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A arquitetura a[terra] o musseque

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Academic year: 2021

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A arquitetura a[terra] o musseque

Projeto Musseque Made

Diogo Herculano Diniz De Carvalho (licenciado)

Projeto Final de Mestrado para a obtenção do Grau de Mestre em Arquitetura

Orientação Científica: Professor Doutor Carlos Alho

Júri:

Presidenta Professora Isabel Raposo Vogal Professor António Abel

Documento definitivo FAULisboa, January 2017

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Agradecimentos

A todos os que se cruzaram neste longo percurso e que de algum modo contribuíram para a sua concretização. Em especial ao arquiteto Fernando Pinto pela disponibilidade e informação preciosa providenciada, à professora Isabel Raposo e ao professor António Abel pelo fio condutor de ideias e confiança depositava, e por fim ao professor Carlos Alho pelo auxílio e orientação.

À família pelo apoio e financiamento do curso, aos amigos pelas conversas atentas e desafiadoras sobre um tema que, apesar de se inserir na disciplina da arquitetura e urbanismo, é afeto à vida de todas as pessoas.

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Título: A arquitetura a[terra] o musseque – Projeto Musseque Made Subtítulo: Tipologias de Habitação em Arquitetura de terra

Descrição: Proposta de intervenção no bairro pericentral de Luanda – “A Xikala”

Resumo

Num mundo onde a globalização é a palavra de ordem e o capital económico a sua ferramenta, outros aspetos da vida são menosprezados, tendo consequências por vezes irreversíveis. O neocolonialismo sentido nas capitais africanas é um dos exemplos desta realidade, onde projetos de grande escala e esmagadora presença são importados de outros países, e assentam neste território, com géneses descontextualizadas e premissas ilusórias, desprezando a vida destas cidades. Com um crescimento demográfico descontrolado, Luanda, cidade escolhida para o presente estudo, terá que articular de uma maneira sábia estes dois mundos: Luanda que quer crescer à altura das grandes potências mundiais e Luanda cidade com cerca de 80% da sua “fisionomia” urbana composta por construção informal onde se vive em condições precárias.

Assim, este trabalho procura mostrar que a arquitetura e o seu executante técnico, o arquiteto, têm um papel muito importante a desempenhar no pensamento e planeamento urbano e que é recompensado, de várias formas, o trabalho à escala humana, abordando as várias dimensões da vida das cidades: económica, ecológica, cultural, social, sustentável, étnica e moral.

Propõe o pensamento consciente e de resolução prática e lógica dos vários problemas urbanos, considera uma inversão de prioridades nos planos e projetos de arquitetura, inova na utilização de materiais não-convencionais na construção, observa atentamente os espaços e a sua utilização e cria com base nas premissas intrínsecas à prática de arquitetar. Palavras-chave

Luanda | Bairros Informais | Gentrificação | Arquitetura de Terra

Mestrado Integrado em Arquitetura

(6)

Lisboa, Janeiro de 2017

Title: The Architecture the earth and the musseque - Musseque Made Project Sub-title: Earth architecture create housing typologies

Description: Intervention proposal for a pericentral settlement in Luanda – “Xicala”

Abstract

In a world where globalization is the watchword and the tool of economical capital, other life aspects are slighted, sometimes with irreversible consequences. The neocolonialism that is felt in the capital cities of Africa, is one of the examples of this reality, where huge projects with overwhelming presence are imported from other countries and based on this territory, with decontextualized genesis and illusionary assumptions, scorning the way of life in this cities. With a demographic growth, Luanda, the city chosen for the present study will have to join wisely these two worlds: Luanda that wants to grow to a level of the major world powers, and Luanda with about 80% of its urban “physiognomy” composed by informal construction where people lives in really bad conditions.

Therefore, this present work seeks to show that architecture and its technical performer, the architect, have a very important role to play in the way that urban space are thinking and planning. This project also wants to show that the work on a human scale is rewarded in different levels, approaching the different dimensions of city’s life: economic, culture, social, sustainable, ethnic and moral.

This project is proposing the conscious thought, practical and logical resolution of the multiple urban issues and considers an inversion of priorities in the plans and architectural designs; is innovative by uses unconventional materials in the construction; watch closely the spaces and their use and promotes creation that is based on the intrinsic assumptions to the practice of architecture.

Key words

Luanda | Informal settlements | Gentrification | Earth Architecture

Mestrado Integrado em Arquitetura

(7)

Lisbon, January de 2017

Agradecimentos……….………..4

Resumo……….……….5

Abstract……….………..6

I. Introdução

1,Objectivos

………..……….………….12

2, Questões

………..……….……….12

3, Metodologia

………..12

II. Estado da Arte

1.Neocolonialismo

……….……….…………..14

-Arquitetura aterra (n)o musseque

……….……….………….…………..16

2.Cidade marginal

……….….………….….………..17

-A arquitetura aterra (aterroriza) o musseque

………..……….………....18

-Expansão Urbana Mercantilizável

………..……….……….19

-Renovação Urbana

………..………..20

-Reassentamentos

……….….……….……..………..21

3.Paradigmas de intervenção

………..……….……….22

-Cultura de um povo

……….………..23

-Direito à Cidade

………..….………...24

-Luanda vs. Maputo

………..25

-Mercados de habitação informais

………...………..26

4.Como intervir?

