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O respeito à dignidade da mulher no sistema prisional

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Academic year: 2021

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SILVANIA DE SOUZA CUNHA

O RESPEITO À DIGNIDADE DA MULHER NO SISTEMA PRISIONAL

Florianópolis 2020

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SILVANIA DE SOUZA CUNHA

O RESPEITO À DIGNIDADE DA MULHER NO SISTEMA PRISIONAL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito, da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientadora: Professora Danielle Maria Espezim dos Santos, Dra.

Florianópolis 2020

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SILVANIA DE SOUZA CUNHA

O RESPEITO À DIGNIDADE DA MULHER NO SISTEMA PRISIONAL

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado à obtenção do título de Bacharel em Direito e aprovado em sua forma final pelo Curso de Graduação em Direito, da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Florianópolis, 08de dezembro de 2020.

______________________________________________________ Professora e Orientadora Danielle Maria Espezim dos Santos, Dra.

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Professora Andreia Catini Cosme, MSC

Universidade do Sul de Santa Catarina

______________________________________________________ Professora Eliane Luís Espíndola de Souza, MSC

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

O RESPEITO À DIGNIDADE DA MULHER NO SISTEMA PRISIONAL

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico e referencial conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Sul de Santa Catarina, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de todo e qualquer reflexo acerca deste Trabalho de Conclusão de Curso.

Estou ciente de que poderei responder administrativa, civil e criminalmente em caso de plágio comprovado do trabalho monográfico.

Florianópolis, 19 de novembro de 2020.

____________________________________

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Dedico este trabalho a todas as mulheres que, pelo país afora, vivem muitas e várias prisões diariamente.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente a Deus, que me concedeu a graça da capacitação intelectual para ver, discernir e agir, acima de tudo, colocando o conhecimento adquirido a serviço das pessoas, da Igreja e da Congregação.

Agradeço a minha família, na pessoa de minha querida mãe, Nair Correa de Souza Cunha (in memoriam), que com pouco estudo, porém com sabedoria imensa, muito me ensinou e me preparou para a vida.

Agradeço também a minha segunda família, a Congregação das Irmãs Franciscanas de São José, da qual faço parte por mais de 24 anos. Com generosidade, compreensão, me possibilitaram mais esta etapa de formação profissional, que será de grande proveito para as nossas Comunidades, Colégios e Hospitais, onde atuamos concretizando o carisma da Misericórdia.

Agradeço de maneira muito especial e carinhosa a minha Orientadora e Professora Danielle Maria Espezim dos Santos, que dedicou seu tempo de forma generosa, exigente e paciente, para junto caminhar comigo nesta jornada acadêmica.

Um agradecimento muito carinhoso a nossa Dinda da turma, Professora Andreia Catine Cosme, que com muita simplicidade, alegria e bom-humor, acalentava nosso coração e nossa ansiedade neste período importante de nossa formação acadêmica.

E, por fim, um imenso obrigada a todos (as) os (as) Professores (as) da Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL), que, ao longo desses cinco anos, fizeram parte da minha história acadêmica e futura profissão. Com certeza, na nova fase de minha vida, serão lembrados com muita gratidão.

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“Minha mãe foi a mulher mais bela que jamais conheci. Tudo o que sou, devo a minha mãe. Atribuo todos meus sucessos nesta vida ao ensino moral, intelectual e físico que recebi dela” (George Washington).

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RESUMO

A sociedade, na qual todos os indivíduos estão inseridos, mediante ao papel que cada um desenvolve, acarreta direitos e deveres, que, ao longo do tempo, estruturam os valores pessoais, morais, éticos que permeiam o perfil da pessoa, criando nela a consciência das suas escolhas, oportunizando vivência de sua dignidade no quotidiano. O objetivo do presente trabalho é refletir sobre o respeito à dignidade da mulher encarcerada no Sistema Prisional de Santa Catarina. A análise da temática foi à luz da vertente constitucional, abordando as garantias mínimas dos direitos fundamentais contidos na Constituição Federal, na legislação vigente, nas doutrinas e nas políticas públicas que embasam o Sistema Prisional do Estado. Para tanto, a metodologia utilizada foi dedutiva, através de pesquisas bibliográficas, contendo abordagens qualitativa e estruturada, de maneira a refletir sobre o respeito à dignidade das mulheres encarceradas; identificando as leis, os decretos em vigor, bem como a sua aplicabilidade; descrevendo o perfil delas, para assim verificar as características quanto à escolaridade, ao tipo de crime, à faixa etária, à raça, à ocupação laboral e ao diagnóstico de doenças das mulheres presentes no sistema prisional de Santa Catarina e do Brasil. Os resultados desta pesquisa revelam índice crescente de mulheres encarceradas; na maioria são mães e chefes de família; com escolaridade de ensino fundamental incompleto; com o principal motivo prisional por tráfico de drogas; com idade entre 18 a 24 anos; em Santa Catarina, a raça é predominantemente branca; com atividade laboral interna; e, quanto ao diagnóstico de doenças, no Estado há maior incidência de doenças crônicas ou respiratórias e, no Brasil, infecção pelo HIV. Assim, constata-se a necessidade de práticas de políticas públicas humanizadas, bem como a renovação nas estruturas prisionais para garantir o respeito à dignidade humana das mulheres encarceradas, na perspectiva de reinserção familiar, profissional e social.

Palavras-chave: Direitos da mulher. Encarceramento feminino. Sistema Prisional Feminino. Políticas públicas.

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LISTA DE SIGLAS

ASBEDIM Associação Beneficente São Dimas CEJA Centro de Educação de Jovens e Adultos CP Código Penal

CPP Código de Processo Penal

DEAP Departamento de Administração Prisional

IDDH Instituto de Desenvolvimento e Direitos Humanos IFSC Instituto Federal de Santa Catarina

INFOPEN Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias LEP Lei de Execução Penal

ONG Organização Não Governamental

UNISUL Universidade do Sul de Santa Catarina UNIVILLE Universidade da Região de Joinville

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Distribuição das mulheres encarceradas, segundo a escolaridade no Estado de

Santa Catarina... 29

Quadro 2 – Distribuição das mulheres encarceradas, segundo crimes mais cometidos no

Estado de Santa Catarina... 30

Quadro 3 – Distribuição das mulheres encarceradas, segundo a faixa etária no Estado de

Santa Catarina... 31

Quadro 4 – Distribuição das mulheres encarceradas, segundo a raça/cor no Estado de Santa

Catarina... 31

Quadro 5 – Distribuição das mulheres encarceradas, segundo a ocupação laboral no Estado

de Santa Catarina... 32

Quadro 6 – Distribuição das mulheres encarceradas no Estado de Santa Catarina, quanto aos

diagnósticos de doenças... 32

Quadro 7 – Distribuição das mulheres encarceradas no país, quanto aos diagnósticos de

doenças em 2014... 33

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ... 9

2 A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A MULHER ENCARCERADA ... 12

2.1 A MULHER ENCARCERADA E A BUSCA DE SUA DIGNIDADE ... 15

3 AS MULHERES ENCARCERADAS E A VIDA PRISIONAL ... 25

3.1 PERFIL DAS MULHERES ENCARCERADAS ... 29

4 A BUSCA PELO RESPEITO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA NO SISTEMA PRISIONAL DO ESTADO ... 37

4.1 RESPEITO À DIGNIDADE HUMANA, LEGISLAÇÃO E POLÍTICAS PÚBLICAS 40 4.2 INICIATIVAS NO ESTADO DE SANTA CATARINA ... 44

5 CONCLUSÃO ... 51

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho, intitulado “O respeito à dignidade da mulher no sistema prisional”, versará sobre os desafios que norteiam o quotidiano das mulheres que se encontram em cárcere privado nos Presídios Femininos do Estado de Santa Catarina, refletindo sobre o respeito à dignidade da pessoa humana, seus direitos fundamentais contidos na Constituição Federal, na legislação, nas doutrinas.

