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Uma breve análise do equilíbrio mundial do poder

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Academic year: 2021

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UMA BREVE ANÁLISE DO EQUILíBRIO

MUNDIAL DO PODER (*)

(Título em Inglês «A Brief-Examination of the Word Balance of Power»).

SfNOPSE A. SUMÁRIO

O estudo representa uma tentativa para prognosticar o que possam vir a ser as formas do equilíbrio do poder ou de equiHbrio entre os Estados, no futuro.

O estudo abre com uma curta análise da história passada, abrangendo situações tanto na terra como no mar e, também, sobre passos dados para regular as disputas internacionais por meio de acordo.

A partir desta análise, tendo em atenção os mecanismos de evolução de-duzidos, são estabelecidos sistemas possíveis de equilíbrio do poder. E, depois, considerando os aspectos peculiares das tensões entre os Estados, os factores estáticos e dinâmicos com um impacto na evolução, são consideradas duas perspectivas para o futuro.

Uma como uma exterpolação baseada nos mecanismos de mudança deduzidos a partir da experiência histórica. Outra, com a ênfase na impor-tância duma crescente e cada vez mais importante moral internacional e nas aspirações do Homem pela Paz.

B. CONTEVDO

PREAMBULO I. INTRODUÇAO

lI. UMA BREVE ANÁLISE DA HISTóRIA PASSADA

m.

SISTEMAS DE EQUILíBRIO DO PODER

I. Sistemas possíveis 2. Tensões entre os Estados

(*) Tese apresentado no Roya1 College of Defence Studies (RCOS), no curso de 1m. Londres, 24 de Junho de 1977

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IV. FACTORES ESTATICOS NO ACTUAL EQUILíBRIO DO PODER V. DINÂMICA DA EVOLUÇÃO

I. Síntese das Relações Actuais

2. Um Factor Significativo de Mudança 3. Prospectivas para o Futuro

PREÂMBULO

«Une individualité géographique ne résulte pas de simples eonsidérations de géologie et elimat. Ce n'est une chose donnée d'avance par la nature. TI

faut partir de celte idée qu'une eontrée est un réservoir ou dorment des énergies dont la nature a déposé le germe, mais dont I'emploi dépend de I'homme. Cest lui qui, en la pliant à son usage, met en lumiêre son indi-vidualité. TI établit une connexion entre des traits épars; aux effeets incohé-rants de circonstances locales il substitue un concours systhématique de for-ces. Cest a10rs qu'une contrée se precise et différencie, et qu'elle devient à la longue comme une médaille frappée à I'éffigie d'un peuple (')>>.

Paul Vidal de la Blaehe Através de inúmeras perturbações e dos mais diversos conflitos, nacionais e internacionais, o Mundo de hoje, com as suas raízes no passado, vivendo o presente, caminha para um futuro que será certamente diferente, e, tenhamos esperança, que será melhor. Possivelmente o final não é para amanhã mas começa a estar à vista. E há muitas indicações de que é este o sentido da evolução. Então, o nosso Mundo estará moldado numa forma mais harmonio-sa e flexível, integrado com os seus diversos componentes, como uma medalha cunhada com a efígie do seu povo: a Humanidade. E terá atingido, finalmente, Q seu objectivo que é a Paz, tanto desejada pelo Homem e insistentemente procurada, tantas vezes, através da guerra. Esta será a empresa dos homens por meio de um longo e doloroso caminho através da sua história, que se desenrola hoje claramente na frente dos nossos olhos.

É este, talvez, um ponto de vista optimista, mas acredito que é também realista.

(I) Paul Vidal de la Blac:he: La France. Tableau Glographique: Librairie Hachette & Cie' 1908, p. 6.

Tradução em português: Uma individualidade geográfica nio resulta de simples consi-derações de geologia e clima. Não é uma coisa dada previamente pela natureza,

e.

preciso partir da ideia que um pais é um reservatório onde donnem as energias de que a natureza. depositou o gennen, mas cujo emprego depende do homem. :e. ele que, moldando-as na sua utilizaçAo, põe à luz a sua individualidade. Ele estabelece uma conexão entre relações dispersas; ao,> efeitos incoerentes de circunstâncias locais ele substitui um jogo sistemático de forças. E ~

então que um pafs se precisa e diferencia e se toma, a longo prazo, como uma medalha cunhada com a ef1gie dum povo

(4)

I

INTRODUÇÃO

A anâ1ise, mesmo sem um exame exaustivo dum problema tão complexo cemo é o de equilíbrio mundial de poder, não cabe, e é difícil de ser tratado, como é óbvio, dentro dos limites restritos de uma «tese» com a natureza desta. Limitada na sua extensão e no tempo que lbe pode ser dedicado. É por esta razão que foi designada simplesmente como uma breve análise do equilí-brio mundial do poder. Sobre este assunto, para além dos artigos aparecidos diariamente nos meios de informação, torrentes de livros e outras publicações têm sido escritos e outros continuam a aparecer, quase todos os dias. Isto constitui uma indicação do interesse pelo assunto e a diversidade de opiniões tantas vezes diametralmente opostas só reforça esse interesse, como se tornará aparente no decorrer deste estudo.

As dificuldades em tratar este problema tornam-se evidentes imediatamente e são várias. O conceito de equilíbrio do poder tem um muito largo espectro e é passível das mais diversas interpretações. Pode abranger uma análise passiva das leis da bistória e a definição das suas projecções no futuro, até à formulação de um guia para a definição duma política.

De qualquer forma, o estudo de equílibrio do poder tem dois conceitos, ou pode ser dividido em dois conceitos: um estático, como uma fotografia do presente, e outro dinâmco consistindo no estudo das forças que actuaram no passado, estão a actuar boje, e continuarão a operar amanhã. Forças que mudarão o equilíbrio num dado momento. Na verdade, o equilíbrio do poder nas relações internacionais ou na política internacional pode ter um conceito restrito como, por exemplo, a atitude e política de um Estado, ou grupo de Estados, protegendo-se contra outro Estado, ou grupo, consolidando o seu poder contra o poder dos antagonistas (').

