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Em busca das famílias reconstituídas: mapeamento dos arranjos familiares da população brasileira de baixa renda por meio do Cadastro Único de Programas Sociais

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Em busca das famílias reconstituídas:

mapeamento dos arranjos familiares da população brasileira de baixa

renda por meio do Cadastro Único de Programas Sociais

Letícia BartholoLuiz Rubens Câmara Araújo

Palavras-chave: família, classe baixa, registro de população.

Resumo

Este artigo pretende contribuir para o entendimento da estrutura das famílias brasileiras, por meio da exploração dos dados relativos à composição familiar da população de baixa renda inscrita no Cadastro Único de Programas Sociais. Esse registro administrativo contínuo, que objetiva ter o registro de todas as pessoas com renda familiar mensal per capita de até ½ salário mínimo, apresenta, em relação aos Censos Demográficos e às PNADs, o diferencial de captar de forma mais detalhada as relações de parentesco e afinidade e de permitir a identificação das famílias reconstituídas.

Dois objetivos principais guiam o texto presente, marcado por um viés exploratório. Primeiramente, como os dados do Cadastro Único não foram até então utilizados nos estudos sobre família, busca-se mapear os tipos de arranjo familiar encontrados nessa base de dados, cotejando-os com aqueles constantes da PNAD 2006. Além disso, objetiva-se explorar uma das potenciais vantagens do Cadastro Único para os estudos sobre família, identificando as famílias reconstituídas entre os arranjos domésticos formados por casal e filhos.

Para tanto, o texto estrutura-se conforme o que segue. Após a introdução, a primeira seção realiza uma breve caracterização do Cadastro Único. Na seção 2, são apresentados as definições e procedimentos metodológicos utilizados na análise. A seção 3 dedica-se à comparação entre os arranjos familiares constantes do CadÚnico e aqueles encontrados na PNAD 2006, enquanto a seção 4 volta-se à identificação das famílias reconstituídas a partir do CadÚnico. Por fim, a quinta seção apresenta um resumo dos dados analisados e as conclusões que deles se depreendem.

Trabalho apresentado no XVI Encontro Nacional de Estudos Populacionais, realizado em Caxambu- MG – Brasil, de 29 de setembro a 03 de outubro de 2008.

Mestranda em Demografia - Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). ♦

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Em busca das famílias reconstituídas:

mapeamento dos arranjos familiares da população brasileira de baixa

renda por meio do Cadastro Único de Programas Sociais

Letícia BartholoLuiz Rubens Câmara Araújo

Introdução

O estudo das dinâmicas familiares tem sido objeto de recorrente atenção na Demografia e em outras ciências sociais. Instituição social responsável pela socialização primária de seus integrantes, a família modela a conduta de seus membros, estabelecendo padrões de relação entre gênero e gerações, ao mesmo tempo em que representa o próprio ordenamento presente na vida social (Durham:1982). Como as demais instituições sociais, a família tem, pois, uma dimensão sócio-histórica, cuja compreensão revela-se basilar ao entendimento das modificações que atravessa, seja em termos de sua estrutura, seja em termos da apreensão das mudanças em seu significado, para os seus membros e para a própria sociedade (Goldani:1990).

As fronteiras da família, entendida como esfera de relações de socialização e proteção baseadas em parentesco e afinidade, não estão ciscunscritas aos limites de um mesmo domicílio. Porém, o fato de as estatísticas oficiais tomarem como unidade de enumeração o domicílio dificulta que análises com enfoque quantitativo abarquem as relações familiares existentes para além dessa raia de demarcação. De todo modo, mesmo tendo em conta tais limites, os estudos sobre os padrões de organização das famílias brasileiras são consensuais em apontar que estas têm passado por mudanças expressivas, entre as quais se destacam a diminuição em seu tamanho e a diversificação em sua composição, em que se sublinha o aumento dos arranjos monoparentais femininos (Berquó et al: 1990; Medeiros e Osório: 2002; Arriagada:2002).

No entanto, a ampliação do entendimento sobre a organização e as dinâmicas familiares esbarra nas características das estatísticas oficiais, apesar de todo o esforço empreendido pelos pesquisadores no desenvolvimento de metodologias para tal fim (Marcondes:2006). Mesmo no que tange às análises sobre as estruturas familiares, há ainda lacunas a suprir. Uma delas refere-se à identificação e ao estudo das famílias reconstituídas ou recompostas, aquelas integradas por casal e filhos, em que há no mínimo um filho de somente um dos cônjuges (Leite:2004; Lobo: 2005).

No intuito de contribuir para o debate sobre as transformações atravessadas pelas famílias brasileiras, o presente texto busca explorar alguns dos dados úteis ao estudo das estruturas familiares contidos no Cadastro Único de Programas Sociais (CadÚnico). Gerido pelo

Trabalho apresentado no XVI Encontro Nacional de Estudos Populacionais, realizado em Caxambu- MG – Brasil, de 29 de setembro a 03 de outubro de 2008.

Mestranda em Demografia - Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). ♦

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Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), este cadastro objetiva ter o registro de todas as famílias cuja renda mensal per capita não ultrapasse ½ salário mínimo (denominadas famílias de baixa renda). Sobre as cerca de 16,8 milhões de famílias inscritas no CadÚnico, há dados relativos à identificação e às características educacionais e de trabalho de cada membro da família, entre outras informações coletadas.

Especificamente no que se refere ao exame da composição das famílias de baixa renda, o Cadastro Único apresenta dois diferenciais, comparativamente aos Censos Demográficos e as Pesquisas Nacionais por Amostra de Domicílios (PNADs): a captação mais detalhada das relações de parentesco e afinidade e o registro, para cada morador, do número de ordem de seu pai e de sua mãe, caso compartilhem o mesmo domicílio do filho, o que enseja a possibilidade de identificar as famílias reconstituídas.

Tendo em vista, portanto, que o CadÚnico possui, potencialmente, dados que podem agregar conhecimento aos estudos sobre as famílias com renda per capita de até ½ salário mínimo, que representam cerca de 1/3 das famílias brasileiras, este artigo tem o principal objetivo de realizar uma primeira exploração das informações sobre a composição familiar da população cadastrada. Para tanto, primeiramente, busca-se mapear os tipos de arranjos familiares existentes no Cadastro Único, comparando-os com aqueles identificados na PNAD 2006. Além disso, objetiva-se identificar as famílias reconstituídas entre os arranjos formados por casal e filhos encontrados no CadÚnico.

Com referência a tais objetivos, o texto presente estrutura-se 5 seções, além desta introdução. A primeira seção dedica-se à uma breve caracterização do CadÚnico, apresentando seus objetivos, desenho, fluxo de coleta e processamento das informações, assim como os dados coletados. Na seção 2, são apresentados as definições e procedimentos metodológicos utilizados na análise. A seção 3 dedica-se à comparação entre os arranjos familiares constantes do CadÚnico e aqueles identificados na PNAD 2006, enquanto a seção 4 volta-se à identificação das famílias reconstituídas a partir do CadÚnico. Por fim, a quinta seção apresenta um resumo dos dados analisados e as conclusões que deles se depreendem.

1. O Cadastro Único de Programas Sociais

O Cadastro Único de Programas Sociais (Cadastro Único/CadÚnico) é um registro administrativo contínuo, gerido em âmbito federal pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), que objetiva ter informações de identificação e caracterização sócio-econômica de todas as famílias brasileiras com renda familiar per capita mensal de até ½ salário mínimo. Sua instituição ocorreu em 2001, por meio do Decreto nº 3.877/2001, o qual determinou a utilização obrigatória do formulário de cadastramento único por todos os programas focalizados de caráter permanente, com exceção daqueles operados pela DATAPREV, entre os quais estão os benefícios previdenciários e o Benefício de Prestação Continuada.

O início dos anos 2000 marcou, no âmbito do Governo Federal brasileiro, um momento de afirmação dos programas de transferência condicionada de renda como mecanismo de combate à pobreza. Em 2001, foi instituído o Fundo de Combate e Erradicação da Pobreza (FCEP), cuja legislação definiu que seus recursos deveriam ser voltados à população com renda per capita inferior à linha de pobreza estabelecida pelo Poder Executivo, ou outro conceito que a substituísse. O atendimento a tal público com os recursos do FCEP deveria ser

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feito prioritariamente por programas de reforço de renda aliados a contrapartidas dos beneficiários (LC nº 111/2001).