Para contribuir com o tema proposto e dinamizar a pesquisa, será feita a reflexão sobre dignidade em si, seu significado, sua aplicação na sociedade; depois, as leis que contêm sua obrigatoriedade para todo cidadão; bem como traçar breve perfil das mulheres encarceradas no Estado, considerando o contexto histórico das prisões e as políticas públicas voltadas ao grupo.

Muitos assuntos são hoje de importância no meio jurídico, campo vasto de temas de relevância administrativa, familiar, social, entre outros. Mas, por ser visível o aumento da população encarcerada feminina na sociedade, o interesse em refletir sobre o assunto foi despertado, buscando entendimento para esse fator relevante e preocupante, tendo presente um futuro trabalho voluntário com este grupo.

Desta forma, o presente tema justifica-se pela importância de serem analisados quais os direitos legais referentes ao respeito à dignidade humana, enquanto mulher encarcerada, perpassando pelo contexto social, familiar, profissional e os motivos que as induziram ao crime; e, por consequência, o aumento da população encarcerada feminina em Santa Catarina e no país.

Justifica-se, ainda, a pesquisa pelo fato do tema buscar um olhar mais humanizado para a questão da mulher encarcerada, chamando a atenção para o respeito a sua dignidade humana dentro do sistema prisional.

Com fim de tornar preciso o problema da pesquisa, estabelece-se como pergunta: em relação às mulheres encarceradas no Estado de Santa Catarina, quais os direitos fundamentais contidos na Constituição Federal de 1988, na legislação, nas doutrinas, quanto ao respeito à dignidade da mulher no sistema prisional?

Com isso, faz-se necessária uma breve identificação de leis e decretos vigentes para a vida das mulheres e sua aplicabilidade no Sistema Carcerário do Estado, conhecendo os seus direitos, mesmo na privação de liberdade.

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Descrever um perfil das mesmas será significativo para ampliar a compreensão dos tipos de mulheres que formam o conjunto de encarceradas, as suas profissões, o grau de instrução, onde mais se concentram na sociedade catarinense, entre outros pontos pertinentes.

Verificando os fatores relevantes em relação ao cumprimento ou não da dignidade humana da mulher encarcerada no Estado de Santa Catarina, juntamente com o contexto histórico das prisões femininas, encontram-se a falta de estrutura para esse público e as políticas públicas voltadas para elas.

Para a realização do presente trabalho, utilizar-se-á o método dedutivo, que consiste na análise de premissas gerais para se obter uma conclusão à pergunta problema, com pesquisa bibliográfica para uma análise crítica, buscando discutir e explicar o tema com base nas referências já existentes. Corroborando, assim, com uma visão geral sobre os direitos ao respeito da dignidade das mulheres encarceradas no Estado.

Por fim, a abordagem será qualitativa, pois se preocupa com a compreensão do problema em relação à dignidade das mulheres encarceradas, conhecendo o perfil, as leis, as políticas públicas envolvidas com esse grupo.

Para tanto, o presente trabalho é estruturado em cinco capítulos. O segundo abordará propriamente a dignidade da pessoa humana, voltada para a relação das mulheres encarceradas, identificando os seus direitos fundamentais, já contidos na Constituição Federativa do Brasil de 1988, na legislação, nas doutrinas quanto ao respeito a sua dignidade humana no sistema prisional.

No terceiro capítulo, estão descritas informações acerca do perfil das mulheres encarceradas, visando caracterizar e quantificar essa população, demonstrando a faixa etária, a raça, a escolaridade e outras particularidades, como gestantes e filhos, dados estatísticos obtidos de documentos próprios do Sistema de Informação das Penitenciárias dos Estados Brasileiros – INFOPEN, buscando elucidar a população feminina encarcerada no Estado.

Diante dos elementos expostos, no quarto capítulo, será verificado o contexto histórico do surgimento de presídios femininos e o desafio encontrado pelas mulheres, através de análise em artigos, leis e doutrinas sobre o assunto, apresentando políticas públicas, leis vigentes, em relação ao respeito à dignidade das mulheres encarceradas.

Discorrendo, assim, sobre a vida prisional em um contexto geral até chegar ao Estado, para se entender o sistema carcerário, com a figura feminina, como um ambiente não preparado para essa nova realidade, pois a maior parte dessas unidades prisionais no Estado é antiga, ou seja, não foi criada visando o público feminino.

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Dados atuais sobre a situação da mulher encarcerada serão analisados, a partir de informações coletados em sítios eletrônicos especializados, em doutrinas e legislação vigente, assim como nas políticas públicas propostas a essa população crescente na sociedade.

Contudo, é visível a complexidade da temática presente nesse trabalho e faz-se necessária a discussão social, moral e jurídica, referente à reintegração dessas mulheres na vida social, familiar, profissional, como resgate ao respeito e a sua dignidade humana.

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2 A DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E A MULHER ENCARCERADA

Para falar do assunto dignidade da pessoa humana, faz-se importante entender a raiz da palavra, que segundo o dicionário Silveira Bueno (2000, p. 258) assim a define: “é respeitabilidade, autoridade moral, portanto ligado diretamente com o ato de respeito, daí advêm à atitude exemplar com o indivíduo, na sua integridade física, moral, psíquica e social”.

Dando continuidade à definição de dignidade, Sarmento (2019, p. 27) esclarece que há pontos divergentes e importantes para ampliar a compreensão da palavra em si:

A noção de dignidade humana evoca duas ideias diferentes que se entrelaçam, mas não se identificam necessariamente: a dignidade da pessoa humana e a dignidade da espécie humana. Pode-se dizer que a dignidade da pessoa humana pressupõe a da espécie humana, mas que o inverso não ocorre. A dignidade da espécie humana consiste no reconhecimento de que o ser humano ocupa uma posição superior e privilegiada entre todos os seres que habitam o nosso mundo.

Deste modo, pressupõe-se que a dignidade é algo maior que o ser humano, sendo um valor inestimável em termos de preço, mas entendido como indispensável para o bem- comum, para o cumprimento de um mérito conquistado na sua essência, através da Constituição Federativa do Brasil (CF/1988), artigo 1º, inciso III, A dignidade da pessoa humana.

Em sociedade, quando se fala nos direitos, em dignidade, logo surge à discussão sobre igualdade em relação a classes sociais, grupos étnicos, às mulheres em relação aos homens; enfim, uma gama de assuntos que clamam por essa discussão e norteiam a formação do indivíduo, desde os primórdios da vida social, como uma prévia seleção natural.

Todo grupo social, por si mesmo, é formado por semelhantes ou, justamente, por aqueles que, não se encaixam em modelos existentes, agrupam-se não porque são iguais, mas por buscarem igualdade em direitos. Assunto há muito tempo na construção social discutido e praticado como seleção natural, conforme destaca Sarmento (2019, p. 31):

É certo que no pensamento grego já se discutia a igualdade. A teoria aristotélica sobre a justiça distributiva e compensatória é até hoje uma referência central nos debates sobre a matéria. O que então não existia era a crença de que todas as pessoas deveriam ser tratadas como iguais. Muito pelo contrário, acreditava-se na desigualdade natural entre os indivíduos como justificativa para discriminações legitimas.

Segundo ainda Sarmento (2019, p. 30), outra formulação hierárquica da dignidade encontra-se na ideia de dignitas, presente na Roma Antiga, em que a palavra era empregada

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para designar o prestígio de certas pessoas ou instituições em razão de seu status; e, também, para designar a altivez que deveria caracterizar o comportamento desses indivíduos de status superior, privilégio de poucos e não um atributo universal. Desta maneira, nota-se que a descaracterização de dignidade humana já está contida na história e na formação da sociedade como um todo.

Por outro lado, ainda afirma Sarmento (2019, p.30), “o surgimento de comunidades, povos, transformados mais tarde em sociedade, percorreu esse processo de escalas de poderes, de divisões, porém não se justifica o prolongamento desse comportamento excludente”, o tratamento diferenciado de maneira negativa em relação a alguns grupos, aqui especificamente o das mulheres, que por vezes não tem sua dignidade respeitada, seja por sua cor, sua classe ou sua condição de vida.