Era este o conceito clássico, mas hoje devemos ter uma concepção mais alargada.

Nós consideraremos o conceito do actual equilíbrio do poder como uma situação de acomodação, numa dada conjutura, entre forças em confronto, sem esquecer que, por detrás, há forças impulsionadoras da mudança. Tal como no sistema solar, onde o homem pode observar que num dado mo-mento os planetas e seus satélites mantêm uma dada posição, que se alterará, inevitavelmente, de acordo com leis dinâmicas, como as de Newton e Kepler, que nos permitem, no entanto, prever qual será a próxima posição. Mas nós estamos, aqui, numa situação muito mais complexa. As leis de evolução das relações internacionais e da evolução do equilíbrio do poder não são tão

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precisas. Apesar do conhecimento tremendo, acumulado pelos homens neste campo, nós estamos, como Newman e Mogenstern escreveram, relativa-mente a outro problema: «Nós estamos ainda hoje, aproximadarelativa-mente na mesma situação, em relação à economia (c não 56!), como estávamos para a astron()mia, antes de Newton» (').

O que fica escrito quer significar que será necessário analisar tanto a estática como a dinâmica do equilíbrio mundial do poder, nos dias de hoje, e isto num momento em que, depois da Segunda Guerra Mundial, uma evo-lução ou revoevo-lução de proporções gigantescas está a ter lugar na política internacional. Cada dia o Mundo altera-se e toma-se diferente.

Dentro desta perspectiva seremos obrigados a deitar um olhar à política internacional encarando-a como a interacção dos seus actores principais presentes no tablado mundial: os Estados ou Estados-Nações, que, na pros-secução dos seus interesses - certos ou errados - , seguem formas diferentes

de comportamento com um leque que vai desde a cooperação até ao con-flito e violência.

Antes de entrar no estudo do problema torna-se necessário definir um método de aproximação ou análise. Vários métodos podiam ser usados, por exemplo partindo duma aproximação de base ideológica e considerando os diferentes sistemas políticos em confrontação, ou analisando o problema de um ponto de vista individual, realçando o interesse do indivíduo «per sh>, ou, ainda, duma maneira mais simplista dando ênfase à soberania do Estado, como um princípio, ainda quase sagrado.

Seria também possível, mas muito mais difícil, tentar um método eclético em que todos os possíveis factores fossem considerados simultaneamente.

Algumas das hipóteses de trabalho estabelecidas acima poderiam ser, na verdade, muito difíceis ou muito limitadas. Adoptámos por isso um método de aproximação diferente usando diversos factores:

- primeiro, lançaremos um breve olhar sobre o passado, considerando alguns factos concretos e os ensinamentos da história;

- partindo daqui, tentaremos deduzir algumas ideias relativas aos me-canismos da evolução, à sua estâtica e dinâmica;

- finalmente, será feita uma tentativa no sentido de deduzir algumas projecções para o futuro.

É um método de análise, evidentemente, sUjeIto a erro, como muitos outros. Mas acreditamos, que o esquema que foi adoptado não é em si utó-pico. Pelo contrário procurará ser pragmático sem se deixar cair no domínio

(J) J. von Newman and O. Morgenstern: Tht!ary of Games anil Economic Behaviour: Princc-ton University Press: 1953. Transcrito por Basil de Perranti: Living with lhe Computer: Science and Enginecring ,Policy Scries: Oxford University Prcss: 1971: p. 14.

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das profecias. Porque os profetas são condenados duas vezes, como podemos deduzir do que PaddeIford e Lincoln escreveram ('), no presente pelos esta-distas e estudiosos, e no futuro pelos historiadores.

Comecemos por deitar um olhar sobre o passado antes de analisar o pre-sente e as prospectivas para o futuro. Isto é muito importante. Em politica como em estratégia, as lições da história não nos permitem, talvez, definir as opcções do presente

e

os esquemas do futuro. Mas, pelo menos, são capazes de detectar os mecanismos em que tais opções podem ser postuladas ou definir as grandes linhas de orientação para a sua formulação.

Como Baldwin disse: «Uma estratégia para amanhã deve ser construída sobre as lições de ontem» (').

Vejamos pois o que podemos aprender da história, - as lições de ontem.

11

UM RÁPIDO OLHAR SOBRE A HISTORIA

Deitemos, então, um breve olhar sobre alguns casos concretos do passado, tendo em vista tentar detectar e definir, mais tarde, as diversas formas do equilíbrio do poder e o processo da sua evolução.

Começaremos com o Império de Alexandre o Grande, da Macedónia. Durante largos anos a Macedónia e a Pérsia, no que era o Mundo Ocidental de então, dominaram pelo seu poder a bacia do Mediterrâneo. Até que a Macedónia considerou, depois de dominar os Estados Gregos, que era suficientemente poderosa para disputar a hogemonia da Pérsia na sua área de influência. E foi, com Alexandre, o Império Macedónico, expandido até às fronteiras da lndia. Foi, no entanto, um império que não sobreviveu muito tempo à morte do seu fundador.

Em 149-146 a.C, depois do esmagamento de Cartago, na Terceira Guerra Púnica, a dicotomia com Roma foi quebrada. Com as suas mãos livres, Roma, progressivamente foi controlando outros espaços, depois de dominar a Grécia em 146 a.c. Naquele ano o Império Romano compreendia sete províncias: Sicília, Sardenha, Córcega, as duas Espanhas, Gália Transalpina, África e Macedónia. Incluía, com a Africa, por exemplo, o Reino do Egipto, que tinha sido por milhares de anos um dos mais poderosos Estados do Mundo, com um Exército de 700 000 homens no reinado de Ramsés 11, o que hoje só é excedido por umas poucas das maiores potências mundiais.

(4) Norman J. Paddelford, George A. Lincoln, Lee D. Olvey: The DynamiCJ 0/ lnter~

national Politics: New York: Me Millan: 1976: p. 17: «Right ar wrong1y, historians and students af internacional politics genera11y praise statesman and condemn prophets». Traduçlo em português: Certo ou errado, os estudiosos da poUtica intemational &erahnente elogiam os estadistas e condenam os profetas.

