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Contradições e conflitos na ocupação e urbanização em áreas de APP: o caso das dunas de Ingleses, Florianópolis

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Academic year: 2021

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CAMPUS REITOR JOÃO DAVI FERREIRA LIMA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO

Adrieli Roberta Schons

CONTRADIÇÕES E CONFLITOS NA OCUPAÇÃO E URBANIZAÇÃO EM ÁREAS DE APP: O CASO DAS DUNAS DE INGLESES, FLORIANÓPOLIS.

FLORIANÓPOLIS 2019

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Adrieli Roberta Nunes Schons

CONTRADIÇÕES E CONFLITOS NA OCUPAÇÃO E URBANIZAÇÃO EM ÁREAS DE APP: O CASO DAS DUNAS DE INGLESES, FLORIANÓPOLIS.

Dissertação submetida ao Programa dePós Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Santa Catarina para a obtenção do título de Mestre em Arquitetura e Urbanismo.

Orientadora: Profª. Drª Maria Inês Sugai

Florianópolis 2019

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Adrieli Roberta Nunes Schons

Título: CONTRADIÇÕES E CONFLITOS NA OCUPAÇÃO E URBANIZAÇÃO EM ÁREAS DE APP: O caso das Dunas de Ingleses, Florianópolis.

O presente trabalho em nível de mestrado foi avaliado e aprovado por banca examinadora composta pelos seguintes membros:

Prof.(a) Maria Inês Sugai, Dr(a). Universidade Federal de Santa Catarina

Prof.(a) Soraya Nór, Dr(a).

Universidade Federal de Santa Catarina

Prof.(a) Renato Tibiriçá de Saboya, Dr(a). Universidade Federal de Santa Catarina

Certificamos que esta é a versão original e final do trabalho de conclusão que foi julgado adequado para obtenção do título de mestre em Arquitetura e Urbanismo.

____________________________ Prof. Dr.(a) Fernando Simon Westphal

Coordenador(a) do Programa

____________________________ Profª. Drª Maria Inês Sugai

Orientadora

Florianópolis, 21 de outubro de 2019.

Maria Ines

Sugai:87945886868

Assinado de forma digital por Maria Ines Sugai:87945886868

Dados: 2019.12.19 23:56:14 -03'00'

Assinado de forma digital por Fernando Simon Westphal:02083464907

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Este trabalho é dedicado a todos os que são injustiçados, aos que carecem de políticas públicas e também aos que lutam por uma sociedade mais justa e inclusiva.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço à minha esposa Anelise por todo o suporte, carinho, amor, paciência e ajuda em todas as etapas do trabalho. Quando comecei essa pesquisa, que trata de injustiças e inequidades no tratamento dos mais vulneráveis, não imaginei que no decorrer dela, nosso casamento também seria alvo de uma injustiça encabeçada por um promotor do Ministério Público de Santa Catarina. À ele o esquecimento, à nós as vitórias e tudo que o amor possa nos proporcionar ainda mais.

Agradeço imensamente à minha orientadora, Maria Inês Sugai, pela sabedoria transmitida, dedicação, paciência e disponibilidade. Chego ao final desta etapa com um crescimento imensurável e muito disso foi graças ao exemplo de mulher de luta, um ser humano a quem irei ter como referência sempre.

Agradeço aos meus pais Alvadir e Eny, pois transmitiram e ensinaram valores e caráter, a ter empatia, respeito, a olhar para o próximo e me ver nele. E me ensinaram a lutar sempre pelo que eu acredito. Agradeço às minhas irmãs Elizangela, Alana, Eloisa e Amanda. À nossa avó Antônieta, que infelizmente nos deixou no caminho desta etapa, mas que sempre nos lembraremos com todo o carinho do mundo, como a mulher humilde e batalhadora que foi, sempre nos incentivando a estudar.

À Fabiana, pela disposição, amizade e carinho, me acompanhando e utilizando de seu talento para capturar as imagens que enriqueceram esse trabalho com suas lentes.

Gostaria de agradecer à todos os meus amigos pela compreensão das minhas ausências todas as vezes que não podia vê-los “porque tenho que escrever a dissertação”, principalmente à Carol, Jana, Augusto, Angelo e Paulinha.

Agradeço aos meus colegas de mestrado pelas trocas de experiência e amizade. E aos meus novos e velhos alunos, que sempre estão me perguntando do mestrado: então, acho que agora terminei!

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“Os filósofos se limitaram a interpretar o mundo. Diferentemente, cabe transformá-lo.”

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RESUMO

Esse trabalho apresenta as contradições de uma ocupação de área de preservação permanente, trazendo uma comparação sobre duas ocupações na mesma APP: uma atualmente ocupada pelo que denominou-se classe média; e outra ocupada pela população mais vulnerável, chamada Vila do Arvoredo. O trabalho faz um levantamento monstrando que as tratativas dos Poderes Públicos em suas diversas facetas não se fazem eficazes dependendo de quem ocupa a APP. As populações mais carentes são tratadas de forma diferenciada e lutam pelo seu direito à cidade, infraestrutura e permanência.

Divididas apenas por uma rua o contraste da segregação socioespacial é marcante no Entorno da Rua do Siri. Ambas as áreas consideradas até hoje como APP pelo Plano Diretor de Florianópolis tem uma tratativa muito diferente durante os anos de ocupação e consolidação estudados (de 1977 até 2017).

A areia das dunas de Ingleses foi removida e os terrenos foram loteados por grileiros, que utilizaram a valorização imobiliária da região Norte para lucrar com a terra urbana, sem intervenções efetivas do poder público para inibir a prática. Já os moradores da Vila do Arvoredo, atraídos pela demanda de emprego na região, construíram suas casas sobre as dunas móveis e fixas. Ao contrário da ocupação de Classe Média, não possuem infraestrura e lutam pela sua permanência no Norte da Ilha de Santa Catarina até hoje.

Esse trabalho levantou os principais aspectos da urbanização de ambas as ocupações e as legislações que às permearam na linha temporal, evidenciando o preconceito social com que são tratadas às classes mais baixas, principalmente quando estão próximas à regiões valorizadas pela especulação imobiliária.

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ABSTRACT

This research presents the contradiction of na occupation there is located in a permanent preserved area (PPA), bringing a comparison between two differt occupations in the same PPA: one currently occupied by what it’s called middle class; and another occupied by the most vulnerable population, called Vila do Arvoredo. The research makes a survey showing the different ways that the public authorities deals with these occupacions, and how they’re acctions are different depending on who occupies the PPA. The most deprived populations are treated differently and have to fight for their right to the city, infrastructure and residency. Divided only by a street, the contrast of socio-spatial segregation is visible around Siri streeth. Both areas are APP by the Florianópolis Urban Master Planning, nevertheless, they were treated very differently during the years of occupation there where studied in this research (from 1977 to 2017).

The sand from the Ingleses dunes was removed and the land was destroyed by railings. They used the real estate enhancement in the city to profit from the land located at Ingleses. The public authorities didn't make any interventions to inhibit that practice, although that land was located in an PPA. On the other hand, residents of Vila do Arvoredo, attracted by the demand for employment in the region, built their houses over the mobile and fixed dunes and, unlike the occupation of the middle class, Vila do Arvoredo occupation had no infrastructure and the people were fighting for they're right to fix residency in the land located at the north of Santa Catarina Island.

This research considers the main aspects of urbanization, developments and legislation to create a timeline evidencing the social prejudice with which they are treated in lower classes, especially when they are located in regions valued with high real estate speculation.

