• Nenhum resultado encontrado

Cota de reserva ambiental

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "Cota de reserva ambiental"

Copied!
55
0
0

Texto

(1)

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

SOLANGE SILVA ALVARES DA CUNHA

COTA DE RESERVA AMBIENTAL

NITERÓI 2013

(2)

COTA DE RESERVA AMBIENTAL

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do título de bacharel em Direito.

Orientador: Luiz Oliveira Castro Jungstedt

Niterói 2013

(3)

SOLANGE SILVA ALVARES DA CUNHA

COTA DE RESERVA AMBIENTAL

Trabalho de conclusão de curso apresentado à Faculdade de Direito da Universidade Federal Fluminense, como requisito parcial para obtenção do título de bacharel em Direito.

Data da Aprovação: ______/_______/______

BANCA EXAMINADORA

_________________________________________ Prof. Luiz Oliveira Castro Jungstedt - Orientador

_________________________________________ Ms. Lincoln Antônio de Castro - Membro

_________________________________________ Prof. Pablo Martinez

Niterói 2013

(4)
(5)

RESUMO

CUNHA, Solange Silva Alvares da Cunha. Cota de Reserva Ambiental. 2013. 55f. Monografia (graduação em Direito) – Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2013. O presente trabalho propõe-se a analisar o instituto da Cota de Reserva Ambiental. Para tanto, faz-se inicialmente breve histórico do instrumento precedente, a Cota de Reserva Florestal, e do surgimento do mecanismo de compensação da Reserva Legal. Em seguida, há análise da tentativa de utilização de cotas em alguns estados da federação, já que em âmbito federal não houve efetiva regulamentação. Concluída tal exposição, o presente trabalho adentrará seu cerne, qual seja a Cota de Reserva Ambiental propriamente dita, introduzida pelo Novo Código Florestal. Analisar-se-á todo o procedimento de emissão e aquisição de cotas, assim como suas modalidades e suas formas de negociação. Identificar-se-á os principais pontos de reflexão do instrumento, assim como as oportunidades e desafios que podem surgir com a efetividade da utilização de cotas como mecanismo de compensação.

Palavras-chave: Direito Ambiental. Cota de Reserva Ambiental. Cota de Reserva Florestal. Compensação de Reserva Legal Florestal. Novo Código Florestal.

(6)

CUNHA, Solange Silva Alvares da Cunha. Cota de Reserva Ambiental. 2013. 55f. Monografia (graduação em Direito) – Universidade Federal Fluminense, Niterói, 2013. This paper aims at analyzing the instrument of Environmental Reserve Quota. In order to achieve its goal, the first part of this paper brings brief history of the previous instrument, the Forest Reserve Quota, and the emergence of the Legal Forest Reserve offsetting mechanism. Then, it focuses on the analysis of the attempt to use quotas in some states of the federation, as under federal there was no effective regulation. Once such matter is surpassed, this paper penetrates its core, which is the Environmental Reserve Quota itself, introduced by the New Forest Code. This paper will analyze the entire procedure of issuance and acquisition of Environmental Reserve Quota, as well as its modalities and forms of transaction. Thereby, this study will identify the main points of reflection of the instrument, as well as the opportunities and challenges that can arise with the effectiveness of the use of quotas as Legal Forest Reserve offsetting mechanism.

Key-words: Environmental Law. Environmental Reserve Quota. Forest Reserve Quota. Legal Forest Reserve offsetting mechanism. New Forest Code.

(7)

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...8

CAPÍTULO I – COTA DE RESERVA FLORESTAL...13

1. Tratamento constitucional dado ao meio ambiente...13

1.2. Tratamento desde o Código Florestal de 1965 até o Novo Código Florestal...14

1.2.1. Experiência de Goiás na implementação da CRF...23

1.2.2. Experiência Mineira na implementação da CRF...23

1.2.3. Experiência de Santa Catarina na implementação da CRF...26

1.2.4. Experiência Matogrossense na implementação da CRF...28

1.2.5. Experiência Paraense na implementação da CRF...29

CAPÍTULO II - COTA DE RESERVA AMBIENTAL...31

2. O novo Código Florestal (Lei nº 12.651/2012)...31

2.2. A Cota de Reserva Ambiental...32

2.2.1. Cota de Reserva Ambiental como forma de compensação da Reserva Legal. .35 2.2.2. Modalidades de Cota de Reserva Ambiental no Novo Código Florestal...36

2.2.2.1.Primeira modalidade: servidão ambiental...36

2.2.2.2.Segunda modalidade: Reserva Legal instituída voluntariamente...38

2.2.2.3. Terceira modalidade: Reserva Particular do Patrimônio Natural...39

2.2.2.4. Quarta modalidade: Unidade de Conservação de domínio público...40

2.2.2.5. Quinta modalidade: pequenas propriedades rurais...41

2.3. Procedimento para a aquisição da Cota de Reserva Ambiental...41

2.3.1 Requerimento...42

2.3.2. Emissão...43

2.3.3. Registro...43

2.3.4. Negociação...45

2.4. Cancelamento da Cota de Reserva Ambiental...46

2.5. Questões pouco desenvolvidas no Código Florestal...47

2.6. Cota de Reserva Ambiental: oportunidades e desafios...48

CONCLUSÃO...52

(8)

A presente monografia tem como objeto entender o contexto histórico da Cota de Reserva Florestal e seus institutos correlatos, bem como analisar a Cota de Reserva Ambiental como instrumento de compensação da reserva legal.

O meio ambiente ecologicamente equilibrado foi elevado a direito fundamental com a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. A importância dada somada com a clara necessidade de se preservar a biodiversidade brasileira trouxe uma maior preocupação na fiscalização e na punição de infratores que não respeitassem a legislação ambiental. Assim foram publicados a Lei nº 9.605/1998 e o Decreto nº 6.514/2008, que em conjunto formam grande aparato punitivo no direito ambiental.

Com o passar dos anos, identificou-se, no entanto, que as políticas punitivas nem sempre traziam resultados positivos ao meio ambiente e que o raciocínio da repressão não era tão eficiente. A solução encontrada foi a utilização de instrumentos econômicos, que pudessem estimular outro raciocínio, qual seja, não só punir quem descumpre, mas beneficiar quem cumpre. Esta prática já vinha sendo utilizada no direito estrangeiro como forma de melhorar a gestão ambiental. Funcionam como verdadeiros incentivos para a redução da poluição e de outros danos ambientais, permitindo a mitigação do custo social presente das restrições advindas do controle ambiental. A Declaração do Rio de 19921 inclusive já previa o fomento a esses tipos de instrumentos.

(9)

9

Sobre a questão da necessidade de fomento a comportamentos positivos e não somente respostas negativas a comportamentos irregulares, traz-se a visão da professora Ana Maria de Oliveira Nusdeo:

A partir do reconhecimento de que a implementação do direito ao meio ambiente, ou mesmo de que o objetivo da proteção ambiental depende de ações estatais, por meio dos mais variados instrumentos, começou-se a discutir a importância de serem criadas regras que induzam comportamentos no sentido da proteção ambiental, não apenas aquelas repressivas de práticas lesivas ao meio ambiente. É a partir dessa constatação que surge a referência e o estudo dos instrumentos econômicos no âmbito do direito ambiental.2 O antigo Código Florestal foi publicado em 1965, na forma da Lei nº 4.771. Durante sua vigência foi objeto de grande emaranhado de remendos feitos por leis ordinárias e medidas provisórias, que tentavam trazer um pouco de oxigênio para uma norma feita na década de 60, época esta em que a preocupação ambiental era mínima e momento em que havia baixíssima consciência ambiental da população.

Em 1998 houve importante alteração na Lei nº 4.771/65, que inseriu a possibilidade de compensação da reserva legal florestal para aqueles proprietários que não conseguissem atingir o percentual mínimo exigido na lei3. Esta informação é de

extrema relevância para o presente estudo, que tem como um de seus objetivos analisar justamente o mecanismo de compensação.

Ademais, a inserção da compensação da reserva legal, em verdade, funcionou como um reconhecimento de que o desmatamento e a falta de preservação era um dado fático, apesar das vedações legais e duras punições previstas em lei. Tanto é assim que conforme informações divulgadas pelo PRODES4, somente no ano de 2012, houve

aproximadamente 4.656 km² de desmatamento na Amazônia Legal. Grande parte desse desmatamento, como se sabe, é feito de maneira irregular.