O ser humano é social, necessita de outras pessoas para a convivência, troca de experiências e situações, que lhe possibilite alegria, frustrações, imposição e compreensão em relação ao outro, que por vez se julga com direitos e privilégios diferenciados. Em contrapartida, relata Sarlet (2019, p. 43):

Verifica-se, portanto, que também nessa perspectiva a dignidade da pessoa humana (independentemente no nosso sentir, de se aceitar, ou não, a tese da dignidade da vida humana ou não) há de ser compreendida como um conceito exclusivo, no sentido de que a sua aceitação não significa privilegiar a espécie humana acima de outras espécies, mas sim, aceitar que do reconhecimento da dignidade da pessoa humana resultam obrigações para com outros seres e correspondentes deveres mínimos e análogos de proteção.

Neste contexto, vale ressaltar o que afirma Santo Agostinho (397- 400 d.C.), nas suas Confissões apud SARMENTO (2019, p.31), “a superioridade da pessoa humana diante dos demais seres vivos também foi afirmada, pois o ser humano é um animal racional, criado por Deus à sua imagem, dando inteligência ao homem, permitiu elevar-se acima de todos os animais da terra, das águas e do ar”. Aqui se reafirma a classificação e subdivisão, também atribuída a pessoas e sociedade, mas sem deixar de lado que o indivíduo é digno por si mesmo.

No entendimento de Nunes (2018, p. 68), “a dignidade é um conceito que foi sendo elaborado no decorrer da história e chega ao início do século XXI repleta de si mesma como um valor supremo, constituído pela razão jurídica”. Resguardada por lei, doutrinas, como um bem-comum, tornando-se um conjunto de direitos básicos, essenciais para o direcionamento ordinário e jurídico do ser humano, quando se busca preservar a sua dignidade.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos, no seu artigo 1º, no início, dá destaque à questão da dignidade humana: “Todas as pessoas nascem livres e iguais em dignidade e

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direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de fraternidade”. Dentro desta dinâmica, é um direito já garantido, porém a realidade está muito distante, pois os seres humanos parecem desumanizados da sua essência.

Diante dos elementos expostos, ficam evidentes as diferenças tanto no entendimento, quanto ao respeito da dignidade, principalmente quando está no contexto situações de violência, pobreza, discriminação, desencadeando julgamentos da sociedade, sem o devido o respeito.

Por isso, Nunes (2018, p. 70), utiliza-se da seguinte argumentação: “é necessário identificar a dignidade da pessoa humana, como uma conquista da razão ético -jurídica, fruto da reação à história de atrocidades que, infelizmente, marca a experiência humana”.

Segundo afirmação de Reis (2017, p.16), “historicamente as mulheres são protagonistas a vivenciar experiências de dor, seja pelo parto de um filho, pelas inúmeras atribuições deixadas a seu encargo, trabalhos de dupla jornada, profissão e família”.

Logo, ao longo da vida, a mulher sofreu muitas transformações no que se refere ao seu papel na sociedade. Lá não é mais somente mãe, mas também provedora de seu sustento, da manutenção familiar, está inserida no mercado de trabalho, buscando igualdade e valorização de seus direitos.

Assim, na busca por espaços e oportunidades, a mulher adentra em várias áreas na esperança de mudanças para a sua vida, de seus filhos, tentando sair da precariedade em que se encontra. Aqui surge a infeliz oportunidade para a futura vida em cárcere privado. Afinal, à procura de manter-se ou ter uma renda financeira pode resultar à ida para a vida do crime.

As pessoas anseiam por uma vida digna, com o mínimo de conforto para si e seus entes queridos, através do trabalho, da integração social. As incertezas, os desafios surgem, assim como propostas de soluções rápidas, que levam a mulher a aumentar as estatísticas da criminalidade. Muitas vezes um caminho sem volta, como se relata no artigo sobre o perfil socioeconômico das presidiárias, segundo Macedo, Terra, Santos, Miranda, Santana e Pereira (2016, p.31):

A inserção do indivíduo na criminalidade traz consigo um rótulo, marcando esse cidadão durante um longo período ou pelo resto de sua vida, com possibilidade de privação de liberdade ou de outros direitos fundamentais. Nesse sentido quando a criminalidade envolve mulheres, seu peso negativo aumenta bastante, devido às características sociais, culturais e histórias de gêneros.

É neste contexto social e familiar que se encontra a figura da mulher. Afirma Lisboa (2018) que:

Por vezes muito jovem, sem estrutura emocional, financeira, desprovida de benefícios básicos, sofre algum tipo de violência, como abuso sexual, físico,

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direcionando a sua vida para a prostituição, uso de substâncias ilegais, até o encarceramento, devido aos crimes cometidos, seja para o sustento de seu vício adquirido, ou para a subsistência dos que dependem dela para viver.

No entendimento de Lisboa (2018), “grande parte das mulheres encarceradas trabalha na baixa hierarquia do tráfico. Não são grandes gerentes e com alta periculosidade. Penas alternativas poderiam ser pensadas”. Poderiam ser pontos relevantes para a vida da mulher encarcerada e seus direitos, quando o motivo de sua prisão estiver atrelado ao mundo das drogas.

2.1 A MULHER ENCARCERADA E A BUSCA DE SUA DIGNIDADE

A sociedade, na qual todos os indivíduos estão inseridos, mediante ao papel que cada um desenvolve, acarreta direitos e deveres que, ao longo do desenvolvimento, estruturam os valores pessoais, morais, éticos, que permeiam o perfil da pessoa, criando nela a consciência das suas escolhas, oportunizando a vivência de sua dignidade humana no quotidiano.

O ser humano tem livre arbítrio, mas a sua vida inserida na realidade pode afunilar as suas escolhas, suas perspectivas até que ele mesmo esquece a sua dignidade, seus direitos (BRASIL, 1988). Não porque é pobre, mas porque está acostumado com essa situação. Conforme estudo da Pastoral Carcerária (2018, p. 33):

Todas as pessoas, independentemente de sua condição social, raça, religião ou orientação sexual, têm direito a vida digna e plena, como reza o artigo 5º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Nos processos de adoecer e morrer, as desigualdades sociais, econômicas e culturais se revelam de maneira diferenciada para cada indivíduo ou grupo populacional. Isto se aplica de modo especial à população privada de liberdade. Na grande maioria não são oferecidas as condições mínimas de prevenção e de recuperação da saúde das pessoas que ali se encontram.

Segundo consta nos dados da Pastoral Carcerária (2018, p. 37), com o surgimento e aumento da população feminina encarcerada, no país, nos estados, faz-se importante ressaltar “os principais instrumentos legais para o tratamento de mulheres em situação de prisão no Brasil: a própria Constituição Federativa do Brasil de 1988, a Lei de Execução Penal (LEP), o Código Penal (CP), o Código de Processo Penal (CPP) e as Regras de Bangkok (Regras das Nações Unidas para o Tratamento de Mulheres Presas e Medidas não Privativas de Liberdade para Mulheres Infratoras)”.

Através destes dispositivos legais, segundo a Pastoral Carcerária (2018, p. 37):

Busca-se a garantia de que essas mulheres, mesmo que infratoras terão seus direitos mantidos, nesse período em que estão privadas de sua liberdade, para cumprir a sentença que lhe foi imposta, não como castigo, mas para reparação do delito

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causado à sociedade. Porém, as dificuldades existentes nos espaços prisionais são várias e muitas vezes afetam a dignidade humana das mulheres encarceradas.

Para Mallmann (2012), o Estado é o principal responsável pelo bem-estar da comunidade encarcerada:

Possibilitando à mulher mantida na prisão, tenha a possibilidade de atendimento médico, odontológico e jurídicos, quando necessário, concomitante ao acesso à alimentação, às instalações com situação digna de abrigá-las, oportunizando estudos, trabalhos, atividades religiosas, interação social, e ainda assistência psicológica.

A prisão de qualquer ser humano já demonstra que houve falhas no Estado, quando se refere à educação, segurança e saúde da população. De alguma maneira, alimentou-se a desigualdade, provocando um efeito dominó dentro da sociedade.