Keywords: Urban PPA. Socio-spatial Segregation. Ingleses Dunes.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Entorno da Rua do Siri: 1957 e 2018 ... 15

Figura 2 - Ao fundo o Colégio Catarinense em 1929 e à frente casas na Praia de Fora ... 31

Figura 3 - Morro a Leste da cidade, início da década de 1920. Áreas desmatadas antes da ocupação. ... 32

Figura 5 - Concentração de pobreza e riqueza na Grande Florianópolis. ... 40

Figura 6 – Brasil, Santa Catarina e Florianópolis: na última imagem, destaque para o centro e o distrito de Ingleses do Rio Vermelho. ... 43

Figura 7 - Restingas e Dunas como Terras Comunais. ... 44

Figura 8 - Terras Comunais na Porção Norte da Ilha de Santa Catarina ... 45

Figura 9 - Ocupação Colonial dos Ingleses ... 46

Figura 10 - Distrito Ingleses do Rio Vermelho em 1955. ... 47

Figura 11 - Estimativa de valorização Imobiliária 1994. ... 51

Figura 12 - Região das Dunas dos Ingleses em 1938 ... 56

Figura 13 - Dunas móveis e fixas da praia do Santinho e Ingleses do Rio Vermelho. ... 60

Figura 14- Troca sedimentar no Sistema Praia-Duna ... 61

Figura 15 - Enrocamento para proteção e degradação da paisagem. ... 62

Figura 16 - Localização dos poços profundos da Casan ... 63

Figura 17 - Rosa dos Ventos na Região das Dunas ... 64

Figura 18 - Evolução do movimento das dunas de Ingleses na região da ocupação humana. ... 66

Figura 19 - Esquema de movimento das Dunas de Ingleses sobre a ocupação. ... 67

Figura 20 - Rua do Siri, Vila do Arvoredo e Ocupação de Classe Média. ... 68

Figura 21 - Plano diretor de Florianópolis vigente. ... 69

Figura 22 - Comparação da Região das Dunas 1938 - 1957 ... 70

Figura 23 - Imagem aérea da Região das Dunas em 1957 e grifos da futura ocupação. ... 71

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Figura 25 - Obras na SC-401 em abril de 1970. ... 73

Figura 26 - Imagem aérea da região das Dunas em 1977 ... 75

Figura 27 - Loteamentos clandestinos sendo cercados em 1984 ... 76

Figura 28 - Plano Diretor dos Balneários 1985 ... 78

Figura 29 - Entorno da Rua do Siri em 1994 ... 79

Figura 30 - Mosaico comparando as aerofotos de 1938, 1957, 1977 e 1994. ... 80

Figura 31 - Aerofoto de 1998 da Região das Dunas ... 82

Figura 32 - Ocupação Urbana em Ingleses 2002 e 1994 ... 83

Figura 33 - Croqui de situação do lote de um proprietário da área de Classe Média ... 84

Figura 34 - Residência em APP de acordo com o Plano Direitor de 2014 .... 85

Figura 35 - Avanço da urbanização 2002 a 2007 ... 86

Figura 36 - Ocupação de Classe Média e Vila do Arvoredo: evolução 2002 a 2007. ... 86

Figura 37 - Análise crescimento da Região de Classe Média 2002 - 2007 ... 87

Figura 38 - Adensamento 2012 e 2015. ... 89

Figura 39 - Plano Direitor Florianópolis 2014 - Ingleses. ... 90

Figura 40 - Placas da Casan de Ampliação da Rede de esgoto na Rua Floresta (APP). ... 91

Figura 41 - Rua que divide a ocupação de Classe Média e a Vila do Arvoredo. ... 92

Figura 42 - Ocupação da Vila do Arvoredo em 1990 ... 95

Figura 43- Ocupação nas Dunas em 1996 ... 96

Figura 44 - Localização do Posto de Saúde ... 101

Figura 45 - Crianças da Vila do Arvoredo brincam perto de Lixeiras ... 103

Figura 46 - Comunidade tentar conter o avanço das dunas com sacos. ... 104

Figura 47 - Alunos plantando mudas na Comunidade Angra dos Reis. ... 105

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1- População residente no município de Florianópolis – SC (1872 –

2010). ... 31

Tabela 2 - Ocupações informais ... 39

Tabela 3 - Valorização fundiária dos Balneários. ... 52

Tabela 4 – Preço do metro quadradro em Ingleses 1990-2000 ... 53

Tabela 5 - Dados socioeconomicos X novos investimentos públicos – Período 2000-2010. 54 Tabela 6 - Crescimento Populacional Bairro Ingleses x Florianópolis ... 74

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ACARI Associação de Moradores de Angra dos Reis

AMOVILAR Associação de Moradores da Vila do Arvoredo APP Área de Preservação Permanente

APR Área Predominantemente Residencial

CASAN Companhia Catarinense de Águas e Saneamento CELESC Centrais Elétricas de Santa Catarina

CIDASC Companhia Integrada de Desenvolvimento Agrícola de Santa Catarina FLORAM Fundação Municipal do Meio Ambiente de Florianópolis

IBAMA Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

IPUF Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis MPF Ministério Público Federal

MPSC Ministério Público de Santa Catarina PMF Prefeitura Municipal de Florianópolis

SASFI Sistema Aquífero Sedimentar Freático de Ingleses UFSC Universidade Federal de Santa Catarina

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SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ... 15 1.1 Justificativas ... 16 1.2 Objetivos ... 18 1.2.1 Objetivo Geral ... 18 1.2.2 Objetivos Específicos ... 19 1.3 Metodologia ... 19

2 A DESIGUALDADE: O ESPAÇO DOS POBRES NAS CIDADES É O QUE SOBRA ... 24

2.1 A construção das desigualdades nas cidades brasileiras ... 24

2.2 O debate sobre as tensões ambientais na cidade ... 27

2.3 A formação urbana em Florianópolis: Do Século XVIII ao XXI. ... 30

3 A OCUPAÇÃO DO BAIRRO INGLESES E AS LEGISLAÇÕES ... 42

3.1 As terras comunais nas dunas de Ingleses ... 42

3.2 De colônia de pescadores à polo turístico ... 45

3.3 A valorização imobiliária em Ingleses ... 48

3.4 Legisções sobre às dunas e Plano Diretor dos balneários ... 54

3.5 O espalo costeiro em Ingleses e a ação antrópica ... 58

4 A URBANIZAÇÃO NO ENTORNO DA RUA DO SIRI ... 68

4.1 A pré-ocupação ... 69

4.2 A classe média ... 71

4.2.1 A Ocupação ... 72

4.2.2 A Expansão ... 73

4.2.3 A Consolidação... 77

4.3 A ocupação da Vila do Arvoredo ... 92

4.4 Adão (Angra) dos Reis: ocupação sobre dunas, desfecho diferente ... 103

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 111 ANEXO A – Termo de Consentimento livre e esclarecido para Gravações ... 117

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1 INTRODUÇÃO

O bairro Ingleses do Rio Vermelho, situado na região norte da lha de Santa Catarina, na cidade de Florianópolis, é um dos grandes destinos turísticos e convida milhares de pessoas na temporada de verão. As belezas naturais da região são atrativas não só para os visitantes à procura do mar e de belas paisagens, mas também para o mercado imobiliário em expansão na região.

O Entorno da Rua do Siri, uma área que até 1957 era as Dunas de Ingleses (figura 1), localizado próximo ao centro do bairro e da praia, é emblemático e pode refletir o que acontece nas cidades brasileiras: de um lado casas de classe média com piscinas e infraestrutura com calçamento, drenagem pluvial, energia elétrica, água e uma rede de esgoto em implantação; do outro lado casebres fixados entre as dunas móveis e fixas que não contam com a infraestrutura adequada e vivem em condições de precariedade.

Figura 1 - Entorno da Rua do Siri: 1957 e 2018

Fonte: Geoprocessamento (1957) e Google Maps (2018). Grifos da autora.

Há um contexto para que as famílias de mais baixa renda ocupem regiões ambientalmente mais frágeis, como em áreas de preservação permanente (APP). Historicamente, um dos fatores responsáveis é a falta de políticas públicas que garantam o acesso à terra e moradia, em especial as bem localizadas próximas de áreas urbanizadas e com emprego. Os mais carentes, na dinâmica sócioespacial brasileira, ocupam e se instalam nas áreas que “sobram” das cidades, como dunas,

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manguezais, bordas de rios ou do mar, alto de morros ou encostas íngremes, etc. Essas áreas geralmente são APPs.

Como a população mais carente não tem acesso ao mercado formal, não gozam de garantias legais para que as famílias possam ficar na terra ocupada. As moradias construídas são precárias e não há investimento público destinado às suas casas por causa da informalidade e da exclusão.