A solução encontrada foi criar mecanismos de regularização de propriedades rurais em vez de simplesmente criar sanções inócuas a proprietários, que descumpriam as normas ambientais com a tranquilidade da impunidade presente em nosso país. Foi neste sentido que, no ano 2000, alterou-se novamente o Código Florestal para que se introduzisse em nosso ordenamento a Cota de Reserva Florestal, que poderia servir 2 NUSDEO, Ana Maria de Oliveira. A Compensação de Reserva Legal através de Contrato de

Arrendamento e os Incentivos à Proteção Florestal. Revista de Direito Ambiental, São Paulo, v. 48, p. 30-45, out./dez., 2007.

3 Através da Medida Provisória nº 1.605-30, de 19 de dezembro de 1998.

4 Projeto de Monitoramento sistemático do desflorestamento da Amazônia, utilizando imagens de

sensoriamento remoto e técnicas de Processamento Digital de Imagens; Dado disponível em:

(10)

como meio de compensação de reserva ambiental. Esta cota funcionaria como um título representativo de vegetação nativa que poderia ser adquirida por proprietários que não conseguissem atingir os percentuais mínimos exigidos na lei.

Este instrumento foi recebido, apesar dos receios iniciais, com grande esperança, já que ao mesmo tempo em que serviria como mais uma alternativa para a compensação, movimentaria o mercado e a economia nacional para a negociação de títulos dessa categoria. No entanto, este instrumento acabou por se tornar infrutífero devido a sua regulamentação incipiente, trazendo uma imensa insegurança jurídica sobre a real efetividade do instrumento. Alguns estados da federação tentaram implementar o instrumento, mas ainda de forma preliminar, muito provavelmente por causa do receio da falta de regulação federal.

A publicação do Novo Código Florestal Brasileiro, depois de anos de tramitação no Congresso Nacional, foi uma resposta à demanda da sociedade por uma legislação florestal democrática e coerente com a atualidade. Em sintonia com as expectativas, foi inserida ao nosso ordenamento a Cota de Reserva Ambiental, que veio substituir a antiga Cota de Reserva Florestal.

O Novo Código Florestal dedicou diversos artigos para a regulamentação do novo instrumento que consiste num título nominativo representativo de área com vegetação nativa, existente ou em processo de recuperação. Pode ser utilizado como uma forma de compensação da reserva legal florestal e há a previsão de ser negociada em bolsas de mercadorias. Há uma intenção nítida de que a Cota de Reserva Ambiental seja uma espécie de “crédito” a ser negociado e transacionado por aqueles proprietários que preservem além do mínimo previsto na lei e por aqueles interessados em adquirir as cotas por não conseguirem preservar esses mesmos percentuais mínimos.

Certamente ainda há diversas dúvidas a respeito da real viabilidade de tal instrumento, e ainda há questões pouco desenvolvidas até o momento sobre as peculiaridades deste instituto. Fato é que há grande esperança de que esse instrumento não seja inócuo como o seu precedente e que possa servir como um estímulo a uma maior preservação devido à possibilidade de se auferir vantagens econômicas dessa preservação além do mínimo.

Há setores da sociedade, dentre eles ONGs e até a Procuradoria Geral da República5, que criticam tal instrumento, entendendo o mecanismo de cotas para

5 A Procuradoria Geral da República, inclusive, encaminhou três Ações Diretas de Inconstitucionalidade

(11)

11

compensação uma maneira de tornar “impune” a falta de preservação da vegetação. Para esse posicionamento, não haveria sentido em dar oportunidade de se auferir vantagens econômicas para aqueles que preservam mais do que o estabelecido em lei. Esse raciocínio, ainda muito carregado pelo princípio do poluidor-pagador, não considera o pensamento contemporâneo de “protetor-recebedor”. Seja qual for a linha de pensamento, esse tipo de mecanismo é cada vez mais uma realidade no mundo globalizado e precisa ser devidamente estudado e compreendido.

Nesse cenário, com o presente trabalho pretende-se entender o contexto histórico da legislação florestal no que tange a inserção, primeiramente, da Cota de Reserva Florestal e seus institutos correlatos. Após, far-se-á breve análise sobre a tentativa de implementação e regulação desse tipo de instrumento em alguns estados da federação.

Ademais, esta pesquisa analisará o contexto da publicação da Lei nº 12.651/2012, adiante chamada de Novo Código Florestal e a análise mais detalhada da Cota de Reserva Ambiental.

Busca-se expor como se dará o procedimento para a aquisição da Cota de Reserva Ambiental, desde seu requerimento até como poderá ser feita sua negociação e as hipóteses de cancelamento das cotas.

Por fim, são tratadas algumas questões acerca da Cota de Reserva Ambiental como instrumento de compensação da reserva legal, que foram pouco desenvolvidas e que merecem ser objeto de reflexão. Outrossim, cuida-se de identificar os principais desafios a serem enfrentados, assim como as oportunidades que surgirão deste instrumento.

Esta monografia justifica-se pela necessidade de conhecimento e compreensão da cota de reserva ambiental, como instrumento de tutela do meio-ambiente, pretendendo-se, assim, obter subsídios para melhor interpretação e aplicação das normas jurídicas de regência da matéria abordada.

Na pesquisa monográfica foram adotados os métodos científicos, indutivo e dedutivo, visando a um modo de pensar ordenado, coerente e lógico. Valendo-se do raciocínio indutivo, o propósito consistiu em obter informações mais amplas. Usando o método dedutivo, pretendeu-se desenvolver raciocínio partindo dos aspectos do tema, sabidos conforme dados levantados, para alcançar novos aspectos.

A pesquisa teve cunho teórico, sendo trabalhado material bibliográfico suficiente para revisão do tema e sustentação de abordagem projetada no objeto da investigação. Portanto, os dados foram coletados e encontrados em livros, artigos publicados em

(12)

revistas, decisões dos Tribunais, textos legais. Assim, a pesquisa envolveu a análise da legislação, doutrina e jurisprudência dos tribunais.

(13)

CAPÍTULO I – COTA DE RESERVA FLORESTAL

Neste capítulo, aborda-se o tratamento constitucional dado ao meio ambiente genericamente, assim como se deu a introdução da Cota de Reserva Florestal em nosso ordenamento jurídico. Analisa-se também a tentativa de regulamentação desse instituto em nível estadual, tendo em vista que não houve uma devida regulamentação em âmbito federal.

1. Tratamento constitucional dado ao meio ambiente

Apenas com a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB) o meio ambiente passou a ser uma prioridade no ordenamento jurídico brasileiro. Por muitos chamada de “Constituição Verde”, a CRFB dedicou o Capítulo VI, do Título VIII (“Da Ordem Social”) para a matéria. O caput do artigo 225 da Magna Carta resume a intenção do constituinte originário:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preimpondo-servá-lo para as presentes e futuras gerações.

Elevou-se o meio ambiente a direito constitucional fundamental, sendo, portanto, um bem indisponível. Da mesma forma que é um direito, também é um dever que toda a coletividade o defenda e o preserve.

Ademais, o artigo 170, inserido no Capítulo I, do Título VII (“Da ordem Econômica e Financeira”), estabelece como princípio a "defesa do meio ambiente,

(14)

inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação". Sobre a possibilidade do meio ambiente se relacionar com a economia, traz-se a lição de Luís Paulo Sirvinskas:

(...) havia uma falsa premissa de que a preservação ou conservação do meio ambiente seria um empecilho ao desenvolvimento socioeconômico. A teoria econômica está fundada na produção e no consumo, objetivando a estabilidade de preços, alta taxa de emprego e concorrência equilibrada (interna e externa). A preservação do ambiente deve ser uma das preocupações a ser perseguida pelo modelo econômico sustentado pelo mercado capitalista. O mercado sempre busca o lucro e este deve estar em harmonia com a utilização racional dos recursos naturais que é matéria-prima da produção.6

Importante ainda para o presente estudo é saber que foi enquadrado como garantia constitucional o fato da propriedade dever atender a sua função social, conforme art. 5º, inciso XIII da CRFB.