Por isso, quando dentro do sistema prisional há qualquer descuido em relação ao desrespeito pela dignidade humana, está-se aumentando a desigualdade entre as pessoas, que por lei têm seus direitos previstos na Constituição Federativa do Brasil de 1988, considerada a Lei Maior.

A natureza do presídio é masculina, pois “o sistema carcerário foi pensado por homens e para homens; e é recente a legislação que propõe a construção de estabelecimentos prisionais que possam atender as específicas necessidades da mulher presa” (SÃO PAULO, 2011).

Segundo artigo escrito por, Nascimento, Salvador e Castellano (2020, p.86), há relatos de situações de descaso com as mulheres encarceradas:

A mulher tem várias necessidades básicas, que são próprias da sua natureza, por isso o ambiente prisional, que hoje existe não está adequado para esse público que tem variante de acordo com o crime que a levou para a prisão, porém há pontos em comum com todas elas, como por exemplo, há o período menstrual, que gera toda uma situação à mulher, o kit de higiene pessoal que elas devem receber, usufruindo do mínimo necessário para a sua dignidade como mulher.

A sociedade em seu contexto e formação apresenta atitudes machistas, que colaboram com o olhar que se tem para as mulheres encarceradas. Esta afirmação tem força e visibilidade na cultura do país, que, até hoje, trata a mulher com minoridade, conforme bem definido na introdução da Regra de Bangkok (BRASIL, 2016, p. 9):

Historicamente, a ótica masculina tem sido tomada como regra para o contexto prisional, com prevalência de serviços e políticas penais direcionadas para homens, deixando em segundo plano as diversidades que compreendem a realidade prisional feminina, que se relacionam com sua raça e etnia, idade, deficiência, orientação sexual, identidade de gênero, nacionalidade, situação de gestação, entre outras nuanças.

Outro ponto relevante, quando se fala em resguardar os direitos da mulher encarcerada, são os cuidados médicos, como ginecologista, principalmente no cuidado em

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relação à prevenção de certas doenças cancerígenas; e assistência e cuidado conforme a idade, direitos definidos nas políticas de saúde pública através do Sistema Único de Saúde (SUS). Para Macedo, Terra, Santos, Miranda, Santana e Pereira (2019.p. 32):

Sem dúvida, a implementação de políticas públicas de inclusão social voltada a essa população é de extrema importância com vistas a garantir a promoção e recuperação de sua saúde e sua prevenção de enfermidades e doenças.

Importa, contudo, ter presente a seguinte constatação, apontada por Vingert (2015, p.19):

Que essa população de mulheres encarceradas, na sua maioria, é pessoas com poucas instruções em nível de escolaridade, que vivem em condições precárias de moradia, de trabalho mal remunerado e ou informal, situações que já colaboravam com sua má condição de saúde, ou seja, muitas embora jovens tenham filhos, sem o menor acompanhamento digno, tão pouco com suporte emocional, financeiro e preventivo.

Ainda há na sociedade atitudes de preconceitos com esse grupo social, pois cometeram crimes de vários níveis, mas não deixaram de serem seres humanos, com necessidades. Talvez seja justamente ao contrário, essa cultura precisa de muita reflexão e cuidado, por isso Macedo, Terra, Santos, Miranda, Santana e Pereira (2016, p.35) afirmam:

Levar o cuidado para dentro das prisões significa abandonar preconceitos e priorizar o bem-estar e a qualidade de vida, direitos garantidos por lei a todos os indivíduos no Brasil. Nesse sentido, a realidade vivenciada nas penitenciárias demanda a elaboração de projetos voltados à implementação de equipes multiprofissionais de saúde.

Sabe-se que “o universo das mulheres encarceradas é de uma realidade pesada no âmbito emocional e, com o tempo, afeta o psíquico, desencadeando outros problemas, tanto físico, como doença crônica, ou alimentando ainda mais o seu instinto criminal” (PIZOLOTTO, 2014, p.17).

Afinal, o ambiente não propicia visão positiva a longo prazo, se o local em que elas estão vem de desencontro com suas expectativas, no que se refere ao tratamento e respeito. Elas estão em situação de desvantagem para exigir que a lei se cumpra, durante o tempo em que permanecerem em cárcere.

Para Andrade (2017, p. 21), a condição dessa população:

Já se inicia com desvantagens significantes, em relação aos homens presos, porque a mulher tem a grande carga de mãe. A preocupação com os filhos e com todo o cuidado dispensado às crianças, no período de seu encarceramento, além da dor pela ausência dos filhos, a mulher ainda sofre com o descaso nas prisões, sendo tratada como invisível pela sociedade.

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A questão emocional, sentimento de abandono e “muitas vezes o peso da solidão, que às vezes é amenizado, quando ocorre o tratamento de saúde, uma atividade esportiva, um trabalho que lhe ocupe de maneira saudável a mente” (REIS, 2017, p.38).

Para a Pastoral Carcerária (2018, p.10), essa população sempre viveu à margem da pobreza, porque não dizer da miserabilidade social, econômica; e a questão da saúde, pior ainda. Mas, por outro lado, quando elas se envolvem na criminalidade, a justiça dos homens ocorre com rapidez na aplicação de penas, que pode até levar à prisão.

Seguindo este pensamento, o Documento de Aparecida, n. 454 (2016 apud PASTORAL CARCERÁRIA, 2018, p. 10) afirma:

Que é urgente escutar o clamor, muitas vezes silencioso, de mulheres que são submetidas a muitas formas de exclusão e de violência, em todas as suas formas e em todas as etapas de suas vidas. Entre elas, as mulheres pobres, indígenas e afro-americanas têm sofrido dupla marginalização. É urgente que todas as mulheres possam participar plenamente na vida eclesial, familiar, cultural, social e econômica, criando espaços e estruturas que favoreçam maior inclusão.

Quando o assunto é respeito à dignidade da pessoa humana, por si não causa tanta polêmica e discussão, pois a sociedade está ciente deste direito, garantido na legislação, porém a prática é diferente. Afinal, se estão presas, é porque cometeram um delito, e essa motivação gera discriminação e disseminação de que preso não tem direitos, mas deveres.

A sociedade não tem tanto esclarecimento, no que tange os direitos de uma pessoa privada de liberdade, “no entanto, quando a temática se volta para a população encarcerada, a visão muda, pois vem carregada de emoções negativas, ideias já formuladas, sentimento de medo e revolta” (MACHADO, 2017, p.48).

Para que ocorra a garantia na execução do direito contido na Constituição Federativa do Brasil, para a mulher encarcerada, na vida em sociedade, Sarlet (2019, p.91) aborda o assunto e diz que:

Além dessa vinculação (na dimensão positiva e negativa) do Estado, também a ordem comunitária e, portanto, todas as entidades privadas e as particulares encontram-se diretamente vinculadas pelo princípio da dignidade da pessoa humana, o que implica a existência de deveres de proteção também na esfera das relações entre particulares.

Continua ainda Sarlet (2019, p.91) por enfatizar a questão de que:

O Estado nunca foi (e cada vez menos o é) o único e maior inimigo das liberdades e dos direitos fundamentais em geral. Que tal dimensão assume particular relevância em tempos de globalização econômica, privatizações, incremento assustador dos níveis de exclusão.

O poder público é a autoridade, tem muita ou toda influência direta no cumprimento das práticas realizadas dentro dos presídios. “No que se refere ao cumprimento de regras, de

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direitos, cabe ao Estado realizar ações que levem a mulher encarcerada a conseguir viver na prisão, não como castigo, mas um processo de ressocialização” (Ventura, 2009, p.21 apud REIS, 2017, p.39).

Enfatiza Zaninelli (2015, p. 22) que “a mulher deveria nesse período ter condições dignas de trabalho, estudo, para adquirir qualidades para o seu retorno à vida social em liberdade”.