As ocupações informais podem ser encontradas geralmente em áreas ambientalmente frágeis, como é o caso da Vila do Arvoredo, situada próxima à Rua do Siri. Esse caso nos chama a atenção porque há dois tipos de ocupações distintas na região. Ambas as ocupações, tanto a de classe média, quanto o setor ocupado pelas camadas mais pobres, estão em uma área que antes era de dunas fixas e móveis de Ingleses.

A área de classe média foi consolidada nos locais onde ocorreu a extração ilegal da areia das dunas e posterior loteamento e aterro. Na área na Vila do Arvoredo a grande maioria das casas erguidas está sobre a areia das dunas. Até o presente momento, apenas a camada social mais empobrecida sofre constante ofensiva dos poderes locais para que desocupe a área.

O poder público deveria ser agente de regulação para promover inclusão das camadas mais pobres nas cidades, investindo em infraestrutura e serviços nas áreas onde se concentram tais populações e garantindo direitos básicos. Ironicamente acaba sendo agente que fortalece exclusão dessas camadas sociais. A presente pesquisa busca demonstrar tais relações e evidenciar, através de estudo de caso de duas ocupações efetivadas por diferentes camadas sociais em uma mesma área de preservação permanente, como se estabelecem os procedimentos de ocupação e consolidação, os conflitos, as contradições, as (in)tolerâncias e as injustiças.

1.1 Justificativas

O processo de urbanização das cidades brasileiras ocorre de maneira conflituosa por priorizar o interesse das elites. Tal processo se dá de forma desorganizada e, ao não planejar onde a inclusão dos mais vulneráveis na composição das cidades, eles passaram a ocupar áreas irregulares.

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Esta pesquisa busca compreender como aconteceu o processo de ocupação em APP de uma região valorizada pelo mercado imobiliário. A região da Rua do Siri, que fica no Bairro Ingleses ao norte de Florianópolis, e está ocupada por duas camadas sociais distintas: a classe média, que iniciou a ocupação da região no final da década de 70 e a classe baixa chegou em meados dos anos 80, ocupando a região das dunas e construindo suas moradias precárias em meio à areia.

De acordo com Maricato (2003), no momento em que uma ocupação se localiza em uma área de interesse da minoria que mantém o poder hegemônico, há uma lei imposta que não é só a norma jurídica, mas a lei do mercado que determina a utilização de mecanismos legais para apropriação. Por essa razão, a autora descreve que áreas ambientalmente frágeis se tornam as regiões ocupadas pela camada empobrecida da população: são as áreas que sobram dentro da cidade. Ela enfatiza que, dependendo da localização de tais áreas, haverá conflito: se são áreas próximas às regiões de interesse do mercado imobiliário, serão alvo do rigor da lei para que não sejam ocupadas. É o caso da Vila do Arvoredo. Por ser próxima a uma região de alto valor imobiliário da Rua do Siri, seus moradores vivem em constante insegurança e risco de despejo.

Através da pesquisa, busca-se compreender como os processos de ocupação de APP são desiguais. No contexto das legislações que tangenciaram os anos da ocupação, estuda-se como o Poder Público em suas diversas esferas foi conivente com uma ocupação de uma população mais abastada, enquanto do outro lado da rua, se utilizou da letra da lei para tentar expulsar os mais vulneráveis que ocupam a mesma duna. Esse estudo é importante para que se evidencie as relações desiguais nos processos de ocupação, as ligações e os preconceitos que se fazem dependendo de quem ocupa a APP, pois tais processos podem gerar mais desigualdade social, e é dever da sociedade e do Estado amenizá-las, ao invés de promovê-las.

Buscando intensificar o debate sobre APPs urbanas, o trabalho trás questões jurídicas e tenta contribuir com propostas para apaziguar as disputas de terra dentro da cidade. Propõe também a trazer mecanismos já utilizados para o cumprimento das leis e políticas públicas de habitação, e denunciar a inequidade

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nos processos que tangem áreas informais que vão sendo ocupadas deliberadamente.

De forma especial, justifica-se este estudo na busca de discutir como aconteceram os desequilíbrios nos processos de negociação dos agentes públicos, evidenciando as inequidades no processo de ocupação da mesma área por diferentes classes de renda. Visa demonstrar as desigualdades enfrentadas pela população de baixa renda em um assentamento precário e insalubre, com estigma social e a falta de infraestrutura na Vila do Arvoredo, enquanto do outro lado da rua não há preocupação com a permanência já consolidada da Classe Média.

A trajetória da ocupação na margem da Rua do Siri (atuamente cadastrada como Rua Ruth Pereira) é marcada por embates entre o poder público e a comunidade mais carente. As casas de classe média podem ser visualizadas no Mapa Cadastral do IPUF como regularizadas, mesmo que o Plano Diretor as demarque como APP. O cadastro das residências mostra a seguridade jurídica que a classe média possui em sua ocupação, diferente do que ocorre com a classe mais empobrecida.

Atualmente não há na literatura discussões suficientes sobre as diferentes interenções do Poder Público nos processos de ocupação de diferentes classes sociais, por isso este estudo se faz tão importante.

1.2 OBJETIVOS

Nas seções abaixo estão descritos o objetivo geral e os objetivos específicos.

1.2.1 Objetivo Geral

A pesquisa tem como objetivo geral entender e investigar o processo de ocupação por dois grupos sociais distintos de parcelas contíguas de áreas de dunas situadas no balneário dos Ingleses, Norte da Ilha, analisando o processo histórico, os conflitos, os interesses em disputa, a atuação e as relações com os agentes públicos, as inequidades e as contradições, durante o período de ocupação e de luta pela apropriação e permanência nesta APP urbana.

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A pesquisa abrangerá as áreas de logradouros e de moradias construídas sobre dunas, e que compreendem o entorno da Rua do Siri até a comunidade da Vila do Arvoredo, durante o período de 1977 até 2017.

1.2.2 Objetivos Específicos

Compreender o papel e a atuação das diferentes esferas dos poderes públicos no processo de ocupação, de negociações e de embates com cada um dos grupos sociais que, em diferentes períodos, vem ocupando essa área de APP, desde 1977.

Analisar as repercussões geradas no processo de ocupação, nas negociações, no controle público e nos conflitos locais a partir da aprovação do Plano Diretor dos Balneários, em 1985, assim como das legislações de proteção ambiental, do Estatuto da Cidade e das demais ferramentas legais que vieram a restringir e/ou garantir a permanência dos moradores da rua do Siri e da comunidade da Vila do Arvoredo na área das dunas.

Fazer um levantamento dos estudos publicados sobre as relações, limites e interferências dessa ocupação urbana na movimentação das dunas móveis e fixas no sistema geológico do Aquífero Sedimentar das dunas dos Ingleses.

1.3 METODOLOGIA

A metodologia utilizada na pesquisa foi divida em quatro etapas. A primeira etapa inclui revisão de literatura da área em estudo, levantamento de mapas e imagens históricas, pesquisa de legislações sobre as dunas de Ingleses. A segunda etapa consistiu em levantamento primário – entrevistas. A terceira etapa foi o levantamendo de estudos sobre as condições geológicas da área ocupada e, por

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fim, na quarta etapa, foi elaborada a periodização das ocupações com base nas informações obtidas nas etapas anteriores.

1.3.1 Primeira Etapa

1.3.1.1 Revisão Bibliográfica

Foram revisados conceitos teórico-científicos e analisada a expansão urbana da área conurbada de Florianópolis com referência de autores que escreveram teses, artigos, dissertações, e classificaram os tempos históricos do desenvolvimento espacial relacionando análises socioeconômicas de cada momento. Dessa forma, foi feita uma análise histórica urbana da pobreza em Santa Catarina, da cidade de Florianópolis e expansão do crescimento urbano no Norte da Ilha. Houve um levantamento bibliográfico do que já foi produzido em mais de 30 anos de ocupação da Vila do Arvoredo.