Logo após a aprovação do Fundo, foram criados três programas federais de transferência direta à população de baixa renda: Bolsa Escola e Bolsa Alimentação, ambos com a exigência de contrapartidas dos beneficiários, e o Programa Auxílio-Gás, este sem contrapartida, criado com o objetivo de servir como subsídio para a compra do gás de cozinha. O CadÚnico surge, assim, com o principal propósito de consolidar, em uma única base de informações, os dados de identificação e caracterização de todas as pessoas e famílias potencialmente beneficiárias desses programas.

A linha oficial de pobreza não foi fixada pelo Executivo Federal, conforme previsto na legislação do FCEP. Porém, como os programas de transferência de renda acima mencionados voltavam-se ao atendimento de famílias com renda per capita de até R$ 90 (metade do salário mínimo vigente em 2001), foi definida como público prioritário do cadastramento a população com renda familiar per capita mensal de até ½ salário mínimo.

Em outubro de 2003, foi criado o Programa Bolsa Família (PBF), que unificou a gestão e a execução dos três programas supracitados, do Programa Cartão-Alimentação e do Cadastro Único de Programas Sociais. Isso não implicou, todavia, o abandono dos objetivos originalmente postos ao CadÚnico. Prova disso é que, em junho de 2007, publicou-se novo decreto sobre o CadÚnico (Decreto nº 6.135/2007), que revogou o anterior e reafirmou o uso obrigatório do instrumento para a seleção de beneficiários e integração de programas do Governo Federal voltados ao atendimento das famílias de baixa renda, excetuando-se aqueles administrados pelo Instituto Nacional do Seguro Social - INSS2.

Nessa medida, apesar da confusão corriqueira que considera o Cadastro Único somente como o cadastro de beneficiários do Bolsa Família, um e outro não devem ser confundidos: o Cadastro Único trata-se da base de dados com registro da população de baixa renda utilizada pelo Bolsa Família para a seleção de beneficiários. Assim, embora todos os beneficiários do PBF estejam cadastrados, nem todas as famílias/pessoas cadastradas são beneficiárias do PBF ou de outros programas usuários do CadÚnico. Atualmente, existem cerca de 16,8 milhões de famílias de baixa renda registradas no Cadastro Único, das quais aproximadamente 11,1 milhões integram o Bolsa Família.

1.1 Fluxo de coleta e processamento das informações:

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Conforme o decreto nº 6.135/2007, são consideradas famílias de baixa renda aquelas com renda mensal per

capita de até ½ salário mínimo ou com renda mensal total de até 3 salários mínimos. Este segundo critério foi

incluído para atender à demanda específica do Ministério das Cidades, responsável pela gestão de alguns programas habitacionais voltados a famílias com essa faixa de renda. Todavia, esse critério de cadastramento ainda não está operacionalizado e o MDS orienta que os municípios cadastrem: (i) todas as famílias com renda per capita mensal de até ½ salário mínimo, independentemente de seu atendimento por programas sociais; (ii) famílias com renda mensal total de até 3 salários mínimos, desde que visando à operacionalização de programas habitacionais; (iii) famílias com renda que não se enquadre nesses dois critérios, desde que sua inclusão no CadÚnico se dê para fins de participação em algum programa social operado por quaisquer dos três níveis da federação. De todo modo, conforme a orientação explícita do MDS, a linha de renda preferencial se trata de ½

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Conforme mencionado, o CadÚnico é gerido em nível federal pelo MDS, mas são seus co-gestores todos os municípios brasileiros signatários do termo de adesão ao Bolsa Família e ao Cadastro Único3. Ao assinar o termo de adesão, os municípios comprometem-se a cadastrar todas as famílias de baixa renda residentes em seu território, a qualquer tempo, e a manter seus dados atualizados.

Para a coleta de dados, os municípios utilizam o formulário de cadastramento único, que pode ser preenchido em meio impresso ou diretamente no sistema utilizado para a entrada dos dados. A coleta de dados é realizada por visita domiciliar ou por demanda. A orientação do MDS é que os municípios dêem preferência à primeira alternativa, mas o retorno obtido é o de que a maior parte deles efetua o cadastramento em postos de atendimento, dado o custo mais elevado da aplicação domiciliar do formulário. Após a coleta de dados, os municípios realizam sua digitação no sistema de entrada de dados e os transmitem à base central.

O arquivo enviado pelo município passa então pelo sistema central, onde é feito o batimento das informações cadastrais das pessoas com as informações desse sistema. Quando o sistema identifica, conforme as regras de unicidade, que uma pessoa já se encontra cadastrada, retorna seu Número de Identificação Social (NIS) antigo encontrado. Quando a pessoa não é encontrada na base, é gerado um novo NIS. Assim, cada pessoa registrada no CadÚnico possui um NIS. Pelas falhas sistêmicas anteriormente existentes no processamento das informações cadastrais, existem caso de multiplicidades de NIS. A maior parte dessas falhas já foi identificada e corrigida, mas ainda há multiplicidades de registros no CadÚnico.

Os dados devem ser atualizados, no máximo, a cada dois anos e os municípios contam com financiamento do MDS para as ações de inscrição e atualização dos dados das famílias no CadÚnico. Em novembro de 2007, das cerca de 16,8 milhões de famílias de baixa renda inscritas no CadÚnico, 15,07 milhões, ou aproximadamente 90%, estavam com informações atualizadas de acordo com o critério supracitado.

1.2 Sobre a coleta e os dados registrados:

No âmbito municipal, as Secretarias de Assistência Social são geralmente os órgãos gestores do CadÚnico e os dados são coletados por demanda, em postos de atendimento do município, ou por visita domiciliar. Também variam os entrevistadores: alguns municípios utilizam seu corpo técnico de assistentes sociais, ou ainda estagiários, como entrevistadores, havendo aqueles que terceirizam as ações de cadastramento. O informante deve ser preferencialmente a mulher responsável pela família e, à exceção do registro dos documentos de identificação de cada pessoa da família, todas as demais informações são auto-declaradas pela(o) informante. O formulário de cadastramento único é composto por mais de 50 quesitos, constantes em três conjuntos de informação ou blocos, além das variáveis de controle (data, código do município, nome e NIS do entrevistador): (i) Identificação do Domicílio e da Família; (ii) Identificação da Pessoa; e (iii) Formulário do Agricultor Familiar. Além dos dados de identificação pessoal e documental (nome, nome da mãe, município de nascimento e número de documentos, entre outros), o CadÚnico apresenta um amplo conjunto de dados de caracterização sócio-econômica das pessoas, tais como qualificação educacional e

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profissional, rendimentos individuais, despesas da unidade familiar e características do domicílio.

Apesar da amplitude das informações coletadas, nem todos os campos do Cadastro Único apresentam qualidade de preenchimento satisfatória. Dois fatores que contribuem expressivamente para essa situação tratam-se da falta de manuais adequados com orientações sobre a coleta de dados e do próprio formulário de cadastramento, que contém alguns conceitos imprecisos. Desde 2006, o MDS tem trabalhado em uma nova versão do formulário de cadastramento único em parceria com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A revisão do formulário visa seu aprimoramento em termos de conteúdo e estruturação dos quesitos, harmonizando-os, quando possível, com o formato utilizado pelas pesquisas do IBGE, principalmente os Censos Demográficos e as PNADs. Além disso, a cooperação com o IBGE também prevê que este instituto forneça apoio técnico na construção do material instrucional para os entrevistadores e no desenho da capacitação aos municípios para a implantação do novo formulário. Com essas medidas, objetiva-se minorar as falhas na captação das informações cadastrais.

2. Definições e procedimentos de análise.

2.1 Sobre o conceito de família e os tipos de arranjo familiar

Os conceitos de família utilizados no CadÚnico e na PNAD não são equivalentes. A PNAD entende por família as pessoas residentes em uma mesma unidade domiciliar, que partilhem laços de parentesco, dependência doméstica ou normas de convivência, assim como a pessoa que more sozinha em uma unidade domiciliar (IBGE:2008). Já o CadÚnico define família como “a unidade nuclear composta por um ou mais indivíduos, eventualmente ampliada por

outros indivíduos que contribuam para o rendimento ou tenham suas despesas atendidas por aquela unidade familiar, todos moradores em um mesmo domicílio” (Decreto nº 6135/2007,

art 4º, inciso I).

Ambas as fontes demarcam a família pelo compartilhamento de um mesmo domicílio e, por necessidades operacionais, aceitam que uma pessoa sozinha em um domicílio seja considerada família. No entanto, o critério de definição de família no CadÚnico remete à noção de unidade doméstica, isto é, requer que os residentes em um mesmo domicílio, independentemente da existência e do grau de parentesco, partilhem um orçamento comum. Desse modo, se na PNAD, um domicílio composto por casal, sua filha e um neto constitui-se num domicílio composto por duas famílias conviventes (casal/mãe e filho), no CadÚnico, este domicílio deve ser considerado uma só família, desde que seus membros compartam o mesmo orçamento doméstico.