Com esse contexto em mente, entra-se adiante no estudo da Cota de Reserva Florestal, que posteriormente veio a ser substituída pela Cota de Reserva Ambiental.

1.2. Tratamento desde o Código Florestal de 1965 até o Novo Código Florestal

A Cota de Reserva Florestal (“CRF”) foi introduzida ao nosso ordenamento pela Medida Provisória nº 1.956-50, de 26 de maio de 2000, que posteriormente se transformou na Medida Provisória 2.166-67, de 24 de agosto de 2001. À época foram acrescentados dois artigos ao pretérito Código Florestal (Lei nº 4.771/65), os quais são significantes para o objeto desta pesquisa. Senão veja-se.

Art. 44-A.O proprietário rural poderá instituir servidão florestal, mediante a qual voluntariamente renuncia, em caráter permanente ou temporário, a direitos de supressão ou exploração da vegetação nativa, localizada fora da reserva legal e da área com vegetação de preservação permanente.

§ 1º A limitação ao uso da vegetação da área sob regime de servidão florestal deve ser, no mínimo, a mesma estabelecida para a Reserva Legal.

§ 2º A servidão florestal deve ser averbada à margem da inscrição de matrícula do imóvel, no registro de imóveis competente, após anuência do órgão ambiental estadual competente, sendo vedada, durante o prazo de sua vigência, a alteração da destinação da área, nos casos de transmissão a qualquer título, de desmembramento ou de retificação dos limites da propriedade.

(15)

15

Art. 44-B. Fica instituída a Cota de Reserva Florestal-CRF, título representativo de vegetação nativa sob regime de servidão florestal, de Reserva Particular do Patrimônio Natural ou reserva legal instituída voluntariamente sobre a vegetação que exceder os percentuais estabelecidos no art. 16 deste Código.

Parágrafo único. A regulamentação deste Código disporá sobre as características, natureza e prazo de validade do título de que trata este artigo, assim como os mecanismos que assegurem ao seu adquirente a existência e a conservação da vegetação objeto do título.

O artigo 44-B acima transcrito foi o único dispositivo específico dedicado à CRF, deixando seu regramento a ser feito por uma regulamentação, que nunca veio a ser feita.

Antes de adentrar com detalhes no tema, é mister identificar o que seria propriamente esta “Cota de Reserva Florestal”. O Código Florestal pretérito, como José Afonso da Silva aponta7, limitou-se a classificá-la como um título negociável.

Identifica-se pouco tratamento doutrinário sobre o tema, tendo em vista a ínfima abordagem legal do instituto.

Pela leitura da lei, observa-se que a CRF pode ser enquadrada nos seguintes regimes: (i) o de servidão florestal; (ii) o de Reserva Particular do Patrimônio Natural; ou (iii) o de “reserva legal instituída voluntariamente” sobre a vegetação que exceder os percentuais mínimos de reserva legal previstos no artigo 16 do diploma pretérito8.

O primeiro regime da CRF é a servidão florestal regulamentada pelo artigo 44-A, do pretérito Código Florestal. Importante frisar que o instituto nada tem relação com a servidão civil. A servidão civil, como explica Carlos Roberto Gonçalves é:

(...) um ônus real, voluntariamente imposto a um prédio (o serviente) em favor de outro (o dominante), em virtude do qual o proprietário do primeiro perde o exercício de algum de seus direitos dominicais sobre o seu prédio, ou tolera que dele se utilize o proprietário do segundo, tornando este mais útil, ou pelo menos mais agradável.9

7 SILVA, José Afonso.Direito Ambiental Constitucional.6ª edição.São Paulo: Ed. Malheiros, 2007. p. 189 8 Art. 16. As florestas e outras formas de vegetação nativa, ressalvadas as situadas em área de preservação

permanente, assim como aquelas não sujeitas ao regime de utilização limitada ou objeto de legislação específica, são suscetíveis de supressão, desde que sejam mantidas, a título de reserva legal, no mínimo: I oitenta por cento, na propriedade rural situada em área de floresta localizada na Amazônia Legal; II -trinta e cinco por cento, na propriedade rural situada em área de cerrado localizada na Amazônia Legal, sendo no mínimo vinte por cento na propriedade e quinze por cento na forma de compensação em outra área, desde que esteja localizada na mesma microbacia, e seja averbada nos termos do § 7º deste artigo; III - vinte por cento, na propriedade rural situada em área de floresta ou outras formas de vegetação nativa localizada nas demais regiões do País; e IV - vinte por cento, na propriedade rural em área de campos gerais localizada em qualquer região do País.

9 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito civil brasileiro, volume 5: direito das coisas. 4ª edição. São

(16)

No Código Civil, o conceito de servidão civil está previsto no artigo 1378:

Art. 1.378, Código Civil. A servidão proporciona utilidade para o prédio dominante, e grava o prédio serviente, que pertence a diverso dono, e constitui-se mediante declaração expressa dos proprietários, ou por testamento, e subsequente registro no Cartório de Registro de Imóveis.

Ademais, a servidão civil em regra tem como característica sua duração indefinida. Nesse ponto, Carlos Roberto Gonçalves indica que a servidão "dura indefinidamente, enquanto não extinta por alguma causa legal, ainda que os prédios passem a outros donos. Por isso, costuma-se dizer que a servidão é perpétua." 10

Tampouco há de se comparar com a servidão administrativa, que nas palavras de José dos Santos Carvalho Filho trata-se de um “direito real público que autoriza o Poder Público a usar a propriedade imóvel para permitir a execução de obras e serviços de interesse coletivo”11. E ainda considera as servidões administrativas como “restrições

sobre propriedade específicas, sendo admissível sua instituição apenas por acordo entre as partes ou por sentença judicial” 12. Por fim, a servidão administrativa é instituída em

favor do Estado para atender ao interesse público.

A servidão florestal, por sua vez, não envolve uma relação de prédio serviente e prédio dominante (servidão privada), nem mesmo um vínculo entre uma coisa serviente (o imóvel particular) e um bem de domínio público (servidão pública).

O que ocorre na servidão florestal, em verdade, é uma aparência de servidão, porque existe um vínculo entre o bem serviente (floresta) e o interesse ambiental. Dessa forma, a servidão florestal funcionaria como uma reserva de floresta no interesse do meio ambiente, que é semelhante à reserva legal, com a diferença que essa reserva não é legal, mas voluntária. Conforme aduz o §2º, do art. 44-A, do Código Florestal pretérito a servidão florestal pode ser instituída por prazo determinado ou indeterminado, sendo resolúvel, pelo seu “prazo de vigência”.

Vale ressaltar que a opção da CRF sob regime de servidão florestal não é um ato tipicamente unilateral do proprietário, já que há a necessidade da anuência do órgão ambiental competente e posteriormente há a necessidade de averbação à margem da matrícula do imóvel no Registro Imobiliário competente. Poder-se-ia enquadrar esse ato 10 Idem, p. 429

11 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 25ª edição. São Paulo: Atlas,

2012. p. 774

(17)

17

como reflexo da “administração pública de interesses privados”, que consiste numa restrição à autonomia e à liberdade do particular devido ao interesse maior envolvido, que nesse caso, é o meio ambiente propriamente dito e em última instância à coletividade que tem o direito e dever de preservá-lo. Nesse ponto, abaixo lição de Ada Pellegrini Grinover:

Existem atos jurídicos da vida dos particulares que se revestem de importância transcendente aos limites da esfera de interesses das pessoas diretamente empenhadas, passando a interessar também à própria coletividade.13

Nesse momento, importante fazer breve digressão sobre a Política Nacional do Meio Ambiente (“PNMA”), instituída pela Lei nº 6.938, em 1981, publicada antes da CRFB. Mesmo tendo sido elaborada e aprovada num período de autoritarismo político-administrativo, a PNMA significou, nas palavras de Édis Milaré, “senão uma revolução pacífica – ao menos uma auspiciosa evolução no relacionamento da sociedade brasileira com o meio ambiente” 14. Ademais a PNMA é o primeiro diploma legal em nosso

direito positivo que disciplina de forma sistematizada o meio ambiente, definindo conceitos importantes como o próprio meio ambiente, degradação da qualidade ambiental, poluição, poluidor, recursos ambientais, dentre outros. Além disso, a PNMA criou o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA) e o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA).