(') Hansom W. Baldiwn~ Strategy for Tomo"ow: New York and Everston: Harper and Row Publishers: 19'70: p. \1.

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A Asia Menor tornou-se mais tarde a oitava província, e César incor-poraria a Gália no império, em 51-50, a.C. Os Romanos estenderam a sua dominação, não somente na área do Mediterrâneo mas para o Norte, até tão longe como a Escócia e sobre a Europa até ao Mar Negro. Incorporando, algumas vezes os povos subjugados, como iguais, numa política audaciosa, como ficou atestado pela prerrogativa estabelecida em 212 a.e. ('), com o «Civis Romanus Sum», que estendeu a cidadania romana a todos os habi-tantes livres do império.

E este império, apesar de sacudido pelas invasões dos bárbaros, durou séculos, só começando por se dividir em 364, entre Valeus e Valentianus 11. E as legiões só começaram a evacuar a Inglaterra em 366. E em 392, com Theodosius, o Império foi novamente reunido, para se voltar a separar, uma vez mais, em 395, entre Honorius e Arcadius. Em 1453, os Turcos captura-ram Constantinopla, a capital do Império do Oriente, e matacaptura-ram o imperador Constantino. Deve assinalar-se que um outro centro de poder significativo tinha aparecido a Oriente. Entretanto, uma evolução similar tinha lugar a Ocidente. O poder fraccionava-se. Em vez de um só poder havia mais.

Em 771, um novo império estava no processo de tomar forma a Ocidente. Carlos Magno, depois da morte de seu irmão Carloman, tornou-se o único chefe do Reino «FRANKISH». Dominou vários países até à sua consagra-ção final, quando, em 800, foi coroado em Roma como o «Sagrado Impera-dor Romano», pelo Papa Leão IH. Era o novo Império do Ocidente, em para-lelo com o Império Bizantino, a Oriente.

Deitemos agora um olhar ao que se passava no extremo ocidental da Europa. Em 1492, os dois reinos de Castela e Aragão foram unidos pelos Reis Católicos: Fernando e Isabel. Depois da conquista do Reino Mouro de Granada só Portugal permanecia, com uma entidade autónoma, na Península IbériOll.

Tinha-se criado um grande centro de poder: a Espanha, que mais tarde, a partir do século XVI, iria disputar o poder terrestre, na Europa, contra a França.

No início do século XIX, Napoleão tentou a unificação do Continente Europeu que podia ser considerado o Mundo de então, do ponto de vista de poder. Do Elba ao Mediterrâneo, e ao Atlântico, subjugou a maioria dos reinos existentes. Mas foi impedido de concretizar o seu projecto pela pertinácia da Inglaterra e pelas vastas distâncias e clima do «heartland» russo.

Talvez seja de interesse assinalar, aqui, que Napoleão para além do poderio do Grande Exército, lhe juntou a força duma ideologia baseada nas ideias ou ideais da Revolução Francesa.

Temos de fazer notar que ao longo deste extenso período diferentes po-deres tinham de ser considerados. O Prof. Toynbee identificou a existência

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na Europa, em 1525, de duas grandes potências: França e Espanha, a que se juntou a Inglaterra em 1672, a Rússia e os Habsburgos em 1772 e o Império Alemão em 1872 ('). A estas, duas outras potências, exteriores à Europa, se haveriam de juntar no futuro, os Estados Unidos da América e o Japão.

Isto é, duma maneira muito geral, uma sucessão de acontecimentos em terra. Vejamos, sumariamente, o que se passava no mar.

A partir do final do século XIV, Portugal primeiro, e a Espanha depois, viram-se envolvidos na monumental empresa, dos Descobrimentos, que haveria de alargar os limites do Mundo, e, ao mesmo tempo, tmcurtar as suas dimensões pela utilização das rotas marítimas. Em 7 de Julho de 1494 ocorreu um facto muito importante, na cidade de Tordesilhas, na Castela do Norte. Com base numa disposição arbitral do Papa Alexandre VI, foi assinado um tratado entre Portugal e a Espanha. A exploração dos mares e das terras adjacentes, «O Mundo do UItraman>, na expressão do Prof. Toynbee ('), foi dividida entre os dois países, por um meridiano, traçado de pólo a pólo, e inicialmente fixado 100 léguas a Oeste das llhas de Cabo Verde. Portugal ficava com direitos exclusivos a Leste desta linha e a Espanha a Oeste. Isto era mais ou menos entre 48' e 49' a Oeste de Green-wich. Esta nova linha foi sancionada pelo Papa Júlio lI, em 1506, o que per-mitiu aos Portuguesses estabelecerem-se no Brasil. É verdade que «Nenhuma potência Europeia, confrontando o Atlântico jamais aceitou a disposição papal(")>>. Mas quanto a isto, é importante leuntar três pontos: o Papa era, então, a cabeça da Cristandade, a disposição papal nunca foi revogada e as «outras potências Europeias», só a contestaram, mais tarde, quando dispuse-ram dos meios para o poder fazer.

O monopólio dos Portugueses e dos Espanhóis manteve-se por quase um século, um período durante o qual os mares foram pacíficos. Isto durou até aos tempos em que os Holandeses e os Ingleses e os Franceses apareceram como potências navais significativas, a partir do final do século XVI e, principalmente, durante o século XVII. Neste período as confrontações no mar foram frequentes. E tudo começou a ser, como foi estabelecido por Mahan: «A história do Poder Naval é, largamente, embora não somente, uma narrativa de confrontação entre nações, de rivalidades mútuas, de vio-lência, culminante com frequência na guerra (")>>. O começo da evolução do

f) Arnold J. Toynbee: A Study 01 History.

(8) Arnold J. Toynbee: war and Civilization: Selcccionado por A1bert Vann Fowler from a c5tudy of History»): London. New-York, Toronto: Oxford University Press: 1951: p. 3.

I{') Encyclopaedia Britanníca: Micropaedia, Ready Reference and Index: VaI. X: P. 50.

(Nelson: Dictionary 01 World History: London: Thomas, Nelson and Son Ltd: p. 1509,

indica 46°31' a Oeste de Grcenwich),

(10) Ibid.