Tendo em vista essa diferença conceitual e o objetivo de cotejar os tipos de arranjos familiares identificados nessas fontes de dados, optou-se por utilizar o conceito de família definido pelo CadÚnico. Assim, a unidade de análise elencada para a comparação, na PNAD 2006, trata-se do domicílio e não da família, posto que o primeiro aproxima-se mais da definição de unidade doméstica. Foram excluídos dos arranjos domiciliares na PNAD 2006, para fins dessa comparação, os indivíduos classificados como pensionistas, empregados e parentes de empregados, que conceitualmente fogem ao critério de divisão de rendas e despesas da unidade domiciliar.

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No CadÚnico, foram consideradas somente as famílias de baixa renda com cadastros atualizados entre novembro de 2005 e novembro de 2007 e com o registro da situação do domicílio (urbano/rural). O total de famílias de baixa renda com dados atualizados foi de 15.073.898 (90% do total de cadastros de famílias de baixa renda), sendo que somente 2.038 destas não tinham declaração da situação do domicílio.

A comparação entre os tipos familiares de ambas as bases não teve em conta o sexo da pessoa registrada como responsável pelo domicílio, porque os critérios utilizados para identificá-la são também distintos entre as fontes. Na PNAD, a pessoa de referência no domicílio trata-se daquela reconhecida pelos demais membros como tal. Já o Cadastro Único utiliza o conceito de “responsável pela unidade familiar” (RUF), o qual preferencialmente deve ser mulher, necessariamente de dezesseis ou mais anos de idade. É em relação ao RUF que os demais residentes são ordenados segundo as relações de parentesco/afinidade, conforme o quadro abaixo.

Quadro 1

Lista de Residentes – Formulário do Cadastro Único.

Código de ordem Definição Código de ordem Definição

1 mãe/responsável legal 11 primo(a)

2 esposo(a) 12 sogro(a) 3 companheiro(a) 13 neto(a) 4 filho(a) 14 tio(a) 5 pai 15 adotivo(a) 6 avô/avó 16 padrasto/madrasta 7 irmão/irmã 17 enteado(a) 8 cunhado(a) 18 bisneto(a)

9 genro/nora 19 sem parentesco

10 sobrinho(a) 20 outro

Fonte: formulário de cadastramento único para programas sociais.

A elaboração dos tipos de arranjo familiar no CadÚnico baseou-se nas variáveis Q263 (número de ordem da mãe/responsável legal da família) e Q264 (parentesco da pessoa em relação à mãe/responsável legal da família). Para a comparação entre os arranjos da PNAD e do Cadastro Único, os dados do último foram agregados de forma compatível com os da primeira, considerando-se, portanto, as condições de filho, enteado e adotivo (também captada separadamente no CadÚnico) como equivalentes e os números de ordem de 5 a 14, de 16 a 18 e 20 entraram na categoria “outro parente” (ver Quadro 1).

Foram construídos os seguintes tipos de família, de acordo com a ordenação dos residentes em relação à pessoa de referência no domicílio, para a PNAD 2006, e ao responsável pela unidade familiar (RUF) no Cadastro Único: (i) unipessoal: pessoa morando só, independentemente do sexo; (ii) monoparental feminino: famílias compostas somente por pessoa de referência/RUF do sexo feminino e filhos; (iii) monoparental masculino: famílias compostas somente por pessoa de referência/RUF do sexo masculino e filhos; (iv) só casal: famílias formadas somente por pessoa de referência/RUF e cônjuge/companheiro; (v) casal com filhos: famílias compostas por pessoa de referência/RUF, cônjuge/companheiro e filhos; (vi) biparental e outros parentes: famílias compostas por pessoa de referência/RUF, cônjuge/companheiro e outros parentes, tenham ou não filhos; (vii) monoparental feminino e parentes: famílias compostas por pessoa de referência/RUF do sexo feminino, sem cônjuge/companheiro, com filhos e outros parentes; (viii) monoparental masculino e parentes: famílias compostas por pessoa de referência/RUF do sexo masculino, sem

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cônjuge/companheiro, com filhos e outros parentes; (ix) sem parentesco: arranjos em que a pessoa de referência/RUF não possui relação de parentesco com nenhum dos demais moradores (pessoa de referência e agregado(s) na PNAD 2006, responsável legal e “sem parentesco” no CadÚnico); e (x) outros: os arranjos não abarcados nas categorias anteriores.

2.2 Sobre o conceito e a identificação das famílias reconstituídas

São, para efeito desta análise, definidas como famílias reconstituídas as unidades domésticas compostas por casal e filhos, onde ao menos um destes é filho natural de somente um dos cônjuges. Sobre essa definição, alguns aspectos merecem nota. Inicialmente, cabe notar que autores como Goldani (2005) e Lobo (2005) apontam que muitas vezes o termo “família reconstituída” e os estudos sobre o tema têm como referência o paradigma da família nuclear tradicional, implicando ao fim que os arranjos reconstituídos sejam não examinados dentro das complexidades existentes nas organizações familiares e conjugais, mas antes julgados a partir do modelo familiar considerado “normal”. Aqui, na impossibilidade de ingressar nesse debate de forma mais consistente, utiliza-se esse termo, mas sem a intenção de lhe embutir tal carga valorativa.

Ademais, a definição adotada abarca somente as unidades domésticas compostas por casal e filhos, isto é, não compreende o exame da existência de núcleos familiares reconstituídos nos arranjos domésticos formados por casal, filhos e parentes/não parentes. Embora as variáveis existentes no CadÚnico permitam essa identificação, isso não foi realizado porque requereria um processamento mais demorado, inviável de ser realizado quando da elaboração deste artigo.

Posto isso, a identificação das famílias reconstituídas foi efetuada a partir da desagregação do arranjo “casal com filhos”, de acordo com o preenchimento das seguintes variáveis para as pessoas registradas como filho/adotivo nesse tipo de arranjo: Q265 (se reside com o pai, registrar número de ordem, se não registrar 99) e Q266 (se reside com a mãe, registrar número de ordem, se não registrar 99).

Ambas as variáveis são de preenchimento obrigatório, o que significa que o cadastro só pode ser enviado à base central com o registro de algum valor nesses campos. Porém, como o fato de esses quesitos estarem preenchidos não implica seu preenchimento correto, foi necessário, antes de se proceder ao mapeamento das famílias reconstituídas, examinar a qualidade de seu preenchimento.

Como tal análise não poderia ser feita para os filhos/adotivos dos arranjos casal e filhos, foi realizada para dois grupos: o primeiro composto por todos os responsáveis pela família dos arranjos unipessoal, só casal, casal com filhos e monoparental feminino. Nesse grupo, que abarca mais de 55% dos responsáveis cadastrados, o preenchimento correto das variáveis Q265 e Q266 seria, para ambas, o número 99, que indica que o responsável pela família não reside nem com seu pai, nem com sua mãe. O segundo grupo é formado por todas as pessoas registradas como filho/adotivo nos arranjos monoparentais femininos, cujo preenchimento correto seria indicado pela variável Q265 registrada com o número 99 e a Q266, com o número de ordem da mãe/responsável legal pela família. Essa avaliação inicial mostrou que, para o grupo 1, mais de 99% dos cadastros estavam preenchidos em conformidade ao esperado, enquanto, para os filhos/adotivos de arranjos monoparentais femininos, o percentual

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de preenchimento correto foi de 98,4%, o que deu força à possibilidade de identificar as famílias reconstituídas por meio dessas variáveis.

Analisou-se, o preenchimento dessas variáveis para cada filho/adotivo do arranjo “casal com filhos”, que foi então destrinchado em 4 categorias: (i) casal com filhos, sendo todos os filhos da mulher e de seu cônjuge; (ii) casal com filhos somente da mulher (família reconstituída tipo 1); (iii) casal com filhos somente do homem (família reconstituída tipo 2); e (iv) casal com filhos de ambos (família reconstituída tipo 3). O tipo 3 refere-se aos arranjos familiares em que residem no domicílio filhos de relações anteriores de ambos os cônjuges, isto é, nos quais cada um dos membros do casal possui ao menos um filho e um enteado. Nessa categoria entram então tanto os arranjos em que a mãe e o pai residem com filhos biológicos de outras uniões e não têm filhos na união atual, quanto aqueles onde os cônjuges também têm filhos da união atual.