Pois bem, em 2006, a Lei nº 11.28415 alterou a PNMA, para prever a servidão

ambiental como um dos instrumentos econômicos (art. 9º, XIII). A inserção de instrumentos econômicos já vinha sendo uma demanda desde a Declaração Rio-92, que em seu princípio 16 estabeleceu o seguinte:

As autoridades nacionais devem procurar promover a internacionalização dos custos ambientais e o uso de instrumentos econômicos, tendo em vista a abordagem segundo a qual o poluidor deve, em princípio, arcar com o custo da poluição, com a devida atenção ao interesse público e sem provocar distorções no comércio e nos investimentos internacionais.

Repare-se que não se inseriu a servidão florestal, mas a servidão ambiental. A servidão ambiental é mais abrangente do que a servidão florestal e, portanto, tem maior 13 CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido Rangel.

Teoria geral do processo. 22ª edição. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 167

14 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 6ª

edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 334

(18)

potencial de aplicação. A primeira permite inclusive a proteção de outras formas de vegetação nativa, não somente as florestas. A servidão ambiental, por exemplo, abrangeria formações campestres e savânicas, áreas úmidas, vegetação rupestre, restingas. Entretanto, o pretérito Código Florestal, sem ter sido alterado pela Lei nº 11.284/2006, ficou estagnado, prevendo apenas a possibilidade de regime de servidão florestal para a CRF.

A servidão ambiental seria uma renúncia voluntária do proprietário rural, em caráter temporário ou permanente, total ou parcialmente, do direito de uso, exploração ou supressão de recursos naturais existentes na propriedade, mediante a anuência do órgão ambiental.

A Lei nº 11.284/2006 também inseriu o art. 9-A à PNMA, no qual caracteriza o instrumento da servidão ambiental em moldes equivalentes ao da servidão florestal, inclusive para efeitos de compensação da reserva legal.

Era latente a necessidade de se unificar os dois instrumentos (servidão ambiental e servidão florestal), mantendo as características abrangentes da servidão ambiental, e assim criando um título representativo que pudesse abranger a servidão ambiental e detalhando outros aspectos necessários à efetividade da servidão. Esta unificação só ocorreu com a publicação do Novo Código Florestal.

Outra forma de regime de CRF seria a Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN). A RPPN é uma das modalidades de Unidade de Conservação do grupo das Unidades de Uso Sustentável. Foi introduzida ao ordenamento jurídico pela Lei nº 9.985/200016. Basicamente, trata-se de uma área privada, gravada com perpetuidade,

com o objetivo de conservar a diversidade biológica. Posteriormente, em 2006, a RPPN veio a ser regulamentada pelo Decreto nº 5.746.

Por fim, a terceira e última forma de regime da CRF seria a da “reserva legal instituída voluntariamente” que, à semelhança da servidão florestal, funcionaria como uma renúncia do proprietário aos direitos de supressão e de exploração da vegetação nativa de sua propriedade, impondo à própria área limitações de uso da mesma natureza e limites que os estabelecidos para a reserva legal.

Após a explicação sobre as formas de regime da CRF, pode-se adentrar em um tema de extrema relevância trazido ainda pelo Código Florestal pretérito. Trata-se da

(19)

19

possibilidade de aquisição de CRFs como uma das formas da compensação da reserva legal17.

Nesse ponto, deve-se atentar para a importância da Reserva Legal Florestal. Como ensina Paulo Affonso Leme Machado:

A Reserva Legal Florestal tem sua razão de ser na virtude da prudência, que deve conduzir o Brasil a ter um estoque vegetal para conservar a biodiversidade. Cumpre, além disso, o princípio constitucional do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado para as presentes e futuras gerações. Importa dizer que cada proprietário não conserva uma parte de sua propriedade com florestas somente no interesse da sociedade ou de seus vizinhos, mas primeiramente no seu próprio interesse.18

É de se ressaltar que não havia dispositivo específico sobre a Reserva Legal Florestal na redação original da Lei nº 4.771/1965. A Reserva Legal foi introduzida pela primeira vez na legislação florestal pela Lei nº 7.803 de 18 de julho de 1989. À época os percentuais da reserva legal não eram tão bem definidos. Houve alterações em seus dispositivos pelas Medidas Provisórias de nº 1.511/96, nº 1.736-31/1998, nº 1956-50/2000 e por fim pela Medida Provisória nº 2.166-67/2001.

A definição de reserva legal se deu apenas pela Medida Provisória nº 1956-50, de 26 de maio de 2000, que acrescentou ao Código Florestal pretérito o inciso III, §2º do artigo 1º, tendo a seguinte definição:

área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, excetuada a de preservação permanente, necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção de fauna e flora nativas.

Trata-se de uma espécie de espaço territorial especialmente protegido que se materializa exclusivamente na esfera da propriedade privada. Ao limitar a livre fruição da propriedade privada, impondo a preservação de determinado percentual da área, a Reserva Legal Florestal cumpre papel relevante na proteção das áreas verdes espalhadas pelos diversos ecossistemas brasileiros.

O instituto da Reserva Legal não inviabiliza por completo o uso da propriedade, mas visa a proteger parcela da propriedade que será objeto de proteção especial, na qual o proprietário somente poderá exercer atividades sustentáveis, compatíveis com a

17 Artigo 44,§5º (incluído pela Medida Provisória 1956-50/2000)

18 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito Ambiental Brasileiro. 15ª edição. São Paulo: Ed. Malheiros,

(20)

manutenção do ecossistema no qual está inserto. É uma limitação administrativa ao direito de propriedade de imóveis rurais, consistente na obrigação de não fazer, ou seja, de não danificar o percentual da vegetação previsto em lei que deve ser preservado conforme a localidade da propriedade. Nesse ponto, vale trazer à baila a lição de Isabella Franco Guerra:

Também é oportuno chamar a atenção sobre o princípio da função socioambiental da propriedade, já que embora a propriedade seja constitucionalmente reconhecida como direito fundamental, a fruição e o exercício desse direito terão que ocorrer de acordo com os limites da ordem pública ambiental, respeitando a função ambiental da propriedade, o que proíbe o uso nocivo e pode levar o poder público a impor limitações administrativas sobre os imóveis tanto rurais quanto aqueles localizados em áreas urbanas.19

A importância é tão grande que há infrações previstas no Decreto nº 6.514/200820 relativas ao descumprimento de regras básicas da Reserva Legal Florestal.

O artigo 51 do referido decreto prevê, por exemplo, multa de até R$5.000,00 por hectare ou fração para aquele que “destruir, desmatar, danificar ou explorar floresta ou qualquer tipo de vegetação nativa ou de espécies nativas plantadas, em área de reserva legal ou servidão florestal, de domínio público ou privado, sem autorização prévia do órgão ambiental competente ou em desacordo com a concedida”.

Esclarecida a importância da Reserva Legal Florestal como meio de se preservar a biodiversidade, passa-se para a análise do que seria a “compensação da reserva legal”. Édis Milaré define o que seria compensar:

Compensar, em linhas gerais, significa oferecer uma alternativa, com peso igual ou maior, para uma forma de uso ou de lesão (evitável ou inevitável) de um bem de qualquer natureza, que, por isso, deve ser substituído por outro, a fim de remover ou minimizar o dano causado. No caso da compensação ambiental requer-se normalmente, que o uso ou o dano sejam inevitáveis ou se façam necessários em vista de um benefício maior e em função do interesse social.21

A compensação de reserva florestal apenas foi inserida no Código Florestal pretérito com a Medida Provisória nº 1.605-30, de 19 de dezembro de 1998, sofrendo alterações ao longo da vigência do antigo diploma. Trata-se, basicamente, de uma das 19GUERRA, Isabella Franco. Código Florestal Brasileiro. In: Curso de Direito Ambiental

(Coordenadores: Flávio Ahmed e Ronaldo Coutinho). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2012. p. 341

20 Dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente, estabelece o processo

administrativo federal para apuração destas infrações

21 MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 6ª

(21)

21

alternativas para o proprietário ou possuidor de imóvel rural com área de floresta em extensão inferior ao previsto em lei para Reserva Legal de se regularizar. A inserção da compensação foi, em verdade, uma resposta ao que ocorria e ocorre na prática, que é o fato de muitos proprietários ou posseiros rurais não conseguirem cumprir com os percentuais previstos na legislação, que podem chegar, dependendo da localidade da propriedade, até oitenta por cento da propriedade rural, no caso por exemplo de imóvel rural situado em área de floresta localizada na Amazônia Legal.