1.3.1.2 Levantamento de Mapas e Imagens

Foram levantadas informações na Prefeitura sobre a regularização fundiária da área de estudo e o crescimento das áreas de informalidade. Foram coletados da blibioteca do IPUF as aerofotos e as imagens do acervo de imagens históricas da área estudada. No setor de cadastro do IPUF foram retiradas as plantas cadastrais dos imóveis da área delimitada. Também no IBGE e na casa da memória foram conseguidas imagens históricas dos respectivos acervos, que constam no estudo.

Essas imagens e informações foram utilizadas para mapear a evolução e a urbanização da cidade com imagens históricas documentadas nesses órgãos. Dessa forma, foram criados mapas e fotografias com intuíto de sistematizar o crescimento, a regularização fundiária e a disparidade no entorno da Rua do Siri.

1.3.1.3 Pesquisa de Legislações

Foi feito um extenso levantamento das legislações federais, estaduais e municipais que o poder público se utiliza nas tratativas em relação às comunidades

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que ocupam áreas de informalidade e como estas são utilizadas no embate às ocupações, nas negociações e nos acordos. Também foram levantadas decições, peças jurídicas, denúncias e ações do Ministério Público. ao longo do período de estudo. As principais leis envolvidas no presente estudo que descrevem sobre a preservação de área de dunas móveis e fixas são:

Decreto nº 23.793/1934 Lei federal nº 4.771 de 1965 Decreto Nº 112 de 31 de maio Resolução CONAMA nº 303 Lei Federal 81/96/2002 e 2012

As demais estudadas e levantadas estão descritas nos capítulos seguintes. Com base nas informações documentais foi abordado o crescimento das áreas de informalidade na cidade de Florianópolis.

1.3.2 Segunda Etapa

1.3.2.1 Levantamento Primário - Entrevistas

Seguiu-se então nos levantamentos primários: entrevistas e avaliação das mesmas, com base no que foi pesquisado anteriormente em literatura e legislações. Também foram incluídos documentos fornecidos pelos entrevistados das duas ocupações.

Foram feitas entrevistas com diferentes atores: moradores de ambas as ocupações, moradores antigos vizinhos às ocupações, engenheiro da prefeitura de Florianópolis, agentes de saúde e enfermeiros do Centro de Saúde responsável pela área. Foram entrevistados 5 moradores da região, 2 funcionários do centro de saúde e 1 engenheiro da prefeitura.

Os entrevistados foram selecionados, por meio de busca direta na área de estudo, objetivando encontrar moradores com mais de 30 anos de residência em

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ambas as ocupações estudadas. A pesquisador foi batendo nas portas das casas localizadas na região e solicitando essas informações.

Todos os entrevistados assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido presente no anexo A.

1.3.2.2 Avaliação das entrevistas

As entrevistas foram transcritas, revisadas e foi feito a checagem das das informações obtidas. Todas as informações obtidas nas entrevistas foram cruzadas com os dados obtidos nas outras etapas: reportagens contidas em jornais da época, fotos históricas, aerofotos, legislações vigentes, teses e dissertações sobre a área de estudo. Foram avaliadas as discordâncias e, quando necessário, as entrevistas foram refeitas. O objetivo do cruzamento de dados foi realizado para validar as informações obtidas nas entrevistas.

1.3.3 Terceira Etapa

Na terceira etapa, foram levantados os estudos sobre as condições geológicas da ação antrópica na ocupação das Dunas de Ingleses. Com bases nos estudos já feitos por diversos geólogos e especialistas na área, buscou-se entender a dinâmica das dunas e como conviver com os problemas gerados dentro da ocupação e também ações de mitigação do problema.

1.3.3.1 Estudo sobre as condições geológicas da área ocupada

Foram levantados estudos, laudos técnicos e trabalhos sobre as condições das dunas fixas e móveis de Ingleses. Também foram incluídas teses e dissertações de técnicos que estudaram a área e criaram mapas e imagens exemplificando a ação das dunas e a questão de sobrevivência ambiental do ecossistema do Aquifero Sedimentar de Ingleses juntamente com a influência da ocupação.

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1.3.3.2 Condições ambientais e de saneamento da população

Para análise das questões ambientais e de saneamento, foram utilizados os dados CECCA (Centro de estudos Cultura e Cidadania) e também dados da prefeitura e secretaria de saúde para sobre os serviços de tratamento de água tratamento de esgoto, coleta de lixo.

1.3.4 Quarta Etapa Períodos de ocupação

Na quarta etapa, foi necessário periodizar a ocupação na linha temporal. Dessa forma, a pesquisa foi divida em períodos da ocupação da Classe Média: Pré-ocupação, Ocupação, Expansão e Consolidação. Em seguida é feita a linha temporal da ocupação conhecida como Vila do Arvoredo.

Foram elaborados mapas, tabelas e imagens que permitiram compreender os diferentes períodos históricos de cada ocupação.

A pesquisa foi estruturada com base no estudo bibliográfico e análise qualitativa de dados coletados em campo, com complementação de levantamentos gráficos para visualização complementar da pesquisa.

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2 A DESIGUALDADE: O ESPAÇO DOS POBRES NAS CIDADES É O QUE SOBRA

2.1 A CONSTRUÇÃO DAS DESIGUALDADES NAS CIDADES BRASILEIRAS A cidade é um reflexo da lógica do sistema capitalista no qual está imersa, dessa forma, sua construção histórica e desigualdades é materialização da atuação da sociedade no espaço geográfico, através de um ambiente físico construído. Castells (1983) descreve que o resultado da segregação social é a reprodução das forças-de-trabalho, sendo estes processos que são sempre interligados e articulados com a estrutura social.

Como efeito da segregação social, no espaço urbano tem-se a segregação urbana ou segregação sócio-espacial. Constitui-se de um processo no qual uma determinada camada ou classe social se concentra em uma mesma área ou região da cidade. Para entendê-la, faz-se necessário considerar todas as disputas históricas pela posse da terra urbanizada e os interesses envolvidos em tais disputas. É importante salientar, conforme destaca Martins (2006), nesse processo de segregação, os diferentes grupos sociais dentro de suas disputas por territórios também buscam melhores condições urbano-ambientais.

No contexto brasileiro de capitalismo periférico, que em sua maior manifestação expressa-se pela imensa desigualdade social, as cidades vão refletir a dinâmica de disputa e segregação das classes sociais no histórico de sua formação urbana. Maricato (2003) destaca que a urbanização do espaço no Brasil foi produzida praticamente no século XX, porém é preciso ponderar que a urbanização não superou os predicados dos períodos colonial e imperial, caracterizados pela concentração de terra, renda e poder, pelo exercício do coronelismo ou política do favor e pela aplicação arbitrária da lei.

A autora destaca a aplicação arbitrária da lei como agente que contribuiu para concentração de poder e privilégios dentro das cidades por uma determinada camada social, e como resultado e reflexo disso, tem-se a promoção da desigualdade social no território urbano.

Para compreender como a promoção da desigualdade ocorre nas cidades brasileiras, é preciso que consideremos as disputas históricas pela terra.

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O evento do êxodo rural, que se intensifica na metade do século XX, quando até o ano de 1940 apenas 31,2% da população vivia nas cidades, segundo o IBGE, é descrito como um fenômeno social por Santos da seguinte maneira:

A sociedade brasileira em peso embriagou-se, desde os tempos da abolição e da república velha, com as idealizações sobre progresso e modernização. A salvação parecia estar nas cidades, onde o futuro já havia chegado. Então era só vir para elas e desfrutar de fantasias como emprego pleno, assistência social providenciada pelo Estado, lazer, novas oportunidades para os filhos... Não aconteceu nada disso, é claro, e, aos poucos, os sonhos viraram pesadelos (Santos, 1986, p. 2).

A partir dos anos 50, esse fenômeno de migração da população rural para as cidades intensifica-se, nos anos 70 com as políticas desenvolvimentistas da ditadura civil-militar a população urbana já era maior que rural, nesse período mais da metade dos brasileiros, cerca de 55,9% de toda a população do país, segundo o IBGE, já vivia nas cidades. O crescimento desordenado sem planejamento urbano e infra-estrutura necessária fez com que as áreas de informalidade nas cidades implodissem.