2.2 Sobre os critérios de definição da renda familiar per capita

O cômputo da renda familiar per capita no Cadastro Único considera todos os rendimentos dos membros da família, com exceção daqueles provenientes dos seguintes programas de transferência de renda: Bolsa Família e programas remanescentes4, Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Pró-Jovem), Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (PETI) e Projeto Agente Jovem de Desenvolvimento (Agente Jovem)5. Não há, no corpo básico da PNAD 2006, como identificar as famílias ou pessoas participantes desses programas, informação que está presente no suplemento da pesquisa, ainda não disponível no período de elaboração deste texto. Os rendimentos referentes a tais programas na PNAD são captados na variável v1273 do arquivo de pessoas, juntamente com aqueles oriundos de juros da caderneta de poupança e outras aplicações.

Dessa forma, com o objetivo de retirar, do cálculo da renda familiar per capita da PNAD 2006, os benefícios financeiros procedentes dos programas de transferência de renda em questão, optou-se por zerar a variável v273, caso esta apresentasse valores tipicamente pagos por esses programas6.

Considerou-se, em ambas as fontes, somente as famílias com renda per capita mensal de até ½ salário mínimo. Na PNAD 2006, o valor de ½ salário mínimo adotado foi aquele em vigor na data de referência da pesquisa (R$ 175,00), enquanto, no CadÚnico, adotou-se o valor vigente no último período de atualização considerado, novembro de 2007 (R$ 190).

A adoção de cortes diferentes de ½ salário mínimo não causa prejuízo significativo à comparação proposta, na medida em que a preocupação aqui colocada não está em cotejar os números absolutos, mas a distribuição dos tipos arranjos familiares da população de baixa renda. Ademais, a diferença entre o número de famílias registradas no CadÚnico com esses

4

São chamados programas remanescentes aqueles unificados ao Bolsa Família (Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Cartão Alimentação e Auxílio-Gás).

5

O Projeto Agente Jovem de Desenvolvimento foi integrado ao Programa ProJovem pela Medida Provisória nº 211, de 27 de dezembro de 2008.

6

Os valores são em reais: 7, 15, 22, 25, 30, 42, 45, 50, 52, 65, 72, 80, 87, 95, 100 e 102 e abrangem os valores típicos pagos por tais programas, assim como algumas combinações de recebimento de valores de mais de um programa, as quais são possíveis identificar o valor.

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dois cortes de renda não chegou a 1%: há 14.949.198 e 15.073.899 de famílias cadastradas, respectivamente, com renda per capita mensal de R$ 175,00 e R$ 190.

De todo modo, não se esperaria encontrar o mesmo número absoluto de famílias de baixa renda, dadas as características distintas das fontes. Em primeiro lugar, no que se refere ao registro dos rendimentos da família, embora a forma de captação seja por auto-declaração, tanto na PNAD quanto no Cadastro Único, é possível que no último haja uma tendência maior à subdeclaração de rendimentos. Isso porque o Cadastro Único é utilizado para a identificação de potenciais beneficiários de programas sociais, cujos critérios de seleção repousam basicamente na renda familiar mensal per capita.

Assim, as famílias podem tender a subdeclarar sua renda a fim de aumentar suas chances de atendimento nos programas sociais usuários do Cadastro Único. Essa possibilidade aqui aventada não tem o sentido de julgar a subdeclaração de renda dos menos pobres entre os pobres, mas somente de alertar para a possível existência de uma maior inclinação à subdeclaração de renda no Cadastro Único comparativamente às demais pesquisas domiciliares, o que deve ser tido em conta na leitura dos dados apresentados.

Além disso, se está confrontando dados provenientes de um registro administrativo contínuo, atualizados entre novembro de 2005 e novembro de 2007, com dados de uma pesquisa domiciliar amostral de ponto fixo, realizada em setembro de 2006. Nesse sentido, ainda que não haja maior tendência à subdeclaração de renda no Cadastro Único, pode haver diferenças oriundas da composição amostral da PNAD, ou mesmo de flutuações de renda e alterações na composição da família não captadas em uma ou outra fonte.

3. Arranjos familiares CadÚnico X Arranjos Domiciliares PNAD 2006

Conforme mencionado, dado que o CadÚnico tem como unidade de enumeração a família entendida como unidade doméstica, a comparação aqui realizada considera, na PNAD 2006, os arranjos domiciliares, doravante também denominados famílias.

Tendo em conta somente os cadastros atualizados e com o registro da situação do domicílio chegou-se a um total de 15,07 milhões de famílias de baixa renda inscritas no Cadastro Único e 14,37 milhões identificadas na PNAD 2006, havendo, portanto, cerca de 700.000 famílias a menos na PNAD 2006, comparativamente ao CadÚnico. Em termos proporcionais, a maior diferença está na região Sul, onde foram identificadas, no Cadastro Único, 17% a mais de famílias de baixa renda. No total, o Cadastro Único apresentou cerca de 5% a mais de famílias de baixa renda relativamente à PNAD 2006, diferença não muito expressiva dadas as distintas naturezas das fontes.

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PNAD 2006 CadÚnico Norte 1.404.209 1.442.845 1,03 Nordeste 7.067.063 6.611.267 0,94 Sudeste 4.080.781 4.049.027 0,99 Sul 1.630.640 1.358.133 0,83 Centro-Oeste 889.168 905.991 1,02 Brasil 15.071.861 14.367.263 0,95 * Cadastro Único de 30/11/2007

** Arranjos domiciliares, excluindo as condições de empregado, pensionista e parente de

empregado

Região CadÚnico* PNAD 2006**

Tabela 1

Fonte: MDS/SENARC. IBGE/PNAD 2006.

Variação no número de famílias de baixa renda - CadÚnico X PNAD 2006

Vale também destacar a distribuição das famílias de baixa renda segundo a situação de domicílio nas duas fontes. Isso porque os critérios utilizados para definir as áreas urbanas e rurais são diferentes: na PNAD, tal definição é feita de acordo com a legislação, enquanto no Cadastro Único o registro da situação do domicílio se dá segundo a declaração do informante. Apesar dos distintos critérios, examinando os dados da tabela 2, vê-se que as famílias estão distribuídas nas áreas urbana e rural de forma muito semelhante.

Urbano Rural Urbano Rural

Norte 67,7 32,3 68,7 31,3 Nordeste 61,1 38,9 63,5 36,5 Sudeste 82,9 17,1 84,6 15,4 Sul 76,8 23,2 72,0 28,0 Centro-Oeste 85,2 14,8 78,0 22,0 Brasil 70,7 29,3 71,7 28,3 * Cadastro Único de 30/11/2007 Fonte: MDS/SENARC.

** Arranjos domiciliares, excluindo as condições de empregado, pensionista e parente

de empregado

Distribuição das famílias de baixa renda segundo a situação do domicílio (em %)

Região CadÚnico PNAD 2006

Tabela 2

Em relação à distribuição dos tipos de família, apresentada na tabela 3, nota-se que o arranjo predominante, tanto no CadÚnico quanto na PNAD 2006, é aquele composto por casal e filhos, mas a última apresenta 7,4% a mais de famílias nessa espécie de arranjo. Percentuais próximos entre as duas fontes (diferenças inferiores a 3%) foram verificados nos arranjos unipessoal, monoparental masculino, só casal, monoparental (feminino e masculino) e outros parentes, sem parentesco e outros tipos de famílias.

(12)

Urbano Rural Total Urbano Rural Total

unipessoal 1,8 0,8 2,6 2,4 0,8 3,2

monoparental feminino 22,4 5,0 27,4 10,1 1,5 11,6

monoparental masculino 1,2 0,6 1,8 0,7 0,3 1,1

só casal 2,1 1,4 3,5 3,5 1,6 5,1

casal com filhos 30,2 17,6 47,9 36,4 18,8 55,2

biparental e outros parentes 3,6 1,4 5,0 8,6 3,5 12,1

monoparental feminino e outros parentes 4,7 0,8 5,6 6,2 0,9 7,2

monoparental masculino e outros parentes 0,2 0,1 0,3 0,5 0,2 0,7

outros 4,4 1,5 5,9 2,9 0,8 3,6

sem parentesco 0,0 0,0 0,0 0,1 0,0 0,1

Total Brasil 70,7 29,3 100,0 71,7 28,3 100,0

Fonte: MDS/SENARC. IBGE/PNAD 2006. Elaboração própria.

* Cadastro Único de 30/11/2007.