Assim, flexibilizando-se o instituto da Reserva Legal pela compensação ambiental, o legislador buscou trazer maior efetividade ao instituto, que vinha sendo constantemente descumprido pelos proprietários rurais.

O proprietário que não atingisse esse percentual poderia ou recompor a reserva legal de sua propriedade mediante o plantio, ou promover a condução da regeneração natural da reserva legal, ou ainda compensar a reserva legal por outra área equivalente em importância ecológica e extensão, desde que pertencesse ao mesmo ecossistema e estivesse localizada na mesma microbacia22. Vale ressaltar que a importância das áreas

de Reserva Legal serem compensadas por áreas de mesma microbacia é uma preocupação decorrente da proteção dos recursos hídricos.

A compensação, apesar de possuir um caráter de excepcionalidade, se torna assim uma alternativa interessante para o proprietário ou possuidor que não tivesse interesse ou não conseguisse cumprir com a restrição de uma propriedade específica.

Marcos André Bruxel e Bruno de Andrade Christofoli também entendem que a flexibilização das regras sobre a reserva legal foi instituída para permitir maior efetividade no seu cumprimento a partir da regularização de inúmeras propriedades que se encontravam em situação irregular23. Por outro lado, a compensação da reserva legal

criou um mecanismo econômico de incentivo para que proprietários preservassem áreas superiores àquelas previstas legalmente para que pudessem auferir vantagens econômicas.

Assim, o Código Florestal pretérito, ao trazer como uma das formas da compensação da reserva legal a aquisição de CRFs, deu sinais da importância de se introduzir uma cota que funcionaria como uma espécie de título negociável em que 22 Microbacia é uma pequena bacia hidrográfica com uma área que não pode ser grande e que

necessariamente faz parte de outra bacia maior. A bacia hidrográfica por sua vez é a área total de drenagem que alimenta uma determinada rede hidrográfica.

23SAES, Marcos André Bruxel e CHRISTOFOLI, Bruno de Andrade. Política Nacional do Meio

Ambiente. In: Curso de Direito Ambiental (Coordenadores: Flávio Ahmed e Ronaldo Coutinho). Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2012. p.83

(22)

proprietários ou possuidores pudessem adquirir esses títulos como uma forma de compensar suas respectivas Reservas Legais que estivessem abaixo dos percentuais mínimos previstos legalmente.

Destaca-se que a Medida Provisória nº 1.956-50, de 26 de maio de 2000, inseriu o artigo 44-C ao Código Florestal Pretérito que dizia:

Art. 44-C. O proprietário ou possuidor que, a partir da vigência da Medida Provisória no 1.736-31, de 14 de dezembro de 1998, suprimiu, total ou parcialmente florestas ou demais formas de vegetação nativa, situadas no interior de sua propriedade ou posse, sem as devidas autorizações exigidas por Lei, não pode fazer uso dos benefícios previstos no inciso III do art. 44.

(compensação)

Percebe-se da leitura deste artigo a preocupação do legislador em evitar que a compensação ambiental acabasse por representar uma “anistia” àqueles que reiteradamente deixam de cumprir a lei. Assim, aqueles proprietários que tivessem suprimido vegetação nativa sem autorização devida após a edição da Medida Provisória nº 1.736-31, de 14 de dezembro de 1998, não poderiam se utilizar da compensação ambiental. A intenção seria beneficiar apenas os proprietários não reincidentes com a opção da compensação.

Criou-se, assim, grande expectativa em diferentes setores. Os produtores rurais que já tivessem suprimido a vegetação poderiam optar entre recompor a reserva legal ou adquirir cotas de outra propriedade. Por outro lado, os proprietários de terras, com excedente de vegetação, ou seja, áreas não utilizadas da propriedade além da reserva legal teriam condições de ofertar no mercado esse excedente, auferindo lucros com a conservação das florestas. Como todo mercado, haveria a balança da demanda e da oferta, o que poderia inclusive incentivar empreendedores a preservar diversas áreas acima dos percentuais previstos para que pudessem negociar suas cotas com aqueles que não conseguiam atingir a limitação legal.

O grande problema foi a falta de regulamentação do instrumento e a consequente insegurança jurídica dos potenciais interessados em adquirir as CRFs. Afinal, pairava grande dúvida acerca de como se daria a negociação dessas cotas, como seria delimitado o valor dos títulos, dentre diversas outras ponderações. Dessa forma, o instituto da Cota de Reserva Florestal, em verdade, nunca saiu do papel. A CRF sem regulamentação não conseguiu ter eficácia na prática, o que inviabilizou a compensação de reserva legal desta forma.

(23)

23

Diante do fracasso da regulamentação em âmbito federal, após pesquisa legislativa em alguns estados da federação, identifica-se, a seguir, a tentativa de implementação da Cota de Reserva Florestal em âmbito estadual.

1.2.1. Experiência de Goiás na implementação da CRF

O Governo do Estado de Goiás publicou o Decreto nº 5.392/2001, criando a CRF estadual. No entanto, não houve, como no âmbito federal, uma devida regulamentação do instrumento.

O decreto estadual limitou-se a reproduzir os dispositivos federais, abordando que a cota de reserva florestal seria um título representativo de vegetação nativa sob regime de servidão florestal, de reserva particular do patrimônio natural ou reserva legal instituída voluntariamente sobre a vegetação que excedesse os percentuais estabelecidos.

Apesar da falta de regulamentação, o estado de Goiás vem mostrando interesse em mecanismos de compensação ambiental. Em 2004, o estado chegou a obter um financiamento do Banco Mundial, que foi utilizado para definir áreas prioritárias e contratação de uma consultoria para análise de cenários econômicos para estabelecimento de um mercado de troca de cotas de reserva florestal. Além disso, em 2009, o Estado de Goiás assinou termo de cooperação técnica para implantar mecanismos de compensação ambiental via instrumentos econômicos de mercado.24

1.2.2. Experiência Mineira na implementação da CRF

A Lei Estadual nº 14.309/2002, que dispõe sobre a Política Florestal e de Proteção à Biodiversidade de Minas Gerais, foi alterada, em 2004, pela Lei nº 15.027, que acrescentou a possibilidade do proprietário rural recompor á área de reserva legal de sua propriedade através da “aquisição de cota de Certificado de Recomposição de Reserva Legal (CRRL) de Reserva Particular de Recomposição Ambiental (RPRA), em quantidade correspondente à área de reserva legal a ser reconstituída, mediante autorização do órgão competente.”25.

24 Informações obtidas no sítio eletrônico do Ministério Público de Goiás:

http://www.mp.go.gov.br/portalweb/1/noticia/ad226447262672c09a9988530fa94278.html - acesso em 18/01/2013

(24)

A RPRA, instituída também pela Lei nº 15.027/2004, foi definida como área degradada por atividade agrícola, pastoril ou silvicultural, pertencente a um ou mais proprietários, de domínio privado, gravada com perpetuidade e destinada à recuperação ambiental.

A Lei nº 15.027/2004 definiu ainda que a cota de CRRL seria emitida pelo órgão estadual competente, autorizando que a entidade gestora da unidade alienasse cota a possuidor ou proprietário rural, equivalente cada uma a um hectare, até o limite da área definida no plano diretor. Ainda estabeleceu que para a obtenção de cota de CRRL, o possuidor ou proprietário rural deveria ser autorizado pelo órgão estadual competente. Importante notar que tal norma fez a ressalva de que não seria possível a alienação de cota de CRRL para posse ou propriedade rural localizada fora da bacia hidrográfica da RPRA. Isso quer dizer que não seria possível um interessado adquirir uma cota de CRRL para utilizar na sua propriedade que não fosse correspondente a mesma bacia hidrográfica da RPRA.