Nesta ótica, a dignidade é um valor adquirido ao ser humano, a partir de seu nascimento, ou como diz Chaves de Camargo (apud NUNES, 2018, p. 71-72):

Pessoa humana, pela condição natural de ser, com sua inteligência e possibilidade de exercícios de sua liberdade, se destaca na natureza e se diferencia do ser irracional. Estas características expressam um valor e fazem do homem não mais um mero existir, pois este domínio sobre a própria vida, sua superação, é a raiz da dignidade humana. Assim, toda pessoa humana pelo simples fato de existir, independentemente de sua situação social, traz na sua superioridade nacional a dignidade de todo ser. Não admite discriminação, quer em razão do nascimento, da raça, inteligência, saúde mental, ou crença religiosa.

Ora, todos têm direitos e garantias contidos na Constituição Federativa do Brasil de 1988, mesmo a população de mulheres encarceradas, que estão envolvidas no mundo do crime. Ou como diz Sarlet (apud NUNES, 2018, p. 72): “todos, mesmo o maior dos criminosos, são iguais em dignidade, no sentido de serem reconhecidos como pessoas, ainda que não se portem de forma igualmente digna nas suas relações com seus semelhantes, inclusive consigo mesmas”.

As atitudes de não valorização de si mesmos podem carregar um fardo de violência anterior, já praticada desde muito cedo. A falta de oportunidades acaba por induzir o indivíduo ao caminho da reprodução daquilo que foi imposto a ele.

Não discernindo que o mal continua, simplesmente ou infelizmente em outra pessoa e em outro espaço. “Afinal, na medida em que o ser humano age socialmente, poderá ele próprio tão dignamente protegido, violar a dignidade de outrem” (NUNES, 2018, p.73).

Por isso, no Documento Regras de Bangkok, especificamente a de nº 29 e nº 33 (BRASIL, 2016, p. 28,), chama a atenção para a formação de agentes, no trabalho com as mulheres encarceradas:

Regra 29 - A capacitação dos/as funcionários/as de Penitenciárias femininas deverá colocá-los em condição de atender as necessidades especiais das presas para a sua reinserção social, assim como a operação de serviços e equipamentos seguros e com foco na reabilitação. As medidas de capacitação de funcionárias deverão incluir também a possibilidade de aceso a postos superiores com responsabilidades determinantes para o desenvolvimento de políticas e estratégias em relação ao tratamento e cuidados com as presas;

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Regra 33 – Todo funcionário designado para trabalhar com mulheres presas deverá receber treinamento sobre as necessidades específicas das mulheres e os direitos humanos das presas.

O ato de estar privado de sua liberdade já desencadeia uma série de situações, na vida da mulher encarcerada. Ainda mais quando o espaço é pequeno para o grande número de presas, provocando desentendimentos, rivalidades, a busca de dominação de território, para com isso impor regras, leis próprias do mundo criminal, podendo gerar rebeliões, mortes e mais prejuízos a sua vida.

No entendimento de Sarmento (2020, p. 59):

De todo modo, na esfera social, as pessoas são e sempre foram percebidas no Brasil como seres situados, inseridos numa teia de relações sociais constitutivas da sua identidade. Todavia, esse enraizamento nunca funcionou como um elemento emancipatório, que propiciasse proteção mais integral aos direitos e necessidades das pessoas vulneráveis, mas pelo contrário: um enraizamento de feições pré-modernas, em que o status jurídico da pessoa se relaciona, na prática, a elementos como classe social, cor, profissão, relações familiares e de amizade do indivíduo. A questão, portanto, acaba se reconduzindo ao mais crônico dos problemas nacionais: a desigualdade.

Para se discutir a desigualdade, faz-se necessário olhar para a sociedade para se verificar atos de violência, questões raciais, religiosas, que por vezes somados podem desencadear outras questões, até chegar ao crime.

Na afirmação da Desembargadora Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer, em 2015, “a maior parte das unidades é antiga, a de Tubarão, nem deveria funcionar mais, foi possível constatar a condição de tratamento cruel, desumano e degradante”, quando fez o relatório daquele ambiente, devido às condições em que se encontrava. Este pode ser outro fator a contribuir para um atendimento menos humanizado (DETENTAS, 2017).

Outro levantamento concreto em relação à situação das demais unidades prisionais, realizado por Detentas (2017), relata que:

Todas as unidades do Estado que abrigam mulheres eram originalmente para homens. Em Florianópolis, por exemplo, o prédio já foi cadeia de político preso, serviu de ala psiquiátrica e abrigou o Presídio Masculino de Biguaçu. De modo geral, os pavilhões que foram desocupados pelos homens acabaram sendo adaptados.

A saúde básica é um instrumento de qualidade de vida, também contido no rol do Direito Social, assegurado na Constituição Federativa do Brasil de 1988. No seu artigo 6º, assim determina: “São direitos sociais: a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”.

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Todos os requisitos citados anteriormente deveriam trazer tranquilidade à mulher encarcerada. Porém, como constatado, ainda é uma realidade distante, mas não impossível de ser alcançada.

Em estudo divulgado pela Diretoria de Análise de Políticas Públicas da Fundação Getúlio Vargas (apud LISBOA, 2018), afirma-se que o Brasil possui uma das maiores populações carcerárias femininas do mundo; e prisões relacionadas ao tráfico de drogas correspondem à maior parte delas. Entre 2000 e 2016, a população carcerária feminina aumentou 567% e que, se considerados dados atualizados até 2018, subiu para 700%.

Além desta dura constatação, na mesma pesquisa, outro ponto chama a atenção em relação à população encarcerada: “o encarceramento das mulheres se dá muitas vezes em presídios mistos, em que há presos e presas. Entre as penitenciárias brasileiras, 17% são mistas e 7% são exclusivamente femininas”. Com esses dados, pode-se verificar o risco ao qual são submetidas, no período do cumprimento de sua pena.

Outro estudo, realizado e organizado por Souto (2016, p.396), afirma que:

É importante salientar que os dados apontam para presas em situação vulnerável na sua sociedade, carente de: subsídios, família que lhe de suporte e a ajude. Na maioria dos casos são mulheres pobres e negras, não que as ricas e brancas não cometam delitos, mas destas poucas são presas, pois cometem crimes muito bem- elaborados e de grau superior em relação a grande parte das encarceradas.

Essas pesquisas revelam o mundo desigual em que as mulheres encarceradas estão inseridas. Sem ambiente preparado para elas, ocorrem outras necessidades em decorrência do descaso legal na pessoa do Estado, que em nada contribui para que, ao saírem do sistema prisional, não tenham reincidência ao crime, pois a desigualdade social e humanitária acaba por ser natural em suas vidas.

Afinal, o fato de serem mulheres encarceradas não exclui o de ser pessoas com dignidade, com necessidades. Mesmo estando no sistema prisional, ainda almejam outra vida, uma nova chance, uma vida livre para recomeçar. Por isso, é de suma importância que, no período em que se encontram encarceradas, tenham consciência e experiência do respeito a sua dignidade humana.

Essa consciência e essa experiência tornam-se mais urgentes se são mulheres gestantes e lactantes. Embora na Lei de Execução Penal, no artigo 89, “assegura que a penitenciária de mulheres poderá ser dotada de seção para gestante e parturiente e de creche com a finalidade de assistir ao menor desamparado cuja responsável esteja presa”.

Segundo a perspectiva de Souto (2016, p.400), são poucos os presídios que realmente possuem locais apropriados para acolher a mãe e a criança. Assim, a criança acaba confinada,

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pois talvez seja o único modo de permanecer junto à mãe e, com isso, os seus direitos não são respeitados.

Quando se fala da questão do desrespeito à dignidade da mulher encarcerada, existem muitas situações em que elas acabam se envolvendo em relações afetivas diversas, para ter uma sobrevida de mínima qualidade no sistema prisional. De acordo com estudo realizado e organizado por Souto (2016, p. 400), surge a

Chamada homossexualidade situacional, ou seja, diante de uma circunstância necessária, a materialidade, a condição financeira e as dependências de variadas ordens se sobressaem no momento de tomar esta decisão; aproximar-se de alguém que possua uma conjuntura mais elevada dentro do presídio pode propiciar vantagens e trazer benefícios para quem, em determinado ponto, precisa de auxílio.