** Arranjos domiciliares, excluindo as condições de empregado, pensionista e parente de empregado.

Tipo de Arranjo Cadastro Único PNAD 2006**

Tabela 3

Distribuição dos arranjos familiares - CadÚnico X PNAD 2006

Salta aos olhos, porém, a diferença entre os percentuais de famílias monoparentais femininas identificados em ambas as fontes. Essas são cerca de 11,6% na PNAD 2006 e 27,4% no Cadastro Único e tal distinção repete-se em todas as regiões brasileiras (ver anexo 1). Com efeito, ao se comparar dados de um registro administrativo contínuo, que visa ter o registro de toda a população de baixa renda, com uma pesquisa amostral, pode se esperar que ocorram diferenças mesmo em características como os tipos de arranjo familiar. Porém, a expressividade da diferença na proporção de famílias monoparentais femininas, assim como o padrão encontrado em todas as regiões acerca da distribuição dos tipos de arranjos biparental e outros parentes e casal com filhos, não deixa de sugerir outra possibilidade explicativa para essa ocorrência.

Em todas as regiões, são esses três os arranjos que apresentam distribuições mais significativamente distintas entre as fontes: as famílias monoparentais femininas sempre com maior representação no CadÚnico e os arranjos biparental e outros parentes e casal com filhos sempre com maiores proporções na PNAD 2006 (ver anexo 1). Na região Sul, onde há a menor diferença nas proporções desses três arranjos entre as fontes, foram identificados no CadÚnico e na PNAD 2006, respectivamente: 25,2% e 12,7% de famílias monoparentais femininas; 5,2% e 9,2% de arranjos do tipo biparental e outros parentes; e 52,4% e 58,8% de famílias compostas. por casal e filhos. Já no Norte do País, região em que há a maior discrepância, tem-se no CadÚnico e na PNAD 2006, respectivamente: 30,8% e 8,9% de famílias monoparentais femininas; 5,5% e 16% de arranjos do tipo biparental e outros parentes; e 45,6% e 55,4% de famílias compostas por casal e filhos.

Dado o padrão das diferenças nas distribuições desses três tipos de arranjos, uma explicação plausível é que o critério formal de definição de família utilizado pelo CadÚnico (unidade doméstica) não se concretize. Em outros termos, apesar de, normativamente, o Cadastro Único definir como unidade de enumeração a família entendida como unidade doméstica, o cadastramento estaria sendo realizado com foco nos núcleos familiares. Nesse sentido, é possível que membros de uma mesma família (unidade doméstica) cadastrem-se separadamente (em “cadastros familiares” distintos, conforme os núcleos familiares), ou mesmo parcialmente. Exemplificando, um domicílio composto por um casal, sua filha e um neto, pode se dividir em duas “famílias” para fins de cadastramento.

(13)

Não há como checar, no CadÚnico, a existência de cadastros familiares distintos que partilhem o mesmo domicílio, o que somente poderia ser feito pelo cruzamento dos campos de endereço, algo bastante demorado e sujeito a erros. Uma forma de averiguar essa ocorrência é cotejar os arranjos familiares do CadÚnico não com os arranjos domiciliares encontrados na PNAD 2006, mas com os arranjos familiares, isto é, seguindo a definição de família adotada pela PNAD. O gráfico 1 mostra as distribuições dos arranjos familiares do CadÚnico, comparativamente aos arranjos familiares e domiciliares encontrados na PNAD 2006.

Gráfico 1

Distribuição dos arranjos domésticos CadÚnico X PNAD 2006

2,6 1,8 3,5 47,9 5,0 5,6 0,3 5,9 0,0 3,8 20,0 2,3 5,9 53,0 6,6 4,7 0,5 3,1 0,1 3,2 11,6 1,1 5,1 55,2 12,1 7,2 0,7 3,6 0,1 27,4 0 10 20 30 40 50 60 unipessoal monoparental feminino monoparental masculino

só casal casal com filhos biparental e outros parentes monop. feminino e outros parentes monop. masculino e outros parentes outros sem parentesco famílias - CadÚnico famílias - PNAD 2006 domicílios - PNAD 2006

Fonte: IBGE/PNAD 2006. MDS/SENARC. Cadastro Único de 30/11/2007. Elaboração própria.

Parece claro, de acordo com o gráfico, que os tipos de família no Cadastro Único estão distribuídos de forma mais próxima à distribuição dos arranjos familiares da PNAD 2006, do que a dos arranjos domiciliares. Cotejando os arranjos familiares na PNAD 2006, nota-se que a diferença entre a proporção de arranjos monoparentais femininos existente entre as fontes cai a menos da metade e percebe-se uma aproximação expressiva nos percentuais de arranjos do tipo biparental e parentes. Nessa segunda comparação, portanto, chega-se a uma distribuição mais similar, mas ainda há diferenças notáveis na proporção de famílias em arranjos formados por casal e filhos (53,0% na PNAD 2006 e 47,9% no CadÚnico) e nos monoparentais femininos (20,0% na PNAD 27,4% no CadÚnico). Esse último resultado traz consigo a dúvida sobre uma possível divisão inclusive de núcleos familiares no cadastramento, embora se deva novamente ponderar que a comparação é realizada entre fontes com características diferenciadas (pesquisa domiciliar X registro administrativo de toda a população de baixa renda).

(14)

Em resumo, mesmo não sendo conclusivos, os dados acima parecem dar validade à hipótese de que o cadastramento ocorre, na prática, tendo como foco os núcleos familiares e não as unidades domésticas. e, em menor medida, de que pode ocorrer mesmo a divisão de núcleos familiares para o cadastramento. Tendo em vista que o CadÚnico é utilizado como base de identificação de beneficiários de programas sociais, cujos critérios de seleção da famílias baseiam-se principalmente na renda auto-declarada, a divisão da família para fins de cadastramento talvez seja vista como um mecanismo de majorar sua possibilidade de inclusão nesses programas.

De todo modo, para não imputar aprioristicamente à família a decisão de cadastrar-se separada ou parcialmente, a investigação dessas ocorrências deve também levar em conta dois aspectos, além, e destacadamente, da natureza distinta das fontes.

Primeiramente, a definição de que o cadastramento deve ter como foco a unidade doméstica pode não estar completamente apropriada pelos municípios e cadastradores. Até novembro de 2007, data final a que se referem os dados do CadÚnico ora expostos, ainda não havia um manual adequado de preenchimento do formulário do CadÚnico acessível aos cadastradores. Além disso, na contra-capa do formulário de cadastramento vigente há a seguinte orientação: “registrar todos os moradores residentes nas unidades domiciliares. (...) Caso no mesmo domicílio resida mais de uma família, preencher, preferencialmente, um caderno para cada família”. Essas orientações, sem uma definição de família no formulário ou em manuais disponíveis aos cadastradores, podem ensejar interpretações heterogêneas quanto à unidade de cadastramento.

Além disso, quando do processo de unificação do programa Bolsa Escola ao Bolsa Família, foi necessário, para transferir as famílias do primeiro para o último, complementar os cadastros daquelas então beneficiadas pelo Bolsa Escola. Isso porque o cadastro utilizado pelo Bolsa Escola, além de possuir menos variáveis que o CadÚnico, só possibilitava o cadastramento do responsável pela família (preferencialmente a mulher/mãe) e de até 3 crianças entre 7 e 15 anos. É possível, então, que a complementação de dados para a transferência das famílias para o Bolsa Família tenha, equivocadamente em alguns casos, pautado-se somente na atualização dos dados das pessoas já inscritas no cadastro Bolsa Escola (via de regra a mãe e três filhos), sem a inclusão dos demais membros da família. Embora essa hipótese certamente não seja capaz de explicar a sobrerepresentação de famílias monoparentais femininas no CadÚnico, já que esta ocorre em todas as regiões (inclusive nas que não tiveram uma ampla cobertura do programa Bolsa Escola), nem por isso merece ser descartada em percursos posteriores de investigação sobre o tema.

4. As famílias reconstituídas no Cadastro Único

Para a identificação das famílias reconstituídas, segundo mencionado, o arranjo “casal e filhos”, foi desagregado em 4 tipos: (i) casal com filhos, sendo todos os filhos biológicos da mulher e de seu cônjuge; (ii) casal com filhos somente da mulher (família reconstituída tipo 1); (iii) casal com filhos somente do homem (família reconstituída tipo 2); e (iv) casal com filhos de ambos, isto é, em que ambos os cônjuges residem com ao menos um filho natural e um enteado (família reconstituída tipo 3).