Nos anos 80, cerca de 67,7% dos brasileiros viviam em cidades, isso fez com que a ocupação desordenada aumentasse, Maricato (2003) revela que foi nessa década que as periferias cresceram mais do que os núcleos ou municípios centrais nas metrópoles, esse impacto configurou imensas regiões nas quais é possível visualizar de forma material a segregação espacial ou ambiental: as inúmeras e extensas regiões nas quais as camadas mais pobres se concentraram, que geralmente são áreas mais sensíveis ambientalmente: encostas de morros, beira de córregos, mangues, etc. Nessas áreas também é possível observar a taxa de ocupação de solo alta e a exclusão social numa situação jamais vista antes nas cidades brasileiras.

Tal aspecto citado pela autora ressalta que as áreas ocupadas por essas camadas socialmente excluídas são em regiões ambientalmente frágeis. Há uma justificativa para que as camadas de mais baixa renda ocupem tais áreas, pois no contexo histórico da explosão do crescimento das cidades, não houve preocupação

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com políticas públicas que garantissem o acesso à terra e à moradia digna para a população mais empobrecida.

Dessa forma temos como resultado, na dinâmica sócioespacial brasileira, que os mais carentes ocupam e se instalam nas áreas que restam das cidades, como dunas, manguezais, bordas de rios ou do mar, alto de morros ou encostas íngremes sujeitas a deslizamentos, etc, geralmente em áreas de preservação permanente, as APPs.

O crescimento exponencial das cidades fez com que as áreas de informalidade também crescessem sem nenhum controle, o poder público não se preocupou em delimitar áreas para a população mais pobre ocupar e nem políticas de planejamento urbano que evitasse a segração social dessas camadas no espaço intra-urbano das cidades.

Esses fatores que dificultam o acesso à terra formal para a habitação é responsável pelo explosivo crescimento de favelas e loteamentos informais, visto o cumprimento ou não da “lei” de acordo com a valorização da área e o interesse do mercado imobiliário na região:

Muitos são os fatores que determinam quando a lei é aplicada ou não. Um nos parece principal. Quando a localização de uma terra ocupada por favelas é valorizada pelo mercado imobiliário, a lei se impõe. Lei de mercado, e não norma jurídica, determina o cumprimento da lei. Não é por outra razão que as áreas ambientalmente frágeis, objeto de legislação preservacionista, “sobram” para o assentamento residencial da população pobre. Nessas localizações, a lei impede a ocupação imobiliária: margens dos córregos, áreas de mangues, áreas de proteção ambiental, reservam. Mesmo quando se trata de áreas públicas, priorizadas nos assentamentos de favelas, sua proteção contra a ocupação depende de sua localização em relação aos bairros onde atua o mercado imobiliário, legal, privado. (MARICATO, 2003, p. 159)

A autora reflete que dependendo da localização de tais áreas ocupadas, haverá ou não conflito: se são áreas próximas às regiões de interesse do mercado imobiliário, serão alvo do rigor da lei para que não sejam ocupadas. A correlação entre problemas habitacionais e ambientais nas cidades brasileiras é recorrente e resulta na ocupação das áreas sujeitas a riscos ambientais pela população de baixa renda.

No Brasil, a vulnerabilidade social é, muitas vezes, sinônimo de vulnerabilidade ambiental, como a população pobre não faz parte do mercado

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formal, é impedida de ocupar áreas formais, sobram as áreas informais: a cidade dos mais vulneráveis é a cidade ilegal.

2.2 O DEBATE SOBRE AS TENSÕES AMBIENTAIS NA CIDADE

Maricato (2000) classifica a tensão social das diferentes classes dentro do espaço urbanizado como “cidade oficial” e “cidade ilegal”. A oficial é onde o espaço é vendido como a verdadeira cidade, onde há planejamento urbano, regularização fundiária, dimensões bem definas em um processo ordenado. Já a “ilegal” é a desordenada, onde não é vista nem reconhecida como parte cidade, é reconhecida apenas pela violência, pela segregação e pela falta de direitos e políticas públicas.

Rolnik (1997) reforça que as leis para o ordenamento urbano acontecem apenas na cidade oficial, ou seja, a parte da cidade que é reconhecida pelo poder público, que por sua vez, desconsidera a produção da cidade ilegal. O resultado da cidade não oficial para a autora são as alternativas inadequadas de moradias como favelas, cortiços, loteamentos irregulares que são visivilmente erguidos de forma alheia ao do poder municipal fiscalizatório.

Existe uma tensão entre os locais de moradia e as áreas que são mais sensíveis do ponto de vista ambiental, o que segundo Martins (2006) pode ser observado na maioria das grandes cidades: em locais precários e irregulares, ambientalmente frágeis, “protegidos por lei” e que ficam de fora do mercado formal encontram-se os assentamentos populares, compostos por uma parcela vulnerável marcada pela exclusão social. A autora destaca que tanto o assentamento urbano quanto o meio ambiente constituem questões transversais, visto que os dois possuem espaço na Constituição Federal Cidadão de 1988 e capítulo próprio.

Para Martins (2006), existem tensões emergentes sobre as políticas urbanas de ferramentas legais para inclusão das camadas que ocupam as áreas ambientalmente frágeis, é um desafio presente nas cidades quando se começa a debater o Plano Diretor. A ocupação de tais áreas sensíveis da cidade é feita pelas camadas mais carentes que são obrigadas a ficar no espaço que sobra da cidade, de forma irregular. A definição do lugar onde todos sejam contemplados no espaço

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urbano em um ambiente saudável não é apenas uma demanda do Estado, mas sim uma grande disputa em conjunto com toda sociedade.

São muitos os estudos que tratam da relação das APPs com os processos de uso/ocupação do solo e também com as tensões conflituosas do Estado sobre ocupações informais quando estas são feitas pela população de mais baixa renda. Dessa forma, tem-se uma problemática das áreas ambientalmente frágeis no meio urbano e sua relação com o planejamento urbano conflituando a necessidade de proteger essas áreas ambientais nas cidades, porém é possível notar que, na maior parte das vezes e de forma nada sutil, aparecem contradições nos interesses e prioridades do poder público quanto às ocupações as quais se destinam as APPs.

Nas cidades onde o modo de produção capitalista é o vigente, tem-se uma reprodução das desigualdades geradas por tal sistema excludente. A terra é uma mercadoria. O valor agregado à localização da terra urbanizada faz com que tais conflitos urbanos ora se intesifiquem, ora passem despercebidos a “vistas grossas”.

A ocupação de áreas ambientalmente frágeis consideradas APPs pela população de mais baixa renda é alvo de estudos, debates e dispositivos jurídicos que podem auxiliar até mesmo a regulamentação em áreas já consolidadas, é a recomendação de Araújo (2002), que propõe utilizar dispositivos legais para regulamentar, flexibilizar e adequar os usos da terra em APPs consolidadas, visando minimizar as consequências que eliminação de cobertura possa trazer, visando dar a devida importância para a função ambiental que tais áreas possuem dentro do meio urbano. Segundo o estudo pautado no Estatuto da Cidade, deve-se buscar alternativas para regularizar o uso da terra em áreas de baixa renda com o pressuposto para controle e preservação das APPs restantes na região, visto que o problema deve ser tratado na ordem de planejamento urbano-ambiental.

Dessa forma, tem-se um problema de política urbana. Muitos podem ser os instrumentos para ser resolver (ou não) o impasse sobre a ocupação urbana em áreas de preservação, mas o que fica evidente nas cidades é que não são as leis que impedem as construções nessas áreas. A prática de construir em áreas de protenção ambiental é comum dentro do contexto das cidades, o que vale ressaltar é que não apenas classes de baixa renda ocupam tais áreas, como também camadas de mais alta renda. O que chama a atenção é que a punição para tais práticas, como Maricato destaca:

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Entre a lei e a sua aplicação há um abismo que é mediado pelas relações de poder na sociedade. É por demais conhecido, inclusive popularmente, no Brasil, o fato de que a aplicação da lei depende de a quem ela (a aplicação) se refere. (MARICATO, 2001, p.42)

Rolnik (2001) escreve que a política urbana deveria utilizar de seus instrumentos e da função social da cidade para discutir e aprovar Planos Diretores com seriedade, a fim de “coibir a retenção especulativa terrenos” e e que visem à “separação entre direito de propriedade e potencial construtivo dos terrenos”.