(11) Alfred Thaycr Mahan: The lnfluence of Sea Power upon History 1660-1783: London:

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processo foi a derrota da «Spanish Armada» em 1588 e o que se passou com Nelson no final do século XVIII e princípios do XIX. A seguir, a situação mudou uma vez mais, e um novo monopólio foi estabelecido pela Inglaterra, como uma autêntica superpotência naval, o que lhe tornou possível construir o maior império dos tempos modernos. Esta situação já não persistia no início d. Segunda Guerra Mundial, processo que vinha de trás, quando outras potências começaram a emergir para disputarem a supremacia nos mares, como os Estados-Unidos da América e o Japão e também a Alemanha, França Rússia e Itália. E, depois da Segunda Guerra Mundial, os Estados-Unidos da América apareceram como a superpotência-naval-dominante, mas, como a evolução nunca pára, a União Soviética já começou a disputar essa posição de hegemonia.

Na terra como no mar, através da breve análise que foi feita, podemos ver que os actores da política internacional são diversos e variam, quer no sentido da simplicidade quer no da complexidade, em ciclos com um, dois ou mais actores. Mas, a partir dum certo momento apareceu uma tendência, numa tentativa para regular a complexidade, introduzindo uma jurisprudência para regular as relações internacionais. É importante, antes de encerrar este olhar retrospectivo sobre a história, considerar duas ou três tentativas para controlar aquelas relações até como um meio de poder ter uma visão mais estreita acerca da complexidade do sistema.

Como já tinha sucedido antes, mas de uma forma mais marcada, com o Congresso de Viena de 1815, a igualdade da soberania dos Estados foi re-conhecida como um princípio fundamental. As duas Conferências da Haia, em 1889 e 1907, tentaram regular as relações internacionais e limitar os armamentos, sem, tem de se admitir, um notável grau de sucesso.

A Segunda Conferência da Haia é bastante impressionante. Pela primeira vez, o que era extraordinário para a época, reuniu o surpreendente número de 44 Estados soberanos. Foi definida, em paralelo com o princípio da igual-dade das soberanias, uma hierarquia do poder. Oito grandes potências foram oficialmente reconhecidas como uma aristrocracia: Alemanha, Áustria-Hun-gria, Estados Unidos da América, França, Inglaterra, Itália, Japão e Rússia. Era um sistema muito complexo e como consequência do jogo das alianças não se considerava possível a destruição de qualquer das potências e, por outro lado, que uma conseguisse impor uma ordem de dominação sobre as outras. Todavia, os campos estavam de certa maneira definidos. Com efeito, a Tripla Aliança, assinada em 1882, entre a Áustria, Alemanha e Itália, reno-vada em 1891 por 12 anos, dividia a Europa em dois partidos. O termo «Eu-ropa», deve ser assinalado. A assinatura do tratado entre a França e a Rússia, em 1893, definia os limites da divisão que foram clarificados quando, em Abril de 1904, a Entente Cordial foi acordada entre a Inglaterra e a França. E de interesse observar como este equilíbrio complexo se rompeu e como no dealbar da Primeira Guerra Mundial se fracturou de uma forma similar a uma reacção nuclear em cadeia, tal como os neutrões duma primeira fissão causam a fissão dos núcleos adjacentes. E transcrevo de Bernard Grun:

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«Primeira Guerra Mundial: o Arquiduque Fernando, herdeiro do trono da Áustria, e a sua mulher, assasinados, em Saravejo, 28 de Junho de 1914; ultimato da Áustria-Hungria à Sérvia, 23 de Julho e declaração de guerra, 28 de Julho; ( ... ) a Alemanha declara guerra à Rússia e França e invade a Bélgica; a Inglaterra declara guerra à Alemanha; a Sérvia e o Montenegro declaram guerra à Alemanha; ( ... ) a França declara guerra à Áustria; a Áustria declara guerra à Bélgica; a Rússia declara guerra à Turquia; ( ... ) (").» E, assim, sucessivàmente, até que a maioria das nações do Mundo, com os seus territórios no Ultramar, se viram envolvidas. Era o estilhaçar do sistema precário de relações entre os diferentes Estados, num equilíbrio muito complexo, tal como sucederia a um núcleo de um átomo bombardeado por neutrões.

O processo de eclosão da Segunda Guerra Mundial não foi muito dife-rente, excepto quanto ao facto de que as declarações de guerra já estavam em desuso (").

Não iremos, agora analisar a evolução mais recente, após a Segunda Guerra Mundial e limitar-nos-emos a assinalar que a situação mudou drastica-mente. A Segunda Conferência de Paz da Haia foi seguida pela Liga das Nações, estabelecida em 1920, de acordo com a primeira parte do Tratado de Versailles. Não incluia os Estados Unidos da América, que tinham sido, aliás, um dos inspiradores do tratado. Uma vez mais, como antes da Primeira Guerra Mundial, a Liga confiara na segurança colecliva mas, por outro lado, voltava-se para o sistema tradicional de alianças defensivas e de equilíbrio entre blocos. Finalmente, mais tarde, e depois de Segunda Guerra Mundial, chegámos às muito mais complexas Nações Unidas, organização internacional devotada à paz e à segurança e à promoção do bem-estar internacional, de acordo com a sua carta, datada de 24 de Outubro de 1945.

É realmente uma instituição muito mais complicada e que abrange ou reconhece algumas diferentes organizações regionais. Compreende 147 Esta-dos soberanos, depois de Angola e Samoa Ocidental terem ingressado nas Nações Unidas em Dezembro de 1976. Somente 12 Estados soberanos do Mundo, não são membros, mas estão representados, na maioria dos casos por observadores permanentes, incluindo a Cidade do Vaticano (Santa Sé).