(15)

Urbano Rural Total Urbano Rural Total

Reconstituída tipo 1 28.440 11.053 39.493 5,0 1,9 6,9 Reconstituída tipo 2 2.101 1.094 3.195 0,4 0,2 0,6 Reconstituída tipo 3 6.865 2.942 9.807 1,2 0,5 1,7

Σ reconstituídas 37.406 15.089 52.495 6,6 2,6 9,2

Casal e filhos biológicos 292.470 225.053 517.523 51,3 39,5 90,8

Σ casal com filhos 329.876 240.142 570.018 57,9 42,1 100,0

Reconstituída tipo 1 114.924 57.666 172.590 3,7 1,9 5,6 Reconstituída tipo 2 8.600 5.470 14.070 0,3 0,2 0,5 Reconstituída tipo 3 21.113 11.010 32.123 0,7 0,4 1,0

Σ reconstituídas 144.637 74.146 218.783 4,7 2,4 7,0

Casal e filhos biológicos 1.497.758 1.392.604 2.890.362 48,2 44,8 93,0

Σ casal com filhos 1.642.395 1.466.750 3.109.145 52,8 47,2 100,0

Reconstituída tipo 1 86.155 15.591 101.746 5,0 0,9 5,9 Reconstituída tipo 2 5.643 1.354 6.997 0,3 0,1 0,4 Reconstituída tipo 3 24.249 4.770 29.019 1,4 0,3 1,7

Σ reconstituídas 116.047 21.715 137.762 6,7 1,3 8,0

Casal e filhos biológicos 1.181.448 411.806 1.593.254 68,3 23,8 92,0

Σ casal com filhos 1.297.495 433.521 1.731.016 75,0 25,0 100,0

Reconstituída tipo 1 30.031 7.727 37.758 3,9 1,0 4,9 Reconstituída tipo 2 2.274 589 2.863 0,3 0,1 0,4 Reconstituída tipo 3 9.461 2.092 11.553 1,2 0,3 1,5

Σ reconstituídas 41.766 10.408 52.174 5,4 1,4 6,8

Casal e filhos biológicos 474.000 241.973 715.973 61,7 31,5 93,2

Σ casal com filhos 515.766 252.381 768.147 67,1 32,9 100,0

Reconstituída tipo 1 52.897 7.700 60.597 14,8 2,1 16,9 Reconstituída tipo 2 5.220 924 6.144 1,5 0,3 1,7 Reconstituída tipo 3 5.876 1.206 7.082 1,6 0,3 2,0

Σ reconstituídas 63.993 9.830 73.823 17,9 2,7 20,6

Casal e filhos biológicos 219.677 64.982 284.659 61,3 18,1 79,4

Σ casal com filhos 283.670 74.812 358.482 79,1 20,9 100,0

Reconstituída tipo 1 312.447 99.737 412.184 4,8 1,5 6,3 Reconstituída tipo 2 23.838 9.431 33.269 0,4 0,1 0,5 Reconstituída tipo 3 67.564 22.020 89.584 1,0 0,3 1,4

Σ reconstituídas 403.849 131.188 535.037 6,2 2,0 8,2

Casal e filhos biológicos 3.665.353 2.336.418 6.001.771 56,1 35,7 91,8

Σ casal com filhos 4.069.202 2.467.606 6.536.808 62,3 37,7 100,0 famílias não identificadas 487.372 188.547 675.919 6,8 2,6 9,4

Fonte: MDS/Senarc. Cadastro Único de 30/11/2007. Elaboração Própria

Brasil Centro-Oeste quantidade % Norte Nordeste Sudeste Sul Tabela 4

Distribuição das famílias compostas por casal e filhos, segundo região e situação do domicílio

Região Tipo de Arranjo

A tabela 4 apresenta o número e o percentual de famílias nessas categorias, segundo a situação do domicílio. Nota-se, inicialmente, que, ao desagregar o arranjo do tipo casal e filhos a partir dessas variáveis, não foi possível integrar à classificação proposta 9,4% dessas famílias (675.919 famílias). São famílias em que algum filho/adotivo traz ambas as variáveis Q265 e Q266 registradas com o número 99 (não residem nem com o pai, nem com a mãe), isto é, registros claramente incongruentes com a ordenação dos residentes em relação ao parentesco com o responsável legal. Com efeito, poderia se questionar se aí não estaria o impacto de possíveis adoções informais entre as famílias de baixa renda, mas os adotivos estão presentes em somente pouco mais de 40.000 famílias não enquadradas nas 4 categorias. Entre as cerca de 6,5 milhões de famílias passíveis de classificação, 91,8% são compostas por casal e filhos de ambos os pais, enquanto 8,2% (535.037 famílias) compõem o grupo de

(16)

famílias reconstituídas. Isso significa que as famílias reconstituídas correspondem, ao menos, a 3,5% das 15,07 milhões de famílias inscritas no CadÚnico.

Vê-se, conforme a tabela 4, que as famílias reconstituídas predominam nas áreas urbanas e são mais freqüentes aquelas em que os filhos são somente da mulher (6,3%, para o Brasil), seguidas por aquelas em que ambos os cônjuges trazem filhos de relacionamentos anteriores (1,4%, para o Brasil). Somente em 33.269 famílias, ou 0,5% do total de arranjos compostos por casal e filhos identificados, a mulher não tem filhos, enquanto o homem traz filhos de relacionamentos anteriores. Em termos regionais, as famílias reconstituídas estão menos presentes na região Sul (6,8%) e são proporcionalmente mais expressivas no Centro-Oeste do País, onde representam 20,6% dos arranjos domésticos compostos por casal e filhos.

% % % % % RO 2.479 5,6 332 0,5 1.127 1,8 59.196 92,1 64.270 100 AC 2.256 9,7 196 0,6 789 2,6 26.301 87,0 30.222 100 AM 5.322 6,6 620 0,6 1.590 1,6 92.978 91,2 101.905 100 RR 945 7,7 122 0,8 520 3,3 13.955 88,3 15.810 100 PA 11.890 6,4 1.490 0,5 4.324 1,6 253.040 91,5 276.629 100 AP 1.200 9,2 110 0,7 235 1,5 13.644 88,5 15.411 100 TO 4.348 8,8 325 0,5 1.222 1,9 58.409 88,8 65.771 100 Norte 28.440 6,9 3.195 0,6 9.807 1,7 517.523 90,8 570.018 100 MA 13.606 6,5 1.864 0,5 3.841 1,0 339.092 91,9 368.797 100 PI 7.422 4,9 941 0,4 1.573 0,7 221.688 94,0 235.826 100 CE 16.490 4,7 1.454 0,3 3.676 0,7 526.331 94,4 557.702 100 RN 7.326 5,6 679 0,4 1.610 0,9 170.011 93,1 182.581 100 PB 8.279 4,5 776 0,3 1.978 0,8 247.950 94,5 262.422 100 PE 21.023 6,1 3.026 0,7 5.251 1,2 418.156 92,1 454.179 100 AL 6.255 4,8 848 0,5 2.113 1,1 175.773 93,6 187.742 100 SE 3.717 5,2 555 0,5 1.270 1,2 102.431 93,1 110.028 100 BA 30.806 6,2 3.927 0,5 10.811 1,4 688.930 91,9 749.868 100 Nordeste 114.924 5,6 14.070 0,5 32.123 1,0 2.890.362 93,0 3.109.145 100 MG 28.008 4,4 2.574 0,3 10.006 1,2 765.042 94,1 813.179 100 ES 5.840 6,6 581 0,5 2.366 1,9 111.887 91,0 122.899 100 RJ 15.281 7,9 1.314 0,6 5.844 2,6 197.938 88,8 222.780 100 SP 37.026 7,1 2.528 0,4 10.803 1,9 518.387 90,6 572.158 100 Sudeste 86.155 5,9 6.997 0,4 29.019 1,7 1.593.254 92,0 1.731.016 100 PR 14.805 4,9 1.421 0,4 5.615 1,5 346.607 93,2 371.792 100 SC 4.194 4,6 475 0,4 2.029 1,6 117.976 93,4 126.258 100 RS 11.032 5,1 967 0,4 3.909 1,4 251.390 93,1 270.097 100 Sul 30.031 4,9 2.863 0,4 11.553 1,5 715.973 93,2 768.147 100 MS 4.329 8,1 417 0,6 1.394 2,1 58.584 89,2 65.696 100 MT 6.180 8,6 476 0,5 1.811 2,0 78.705 88,9 88.581 100 GO 11.410 8,0 915 0,6 3.189 1,9 147.148 89,5 164.399 100 DF 30.978 86,8 4.336 10,9 688 1,7 222 0,6 39.806 100 Centro-Oeste 52.897 16,9 6.144 1,7 7.082 2,0 284.659 79,4 358.482 100 Brasil 312.447 4,8 33.269 0,5 89.584 1,4 6.001.771 91,8 6.536.808 100,0

Fonte: MDS/SENARC. IBGE/PNAD 2006. Cadastro Único de 30/11/2007. Elaboração própria

*Considera somente os arranjos do tipo "casal e filhos" identificados nas 4 categorias propostas.

