguindo as lições funcionalistas, aprendemos que essas novas formas linguísticas resultam de fatores motivacionais de uso que estão atreladas à necessidade de comunicação. Dito isto, cabe aqui acionarmos a noção de marcação já que tem uma relação com a questão da frequência de uso de uma dada forma.

No tratamento variável do subjuntivo, no qual ocorre a alternância das formas indicativas e das formas subjuntivas, este modo verbal se constitui o modo não marcado. Dito isto, o uso do modo subjuntivo no Corpus PPVC, quando analisado ao lado da sua forma variante, apresenta as seguintes características: não marcado, pois apresenta um contexto de ocorrência maior, com menos complexidade estrutural e menos complexidade cognitiva.

O fato da forma subjuntiva se apresentar com maior frequência (63,5%) provoca a automatização dessa forma, tornando-a com menor expressividade. Diferentemente, a forma inovadora – modo indicativo - com o percentual de 36,5%, tende a apresentar-se com grande expressividade, uma vez que se mostra como a forma marcada, nesse contexto de uso analisado.

O modo subjuntivo, por se constituir a forma não marcada, pode, consoante à visão givoniana, sofrer erosão de uma maneira mais fácil. É necessário frisar que, a emergência da nova forma – o indicativo em contexto de subjuntivo - não acarreta, necessariamente, o desaparecimento da forma mais antiga - modo subjuntivo - e, então, neste momento, tomamos a posição de devolver a palavra a Hopper (1991) que tem a resposta para explicar como se dão esses estágios ou graus de gramaticalização a partir de três dos cinco princípios estabelecidos por ele: estratificação, divergência e persistência.

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Para Hopper (1991), o princípio da estratificação, conforme mencionado anteriormente, em relação ao nosso fenômeno linguístico, ocorreria da seguinte maneira: as formas variantes do modo subjuntivo podem coexistir com o mesmo sentido, ou seja, permanecer com funções semelhantes como evidenciamos nos seguintes fragmentos de fala:

(02) [...] aí ele falou bem assim: Tu quer [nem] que eu VÁ arrumar pra tu? [...] (E.S.P)

(03) [...] ele falou assim: “Quer que eu (34) VÔ com você?”(E.F.O)

O verbo ir em (3) mantem o mesmo valor nocional de incerteza do fragmento de fala em (2) mesmo com o emprego da forma indicativa vou. Essa forma variante do verbo ir (vô) pode passar pelo processo de gramaticalização, mas a sua forma mais antiga (vá) pode se manter como um item autônomo, processo conhecido como divergência. E, se o valor de subjuntivo permanece, mesmo que, no processo de alternância, a forma utilizada seja a forma indicativa, Hopper (1991) denomina esse processo de princípio da persistência.

Sabemos que essas variações/mudanças ocorrem porque, o falante, no contexto comunicativo, pressiona o sistema linguístico em virtude de uma necessidade de uso. Consequentemente, isso gera uma contínua remodelação ou reorganização das estruturas linguísticas e esses princípios estabelecidos por Hopper (1991) vêm trazer à luz a visão da gramática emergente, esclarecendo, assim, como esses processos e estágios da gramaticalização podem ser compreendidos.

Em relação aos fatores extralinguísticos, a atuação da variável faixa etária está detalhada na tabela 2 que se segue:

Tabela 2: Atuação da variável faixa etária

Faixa etária Ocorrência/Total Percentual

Faixa I (15 a 25) 4/6 67%

Faixa II (26-50) ) 9/16 56% Faixa etária III (51 em diante) 6/11 54%

Os percentuais mostrados na tabela 2 evidenciam o uso mais elevado da variante inovadora pela faixa etária mais jovem (67%) em relação as outras faixas etárias. A variação está presente na Faixa I, o que sinaliza um processo de mudança em progresso desse fenômeno linguístico.