A regulamentação do instrumento com maiores detalhes só veio com o Decreto Estadual nº 43.710/2004. Nesse momento, a cota de reserva florestal passou a possuir redação semelhante à legislação florestal federal, definindo-a como título representativo de vegetação nativa sob regime de servidão florestal, de RPPN ou reserva florestal instituída, voluntariamente, sobre a vegetação que exceder os percentuais estabelecidos. Apesar de praticamente reproduzir o dispositivo do Código Florestal pretérito, trouxe maior detalhamento sobre o procedimento para a aquisição da Cota de Reserva Florestal. De acordo com o Decreto Estadual nº 43.710/2004, a cota somente poderia ser entendida como tal após parecer técnico do Instituto Estadual de Florestas (IEF).26

Dispôs ainda que as Cotas de Reserva Florestal deveriam ser emitidas para as áreas que estivessem devidamente cadastradas e registradas no órgão ambiental, na proporção de uma cota para cada hectare. Após, seria necessária a averbação no Cartório de Registro de Imóveis, na forma de servidão florestal27. Percebe-se nitidamente a intenção do

legislador estadual em controlar e fiscalizar de maneira mais eficiente, através dos registros e de seus pareceres, a emissão dessas cotas.

Pairava uma dúvida na redação da Lei nº 14.309/2002 no sentido da necessidade ou não da utilização de cota de reserva florestal representativa da mesma microbacia daquela área que se beneficiaria da cota. Certamente com a publicação da Lei nº

26 Art. 35, §1º, do Decreto nº 43.710/2004 27 Art. 35,§2º , do Decreto nº 43.710/2004

(25)

25

15.027/2004, que previa, como visto acima, não ser possível a alienação de cota de CRRL para posse ou propriedade rural localizada fora da bacia hidrográfica da RPRA e também com a publicação do Decreto nº 43.710/2004, que em seu artigo 35, §3º, previa que as cotas quando utilizadas para fins de recomposição de Reserva Legal precisariam necessariamente corresponder à mesma sub-bacia hidrográfica de localização da propriedade, onde a Reserva Legal seria recomposta, esta dúvida deixada pela omissão da Lei nº 14.309/2002 perdia o espaço de existir.

No entanto, a dúvida não estava sanada. Tanto é assim que em 2008, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, por meio de representação de inconstitucionalidade do artigo 17, da Lei nº 14.309/2002, decidiu definitivamente não permitir a interpretação que entendesse ser possível a compensação da reserva legal em imóveis rurais fora da mesma microbacia hidrográfica. Senão veja-se:

Ação Direta de Inconstitucionalidade. Artigo 17, incisos V, VI e VII e parágrafo 6º da Lei Estadual nº 14.309/2002. Política florestal e de proteção à biodiversidade no Estado. Artigo 19, incisos V e VII, e parágrafo 6º, do Decreto Estadual nº 43.710/04. Regulamento. Reserva legal. Inconstitucionalidade manifesta. Extrapolação de competência suplementar. Disciplina contrária à legislação federal de regência. Ofensa ao artigo 10, inciso V, e parágrafo 1º, I, da Constituição Estadual. Representação acolhida. Vício declarado. - A recomposição da reserva legal em imóveis rurais a ser implementada mediante compensação, consoante a legislação federal de regência, somente é possível se se der por outra área equivalente em importância ecológica e extensão, desde que pertença ao mesmo ecossistema e esteja localizada na mesma microbacia. V.V. (Ação Direta Inconst 1.0000.07.456706-6/000, Rel. Des.(a) Roney Oliveira, CORTE SUPERIOR, julgamento em 27/08/2008, publicação da súmula em 07/11/2008)

Grifo nosso

A legislação mineira enfrentou ponto interessante ao definir que o proprietário da área registrada como de servidão florestal seria responsável pela conservação e manutenção da área averbada28, sendo de sua inteira responsabilidade a ocorrência de

danos ou sinistros que viessem a comprometer a sua integralidade ou a sua peculiaridade como área protegida. No caso da ocorrência de danos ou sinistros na área averbada como de servidão florestal, o proprietário deveria informar rapidamente ao IEF, o qual estabeleceria as medidas necessárias para a sua recomposição ou a declaração de sua extinção.

(26)

Essa, aliás, era mais uma questão omissa no Código Florestal pretérito, já que não havia nenhum dispositivo que previsse a responsabilidade por eventuais danos à área que vinculada a uma cota. Não se sabia ao certo se haveria a responsabilização apenas do alienante da cota ou se haveria também a responsabilidade do adquirente.

1.2.3. Experiência de Santa Catarina na implementação da CRF

Em 2009, o estado de Santa Catarina, introduziu, através de seu Código Estadual do Meio Ambiente (Lei nº 14.675/2009), a Cota de Reserva Florestal.

Foi previsto que na propriedade ou posse de imóvel rural que não atendesse ao percentual de reserva legal exigido, deveriam ser adotadas as seguintes medidas, isolada ou conjuntamente: (i) recomposição da reserva legal mediante o plantio na área necessária a sua complementação; (ii) condução da regeneração natural da reserva legal; (iii) compensação da reserva legal por outra área equivalente em importância ecológica e extensão, que pertença ao mesmo ecossistema e esteja localizada na mesma bacia hidrográfica; (iv) mediante o arrendamento de área sob o regime de servidão ambiental, ou de reserva legal, ou da aquisição de Cotas de Reserva Florestal - CRF; (v) através da aquisição e doação ao Estado de áreas no interior de Unidades de Conservação de proteção integral de domínio publico pendentes de regularização fundiária.

Interessante notar que Santa Catarina colocou a aquisição de cotas como uma modalidade distinta da compensação, o que vai de encontro à legislação federal, que define que a aquisição de cotas é justamente uma das formas de compensação da reserva legal. Na prática não faz tanta diferença, já que todas essas formas são maneiras de se compensar em lato sensu.

O Código Ambiental de Santa Catarina, no mais, definiu a CRF nos mesmos moldes do Código Florestal pretérito, qual seja, como título representativo de vegetação nativa sob regime de servidão ambiental, ou de Reserva Particular do Patrimônio Natural ou de reserva legal instituída voluntariamente sobre a vegetação que exceder o percentual definido em lei. Note-se, todavia, que a legislação de Santa Catarina trata da servidão ambiental, e não somente da servidão florestal.

A emissão do título seria feita contra o registro da existência da área no órgão ambiental para que em seguida se gerasse o respectivo crédito em conta para o proprietário, a fim de permitir sua negociação total ou parcial, mediante preço a ser ajustado entre o proprietário e o adquirente.

(27)

27

Estipulou-se que a CRF deve ser controlada em banco de dados do próprio órgão ambiental e livremente negociada. Sua aquisição, no entanto, deve ser averbada em matrícula no registro de imóveis quando utilizada para fins de compensação de reserva legal.

Houve, por fim, a previsão de que as Cotas de Reserva Florestal serão emitidas pela Fundação do Meio Ambiente de Santa Catarina (FATMA) para as áreas que estivessem devidamente cadastradas e registradas no órgão, na proporção de uma cota para cada hectare, para posterior averbação no cartório de registro de imóveis.

O Código Estadual previu também dispositivo relativo à responsabilidade pelas obrigações de conservação da área. Assim, o proprietário da área registrada como de servidão ambiental seria responsável pela conservação e manutenção da área averbada, sendo de sua inteira responsabilidade a ocorrência de danos ou sinistros que venham a comprometer a sua integridade ou peculiaridade como área protegida.

Havendo danos ou sinistros na área averbada como de servidão ambiental, haveria a obrigação do proprietário informar à FATMA, a qual deveria estabelecer as medidas necessárias para a sua recomposição ou a declaração de sua extinção.

A extinção da servidão ambiental, pela perda de sua identidade, é decidida pela FATMA, que comunica o proprietário rural e o cartório competente para o devido cancelamento da averbação.

Nos casos de compensação de reserva legal com CRF temporárias, esgotados os prazos de validade destas, o proprietário deveria apresentar nova área para fins de reserva legal.

Percebe-se a extensa regulamentação do instituto pelo Código Ambiental de Santa Catarina, demonstrando mais uma vez o interesse dos entes da federação num mecanismo de compensação ambiental da reserva legal que formasse uma espécie de mercado de cotas.

1.2.4. Experiência Matogrossense na implementação da CRF

O estado do Mato Grosso publicou, em 2009, o Decreto nº 2.238, que regulamenta o Programa Mato-grossense de Regularização Ambiental Rural. Nessa norma foi estipulado que a compensação poderia ser implementada mediante o arrendamento de área sob o regime de servidão florestal, de Reserva Natural do Patrimônio Particular (RPPN) ou reserva legal instituída voluntariamente sobre a

(28)

vegetação que excedesse os percentuais estabelecidos na lei federal, ou aquisição de Cota de Reserva Florestal.