UF Reconstituída 1 Reconstituída 2 Reconstituída 3

Casal e filhos

biológicos Total

Tabela 5

Distribuição dos arranjos compostos por casal e filhos por Unidades da Federação*

(17)

Federal. Em todas as demais as unidades da federação são mais freqüentes, nos arranjos formados por casal e filhos, aqueles em que os filhos residem com ambos os pais biológicos, enquanto as famílias compostas por casal e filhos somente da mulher, as mais expressivas no conjunto das famílias reconstituídas, não chegam a representar 10% dos arranjos casal com filhos identificados.

Somente no Distrito Federal há uma inversão dessa distribuição: as famílias reconstituídas de tipo 1 representam cerca de 87% dos arranjos formados por casal e filhos, enquanto aquelas compostas por casal e filhos biológicos não chegam a 1%. Essa inversão, que chega a causar estranhamento, a não ser por peculiaridades extremas na conjugalidade da população de baixa renda no DF, provavelmente deriva de erros no preenchimento do Cadastro Único no Distrito Federal. Resta a dúvida de por que um padrão tão marcado de erros nas variáveis Q265 e Q266 nessa unidade da federação.

Por fim, ainda que esteja fora do escopo deste texto, merece ao menos menção a forma com que se distribuem, conforme o sexo, os responsáveis pelas unidades familiares nas categorias do arranjo casal e filhos. Esse dado, exposto na tabela 6, exclui da região Centro-Oeste o Distrito Federal, dada a possibilidade clara de erros de preenchimento nas variáveis utilizadas para a identificação das famílias reconstituídas.

Conforme mencionado, o CadÚnico define que a responsável pela família deve ser preferencialmente a mulher e isto ocorre em mais de 93% dos 15,07 milhões de famílias examinadas. Porém, os dados da tabela 6 mostram que a declaração da responsabilidade pela família no arranjo composto por casal e filhos varia significativamente entre as 4 classificações adotadas.

São, pois, as famílias reconstituídas nas quais somente as mulheres têm filhos aquelas em que predominam as mulheres como responsáveis pela unidade familiar, de forma inclusive mais expressiva que nas famílias compostas por casal e filhos biológicos de ambos. Já nas famílias reconstituídas onde ambos os cônjuges têm filhos de relacionamentos precedentes (tipo 3), parece haver uma flexibilização da ocorrência de mulheres como responsáveis e os homens aparecem como responsáveis pelas unidades familiares em mais de 27% desses arranjos. Por fim, é exatamente nas famílias reconstituídas com filhos somente dos homens que esses sobrepujam as mulheres em termos de declaração de responsabilidade pela família. Declaram-se então responsáveis em 65,4% desDeclaram-ses arranjos.

Tabela 6 Distribuição F M F M F M F M Norte 97,9 2,1 28,0 72,0 71,2 28,8 89,1 10,9 Nordeste 98,1 1,9 31,7 68,3 75,7 24,3 92,1 7,9 Sudeste 97,7 2,3 37,8 62,2 69,0 31,0 91,3 8,7 Sul 97,7 2,3 46,0 54,0 73,8 26,2 93,2 6,8 Centro-Oeste 97,8 2,2 37,7 62,3 72,3 27,7 91,5 8,5 Brasil 97,9 2,1 34,6 65,4 72,5 27,5 91,7 8,3

Fonte: MDS/SENARC. Cadastro Único de 30/11/2007. Elaboração própria. * Cadastro Único de 30/11/2007

Região

Tipos de família

sexo do responsável pela unidade familiar

(18)

O que os dados acima parecem indicar é que existe uma relação entre a declaração da responsabilidade pela família no CadÚnico e as responsabilidades pelo cuidado com os filhos, o que faz bastante sentido tendo em vista que o CadÚnico é utilizado como base de seleção das famílias para programas sociais que têm como objetivos principais os cuidados com as crianças e adolescentes (Bolsa Família e PETI). Não deixa de ser interessante, porém, que os homens declaram-se responsáveis em 30% das famílias reconstituídas onde ambos têm filhos e em quase 70% daqueles em que os filhos são somente seus, mesmo existindo a indução para que a mulher declare-se como responsável e que os cuidados com a prole sejam tradicionalmente vistos como atribuições femininas.

Comentários Finais

O texto presente teve o intuito de contribuir para a compreensão da organização das famílias com renda per capita mensal de até ½ salário mínimo, por meio do exame de sua composição com base nos dados do Cadastro Único de Programas Sociais. Esse registro administrativo contínuo apresenta, em relação aos Censos Demográficos e às PNADs, o diferencial de permitir a captação mais detalhada das relações de parentesco e afinidade e a identificação das famílias reconstituídas.

Como os dados do CadÚnico são praticamente inexplorados nos estudos sobre família, considerou-se inicialmente necessário cotejar a distribuição dos tipos de arranjos familiar encontrados no CadÚnico, com aqueles identificados na PNAD 2006 para a população de baixa renda, isto é, com renda mensal per capita de até ½ salário mínimo. Tendo em vista que normativamente o CadÚnico define família como unidade doméstica, a comparação realizada considerou os arranjos domiciliares da PNAD 2006.

Embora a distribuição dos arranjos familiares no CadÚnico e domiciliares na PNAD 2006 tenha sido próxima para boa parte dos tipos de arranjo fixados, houve grande diferença na proporção de famílias monoparentais femininas entre as fontes: em todas as regiões essas famílias estiveram mais presentes no CadÚnico. De outro lado, ocorreu, na PNAD 2006, sempre uma maior participação dos tipos de arranjo biparental e outros parentes e casal com filhos.

Com efeito, não é de se esperar que se chegue aos mesmos resultados ao se cotejar dados de uma pesquisa amostral de ponto fixo com aqueles provenientes de um registro administrativo contínuo da população de baixa renda. De todo modo, o padrão das diferenças encontradas na distribuição desses três tipos de arranjos fez com que fosse sugerida a explicação de que, na prática, o CadÚnico tenha como unidade de registro não as unidades domésticas, mas sim os núcleos familiares, havendo portanto a possibilidade de divisão das unidades domésticas para fins de cadastramento. Essa hipótese ganhou força ao se tomar, para efeito de comparação entre os tipos de arranjos, as famílias na PNAD 2006, conforme o conceito adotado por essa pesquisa. Nessa última comparação, as proporções encontradas nos tipos de arranjos domésticos foram mais símiles e somente nos arranjos monoparentais femininos e nos formados por casal e filhos houve diferenças proporcionais significativas de entre as fontes. Esse resultado ensejou também a dúvida sobre a possível ocorrência de divisões dos núcleos familiares para a inscrição no CadÚnico.

Aventou-se que o fato de o CadÚnico ser utilizado para a identificação de beneficiários de programas sociais que têm como critérios básicos de seleção a renda e a composição familiar

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pode fazer com que as unidades domésticas se dividam no cadastramento, a fim de aumentar a possibilidade de serem atendidas por esses programas. Todavia, argumentou-se, ainda que se confirme que o excesso proporcional de famílias monoparentais femininas no CadÚnico (comparativamente à PNAD 2006) deriva dessa divisão das unidades domésticas, ou mesmo de núcleos familiares, é precipitado imputar diretamente às famílias a responsabilidade por tal ocorrência. Isso porque, é também plausível supor que a falta de apropriação dos municípios e cadastradores sobre o conceito de família normativamente utilizado pelo CadÚnico, assim como a pouca clareza das orientações contidas no formulário de cadastramento possam acarretar interpretações heterogêneas sobre a unidade de cadastramento. Ou ainda, mas em menor medida, que tenham ocorrido problemas relativos à complementação, no CadÚnico, das informações sobre a composição das famílias com registros originários do antigo Cadastro Bolsa Escola.

A análise apresentada também objetivou explorar o diferencial do CadÚnico para a identificação das famílias reconstituídas entre os arranjos compostos por casal com filhos. À exceção do Distrito Federal, onde as variáveis utilizadas para tal identificação parecem ter qualidade insatisfatória, em todas as demais unidades da federação foi encontrada uma maior proporção de arranjos formados por casal e filhos biológicos de ambos os cônjuges. Entre as famílias reconstituídas, foram mais freqüentes aquelas em que os filhos são somente da mulher. Notou-se, também, que, embora o CadÚnico defina legalmente que a responsabilidade pela unidade familiar deva ser preferencialmente da mulher (o que ocorre em cerca de 93% das famílias de baixa renda cadastradas), entre as famílias reconstituídas em que os filhos são somente do homem, estes assumem a responsabilidade pela família na maior parte dos cadastros. Isso poderia indicar que se declaram, no CadÚnico, como responsáveis pela unidade familiar aqueles a quem mais competem os cuidados com a prole.