Para Souto (2016, p.400), situações constrangedoras como essas “poderiam ser evitadas nesse espaço, se as mulheres encarceradas fossem tratadas com respeito, com dignidade, com as garantias das leis existentes sendo executadas, tendo presente a sua segurança”.

Continua Souto (2016, p. 401) afirmando que “seu bem-estar, não é um ato a se negociar, submetendo-se a ações que vão à contramão com seus princípios, para manter-se segura nos presídios, enquanto estiver no cumprimento de sua sentença”.

Conclui o mesmo autor essa questão da segurança, afirmando:

Essas mulheres acabam por se desumanizar ainda mais, pois estão trocando sua vida, seu corpo, como garantia de coisas básicas, como materiais de higiene pessoal, comida mais digesta, roupas limpas para vestir, e sentir-se mais segura, nesse ambiente de violência, disputa de poder, de espaço.

Os crimes que as mulheres encarceradas cometeram irão marcá-las para o resto de suas vidas, farão parte do seu DNA social. A sociedade, por vezes, as tratará com indiferença, nunca as absolvendo de suas culpas, embora já pagaram a sua penalidade nos tempos de prisão. Segundo o estudo realizado e organizado por Souto (2016, p. 402):

A questão é que o cárcere feminino possui diversos erros, mas que podem ser resolvidos para que essas mulheres saiam dos presídios cidadãs melhores, e o ponto principal que haja a garantia de seus direitos, pois mesmo tendo cometido um crime, nunca deixaram de serem seres humanos e, principalmente antes de julgar, devemos entender o motivo que as levou para trás das grades.

No livro Presos que menstruam, Queiroz (2015, p. 182) cita um importante fato, mas triste, de que “muitas mulheres encarceradas têm que usar até miolo de pão, como absorvente interno”, porque não o possuem e o Estado não supre esta necessidade básica. Há situações em as mulheres não recebem nenhuma visita, por isso não tem como pedir este auxílio, ainda conclui a autora.

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A Lei de Execução Penal (BRASIL, 1984), nos seus artigos 10 e 11, traz garantias a mulheres encarceradas, possibilitando às presas que tenham condições dignas no seu período de cárcere:

Art. 10. A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade. Parágrafo único. A assistência estende-se ao egresso.

Art. 11. A assistência será: material; à saúde; jurídica; educacional; social e religiosa.

É notório o desafio ao tratamento da mulher encarcerada no Estado, no país, pois diferentemente do homem possui especificidades próprias do ser mulher. Como bem define Heide Ann Cerneka, Coordenadora da Pastoral Carcerária, “a mulher pode visitar o marido preso e engravidar dentro da cadeia e sair, mas se a mulher é presa, o homem a visita e ela engravida, o problema passa ser do Estado” Queiroz, (2015, p. 234 apud VINGERT, 2015, p. 30). Aqui se acentuam os problemas e as desigualdades como mulher e mãe.

Para Diuana (2016, apud REIS, 2017, p. 33), “a defesa da mulher encarcerada dá-se muito no âmbito social e humano, como forma de evitar o aumento ainda mais desse grupo e também colaborar à não desestruturação familiar, em que os seus já estão inseridos”.

Outro forte motivo é acentuado ainda por Diuana (2016 apud REIS, 2017, p.33):

É notável a ausência do Estado na garantia dos direitos mínimos tanto de atendimento social, como de saúde destas mulheres, contando a Instituição com parcerias de ONGs para a realização da assistência à saúde, bem como realização de exames. As ONGs atuam nas lacunas da ausência do Estado nas políticas públicas. No entanto, é fundamental a responsabilidade do Estado na promoção de condições que contribuam para a ampliação de escolhas e efetivação de diretos destas mulheres, entre eles o direito à saúde, em especial, à saúde sexual e reprodutiva.

A sociedade, como um todo, apresenta diversidades financeira, racial e cultural Porém, a desigualdade em relação à distribuição de suas riquezas, nas relações socioeconômicas, gera pobreza, exclusão, dá margem para a violência, tornando-a, por vezes desumana, esquecendo-se do respeito, da dignidade de ser pessoa (BRASIL, 1988).

Ainda sobre dignidade humana, é importante ressaltar as palavras de Sarlet (2019, p.90), sobre o assunto:

Considerando a dignidade como tarefa, o princípio da dignidade da pessoa humana impõe ao Estado, além do dever de respeito e proteção, a obrigatoriedade de promover as e condições que viabilizem e removam toda a sorte de obstáculos que estejam a impedir as pessoas de viverem com dignidade. Dupla função de proteção e defesa segue também o dever de promover medidas de precaução procedimentais e organizacionais no sentido de evitar uma lesão a dignidade e dos direitos fundamentais, ou quando isso não ocorrer, com o intuito de reconhecer e fazer cessar (ainda que para efeitos simbólicos), ou de acordo com as circunstâncias, minimizar os efeitos das violações, inclusive assegurado a reparação de dano.

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A dignidade é uma tarefa, um dever a ser realizado, com tempo para iniciar, porém sem tempo de finalização; pois o ser humano evolui e suas exigências também. Contudo, o respeito à dignidade da pessoa humana é um valor que acompanha a sociedade, a pessoa na sua essência. Afirma Sarlet (2019, p. 151):

É justamente neste contexto que o princípio da dignidade da pessoa humana passa a ocupar lugar de destaque, notadamente pelo fato de que, ao menos para alguns, o conteúdo em dignidade da pessoa humana acaba por ser identificado como constituindo o núcleo essencial dos direitos fundamentais.

Por fim, a dignidade é um princípio, um valor que não se perde no tempo. Ao contrário, é uma busca diária da sociedade e na vida humana. Como nos instiga a Pastoral Carcerária, ao afirmar: “quando defendemos um mundo sem cárceres, precisamos usar instrumentos eficientes para demoli-los”.

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3 AS MULHERES ENCARCERADAS E A VIDA PRISIONAL

Desde seus primórdios, a sociedade constrói-se com base na dominação de povos, tribos; imposição de culturas, raças, religiões. Na atualidade, continua a seguir a sobreposição de poderes, só que por outra ótica, partindo para a questão financeira e social, periferia e centro, pobres e ricos, homens e mulheres, com escalas de direitos e deveres diferenciados, devido à formação do início da essência humana.

Na definição de Tomás de Aquino (apud BATISTA; OLIVEIRA; GROKORRISKI, 2017, p.2) “a mulher é um homem incompleto”. Nota-se a concepção diferenciada em relação à mulher migrando para dentro dos sistemas prisionais, que não estão adequados a elas, devido às estruturas pensadas e executadas por e para homens.

Passando para outra visão da mulher, a mitologia grega cita “Pandora (a que possui todos os dons, ou a que é o dom de todos os deuses) foi a primeira mulher criada por Zeus como punição aos homens pela ousadia do titã, que viviam felizes e sem preocupação”, (BATISTA; OLIVEIRA; GROKORRISKI, 2017, p.2). A mulher era tratada com desigualdade, vista como algo negativo à sociedade da época.

Nos tempos de hoje, apesar das conquistas femininas, como direito ao voto, de decidir sobre possível aborto legal, de estar na disputa no mercado de trabalho, de não deixar sua feminilidade escondida, a mulher pobre, de periferia, negra, muitas vezes de baixa escolaridade, e exercendo trabalho informal, são aquelas que, por vezes, formam ou aumentam a população de mulheres encarceradas no país e no Estado.

Segundo Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias (INFOPEN, 2016), a população encarcerada no Brasil, dividida em raças e etnias, está assim representada:64% são de raça negra e 35% são de raça branca. Em Santa Catarina, devido às origens europeias, as porcentagens são diferentes, sendo 56% brancos, 42% negros, 1% amarelos. Esses dados, em termos gerais, não definem o sexo dos presos.

Outros dados retirados do Plano de Ação Estadual para Atenção à Saúde da Pessoa Privada de Liberdade do Estado de Santa Catarina, de 2014/2015, tratam de todas as questões voltadas para essa população e afirmam que:

Havia um número de 1091 mulheres presas, com faixa etária de 18 a 60 anos, que por suavez tinha 24 acima dos 61 anos, sendo 16 gestantes e 04 crianças de até 06 (seis) meses habitando no presídio, ou seja, uma grande mistura de biótipos no mesmo espaço, porém com necessidades diversas, que estão longe de alcançar o respeito pela dignidade humana.