As ocupações irregulares, dependendo de sua localização, podem passar totalmente despercebidas da ação do poder público ou ser alvo da fiscalização de tais agentes, sofrendo constantes ataques de diversos órgãos e esferas. Fix (2006) diz que existe “a cidade própria” das classes mais abastadas e a cidade dita clandestina, que ocupa beiras de córrego, encostas de morros, margens de represas. Maricato (2006) é precisa ao dizer que o uso ilegal da terra é tolerado desde que não interfira nos circuitos centrais de lucro imobiliário.

O poder de polícia sobre o uso das terras públicas urbanas, é exercido de forma discriminatória nos diversos bairros da cidade. Áreas de proteção ambiental, desvalorizadas para o mercado imobiliário, não raramente são priorizadas para ocupação pela população pobre, seja nas favelas ou nos loteamentos irregulares, abertos sob os olhares da condescendente fiscalização. A tolerância pelo Estado, em relação à ocupação ilegal, pobre e predatória de áreas de proteção ambiental ou demais áreas públicas, por parte das camadas populares está longe de significar, o que poderia ser argumentado, uma política de respeito aos carentes de moradia ou aos direitos humanos, já que a população aí se instala, sem contar com qualquer serviço público ou obras de infraestrutura urbana. Em muitos casos os problemas de drenagem, risco de vida por desmoronamentos, obstáculos à instalação de rede de água e esgotos, torna inviável ou extremamente cara, a urbanização futura. (MARICATO, 1995, p.34)

Rolnik (1990) ressalta a importância de conhecer e se utilizar do planejamento urbano, principalmente pelos agentes sociais que produzem e se apropriam dos espaços, com base na democratização das informações, para que movimentos sociais também reivindiquem seus direitos, como o de ocupar e ter sua moradia, visto que a cidade também lhes pertence. Para a autora, é possível que tais agentes sociais busquem um uso que corrija as injustiças no meio urbano e que

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também seja equilibrado do ponto de vista ecológico para a cidade e para a propriedade urbana.

2.3 A FORMAÇÃO URBANA EM FLORIANÓPOLIS: Do Século XVIII ao XXI.

Essa seção visa levantar os principais aspectos da ocupação da cidade de Florianópolis. O município tem 97,23% de seu território na Ilha de Santa Catarina e é marcado por exclusão e desigualdades sócioespaciais. A capital catarinense será analisada sob a ótica das grandes cidades brasileiras na lógica de segregação urbana.

No final do Século XVIII, tem-se registros de que a população mais pobre da cidade que então chamava-se Desterro vivia em habitações de barro batido com madeira e rochas, essas serviam como estruturas para segurar o barro e assim formavam as fachadas e paredes internas. Cobertas e acabadas de forma rudimentar, o óleo de baleia utilizado para acabamento na época era muito caro e não acessível aos mais carentes que tinham suas casas feitas com liga fraca que necessitava de constantes reparos.

É no século XIX que as edificações adquirem um maior padrão arquitetônico e demonstram alguma uniformidade do ponto de vista urbanístico, como descreve Santos (2009), na tentativa de reproduzir a aparência de cidades portuguesas os elementos são adicionados na arquitetura da cidade. O que não era acessível aos mais pobres, que viviam em casas baixas de um pavimento de chão batido, sendo úmidas e escuras no seu interior. Outra forma muito comum de residência da população mais pobre no referido século era os cortiços, de acordo com Santos (2009), tais cortiços eram integrantes da paisagem de Desterro, eram sobrados partilhados por várias famílias ou grupo de pequenas casas alugadas. Segundo o autor, isso foi muito comum até 1920.

Ao final do século XIX, segundo dados do IBGE, o município possuia cerca de 30 mil habitantes, neste período que a ocupação urbana em Florianópolis concentra-se no Centro da cidade, na metade do ´século XIX já há registros de um processo de expulsão dos pobres da área central da cidade de Desterro, com a tomada de significativa parte da área central pelo comércio e pelas moradias da classe de mais alta renda.

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Tabela 1- População residente no município de Florianópolis – SC (1872 – 2010).

Fonte: IBGE (2019).

A busca por faixas próximas ao mar por essas classes se evidencia no início do século XX com a ocupação da Praia de Fora que mais tarde viria a se tornar a Avenida Beira-Mar Norte. Vale ressaltar que na época o mar recebia o dejeto das casas situadas lá, como mostra a Figura 2, com as casas da Rua Almirante Lamego e seus quintais virados para o mar.

Figura 2 - Ao fundo o Colégio Catarinense em 1929 e à frente casas na Praia de Fora

Fonte: Acervo Imagens Históricas (2019)

A partir do século XX, Ferreira (1998) destaca o conceito de higienização da Ilha que promovido pelo Poder Público consistiu em retirar os pobres da cidade, acabando com os cortiços onde residia parte da população excluída. Segundo Dantas e Vendramini (2011), as pressões para que população pobre e negra saísse do Centro as levou a buscar novas áreas, passando a fixarem-se em áreas de encostas como a do Maciço Central do Morro da Cruz num primeiro momento.

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No início da década de 1920, Müller (2002) ressalta a influência das políticas saninaristas da época na urbanização da cidade e consquente segregação dos mais pobres. É nessa década que o processo de evacuação dos pobres do perímetro oficial da cidade tem seu auge graças a tais políticas sanitaristas e que também se diziam de “modernização” ou renovação urbana que ocasionaram nas demolições das casas e cortiços que a população de baixa renda vivia, o que os levou a ocupar os Morros no entorno do perímetro oficial da cidade.

Figura 3 - Morro a Leste da cidade, início da década de 1920. Áreas desmatadas antes da ocupação.

Fonte: Acervo da Casa da Memória (Fundação Franklin Cascaes)

Os autores também indicam que os Morros da Mariquinha e o Morro do Mocotó comecaram a ser ocupados nessa mesma época por homens e mulheres de baixa renda e que muitos eram ex-escravos, trabalhadores das casas de famílias da área central da cidade ou do Mercado Público Municipal, uma forma de segregar as classes mais pobres nas encostas ambientalmente frágeis com riscos à sua ocupação.

Em 1926 o Estado de Santa Catarina decide construir a maior ponte da América do Sul da época que custaria duas vezes a receita orcementária anual da unidade federativa, a Ponte Hercílio Luz. Para Sugai (2002), a dimensão do investimento causa espanto numa cidade de apenas 40 mil habitantes.

Ferreira (1998) também descreve que a partir construção da Ponte Hercílio Luz, passaram-se a noticiar banhos de mar nessa região continental da cidade, fazendo com que de locais de colônia de pescadores, as praias tornaram-se balneários da elite da Capital catarinense.

Aos poucos a região do Estreito começou a tornar-se valorizada e surgiram os primeiros loteamentos para as elites próximos ao mar ainda na década de 20, a

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região que outrora era utilizada como passagem para diversos serviços e transporte de pessoas para Ilha de Santa Catarina com alguns hotéis para pernoite e um matadouro de animais agora torna-se valorizada e vira alvo dos agentes imobiliários que buscam o mar como atrativo.

Com a construção da ponte Hercílio Luz, Sugai (1994) destaca que agentes imobiliários e forças do capital começavam a se apropriar das terras do Estreito que pertenciam ao Município de São José. Segundo a autora, essa ligação entre a Ilha e Continente foi responsável por inúmeras mudanças e urbanização na área continental e cidades vizinhas. As justificativas para a construção de uma Ponte para ligar a região continental à Ilha de Santa Catarina eram muitas, dentre elas destacava-se a necessidade de criar tal ligação consolidar a capital do Estado que ficava isolada na área insular, como também o apelo ao discurso que todos os problemas da cidade era advindos da falta de uma ligação rodoviária entre ilha e continente, numa época em que, segundo Peluso Jr (1981), a cidade possuía apenas 14 automóveis.