Concernente a atuação da variável sexo/gênero, estão detalhadas na tabela 3 abaixo:

Tabela 3: A atuação da variável sexo/gênero

Sexo/Gênero Ocorrência/Total Percentual

Feminino 11/25 44% Masculino 7/9 78%

Em relação a variável sexo/gênero, a tabela 3 revela que a variante não-padrão é realizada de forma mais acentuada pelos homens, perfazendo um total de 78%, em contraposição às mulheres, que apresentaram um uso de 44%. Esse resultado condiz com a literatura sociolinguística, na qual há o registro de uma tendência do gênero/sexo feminino a usar mais a forma de prestígio em sua comunidade de fala.

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Referente à variável nível de escolaridade, ela tem sido testada pelos pesquisadores a fim de averiguar a influência desse fator no comportamento do falante no que alude o uso ou não uso da variante padrão. A fim, também, de testamos esse fator, na tabela 4, a seguir, exibimos a distribuição frequencial da variação do modo subjuntivo entre os informantes sem escolaridade e até 5 (cinco) anos de escolarização:

Tabela 4: Atuação da variavel nível de escolaridade

Nível de escolaridade Ocorrência/Total Percentual

1ª a 5ª série 6/18 33% Sem escolaridade 9/19 47%

De acordo com os resultados expostos na tabela 4, os falantes sem nenhuma escolaridade utilizaram mais a forma inovadora com um percentual de 47% em relação aos falantes que tiveram até 5 (cinco) anos de escolarização (33%).

Diante desse quadro, podemos depreender que o uso do subjuntivo (forma de prestígio) está correlacionado ao grau de escolaridade. Isso porque o universo escolar provoca mudanças no modo de falar porque o indivíduo tem contato com um ensino que privilegia e incute a variante de prestígio. “A escola move campanhas em prol da pureza do idioma, na variedade padrão [...]” (VOTRE, 2007, p. 52), ela controla e corrige qualquer uso que foge à regra dos manuais gramaticais.

5 Considerações finais

A questão central desse trabalho foi investigar indícios de variação do modo subjuntivo no Corpus PPVV. Para a análise dos dados, utilizamos do aporte do Sociofuncionalismo integrando os seguintes pressupostos: na perspectiva funcionalista, as noções de marcação e a modalidade na visão givoniana e três dos cinco princípios de Gramaticalização estabelecidos por Hopper (1991): estratificação, divergência e persistência. E, na visão Sociolinguística, nossa análise se centrou na correlação dos fatores de ordem extralinguística (variáveis gênero/sexo, faixa etária e grau de escolaridade).

Comprovamos, nos dados analisados, indícios de variação no contexto irrealis em um total de 36,5% em relação à forma padrão - subjuntivo (63,5%). Vimos que o modo subjuntivo no Corpus PPVC quando analisado ao lado da sua variante - modo indicativo em contexto de subjuntivo - é considerado não-marcado o que favorece a variação desse modo verbal já que aparece com maior frequência de uso o que acarreta um desgaste semântico, ocasionando o aparecimento de novas formas linguísticas conduzindo, assim, a um processo de gramaticalização.

Em relação às variáveis extralinguísticas, no que concerne à variável gênero/sexo, os dados revelaram que a variante inovadora é realizada de forma mais acentuada pelas homens, perfazendo um total de 78% em relação as mulheres, que apresentaram um uso de 44%. Esse resultado condiz com a literatura sociolinguística, na qual há o registro de uma tendência do gênero/sexo feminino a usar mais a forma de prestígio em sua comunidade de fala.

Referente à variável faixa etária, os falantes mais jovens realizaram com maior índice a forma inovadora (67%) o que sinaliza uma variação em progresso. Concernente à variável nível de escolaridade, demonstramos que o uso do subjuntivo (forma de prestígio) está correlacionado ao grau de escolaridade do falante quando os

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resultados evidenciaram que os informantes que tiveram algum tipo de instrução utilizaram menos a forma inovadora (33%) do que aqueles sem escolaridade (47%). Diante do exposto, evidenciamos, no estudo realizado, que, à revelia da prescrição presente na Tradição Gramatical, o falante conquistense do Português Popular realiza a alternância entre as formas do indicativo e do subjuntivo em orações completivas introduzidas pelo complementizador que.

REFERÊNCIAS

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Referências

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