A Cota de Reserva Florestal seria um título representativo de vegetação nativa sob o regime de servidão florestal, existente em RPPN ou reserva legal. Cada CRF corresponderia a um hectare de vegetação nativa da área sob o regime de servidão florestal.

O proprietário de área rural com vegetação nativa intacta em extensão superior a prevista no Código Florestal pretérito, interessado na emissão de Cota de Reserva Florestal, deveria apresentar ao órgão ambiental estadual, proposta acompanhada de: (i) cópia dos documentos pessoais do proprietário; (ii) matrícula atualizada do imóvel; (iii) Licença Ambiental Única e memorial descritivo georreferenciado da área a que se pretende instituir a servidão; (iv) comprovante da averbação da reserva legal ou da instituição da RPPN.

Apresentados os documentos referidos no artigo anterior, o órgão ambiental, mediante parecer técnico favorável, aprova a proposta e, então, emite as Cotas de Reserva Florestal em favor do proprietário rural, identificando: (i) o número da CRF no sistema de registro; (ii) o número do Cadastro Ambiental Rural – CRA; (iii) o número da LAU; (iv) o número da matrícula do imóvel; (v) o nome do proprietário; (vi) as coordenadas georreferenciadas, o bioma, a tipologia e a microbacia/bacia correspondente à área; (vii) o tamanho da área, em hectare.

A Cota de Reserva Florestal poderá ser vendida, arrendada ou doada à pessoa física ou jurídica de direito público ou privado, para efeitos de compensação de reserva legal e proteção de áreas de interesse ambiental, a critério do órgão ambiental. A venda ou doação da Cota de Reserva Florestal não implica em transferência de domínio da área a que se refere.

A CRF poderá ser cancelada por solicitação do proprietário da área que originou a CRF, em caso de desistência de mantê-la nas mesmas condições. Também poderá ser cancelada por decisão do órgão estadual ambiental, no caso de degradação da vegetação nativa da área que originou a CRF. Em caso de cancelamento, se a CRF estiver sendo utilizada para compensação de reserva legal, o órgão ambiental deverá notificar o proprietário da área servida para regularizar o passivo ambiental no prazo de 30 dias.

Percebe-se que o estado do Mato Grosso foi ainda mais detalhista que Santa Catarina, trazendo um maior detalhamento dos dados relevantes que deveriam constar

(29)

29

da própria cota, além de mecanismo de controle, através dos registros exigidos e pareceres.

1.2.5. Experiência Paraense na implementação da CRF

O estado do Pará publicou, em 2010, o Decreto nº 2.099, que dispôs sobre a manutenção, recomposição, condução da regeneração natural, compensação e composição da área de Reserva Legal de imóveis rurais no Estado do Pará.

Mais próximo ao regramento federal, definiu que o proprietário ou possuidor de imóvel rural com área recoberta por vegetação nativa em extensão inferior ao mínimo estabelecido para a Reserva Legal deverá adotar as alternativas, isolada ou conjuntamente, quais sejam: (i) recomposição da vegetação nativa no próprio imóvel; (ii) condução da regeneração natural; (iii) compensação da Reserva Legal por outra área equivalente em importância ecológica e extensão, ou mediante arrendamento de área sob regime de servidão florestal, ou finalmente mediante aquisição de cotas de Reserva Legal.

A Cota de Excedente de Reserva Florestal (CERF), como é chamada no Pará, foi definido como título representativo de vegetação nativa sob regime de servidão florestal instituída voluntariamente sobre a vegetação que exceder os percentuais estabelecidos para a Reserva Legal. Repare-se que a RPPN não foi posta como uma das modalidades de instituição da cota.

Repetindo o entendimento de outros estados, cada CERF corresponderia a um hectare de vegetação nativa da área sob o regime de servidão florestal.

O proprietário de área rural com vegetação nativa que possuísse extensão superior a reserva legal, interessado na emissão de Cota de Reserva Florestal deveria apresentar, à semelhança do previsto no Mato Grosso, ao órgão ambiental estadual, proposta acompanhada de: (i) cópia dos documentos pessoais do proprietário; (ii) matrícula atualizada do imóvel; (iii) Licença Ambiental Rural - LAR e memorial descritivo georreferenciado da área a que se pretende instituir a servidão; (iv) comprovante de averbação da reserva legal.

O estado do Pará, com redação muito semelhante a do Mato Grosso, definiu que o órgão ambiental, mediante parecer técnico favorável, aprovaria a proposta e emitiria, então, as Cotas de Reserva Florestal em favor do proprietário rural, identificando: (i) o número da CERF no sistema de registro; (ii) o número do Cadastro Ambiental

(30)

Rural-CAR; (iii) o número da LAR; (iv) o número da matrícula do imóvel; (v) o nome do proprietário; (vi) as coordenadas georreferenciadas, o bioma, a tipologia e a microbacia/ bacia correspondente à área; (vii) o tamanho da área, em hectare.

A CERF poderia ser vendida, arrendada ou doada à pessoa física ou jurídica de direito público ou privado, para efeitos de compensação de reserva legal, não implicando em transferência de domínio da área a que se refere.

A CERF, por fim, poderia ser cancelada por solicitação do proprietário da área que originou a CERF, em caso de desistência de mantê-la nas mesmas condições. Poderia ainda ser cancelada por decisão do órgão estadual ambiental, no caso de degradação da vegetação nativa da área que originou a CERF. Havendo o cancelamento, caso a CERF estivesse sendo utilizada para compensação de reserva legal, como também previsto no Mato Grosso, o órgão ambiental deveria notificar o proprietário da área servida para iniciar a regularização do passivo ambiental no prazo de 30 dias.

(31)

CAPÍTULO II - COTA DE RESERVA AMBIENTAL

Neste segundo capítulo, trata-se especificamente da Cota de Reserva Ambiental, instrumento introduzido pela Lei nº 12.651/2012, que veio a substituir a antiga Cota de Reserva Florestal. Foca-se no estudo da Cota de Reserva Ambiental como modalidade de compensação da Reserva Legal. Para tanto faz-se análise das espécies de instituição da Cota de Reserva Ambiental, além do procedimento para sua aquisição, desde o requerimento até sua negociação. Por fim, analisam-se algumas questões poucas desenvolvidas no novo diploma florestal, além das oportunidades e desafios decorrentes desse novo instrumento.

2. O novo Código Florestal (Lei nº 12.651/2012)

Após 12 anos de tramitação, o Projeto de Lei nº 1.876/1999 foi sancionado, com veto parcial de doze dispositivos, e publicado no dia 28 de maio de 2012, dando origem à Lei nº 12.651, o Novo Código Florestal Brasileiro. No mesmo dia, foi publicada a Medida Provisória nº 571 para alterar e complementar a redação de diversos artigos da referida lei. Pelo regramento constitucional, tal Medida Provisória precisou passar pela análise do Congresso Nacional para que fosse convertida em lei. Assim, em 25 de setembro de 2012, a MP foi aprovada pelo Senado, sendo sancionada pelo presidente e covertida na Lei nº 12.727, em 17 de outubro de 2012. Houve, então, a revogação expressa da Lei nº 4.771/1965.

Durante a tramitação do projeto de lei do Novo Código Florestal, a ideia da Cota de Reserva Ambiental surgiu com o apenso do Projeto de Lei nº 3342/2008, do

(32)

deputado Homero Pereira (PR/MT). Este projeto surgiu com o intuito de unificar os institutos de servidão florestal e servidão ambiental, além da criação da Cota de Reserva Ambiental.

O Novo Código Florestal sancionado deu tratamento diferenciado e detalhado à Cota de Reserva Ambiental, que veio a substituir expressamente a Cota de Reserva Florestal29. Alterou também dispositivos da PNMA. O artigo 9º-A da Lei nº 6.938/1981,

foi alterado, por exemplo, para que as áreas que tivessem sido instituídas na forma de servidão florestal passassem a serem consideradas como servidão ambiental, unificando os dois institutos.