Ao final da década de 20 uma nova cidade começa a se formar, Santos (2009) descreve como:

No final da década de 1920, a cidade apresentava uma outra paisagem urbana, ruas calçadas, aterros, urbanização de largos e praças, redes de iluminação elétrica e de água. Abertura de ruas e avenidas, novos prédios, automóveis circulando pela cidade e cruzando a ponte sobre o Estreito. Nessa nova cidade, novos serviços. (SANTOS, 2009, p.570).

A pobreza da cidade concentra-se então nos morros a partir da década de 30 e intensifica nas décadas sequentes, pois como não haviam mais cortiços e aluguel acessível, os lugares onde os pobres conseguiam viver na cidade eram os morros, já a classe de mais alta renda, começa a ocupar outras áreas que vão ganhando valor com a nova infra-estrutura realizada pelo poder público impulsionada pelos diversos interesses e agentes.

Após a construção da ponte Hercílio Luz a região continental começou a ser valorizada e saiu do isolamento anterior como apenas uma região de passagem: uma grande frente de expansão imobiliária migrou das áreas já valorizadas e

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ocupadas do Centro de Florianópolis em direção ao Continente. Sugai (1994) relata que a tendência às classes de maior poder aquisitivo migrarem para região já era vista logo no início da construção da ligação, nos anos de 1924 e 1925 as primeiras ruas no Balneário do Estreito começaram a ser abertas. Através de depoimentos de moradores locais, é possível constatar que os donos dos estabelecimentos outrora desvalorizados na cabeceira continental da ponte como hotéis e açougues, em 1941 começam a adquirir lotes no Estreito e adjacências visando a valorização decorrente.

A partir da década de 40 a cidade começa a se expandir com o loteamento das chácaras que ficaravam no entorno da área central, o que fortalece a especulação imobiliária tanta da área central quanto da área continental, que agora contava com a ligação da Ponte Hercílo Luz.

No ano de 1944 é feita à anexação ao município de Florianópolis de parte da região continental que pertencia à São José, e mais que os interesses políticos, segundo Sugai (1994), haviam interesses econômicos na área que se desenvolveu no entorno da ponte. Na época já residiam na região do Estreito cerca de 25% dos moradores da cidade.

Com o desenvolvimento da região após a construção da Ponte Hercílio Luz, novos agentes de interesse imobiliário começam a se configurar também na parte continental. As empresas que ali exerciam suas atividades chamavam a atenção das classes dominantes e foram o motor propulsor para que as classes de mais baixa renda também ocupassem a região em busca de emprego nas grandes empresas madeireiras e de serviços que ali se instalaram. O porto também fazia parte da atividade econômica da cidade na época.

Santos (2009) descreve o principal movimento de ocupação pela população mais pobre e negra em tal período histórico: na década de 1950, os migrantes advindos do Alto Biguaçu (atual município de Antônio Carlos) destinam-se rumo ao Monte Serrat, e essa migração está ligada ao desenvolvimento econômico e da construção civil que se intesifica na cidade.

Ferreira (1994) relata que até os anos 60 as praias de Coqueiros e da Ponta do Leal eram os balneários preferidos da elite florianopolitana em busca do banho de mar, onde concentravam suas casas de veraneio. Visando atingir esse público, em 1951 uma área pertencente ao Estreito tornou-se um empreendimento feito por

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um comerciante: o bairro Jardim Atlântico foi loteado e considerado precursor em Florianópolis. Criado por Jacques Schweidson, proprietário das lojas “A Modelar”, o loteamento visava utilizar a praia do Jardim Atlântico como novo ponto de balneário voltado para o que o público de alta renda procurava no continente, que fracassa com poluição da praia continental o avanço da especulação imobiliária para a região Norte da Ilha de Florianópolis. (SOARES, 1990).

Nas décadas de 50 e 60, Florianópolis recebe a construção de várias sedes estaduais e federais, como a Telesc, a Universidade Federal de Santa Catarina, o Banco do Estado de Santa Catarina, entre outras. Bastos (1997) narra como a cidade foi privilegiada pelas políticas desenvolvimentistas da Ditadura Militar na década de 70, quando a capital recebeu maciços investimentos. Com todas as novas construções, adensamento da área central e verticalização, o local que os trabalhadores conseguem morar para trabalhar são os Morros.

As políticas da Ditadura Civil Militar brasileira também causaram o aumento do êxodo rural que já vinha provocando o inchaço das cidades brasileiras desde a década de 50. Fenômeno também observado em Florianópolis devido à sua consolidação como capital do Estado de Santa Catarina. Dessa forma, sendo a sede de diversos órgãos públicos governamentais e comportando várias repartições públicas, a cidade tem sua economia movida pelo setor de serviços, comércio, construção civil e demais atividades ligadas ao turismo, a cidade torna-se atrativa a diferentes setores sociais.

Em 1970 no auge das políticas desenvolvimentistas da ditadura civil-militar brasileira, Florianópolis tem maciços investimentos, para Pimenta e Pimenta (1999) essa década é expoente do desenvolvimento da cidade nas áreas centrais como também o investimento nos balneários ao norte da Ilha. É notória a aplicação de tais investimentos no mercado imobiliário e direcionada para áreas como Canasvieiras, praia dos Ingleses e Cachoeira do Bom Jesus e, intermediações da Universidade Federal de Santa Catarina, esta última em resposta a aceitação de uma demanda crescente de alunos de outras cidades.

As consequências de tais investimentos foi a redistribuição espacial dos moradores da cidade: a região dos balneários do Norte da Ilha foi rapidamente

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transformando as antigas colônias de pescadores em empreendimentos destinados à turístas.

Outro aspecto importante de tais políticas consta num relatório elaborado pelo Centro de Estudos Cultura e Cidadania (CECCA, 1997), que evidencia o crescimento urbano da Capital nas décadas de 60 e 70, integrado à sua área conurbada. Através dos investimentos da Ditadura Militar na malha viária, começam as construções de novas vias que buscam ligar as cidades vizinhas, tornando o tecido urbano mais denso e interligado com as cidades de São José, Biguaçu e Palhoça. Nos anos 70 o processo de conurbação é consolidado com obras de infraestrutura que desenham o traçado urbano até os dias atuais. (CECCA, 1997).

A década de 70 também é essencial para o processo migratório na cidade. Pessoas advindas de várias partes do Estado e do país migram para a capital catarinense em busca de empregos. O processo de verticalização da cidade é intensificado, e a ocupação da região Norte da Ilha se potencializa nessa década. Sugai (1994) descreve que o início das obras de pavimentação da SC-401 e SC-404 é de interesse da elite:

“A Via de Contorno Norte Ilha, no final dos anos 70, viabilizou este propósito, gerando acessibilidade e constituindo-se no eixo estruturador e de interligação dos principais bairros onde as elites localizaram e pretenderam expandir suas áreas residenciais e de veraneios” (SUGAI, 1994, p.217).

Até meados de 1960 e início de 1980, as regiões de pobreza em Florianópolis estavam concentradas na região do Maciço do Morro da Cruz, em toda a extensão da Avenida Mauro Ramos e dos bairros Agronômica e Trindade. Witt (2010) descreve que faziam parte dessas áreas as comunidades do Morro do Mocotó, Morro da Mariquinha, Morro da Caixa, Santa Clara, Ângelo Laporta, Morro do Céu, Morro do 25, Morro do Horácio, Morro da Penitenciária, Serrinha, Morro da Queimada e Caeira da Vila Operária.

Tantos investimentos causaram um impacto na dinâmica urbana da cidade, como ressalta Witt (2010): se por um lado um grupo de trabalhadores especializados vinham para a cidade preencher as novas vagas de trabalhos especialiados de nível técnico e intelectual, ocupando empresas e instituiçãoes de nível público; por outro lado havia um grupo de trabalhadores empobrecidos migrantes de áreas rurais que

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vinham ocupar postos de trabalhos braçais que não exigiam qualificação ou subempregos da construção civil e serviços gerais.

Sugai (1994) atribui a construção da Via de Contorno Norte-Ilha como um processo anterior que vinha historicamente se configurando: dos interesses de setores da classe dominante de ocupar e investir em localidades situadas nas direções norte e nordeste da Ilha.