De fato, pouco de conclusivo se retira da análise realizada, marcada principalmente por um viés exploratório. Porém, alguns são os itinerários de investigações futuras depreendidos das informações expostas. Um deles está no exame mais detido dos fatores que resultam na sobrerepresentação de famílias monoparentais femininas de baixa renda no CadÚnico, em relação à PNAD. Outros se direcionam a um maior entendimento sobre a organização das famílias reconstituídas de baixa renda: por exemplo, análises mais detalhadas sobre sua composição, incluindo a idade dos cônjuges, a distribuição de crianças nesses arranjos e mesmo a caracterização dessas famílias em termos de educação e participação no mercado de trabalho são potencialmente viáveis por meio do Cadastro Único, a depender de avaliações sobre a qualidade de preenchimento dos campos.

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urbana rural Total urbana rural Total urbana rural Total

unipessoal 0,7 0,3 1,0 1,4 0,3 1,8 2,6 0,5 3,2

monoparental feminino 23,8 7,0 30,8 7,6 1,3 8,9 15,5 2,9 18,4 monoparental masculino 1,9 1,3 3,2 0,7 0,5 1,2 1,9 0,8 2,7

só casal 1,0 0,7 1,8 2,1 1,6 3,6 2,9 1,8 4,8

casal com filhos 26,9 18,8 45,6 35,1 20,3 55,4 35,3 18,8 54,1 biparental e outros parentes 3,8 1,7 5,5 11,3 4,7 16,0 5,6 2,4 8,0 monoparental feminino e outros parentes 4,6 0,9 5,6 6,3 1,4 7,7 4,1 0,8 4,9 monoparental masculino e outros parentes 0,3 0,1 0,4 0,8 0,3 1,1 0,4 0,1 0,5

outros 4,6 1,5 6,1 3,5 0,7 4,2 2,8 0,6 3,4 sem parentesco 0,0 0,0 0,0 0,1 0,0 0,1 0,0 0,0 0,0 total 67,7 32,3 100,0 68,7 31,3 100,0 71,2 28,8 100,0 unipessoal 2,2 1,4 3,7 1,8 1,1 2,9 2,5 1,2 3,7 monoparental feminino 18,0 7,1 25,1 8,1 2,0 10,2 13,5 3,6 17,2 monoparental masculino 1,0 0,8 1,8 0,6 0,4 0,9 1,7 0,7 2,4 só casal 2,5 2,3 4,8 3,1 1,9 5,0 3,7 2,1 5,8

casal com filhos 25,6 22,2 47,8 31,6 23,7 55,3 31,7 22,5 54,3 biparental e outros parentes 3,2 1,6 4,8 8,9 4,7 13,7 5,0 2,6 7,7 monoparental feminino e outros parentes 4,0 1,1 5,1 6,0 1,4 7,4 4,0 1,1 5,1 monoparental masculino e outros parentes 0,2 0,1 0,3 0,5 0,3 0,8 0,5 0,2 0,6

outros 4,3 2,2 6,6 2,7 1,0 3,7 2,3 0,9 3,2 sem parentesco 0,0 0,0 0,0 0,1 0,0 0,1 0,1 0,0 0,1 total 61,1 38,9 100,0 63,5 36,5 100,0 65,0 35,0 100,0 unipessoal 1,6 0,3 1,9 3,6 0,5 4,0 3,6 0,5 4,1 monoparental feminino 28,3 2,4 30,7 13,4 0,9 14,3 22,6 1,6 24,3 monoparental masculino 1,2 0,3 1,5 1,0 0,1 1,1 1,9 0,3 2,2 só casal 1,7 0,6 2,3 4,5 0,9 5,4 5,0 1,0 6,0

casal com filhos 36,0 11,5 47,4 43,6 10,5 54,2 40,7 9,5 50,2 biparental e outros parentes 3,8 0,8 4,6 7,7 1,6 9,3 3,9 0,8 4,7 monoparental feminino e outros parentes 5,7 0,5 6,2 6,9 0,4 7,3 4,5 0,3 4,8 monoparental masculino e outros parentes 0,2 0,0 0,3 0,4 0,1 0,5 0,4 0,0 0,4

outros 4,3 0,7 5,0 3,3 0,4 3,7 2,9 0,3 3,2 sem parentesco 0,0 0,0 0,0 0,2 0,0 0,2 0,2 0,0 0,2 total 82,9 17,1 100,0 84,6 15,4 100,0 85,7 14,3 100,0 unipessoal 1,8 0,3 2,1 2,8 0,6 3,4 3,2 0,7 3,9 monoparental feminino 22,6 2,6 25,2 11,6 1,1 12,7 19,0 2,1 21,2 monoparental masculino 1,0 0,3 1,4 0,7 0,6 1,4 1,4 0,8 2,2 só casal 2,4 0,7 3,1 4,1 1,9 6,0 4,7 2,1 6,7

casal com filhos 35,8 16,6 52,4 38,6 20,3 58,8 36,6 18,7 55,3 biparental e outros parentes 4,0 1,3 5,2 6,9 2,3 9,2 3,6 1,2 4,8 monoparental feminino e outros parentes 4,5 0,6 5,0 4,8 0,5 5,3 2,8 0,2 3,1 monoparental masculino e outros parentes 0,2 0,0 0,2 0,3 0,2 0,5 0,2 0,0 0,2

outros 4,6 0,8 5,3 2,0 0,7 2,6 1,9 0,6 2,5 sem parentesco 0,0 0,0 0,0 0,1 0,0 0,1 0,1 0,0 0,1 total 76,8 23,2 100,0 72,0 28,0 100,0 73,5 26,5 100,0 unipessoal 1,3 0,2 1,5 2,9 0,8 3,7 3,2 0,7 4,0 monoparental feminino 27,4 2,3 29,7 12,1 1,0 13,1 19,8 1,8 21,7 monoparental masculino 1,4 0,3 1,7 0,9 0,3 1,2 1,6 0,4 2,0 só casal 1,8 0,4 2,2 4,0 1,9 5,9 4,8 1,8 6,6

casal com filhos 35,9 9,2 45,1 38,5 14,8 53,3 37,2 13,7 51,0 biparental e outros parentes 5,2 1,1 6,2 9,3 2,5 11,8 5,5 1,4 6,9 monoparental feminino e outros parentes 6,5 0,5 7,0 6,3 0,2 6,5 3,9 0,2 4,1 monoparental masculino e outros parentes 0,3 0,0 0,4 0,4 0,1 0,5 0,3 0,2 0,5

outros 5,4 0,6 6,0 3,2 0,4 3,7 2,6 0,4 3,0 sem parentesco 0,0 0,0 0,0 0,2 0,1 0,3 0,2 0,1 0,3 total 85,2 14,8 100,0 78,0 22,0 100,0 79,3 20,7 100,0 unipessoal 1,8 0,8 2,6 2,4 0,8 3,2 2,9 0,8 3,8 monoparental feminino 22,4 5,0 27,4 10,1 1,5 11,6 17,3 2,7 20,0 monoparental masculino 1,2 0,6 1,8 0,7 0,3 1,1 1,7 0,6 2,3 só casal 2,1 1,4 3,5 3,5 1,6 5,1 4,2 1,7 5,9

casal com filhos 30,2 17,6 47,9 36,4 18,8 55,2 35,5 17,5 53,0 biparental e outros parentes 3,6 1,4 5,0 8,6 3,5 12,1 4,7 1,9 6,6 monop. feminino e outros parentes 4,7 0,8 5,6 6,2 0,9 7,2 4,0 0,7 4,7 monop. masculino e outros parentes 0,2 0,1 0,3 0,5 0,2 0,7 0,4 0,1 0,5

outros 4,4 1,5 5,9 2,9 0,8 3,6 2,5 0,6 3,1

sem parentesco 0,0 0,0 0,0 0,1 0,0 0,1 0,1 0,0 0,1

total 70,7 29,3 100,0 71,7 28,3 100,0 73,3 26,7 100,0

Fonte: MDS/SENARC. IBGE/PNAD 2006. Elaboração própria. * Cadastro Único de 30/11/2007.

**Exclusive empregados, pensionistas e parentes de empregado. Centro-Oeste Brasil Norte Nordeste Sudeste Sul Cadastro Único* Anexo 1

Distribuição das famílias de baixa renda - CadÚnico X PNAD 2006 (em %)

PNAD 2006 - domicílios** PNAD 2006 - famílias** Região tipo de arranjo

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Referências

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