Diferentemente do antigo diploma florestal, que simplesmente remetia a uma futura regulamentação – que nunca ocorreu - o Novo Código Florestal detalhou as características, modalidades, mecanismos, validade, forma de emissão e requisitos da Cota de Reserva Ambiental.

Vale ressaltar que o Novo Código Florestal está sendo objeto de três ações diretas de inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal, propostas pelo Procurador-Geral da República, quais sejam: ADI 4901, ADI 4902 e ADI 4903. Este trabalho não tem como objetivo analisar o conteúdo específico de cada uma dessas ADIs, mas para fins desse estudo é importante destacar que existem dispositivos relativos à CRA sendo questionados. A ADI 4901, por exemplo, defende a inconstitucionalidade da possibilidade de redução da reserva legal e da compensação da reserva legal em imóvel distinto daquele ilegalmente degradado.

2.2. A Cota de Reserva Ambiental

Foi definido que cada CRA corresponderá a um hectare. Ademais as cotas podem ser classificadas como: (i) área com vegetação nativa primária ou com vegetação secundária em qualquer estágio de regeneração ou recomposição; ou (ii) áreas de recomposição mediante reflorestamento com espécies nativas.

O Novo Código Florestal estipulou como princípio a “afirmação do compromisso soberano do Brasil com a preservação das suas florestas e demais formas de vegetação nativa, bem como da biodiversidade, do solo, dos recursos hídricos e da

(33)

33

integridade do sistema climático, para o bem estar das gerações presentes e futuras”30. (grifo nosso). Assim, em coerência com tal compromisso, não será deferido o pedido de instituição de CRA de área com vegetação exótica.

Vale lembrar que, pela própria natureza do instrumento, não será emitida CRA quando a regeneração ou recomposição da área forem improváveis ou inviáveis.

A CRA só poderá ser utilizada para compensar Reserva Legal de imóvel rural situado no mesmo bioma31 da área a qual o título está vinculado. Dessa forma, não seria

possível um proprietário rural de imóvel localizado no bioma da caatinga adquirir uma cota vinculada a uma área cujo bioma fosse do cerrado. A ideia da compensação da reserva florestal é justamente preservar a biodiversidade, então, é coerente e pertinente esta exigência.

Pelo artigo 44 do Novo Código Florestal, a Cota de Reserva Ambiental é um título nominativo representativo de área com vegetação nativa, existente ou em processo de recuperação. Para entender melhor a natureza jurídica do instrumento, é necessário analisar o Capítulo IV (“Do Título Nominativo”), do Título VIII (“Dos Títulos de Crédito”) do Código Civil, qual seja:

Art. 921. É título nominativo o emitido em favor de pessoa cujo nome conste no registro do emitente.

Art. 922. Transfere-se o título nominativo mediante termo, em registro do emitente, assinado pelo proprietário e pelo adquirente.

Art. 923. O título nominativo também pode ser transferido por endosso que contenha o nome do endossatário.

§ 1º A transferência mediante endosso só tem eficácia perante o emitente, uma vez feita a competente averbação em seu registro, podendo o emitente exigir do endossatário que comprove a autenticidade da assinatura do endossante.

§ 2º O endossatário, legitimado por série regular e ininterrupta de endossos, tem o direito de obter a averbação no registro do emitente, comprovada a autenticidade das assinaturas de todos os endossantes.

§ 3º Caso o título original contenha o nome do primitivo proprietário, tem direito o adquirente a obter do emitente novo título, em seu nome, devendo a emissão do novo título constar no registro do emitente.

30 Art. 1º-A, inciso II – Lei nº 12.651/2012

31 Bioma é o amplo conjunto de ecossistemas terrestres, caracterizados por tipo fisionômicos semelhantes

de vegetação com diferentes tipos climáticos. São grandes ecossistemas que compreendem várias comunidades bióticas em diferentes estágios de evolução, em vasta extensão geográfica. Por necessidade ecológica, os biomas apresentam intensa e extensa interação edáfica e climática imediatamente superior ao ecossistema. Os grandes biomas brasileiros são a Floresta Amazônica, a Mata Atlântica, o Pantanal Mato-Grossense, o Cerrado, a Caatinga, o Domínio das Araucárias, as Pradarias e os ecossistemas litorâneos. (definição contida no Glossário Ambiental In MILARÉ, Édis. Direito do ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 6ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. p. 1291.)

(34)

Art. 924. Ressalvada proibição legal, pode o título nominativo ser transformado em à ordem ou ao portador, a pedido do proprietário e à sua custa.

Art. 925. Fica desonerado de responsabilidade o emitente que de boa-fé fizer a transferência pelos modos indicados nos artigos antecedentes.

Art. 926. Qualquer negócio ou medida judicial, que tenha por objeto o título, só produz efeito perante o emitente ou terceiros, uma vez feita a competente averbação no registro do emitente.

Pela leitura do caput do artigo 921 do Código Civil, acima transcrito, percebe-se que o título nominativo se dá em favor de pessoa cujo nome deve constar no registro do emitente. Por óbvio o título nunca poderá ser ao portador, inclusive por vedação expressa em lei e por razões fiscais32.

Por estar inserido no Título VIII há o questionamento da cota de reserva ambiental, como título nominativo, possuir natureza cambiária. Para tanto se faz necessário analisar a principiologia dos títulos de crédito no geral. Os princípios básicos dos títulos de crédito são a autonomia, literalidade e cartularidade.

Primeiramente, identifica-se que as cotas de reserva ambiental não são regidas pelo princípio da autonomia. O principal motivo é que as cotas de reserva ambiental são títulos representativos caracterizados como aqueles que representam bens ou mercadorias, tendo sua constituição e validade vinculadas a uma área com vegetação nativa, existente ou em processo de recuperação.

Em relação à literalidade, a cota de reserva ambiental, de fato, como dito acima, é um título representativo de área com vegetação nativa, existente ou em processo de recuperação, que se enquadre em uma das modalidades previstas de instituição (ver capítulo 2.2.2) Assim, as cotas de reserva ambiental atenderiam ao princípio da literalidade, posto que se faz necessário mencionar tais informações no título.

O último princípio fundamental dos títulos de créditos é a cartularidade, que vem sendo mitigada ao longo do tempo, grande parte pelos avanços tecnológicos, que permitem a emissão de títulos inclusive de forma virtual. As cotas de reserva ambiental deverão ser negociadas em bolsas de mercadoria ou sistema de registro de liquidação financeira de ativos (ver capítulos 2.3.3 e 2.3.4), o que se dará, provavelmente, sem a necessidade de tradição da cártula, mas de forma escritural. É o que ocorre, por exemplo, com as ações, debêntures e outros valores mobiliários. Entende-se que a 32 A Lei 8.021/1990, que dispõe sobre a identificação dos contribuintes para fins fiscais veda a emissão de

títulos ao portador. Hoje a única exceção em nossa legislação cambiária de título ao portador é o cheque no valor máximo de R$100,00 (art. 69, Lei nº 9.069/1995).

Referências

Documentos relacionados

De acordo com o art. 2º da Resolução CNE/CP n°03/2002, os cursos de educação profissional de nível tecnológico serão designados como cursos superiores de tecnologia e

O candidato deverá solicitar as devidas adaptações, com a indicação das condições diferenciadas de que necessita, no prazo de antecedência de até 72 horas a contar da

Os trabalhadores que tenham acesso a dados pessoais relativos a pessoas singulares ou cole- tivas, designadamente os relativos a trabalha- dores e colaboradores do Banco, às

Por fim, parece-nos que é muito difícil ainda sustentar que o projeto proposto originalmente por Vargas não correspondia aos objetivos e ao programa econômico do governo, sendo

Em meio às ações de leitura propostas nos roteiros de práticas leitoras hipermidiais, constantes desta obra, pressupõe-se o desen- volvimento de diferentes tipos de leitor

A partir da necessidade da adequação ambiental da propriedade rural nos dispositivos do novo Código Florestal, principalmente em termos de recuperação das Áreas de

As atividades desenvolvidas durante o período de estágio no Parque Estadual Dois Irmãos foram: acompanhamento da rotina do hospital veterinário (manejos, medicações

Introdução ao curso; Conceitos básicos de plantas medicinais e fitoterapia; Estudo com plantas medicinais e trabalhos práticos, Aspectos Práticos do trabalho