O princípio da igualdade, estabelecido pela primeira vez no Congresso de Viena em 1815,aplica-se a todos os membros, dos mais poderosos aos mais pequenos, como por exemplo Grenada (que entrou em 1975) com uma área de 133 milhas quadradas e uma população de 106 049 habitantes, ou S. Tomé e Príncipe (entrado também, em 1975) com, respectivamente, 377 milhas qua-dradas e 73 361 habitantes, o que é aproximadamente a população

Londonder-(12) Bemard Grun: The Tim~Tables of Hislory. A. Chronology 0/ ",orld Events: London: lhames and Hudsen: 1975: p. 466.

(11) Esta tendência tomar-se-ia normal nos anos futuros. Na verdade, desde a Segunda Guerra Mundial, 6 dificil encontrar uma simples instância em que uma declaração de guerra formal tenha sido feita.

(11)

ry. Ambos com orçamentos que não atingem o de uma cidade inglesa de provincia ("). Iguais em princípio e em qualidade a todos os outros Estados membros excepto quanto ao estatuto privilegiado dos cinco membros perma-nentes do Conselho de Segurança. Mas a realidade é espantosamente diferente. Com efeito os Estados membros da comunidade mundial não são iguais, pelo contrário são muito diferentes. Os acontecimentos do dia-a-dia são dominados pelo tremendo poder dos Estados Unidos da América e da União Soviética. Estes são seguidos pelos outros centros do poder significativos - ou grandes potências - e a seguir, pela escala abaixo, pelos outros com diferentes graus de poder, até à pequena Grenada.

Na verdade os actores da cena internacional não são iguais. Como no teatro, há as estrelas, que desempenham os papéis mais importantes, os acto-res secundários que às vezes têm alguma coisa para dizer, e os simples figu-rantes que geralmente não falam mas que são frequentemente os mais nume-rosos. E é neste quadro que o equilíbrio é estabelecido. É um sistema muito complexo, na verdade.

A análise histórica, ou olhar sobre o passado, já vai muito longa. É tempo de procedermos a algumas deduções.

II1

SISTEMAS DE EQUIL1BRIO DE PODER

J. Sislemas possíveis

Antes de entrar na definição dos esquemas possíveis de equilíbrio do poder torna-se necessário determinar as forças que actuam por forma a estabelecer o alinhamento entre os Estados no sistema internacional. De uma forma geral essas forças deveriam ser, na actual conjuntura, a expressão do poder de cada um dos Estados: isto é do que designaremos por potencial estratégico, que podia e devia determinar a sua capacidade de expressão, - a real capacidade de expressão de cada Estado na cena internacional. E poderemos dizer que o potencial estratégico é, no quadro de uma estratégia global, à escala do mais alto estádio de formulação das decisões políticas, o somatório de todos os factores susceptíveis de influenciar o poder de um dado Estado. Estes factores não são só de natureza militar, mas são também, outros como: físico ou geo-gráfico considerando por exemplo a extensão, localização, forma e natureza do território; político, em particular a importância das estruturas orgânicas

('of) Orçamentos

- Grenada, 1976: Ec. $50.3 milhões, equivalente a 1l.2 milhões de libras.

- S. Tomé e Prlncipe, 1976: Esc. 180.6 milhões, equivalente a. 260 milhões de libras. Origem das informaçOes: The Europe Yearbook 1977. A World Survey: London: Europc Publications: Volume 11, The Americas, Asia and Austmlasia: Grenada: p. p. 620, 621: S. Tom6 e Principc: p. p. 1394-1396.

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ideologia, estabilidade; social; económico, existência de recursos naturais e possibilidades de acesso; industrial; tecnológico; militar; e assim

sucessiva-mente, para não nos alargarmos num estudo exaustivo. Todos os quais são importantes para determinação do potencial estratégico num Mundo ainda dominado pelo espírito de conflito. Nas mais diversas formas.

Em princípio, os objectivos a serem prosseguidos pelos Estados deveriam estar directamente relacionados com o seu potencial estratégico, ou para evitar esta expressão, passível de ser mal interpretada, com uma atitude pra-gmática concatenada com as possibilidades reais daqueles Estados, não esque-cendo, no entanto, que de acordo com a lei internacional, eles são, pelo menos em teoria, todos iguais. Por motivos de prestígio, importância própria e por outras razões, há Estados que tentam assumir posições muito acima do seu potencial actual, «per se», ou agrupados em conjuntos por forma a tirar vantagem do número, como vem acontecendo. Todavia, as forças que foram definidas acima continuam a ser um factor dominante e é pela sua acção ou inter acção que o equilíbrio do poder tem sido definido e ainda continuará

? ser definido.

A partir destas considerações e retornando à análise histórica, para extrair algumas deduções, nós podemos concluir que é possível definir três situações essenciais ou três sistemas de equlíbrio do poder: unipolar, bipolar e pluripo-lar, pluralista ou complexo.

- O sistema unipolar é caracterizado por um centro do poder dominante. É relativamente estável no seu núcleo apesar do facto de que existem ou podem existir conflitos na periferia. Foi o caso do Império Romano, do Carlos Magno e de Alexandre, apesar da sua curta duração, e da Inglaterra, nos mares.

A evolução deste tipo de sistema pode processar-se em duas vias diferentes: fragmentação, quando se desmenbra em outros centros de poder ou quando a evolução faz aparecer a seu lado outros poderes significativos.

- O sistema bipolar, com dois pólos de poder dominantes, tem simultanea-mente características de estabilidade e instabilidade. É estável quando os dois pólos ou os dois poderes principais acordam em evitar uma confrontação, e é instável quando um deles ou ambos, procuram ou tentam procurar uma ordem de dominação. Um exemplo pode ser visto no caso do Tratado de Tordesilhas, com quase um século de paz, nos mares. Outro, característico desta situação, pode ser o da actual situa-ção bipolar entre os Estado Unidos da América e a União Soviética situação que contém um certo grau de acordo ou pelo menos visa asse-gurar que a confrontação não conduzirá à «ascensão aos extremos», o que poderia significar uma guerra total.

A evolução de um sistema deste tipo, de um ponto de vista teórico pode operar-se em duas direcções diferentes: do unipolarismo, se um dos poderes for capaz de dominar completamente o outro e impor a sua vontade ou no do pluripluralismo se, ao lado dos dois aparecem

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outros centros de poder da mesma ou similar capacidade ou potencial. Como pode ser ilustrado, para o último caso, pela evolução que con-duziu à situação que Se veio a verificar ao tempo do Congresso de Viena. No sentido pluripolar.