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Em uma reportagem de Detentas ((2017), fez-se o seguinte levantamento com dados obtidos do Departamento de Administração Prisional (DEAP), relatando que havia no Estado de Santa Catarina 688 vagas para mulheres, porém tinha 956 detentas, das quais 265 no regime semiaberto; 278 no regime provisório; e 413 no regime fechado. Ou seja, número muito superior ao previsto, para que elas contemplem um tratamento mais adequado nos presídios, acarretando mais desconforto, exigindo mais cuidado e possibilitando outros problemas com a lotação.

No mesmo relato, ainda se constatou que havia cinco grávidas presas de maneira preventiva e uma com o filho na cela, devido à falta de estrutura para creche nesses espaços, em que crianças e mães precisam se instalar com qualidade e respeito as suas vidas e sua dignidade pessoal.

Os dados mostram um breve raio X do sistema carcerário no Estado de Santa Catarina, que não trabalha sozinho e conta com o apoio da Defensoria Pública. Esta, em 2017, realizou um mutirão, no qual analisaram 890 processos. Nele foram levantados dados importantes, como: presas que são mães de crianças menores até 12 anos, num total de 437; reavaliação de processos a pedido das mesmas, sendo ao todo 373 (DETENTAS, 2017).

Ainda no relato de Detentas (2017), há mais apontamentos:

Diante da realidade apresentada, nota-se o empenho da justiça, porém ainda há muito a ser feito por essa população feminina encarcerada, que vivem em presídios precários e até mistos, gerando insegurança, principalmente naquelas que estão grávidas e com crianças no mesmo espaço, com as demais presidiárias.

Quando se fala da dignidade da pessoa humana, faz-se importante sempre retomar o que consta na Constituição Federativa do Brasil de 1988, no seu artigo 5º inciso III: “Ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento desumano ou degradante” (BRASIL, 1988). Olhando para a realidade da mulher encarcerada tanto em Santa Catarina, como no Brasil, percebe-se que há lacunas relacionadas à questão, pois existem crianças envolvidas nesse emaranhado prisional.

Desta forma, nem a mãe encarcerada, nem a criança, nesse ambiente, tem condição de usufruir de um afeto sereno, com privacidade, porque nada favorece a elas. Não foi criado, adaptado um local para essa nova realidade, tão pouco voltado ao respeito a sua dignidade como pessoa, que vai muito além do espaço físico, como afirma Sarlet (2019, p. 90):

Assim, percebe-se, desde logo, que o princípio da dignidade da pessoa humana não apenas impõe um dever de abstenção (respeito), mas também condutas positivas tendentes a efetivar e proteger a dignidade dos indivíduos. Aqui considerando a dignidade como tarefa do Estado, que tem o dever de respeito e proteção, a obrigação de promover as condições que viabilizem e removam toda a sorte de obstáculos que estejam a impedir as pessoas de viverem com dignidade.

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A mulher encarcerada, seja aqui em Santa Catarina, seja em qualquer outro lugar do país, quase sempre é mãe de vários filhos, sem ou quase nenhum nível de estudo, de classe pobre, de origem familiar desestruturada, de bairros sem condições sanitárias e com tamanha pobreza. Toda esta situação pode favorecer para a entrada ao submundo do crime.

Nesta circunstância, a mulher à margem do respeito a sua dignidade, por consequência, torna-se uma pessoa encarcerada. Ela pode ficar apática no ambiente, não buscando seus direitos e ficando apenas com os deveres. Talvez, com medo, considere que a vida é assim e se acomode ou, por vezes, se acostume com a falta de cuidado, como constata Vingert (2015, p. 18):

As garantias para a mulher presa existem, mas não são, em absoluto, atendidas, sendo, umas das causas, o ânimo pacífico das detentas, pois há poucas rebeliões orquestradas por mulheres, e, quando ocorrem, são menos violentas e não causam repercussão.

Nota-se, então, que há direitos na lei, porém há dificuldade ao acesso e ao conhecimento para se chegar a eles. “As mulheres encarceradas muitas vezes não sabem deles, porque, no sistema prisional, pode de alguma forma não chegar essa informação, pois faltam pessoas no espaço que levem essas informações a elas” (VINGERT, 2015, p. 18).

A realidade apresentada deixa evidente o desrespeito à dignidade da mulher encarcerada em ser mulher, pois nem o atendimento básico a sua saúde é observado, principalmente para as grávidas. Segundo aponta Detentas (2017), das 13 unidades que abrigam mulheres no Estado, apenas duas constam com Berçário (Florianópolis e Itajaí). No entanto, nenhuma delas dispõe de creche, e áreas de atendimento à saúde, dificilmente possuem acompanhamento ginecológico.

Afirma ainda Queiroz (2015, p. 94):

Pesquisadores estimam que por volta de 85% das mulheres encarceradas sejam mães. Quando detidas, seus filhos são distribuídos entre parentas e instituições. Só 19,5% dos pais assumem a guarda das crianças. Os avós maternos cuidam dos filhos em 39,9% dos casos e 2,2% deles vão para orfanatos, 1,6% acabam presos e 0,9% internos de reformatórios juvenis.

Diante da questão, os filhos acabam aos cuidados de terceiros. Essa realidade é um desafio, pois são filhos de encarceradas. Assim, essas mulheres acabam com uma condenação ainda maior, além do crime que cometeram irão para a prisão e, por consequência, ficarão distantes de seus filhos, de tenra idade, e muitas vezes sofrem o abandono de familiares, afirma ainda o mesmo autor.

Não é uma situação muito rara a questão da solidão e tristeza por causa da separação dos filhos, nem tão pouco o afastamento voluntário dos demais parentes. Aqui também

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podem surgir discriminação e vergonha de conviver com uma presidiária, como define Silva (2017, p.4):

Na ala feminina, as visitas são bastante escassas. Nos dias de visita da unidade, a fila para a ala masculina era enorme, enquanto que a feminina nem fila tinha. As famílias não acham necessário visitar as mulheres todos os finais de semana. Muitas ainda recebem a visita de suas mães, porque precisam levar os filhos para elas verem. Maridos são raridades, ou porque também estão presos ou abandonam suas esposas quando recebem a liberdade antes delas.

A situação das mulheres encarceradas fica mais penosa, na questão da maternidade, do afeto familiar, do respeito a sua pessoa, dos seus sentimentos. Cabe ressaltar que, mesmo tendo cometido delito, a mulher não deixou de ser humana, de ter sua dignidade como pessoa, por isso é importante um olhar mais humanizado, até mesmo dos seus familiares.

Existem fatores que não contribuem com a perspectiva de mudança de vida, pois “quando analisado mais de perto, cada mulher encarcerada tem uma história sofrida, com pouco diálogo, com muitas exigências, pobreza de afeto, de limitações sociais, educacionais e financeiras” (SILVA, 2017, p.8).

Por isso, faz-se necessário conhecer quem são as mulheres que fazem parte da população encarcerada no Estado e mostrar breve perfil do grupo, de não invisíveis, mas que estão à margem da sociedade, por causa de seus crimes. Logo, acabam não se reabilitando de maneira saudável para si, para os seus e para o sistema carcerário, devido à falta de informação e formação dentro e fora do presídio.

Para Silva (2017, p. 8), está ocorrendo mudanças, pois:

Um olhar mais crítico ao encarceramento feminino está surgindo, hoje, estas mulheres estão começando a ter visibilidade, e ter esperanças por dias melhores, principalmente nas condições de cumprimento de suas penas e evoluir no tocante as garantias de direitos das mulheres em conflito com a lei, incluindo desde o momento da prisão, execução penal e retorno à sociedade.

Na compreensão de Pimenta (2018, p.128), em relação ao assunto:

O sistema de justiça atua de forma mais rigorosa contra negros, se comparando com os brancos. Uma das alegações de que há mais negros pobres do que brancos pobres, portanto maior prática de crimes por esse extrato. Ou seja, mesmo quando controladas as demais variáveis, a cor da pele é decisiva para decisões judiciais.