Tal influência na centralização dos investimentos estatais e privados para o norte e leste de Florianópolis, foi responsável por uma dinâmica segregadora: promoveu impactos socioambientais na estrutura urbana da cidade.

“No norte da Ilha de Santa Catarina, sobretudo nos bairros de Ingleses, Santinho e Rio Vermelho, atuam grupos como o Costão do Santinho Empreendimentos Turísticos, e o CostãoVille Empreendimentos. Estes grupos além de possuírem muitos terrenos, também são favorecidos por legislações que não lhes restringe o uso e ocupação do solo, contribuindo com a segregação urbana, e produzindo danos à sociedade e ao meio ambiente.” (LOPES, 2011, p.62).

Nos anos 80 a configuração da cidade em expansão mostra que as áreas de pobreza estão concentradas em novas regiões, e agora não somente os morros que são ocupados pelas camadas de mais baixa renda. Um levantamento à epoca do IPUF (Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis) em 1886 indica que as áreas de pobreza se localizavam tanto na parte insular de Florianópolis, como em sua porção continental. É ao fim da década de 80 que outra importante obra é construída no município: a BR-282. Também chamada de via-expressa, faz a ligação com a BR-101 com as pontes.

Há evidência na bibliografia pesquisada que a expansão das áreas de pobreza no espaço urbano de Florianópolis deu-se nas direções centro/continente e centro/norte da ilha. Os dados do IPUF da época mostram que a concentração das camadas de mais baixa renda foi nos bairros Monte Cristo e adjacências, no continente, na Rua Adão Reis e na Rua do Siri (atual Vila do Arvoredo), no bairro Ingleses. Os morros do Balão, do Vino e do Janga, no bairro Saco Grande, estes últimos, localizados na região ao norte do centro de Florianópolis. E, a Costeira do Pirajubaé, no caminho em direção ao sul da Ilha. Witt (2010) revela que

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possivelmente, exceto a Costeira do Pirajubaé, todas as comunidades referidas começaram sua ocupação por migrantes pobres que vieram para a cidade em busca de emprego e melhores condições de vida, o que as difere das comunidades do Maciço do Morro da Cruz que foram ocupadas pela população local.

Um levantamento feito Miranda (2001), extraído de pesquisas do IPUF de Florianópolis e dados da Divisão de Ação Comunitária, realizadas em 1987 e 1993, mostra que havia 55 áreas de informalidade na cidade e que no ano de 1992 já abrigavam 32.290 habitantes.

Os anos 90 são marcados pela pobreza e exclusão social, o reflexo do êxodo rural e explosão urbana são sentidos em meio à crise e super inflação que o Brasil vivia depois do fim da ditadura civil-militar. Em Florianópolis Pimenta e Pimenta (2004) falam sobre o contexto social da época, que era a falta de empregos e infra-estrutura básica para as populações de baixa renda e também para o fluxo de migrantes que continuava a chegar:

Sob o argumento de proteção às áreas de preservação permanente, a Prefeitura de Florianópolis impede novos acessos aos serviços de energia elétrica o que, vindo somar-se à falta de abastecimento de água, torna regressivas as condições de vida nos Morros Centrais. (PIMENTA & PIMENTA, 2004, p. 03.)

A região do Norte da Ilha de Florianópolis seguiu a expansão das áreas de pobreza e novas ocupações informais apareceram como o entorno da Rua do Kartodromo e a Vila União, esta última, resultado da remoção de famílias da via expressa BR 282, na parte continental Florianópolis próximo a divisa com São José.

Em novo levantamento em 2002, a Prefeitura Municipal de Florianópolis detalha o crescimento das áreas de ocupação precária na cidade, mapeando 59 ocupações, conforme tabela:

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Tabela 2 - Ocupações informais

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Em 2005, a prefeitura divulga um novo diagnóstico de áreas de interesse social, dessa vez o mapeamento mostra 61 comunidades. Nesse ano o relatório da prefeitura trazia dados de crescimento, que já mostravam uma preocupação com o aumento das áreas de informalidade, visto que o crescimento urbano registrado da cidade havia sido de 3% ao ano e o crescimento dessas áreas foi o dobro. Um exemplo do crescimento acelerado foi da comunidade do Saco Grande, mais localizado ao Norte da Ilha, que só naquele ano havia crescido 18%.

A desigualdade sócio espacial na Grande Florianópolis pode ser observada na Figura 4, elaborada por Sugai (2002), mostrando que as áreas de pobreza não são exclusividade da capital, mas se extendem à sua área conurbada nos Municípios de São José, Biguaçu e Palhoça.

Figura 4 - Concentração de pobreza e riqueza na Grande Florianópolis.

Segundo Pimenta e Pimenta (2005), o processo de urbanização de Florianópolis tem se caracterizado pelos interesses dos proprietários privados e, como resultado observamos a crescente ocupação de áreas de manguezais, áreas públicas, área de dunas, transformação de áreas públicas em privadas, fechamento

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das orlas marítimas, verticalização e, alterações sucessivas no zoneamento da cidade. De acordo com os autores, este processo vem acontecendo desprovido de investimentos públicos necessários à infraestrutura urbana de Florianópolis, comprometendo, especialmente, seu ambiente natural.

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3 A OCUPAÇÃO DO BAIRRO INGLESES E AS LEGISLAÇÕES 3.1 AS TERRAS COMUNAIS NAS DUNAS DE INGLESES

A Coroa Portuguesa, com o objetivo de povoar a parte sul de sua então colônia, o Brasil, dá início entre 1748 e 1756 à um processo de imigração, dessa forma, as terras que hoje são compreendidas como o distrito dos Ingleses no Norte da Ilha de Santa Catarina, sofreram esse processo imigratório, o que gerou uma nova configuração espacial nas terras que então eram totalmente rurais e foram utilizadas exclusivamente para a agricultura e pecuária, além da pesca. É a partir desse marco que se inicia o proceso de ocupação da costa sul brasileira, o que segundo Reis (2002), tal processo gerará uma disposição territorial que irá persistir até os dias atuais, salvo sua modificação radical com o desenvolvimento da ocupação turística.

Sadowski (2017) descreve que os primeiros imigrantes portugueses, que segundo a Coroa deveriam se assentar de sessenta ou mais casais, se instalaram inicialmente na rua dos Ilhéus, localizada hoje no que é o Centro do Florianópolis, bem como nos arredores do Morro da Cruz. Após isso começaram a fundar as chamadas “Freguesias” mais para o interior da Ilha. Em 1755 é fundada a Freguesia Nossa Senhora das Necessidades e Santo Antônio, ao norte da Ilha. Essas localidades agrícolas mais isoladas caracterizaram um fechamento da, um isolamento das comunidades agrícolas da ilha na época que perdurou por muito tempo.

A economia girava em torno da agricultura familiar dessas pequenas propriedades, que sempre estavam localizadas, segundo Campos (1991), em planícies quaternárias e meia-encostas. As encostas mais íngremes delimitavam as terras cultiváveis, juntamente com dunas, baías, praias e aspectos da hidrografia da região. Porém a agricultura não era a única atividade desempenhada pelos imigrantes da época, visto que a pesca também era uma atividade secundária desempenhada pelos mesmos, mas não tinha tanta importância econômica (exceto quanto à pesca baleeira teve seu pico em busca do óleo de baleia). Nessas

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atividades agrícolas dentro das freguesias, um aspecto contundente da vida econômica e social era o compartilhamento do solo, nas terras chamadas comunais.

Figura 5 – Brasil, Santa Catarina e Florianópolis: na última imagem, destaque para o centro e o distrito de Ingleses do Rio Vermelho.

Fonte: Passold, (2014). Adaptação e edição da autora.

Essas terras comunais eram terras não muito adequadas para a agricultura e o cultivo do solo, mesmo de acordo com Campos (1991) algumas fossem utilizadas em pequenas plantações. As terras compartilhadas eram usadas como suplementares à propriedade privada, as principais atividades que eram desenvolvidas nessas áreas era a extração de madeira, pecuária e também eram

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