- O sistema pluripolar, pluralista ou complexo é caracterizado pela existência de múltiplos pólos de poder. Era esta a situação no Mundo ao tempo da Segunda Conferência da Haia e a que existia no dealbar das Primeira e Segunda Guerras Mundiais. É um sistema que pode apresentar sinais aparentes de estabilidade mas que tem em si próprio poderosos germens de instabilidade. Isto porque devido à falha do «jogo das alianças», erro de cálculo ou excesso da margem de liberdade de acção, o sistema pode desequilibrar-se. Um exemplo do último caso foi o de Hitler invadindo a Polónia em 1939, fazendo desmoronar o pre-cário equilibrio existente.

É, sem grande margem para dúvidas, um sistema muito mais complexo, llma vez que implica um muito maior número de relações entre múltiplos centros do poder. É esta uma das razões porque, neste caso, nós pomos a ênfase na complexidade. Num sistema bipolar há só, evidentemente, uma relação dominante - aquela entre os dois poderes principais. - Mas se atentarmos na situação da Conferência de Haia de 1907, com oito grandes potências, teremos de considerar 28 relações dominantes, para incluir todas as relações entre as oito potências prin-cipais. Este sistema pode evoluir em duas direcções: o aumento da complexidade pelo alargamento do número de pólos de poder, ou na direcção do bipolarismo, primeiro, e do unipolarismo, depois, pelo processo de eliminação dos outros centros de poder. Foi isto o que aconteceu depois da Segunda Guerra Mundial. Ao princípio emergiu uma única superpotência mas, a curto prazo, e depois, teve de ser considerada uma segunda.

A mudança das diferentes formas de equilíbrio do poder, a passagem de um sistema a outro, as mutações no interior de um dado sistema têm sido feitas através dos mais diversos conflitos com variados graus de intensidade. O Prof. Quincy Wright (") salienta que entre 1500 e 1940, um ciclo de 440 anos, houve mais de 278 guerras (mais de uma em cada dois anos), envolvendo 50 000 soldados ou mais. Algumas das verificadas nos últimos anos, já fora do período daquela análise, foram similares em baixas, duração e custos, às das duas guerras mundiais, como foi o caso das guerras da Coreia, Vietnam e Biafra.

É importante notar que o panorama actual é, ainda, alarmante, e que o processo está longe de se ter terminado ou atenuado. Duma conferência

(45) Quincy Wright: A Study of War: Chicago: University of Chicago Press: 1942: VaI. 1 : Apdx. 20.

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do Secretário de Estado, à data, McNamara, em Montreal em 1966 ("), podem extrair-se os seguintes números significativos que são da mais transcendente importância, porque se referem não só a conflitos internacionais, mas, tam-bém, a nacionais, os últimos aparecendo com uma frequência crescente nos últimos tempos. De 1958 a 1966, um período de oito anos, houve 168 surtos de violência, envolvendo 82 governos diferentes. Somente 15 daqueles envolveram dois ou mais Estados, o que quer dizer que 149 daqueles con-flitos foram de natureza interna, apesar de, como é evidente, implicarem uma ajuda externa, que se traduzia, portanto, num envolvimento indirecto de outros. Referindo-se aos últimos - aos conflitos internos - , verifica-se que 87 por cento das nações muito pobres, com um rendimento «per capita» inferior a 100 US dólares por ano, ou seja 32 de entre o total de 38 nações naquelas condições, foram flageladas por conflitos daquele tipo. Isto signi-fica uma média de duas erupções de violência, por país, durante o período de oito anos. A percentagem era de 69 por cento entre as nações pobres, com rendimentos «per capita» de 100 a 400 dólares e já só de 48 por cento para aqueles entre os 400 e os 750 US dólares. Somente um desses casos ocorreu entre as 27 nações, que a partir de 1958 já tinham um rendimento acima dos 750 US dólares, o que representa somente 4 por cento, comparado com as outras percentagens muito superiores. O Sr. McNamara chegou à conclusão de que: «Há uma irrefutável correlação entre a violência e o atraso (''»), e nós podemos avançar outra conclusão, a de que o atraso deve ser atenuado e progressivamente eliminado, como uma base para um mais perfeito e pacífico sistema de relações internas e internacionais.

Das considerações prévias e dos dados estatísticos apresentados decorre imediatamente uma questão: porque é que os povos se revoltam, porque é

que os Estados lutam entre si, uns com os outros? Dentro do âmbito deste estudo só será tentada uma resposta à segunda parte da questão. Todavia, devemos lembrar que os conflitos internos têm um impacto directo - num maior ou menor grau - nas relações internacionais. Dentro do quadro de qualquer sociedade, em qualquer Estado: com efeito não é possível ter uma sociedade estável se os cidadãos não são responsáveis no interior dos Es-tados e se os conflitos entre eles não são mantidos no patamar mais baixo possível. Isto terá de ser um processo difícil e lento. A resposta à segunda parte da questão, atrás posta, pode ser tentada a partir da identificação das tensões entre os Estados que geram as situações de conflito. Isto é o que tentaremos fazer no que se segue.

2. Tensões entre os Estados

Os Estados ou as Nações-Estados continuam a ser os actores ou as enti-dades mais relevantes nas relações internacionais e é entre eles que se geram as tensões que podem conduzir a conflitos internacionais. É possível e até (16) Trancrito de Kenneth W. 'Ibompson: Understanding World Polilic~: Lenden: Uni-vcrsity of Notre Dame Press: 1975: p. 20.

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previsível que o pluralismo do sistema actual será encurtado e substituído por um esquema de largos agrupamentos de Estados capazes de resistirem, melhor, às forças de atracção originadas pelos dois principais pólos de poder actuais, simplificando o sistema. Algumas dessas possíveis associa-ções já estão definidas, algumas irão desvanecer-se e outras aparecerão. Alguns analistas prevêm um Mundo construído sobre as relações entre grandes grupos de Estados, com interesses comuns, mas isto não é ainda aparente.