Mas a questão da discriminação, da desigualdade de classes, de raças, cujas raízes fortes na sociedade acabam por criar as regras, quando se trata de pessoas encarceradas, dando a elas um estereótipo, que as limitam e impedem de retomarem seus direitos, seus deveres, como cidadãs.

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O sistema penal está direcionado à perseguição e à repressão de uma forma específica de criminalidade, típica das classes mais pobres, operando através de um sistema de criminalização seletiva, de um lado, e de outro, a partir da maior imunidade conferida à elite frente a esse sistema.

Vale salientar que a divisão de classes, de raças, é um fato, é uma realidade orgânica e estrutural, explicitando que a escravidão no documento foi abolida, mas a questão tem peso relevante na falta de respeito à dignidade humana.

Assim, a liberdade de expressão está contida na lei, mas o cidadão não consegue se manifestar livremente, como consta na Constituição, no artigo 5º, inciso IV: “é livre a

manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato” (BRASIL, 1988).

Dentro desta ótica, para as mulheres não é diferente. Elas não mandam no seu corpo, mas têm sonhos, desejos, dentro da sociedade, e esses pontos podem ser mais difíceis para aquelas que deixam o sistema prisional.

3.1 PERFIL DAS MULHERES ENCARCERADAS

A sociedade não está habituada com a figura da ex-encarcerada, da mulher que cometeu um crime, porém cumpriu sua pena e tenta retornar para a vida familiar e profissional. Existe preconceito com esse grupo que sempre levará consigo a marca de ter um dia passado pela situação prisional.

Por isso se faz necessário traçar um breve perfil desse grupo dentro da sociedade, como busca de conhecer melhor, para assim almejar soluções, viáveis no âmbito social familiar, judicial, tendo como prioridade a ressocialização das mesmas.

Neste contexto, afirma Silva (2017, p.5) que:

O sistema de justiça criminal está evoluindo. E o que temos percebido é a sociedade, na maioria dos casos não está preparada para receber estas mulheres ao seu convívio. É necessário urgentemente a expansão de políticas públicas de reintegração social, com encaminhamento ao mercado de trabalho, aproveitando esta mão de obra qualificada que está saindo dos presídios.

Há despreparo em receber essas mulheres no mercado de trabalho. Também, algumas particularidades merecem atenção, como a escolaridade das mulheres encarceradas, tanto ao ingressar no sistema prisional como na sua saída.

Em relação ao grau de instrução no Estado, pode-se observar que, em 2011, nos dados coletados pelo Projeto Mulheres Presas, a escolaridade foi assim demonstrada:

Quadro 1: Distribuição das mulheres encarceradas, segundo a escolaridade no Estado de Santa Catarina.

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Escolaridade das mulheres presas Quantidade Percentual

Analfabetas 49 3,9

Alfabetizadas 69 5,49

Ensino Fundamental Incompleto 557 45,97

Ensino Fundamental Completo 315 25,09

Ensino Médio Incompleto 140 11,15

Ensino Médio Completo 161 12,82

Ensino Superior Incompleto 29 2,31

Ensino Superior Completo 10 0,79

Ensino acima de Superior Completo 0 0

Não informado 4 0,31

Cursam Educação Formal 7,5

Fonte: INFOPEN/2011

Os crimes que levaram as mulheres ao sistema carcerário, em decorrência de baixa escolaridade, pobreza, abandono de seus companheiros que as tornam chefes de família, provedoras de todos os custos e benefícios de seus filhos e demais dependentes, foram:

Quadro 2: Distribuição das mulheres encarceradas, segundo crimes mais praticados no Estado de Santa Catarina.

Crimes mais praticados no Estado Percentual

Contra a pessoa 5,17

Contra o patrimônio 17,29

Contra a paz pública 1,27

Contra a fé pública 0,15

Tráfico 55,45

Tráfico Internacional 7,72

Fonte: INFOPEN/2011

Para Cortina (2015, p.773), existem fatores que contribuem com o aumento de mulheres presas, por isso afirma:

O incremento numérico do aprisionamento feminino no Estado, alia ao crime de tráfico de drogas outros indicativos do perfil dessa população, tais como: baixa

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escolaridade, ser mãe, jovem (menos de 35 anos), desempregadas, abuso de drogas e não possui companheiro.

Cada vez mais cedo essas mulheres assumem responsabilidades nas famílias, porque já foram criadas por mães solteiras, pobres. Elas reproduzem a mesma realidade vivida por suas mães, pois não conhecem outra, ou não encontram alternativa para viver de maneira diferente. Vemos, no quadro abaixo, a faixa etária das mulheres em Santa Catarina, que elucidam esta estatística:

Quadro 3: Distribuição das mulheres encarceradas, segundo a faixa etária no Estado de Santa Catarina.

Idade das mulheres presas Percentual

Mulheres de 18 a 24 anos 28,68

Mulheres de 25 a 29 anos 21,83

Mulheres de 30 a 34 anos 18,08

Mulheres de 35 a 45 anos 16, 97

Mulheres de 45 a 60 anos 8,28

Mulheres acima de 60 anos 0,95

Fonte: INFOPEN/2011

O Estado de Santa Catarina foi povoado na sua maioria pela cultura europeia, por isso a população é predominantemente branca. As mulheres que cometeram algum tipo de infração penal, em grande parte, são da área urbana, talvez por causa da realidade da região Sul. Logo, observa-se abaixo:

Quadro 4: Distribuição das mulheres encarceradas, segundo a raça/cor no Estado de Santa Catarina.

Relação à cor da pele das mulheres presas Percentual

Consideradas Pardas 16,33 Consideradas Brancas 64,78 Consideradas Negras 12,03 Consideradas Indígenas 0.07 Consideradas Amarelas 0,15 Fonte: INFOPEN/2011

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Segundo levantamento do INFOPEN, “o Estado de Santa Catarina em 2011 possuía 1255 mulheres presas, o que equivale a 8,38% da população carcerária estadual, e 3,77% da população encarcerada feminina nacional” (BRASIL, 2011, p.54). Em relação ao país, merece atenção à situação catarinense, pois cresce esta realidade social.

Por isso, outra questão de relevância para a vida e o respeito à dignidade dessas mulheres é a ressocialização, o trabalho, a ocupação saudável, que vai além do ocupar-se, mas uma oportunidade de obter uma profissão, de conseguir redução de pena, independência financeira, de permitir segurança futura ao deixar o sistema prisional.

Quadro 5: Distribuição das mulheres encarceradas, segundo a ocupação laboral no Estado de Santa Catarina

Mulheres trabalhando no Sistema Prisional Percentual

Trabalhando internamente 47,6

Trabalhando externamente 3,3

Fonte: INFOPEN/2011

Sobre os trabalhos realizados nas prisões femininas catarinense, Cortina (2015, p.772), em seu estudo sobre o tema, faz uma afirmação que não reforça a dignidade da mulher encarcerada:

Na prisão feminina catarinense, o principal trabalho exercido era a montagem de grampos de roupa, seguido do artesanato e da costura de sapatos e zíperes, o que reforça a continuidade de trabalhos domésticos ligados às mulheres. A discriminação da mulher no mercado de trabalho é reproduzida no cárcere e, indubitavelmente, continuará na vida livre.

No ambiente de encarceramento, surgem doenças comuns e variadas, devido à própria realidade pessoal e estrutural, porque “dentro do sistema prisional, as mulheres encarceradas podem desenvolver algumas doenças, pois no ambiente, que está mal estruturado, pouca higiene, falta de cuidados, situações emocionais e de uma precária assistência médica” (CORTINA, 2015). Segundo o Sistema Prisional do Estado, em 2020, eram esses os diagnósticos:

Quadro 6: Distribuição das mulheres encarceradas, no Estado de Santa Catarina, quanto aos diagnósticos de doenças

Doenças das mulheres presas Quantidade

Doenças crônicas e ou respiratórias 164

Referências

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