Por exemplo, a NATO é essencialmente um pacto militar. O Pacto de Varsóvia é menos do que isso, pois estabelece, em oposição à NATO, um grupo de Estados dominados pela União Soviética, que, por várias razões, como a expansão do comunismo, mas também por razões geopolíticas é man-tido unido em conjunto. É possível que a Comunidade Europeia se esteja orientando na direcção de uma qualquer forma de unidade política, que alguns profetizam como o tipo de instituição do futuro. Com um certo opti-mismo, Sir Christopher Soames, antigo Comissário Britânico na EEC, escre-veu, pouco antes de se retirar daquelas funções, no Dai/y Telegraph.

«De facto houve um progresso real em áreas cruciais: as relações externas e o desenvolvimento de uma maquinaria internacional para a criação de um centro político de decisão na Comunidade. Por baixo da superfície de desacordo e crise (meu sublinhado) a Europa começou de facto a tomar forma como uma nova personalidade internacional (") .• No mesmo jornal, e no mesmo dia, um comentador afirmava que: «Sir Christopher Soames, no seu artigo nesta página, diz que a Europa começa a tomar forma como uma nova entidade internacional. Verdade, mas só num sentido muito limitado e com a ênfase no «começa» ("). E acrescentava: «Nas grandes coisas como a energia, a África do Sul, a «détente» Leste-Oeste, pode considerar·se que a Comunidade não existe» ('")>>.

O caminho para uma unidade política, ou uma qualquer forma de unidade política parece enfrentar ainda, dificuldades tremendas. Num documento recente foi escrito: «O Partido Trabalhista deve reafirmar a sua oposição ao princípio de eleições directas para a Assembleia da EEC e a quaisquer inicia-tivas na direcção duma Europa federal ou unitária "». (meu sublinhado) ("). Outras organizações ou agrupamentos transnacionais, como o Terceiro Mundo, a OUA, a Organização dos Estados Americanos, os Estados Árabes, não apresentam um mais largo grau de coesão, excepto em problemas de natureza específica e bastante limitada quando uma marcada convergência de interesses é posta à prova ou se a existência de um objectivo comun não se torna um assunto de discussão.

(18) Daily Telegraph: Artigo por Sir Christopher Soames: London: 7 January 1977

(1") Jbid.

(10) Ibid.

(lI) The Common Market. lhe Cosi of Member:rhip: Publicado peto Labour Party Safe-guards Committee: Impresso pela Civic Press: Glasgow (final de Junho de 1977): Publicado aquando do segundo aniversário do referendo.

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Isto foi o que sucedeu, continua e continuará a suceder, por exemplo nas reuniões da OPEP, com a solidariedade dos países árabes no seu confronto com Israel, ou, mais recentemente, no diálogo Norte-Sul, em Paris, onde os países «pobres» apresentaram contra os «ricos» um notável grau de unidade, e vice-versa. Isto não quer, de modo algum, significar que tais tipos de agru-pamentos transnacionais não devem ser considerados nas relações interna-cionais. Significa, simplesmente, que a soberania continua a ser um factor de transcendente importância que não pode ser posto de lado, e que os Estados, l'S Estados individuais-soberanos continuam a ser os actores principais dos dramas internacionais, que vão sendo representados, todos os dias, sob os nossos olhos. Na realidade, a origem de muitas tensões reside na divergência de interesses que ocorre quando há a suspeita de que o princípio sagrado da soberania pode ser afectado e isto é muitas vezes exacerbado por um nacio-nalismo militante.

Deitemos um olhar ao interesse nacional citando Paddelford e Lincoln: .Há muitos pontos de vista diferentes no que é o interesse nacional e o que exige numa dada situação. Os conceitos do interesse nacional são centrados no cerne dos valores da sociedade, o que inclui o bem-estar da nação, a segurança das convicções políticas, o estilo nacional de vida, a integridade territorial e a autopreservação. Alguns estados tentam proteger o que consideram o seu interesse nacional defendendo um dado «status--quo», outros procurando reduzir um perigo ou ameaça estrangeiros, e outros, ainda esforçando-se por dominar estados mais fracos (")>>.

Fica aqui traçada, numa síntese elegante e precisa a importância do «interesse nacional» e as principais motivações para as tensões que contante-mente se originam entre os Estados. Acredito que alguma ênfase devia ser posta na importância das ideologias que continuam a influenciar o comporta-mento dos indivíduos no ínterior dos Estados e dos Estados entre si.

Agora, consideraremos numa forma muito sumãria, a importância da sobe-rania porque é com a sua cobertura, não só que o «interesse nacional» se exprime mas que as tensões se manifestam, conduzindo a conflitos, susceptí-veis de atingirem o patamar de violência, até ao nível de confrontações mili-tares directas ou indirectas, em que se incluem o terrorismo e as guerrilhas, um dos flagelos dos nossos tempos.

Todos os Estados mantêm, em graus diversificados, o culto da soberania, com uma intensidade que varia e é incrementada no caso dos Estados que mais recentemente ascenderam à independência. A tendência da evolução recente tem sido a de um aumento, simultaneamente em quantidade e quali-dade, quantidade pelo aparecimento na cena internacional de diversas séries de novos Estados independentes, especialmente em e depois de 1960-1961, - o piso do processo de descolonização _. Alguns desses Estados - que

(») Norman J. Paddelford, George A. Limol, Lee D. Olvey: The Dynamis 01

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dificilmente podem ser considerados nações - , caracterizados e apoiados, em certos casos, por um comunismo militante com a sua teoria duma guerra permanente e prolongada, e, outros instáveis e mesmo imaturos, sem as tra-dições dos antigos Estados que tiveram um muito mais lento processo de desenvolvimento. Qualidade, porque, por estas razões ou outras, estas novas séries de Estados, consideram quase patologicamente o conceito de soberania, todos os dias invocado - e também quase todos os dias violado. Todo este processo tem um impacto que cnduz à diversificação do comportamento e que, sem sombra de dúvidas, conduzem a um aumento de complexidade do sistema internacional.

Com efeito os Estados não têm um comportamento uniforme. Van VaIk· enburg ("), estabeleceu uma classificação dos Estados, relacionada com o seu comportamento, que tem o objectivo limitado de definir uma tendência e perspectivar o futuro. Classificou os Estados como: jovens, aqueles orienta-dos para a sua organização interna; adolescentes, agressivos procurando expandir-se; maduros, satisfeitos com o que têm; velhos ou senis, já num estádio de desagregação, desinteressados, numa fase de nítido declinio do poder.

Esta classificação, passível de um grande coeficiente de incerteza, ou pelo menos de dúvida, tem o grande mérito de indicar que para além do potencial estratégico em si, a partir do qual uma correlação poderia ser estabelecida em relação à «capacidade real de expressão», há outros factores ou circunstân-cias a considerar. Se uma correcção devesse ser introduzida nas ideias expres-sas no notável livro de Van Valkenburg, esta seria, a meu ver, a de que nos tempos modernos, os Estados orientados para a sua organização interna, o que deveria ser do seu mais instante interesse, quase desapareceram. Torna-ram-se agressivos, insatisfeitos com o que têm. Esta é uma realidade que tem de ser tomada em consideração. Por outro lado os Estados «maduros» e esta-bilizados cresceram em número ou, pelo menos a sua situação consolidou-se. Foi assim criada, como consequência da evolução uma dicotomia entre aque-les que têm e os que não têm, que pode ser traduzida entre a dos defensores do «status-quo» e aqueles que exigem a mudança. E para alguns dos mais entusiásticos quanto à mudança parece que esta não deve ser subordinada a quaisquer regras.

Tem interesse apresentar, ainda que um s6 simples exemplo, das tensões originadas neste contexto, entre os que «têm», e os «que não têm». Considera-mos, neste aspecto como muito significativa a resposta dada pelo Presidente Nyerere da Tânzania (de certo modo um moderado) a uma pergunta posta pelo jornalista Johnathan Dimbledey, acerca da distribuição dos recursos mundiais. O Presidente Nyerere afirmou:

«Não sei como hei-de pôr a questão. O Mundo é s6 um. Nós necessita-mos desses recursos que estão a ser utilizados para levar as pessoas à Lua.

(23) S. Van Valkenburg: Elements of Politleal Geografhy: Sir Isaac Pitman and Sons, Ltd:

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É uma questão de direito. Por isso eu obterei esses recursos, de qualquer maneira, para o nosso povo. Esses recursos são recursos do Mundo, para o povo do Mundo. Nós vamos obtê-los e desenvolver o nosso país. É infelizmente verdade, nas presentes circunstâncias, porque na verdade não dispomos desses recursos, que não temos autoridade para impor impostos sobre os ricos, para beneficiar os pobres. É necessário devolver aos pobres o que lhes foi tirado pelos ricos. Mas se este for o único pro-cesso pelo qual eu poderei obter aqueles recursos, eu não hesitarei ... ! ... não hesitarei! ... não hesitarei ... ! em obter aqueles recursos (")>>. Isto não é, evidentemente, completamente verdade. E não é porque a totalidade dos recursos mundiais, muitos próprios, foram industriosamente utilizados pelos chamados «ricos», desenvolvendo tecnologias, sem negar que os benefícios, em algumas situações coloniais ou similares, representavam uma certa exploração dos «pobres».

Mas o problema existe. A transcrição acima representa um estado de espírito e pode tomar-se um gerador de conflitos ou, pelo menos, uma barreira para uma aproximação ecuménica entre os povos, nações e Estados do nosso Mundo. E aparecem algumas opiniões pessimistas, que, esperamos, não se materializem acerca da possibilidade de se atingirem patamares de extrema violência, como foi posto por Robert Heilbroner, na trancrição feita por Paddelford and Lincoln ("):

« ... encara-se a possibilidade de governos de «ferro» capazes de por si só provocarem as mudanças domésticas e económicas, necessárias. Alar~

gando esta análise à cena internacional, ele põe a hipótese de que as nações pobres possam obter armas nucleares e conduzir «guerras de distribuição» com a finalidade de promover uma transferência macissa da riqueza para a pobreza a partir dos países velhos e ricos do Mundo.»

Esta é, evidentemente, uma visão muito sombria, se a actual ordem inter-nacional, com as tensões que incorpora, caminhasse nesse sentido. A situação seria muito mais complexa e incerta do que a do Concerto Europeu e as perspectivas para o futuro seriam muito mais dramáticas. Todavia, acima das tensões, a aspiração para um equilíbrio estável da ordem internacional, em paz, aparece crescentemente e universalmente desejada e aceité, apésar dos desacordos e da incerteza, quanto à natureza de uma tal ordem. O conflito persiste e um consenso generalizado não está ainda ao nosso alcance. Como no seio das famílias há qualquer coisa como uma rebelião dos jovens - os mais numerosos - , contra os mais velhos. Os mais jovens e mais nu-merosos países apresentam o mesmo espírito de confrontação e incompre-ensão, por vezes numa forma tão turbulenta que John Scali, o representante

(24) Transcrição da Tham.es. This Week. Tanzania. The World is One: Te1evisionada em 3 de Março de 1917.

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dos Estados Unidos da América na Assembleia Geral das Nações Unidas, se tomou tão preocupado quanto ao espírito de dominância dos pequenos países na Vigésima Nona Assembleia Geral, que alertou a Assembleia para a «tira-nia da maioria

("»),

o que levaria a minoria, neste caso os países desenvolvi-dos, a poderem não respeitar as decisões.

No que se segue, veremos se podemos ter uma esperança quanto ao futuro, analisando algumas condições de apaziguamento e estabilização, que estão profundamente enraizadas nos corações dos seres humanos e que consti-tuem as raízes - os fundamentos - de um Mundo melhor.

Mas antes de nos empenharmos neste caminho lançemos um olhor ao equilíbrio do poder, no Mundo de hoje.

(Continua no pr6ximo número)

F. M. Rocha Simões

Brigadeiro

Chefe do Departamento dos Estudos e Ensino Instituto da Defesa Nacional

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