………..….………..27

-A arquitetura aterra (nivela) o musseque

……….………...………28

-Autoconstrução, a força local, Chile

……….……….………..29

III. Construção Sustentável e Bioclimática

1.Construir nos trópicos

………..………..32

2.A terra

………...…..…………..34

-Características da terra como material de construção

(8)

-Durabilidade

………..……….……..35

-Resistência estrutural

………..………36

-Desempenho térmico

……….………37

-(Im)permeabilidade

……….37

-Economia

………..37

-Técnicas -A Taipa

………..38

-O adobe ou adobo

………..………..39

-O tabique ou pau-a-pique

……….………40

-O btc (bloco de terra comprimido)

………..……….…..…………..41

-Composição

………..…….………..42

-Terra na construção de coberturas

………43

-A terra aterroriza o Homem contemporâneo, porquê?

………..44

-(Re)valorização

………..……….………..45

IV. O Território

1. Luanda capital

………..47

-

Génese

………..51

-Cidade Formal - Processo de Estruturação Urbana

………..………..52

-Cidade Informal - Os musseques

……….………61

-Materiais

………..64

-Morfologias

………..………..64

2. Área de Estudo - A “Xikala”

……….………..66

-Macro

………..……..67

-Evolução das areias em Luanda ao longo dos tempos

………..………..68

-Micro

………..69

-População

……….………..69

-Urbanidade da Chicala

……….………70

-Arruamentos

……….………72

-Infraestruturação precária

………..………73

-Habitação

……….……….………..74

-Ventilação

………77

-

Comércio

………78

-

Lazer

………..………..……79

Locais de Culto

………..………80

Escolas da Chicala

………...………81

(9)

Materiais

……….………..82

O embarcadouro

………..………83

Demolição

………..……..84

Futuro

………..………..85

V. O Projeto

1.Princípios de projeto

………..89

2.Como?

………..………89

3.Autoconstrução

………..……….………….91

4.Elementos gráficos do existente

………..……….…………92

5.A Proposta

……….……….…………94

6.Fases do processo:

……….……….…………97

7.O Programa

………..………..………..98

O Museu

………..………..………100

Restaurantes de peixe

………..………100

Centro de Saúde e Farmácias

……….………..………100

Biblioteca

……….………100

Locais de culto

……….……….…………100

Edifico de proteção e conservação da Baía do Samba e Ilha

………..……….………101

Escola e Centro Infantil

……….……101

Oficinas Musseque Made

……….……….…………101

8.Definição Tipológica da habitação

……….………102

O Conceito

………….……….………103

A Habitação

……….………..……….………104

A Horta Doméstica

……….……..…………105

A Cisterna

.………..…………105

A Ventilação

……….……….………106

O Sombreamento

………..…………..……107

A Iluminação Natural

………..……107

A Energia

………107

Materialidade

………..………108

(10)

Paredes

……….………109

Tetos/Pavimentos

………..……….…..………110

Cobertura

………110

Janelas

………110

Representação da tipologia com loja

……….………111

VI. Conclusões finais………..………112

VII. Bibliografia e webgrafia………...………114

VIII. Anexos………..………117

- Anexo 1

……….………118

- Anexo 2

……….…………..………118

- Anexo 3

……….…………..………119

IX. Desenhos Técnicos……….…………..………120

-01.Chicala -02.Planta geral -03.Tipologias de habitação -04.Corte longitudinal -05.Método construtivo -06.Planta de cobertura

-07.Reservatório de retardo das águas pluviais -08.Alçado frontal

-09.Alçado frontal -10.Alçado lateral

-11.Alçados frontais -12.Cortes transversais

-13.Tipologia sobrelevada – Planta do piso inferior -14.Tipologia sobrelevada – Planta do piso superior -15.Tipologia sobrelevada – Corte longitudinal -16.Corte construtivo

-17.Pormenor construtivo – interior da cisterna -18.Corte longitudinal

-19.Planta

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1.Objectivos

Este trabalho tem como objetivo a reflexão sobre as intervenções arquitetónicas e urbanísticas nas áreas de génese informal do espaço urbano. O estudo mostra como é crucial que estas áreas sejam integradas e reconhecidas nos planos urbanos das cidades, assim como as vontades dos seus habitantes, que é crucial uma aproximação interpretativa destes lugares, para uma mais conhecedora e consciente intervenção.

A elaboração de um projeto de arquitetura que vise agir numa ação consciente, respeitadora e solucionadora destes paradigmas do espaço urbano é o objetivo deste trabalho.

2.Questões

Estas são algumas das questões que este trabalho procura responder:

1. Qual a melhor abordagem por parte do governo, urbanistas e arquitetos, face ao descontrolado crescimento urbano? 2. Gentrificar em prol do crescimento económico?

3. Arquitetura de terra pode ser uma boa opção para usar na construção de habitação nos dias de hoje? 4. Como valorizar e não perder a cultura africana?

5. Como é que o arquiteto pode ter um papel ativo na resolução de problemas sociais do espaço urbano? 6. De que maneira um edifício pode responder às exigentes condições climatéricas de Africa?

3.Metodologia

O tema deste trabalho final de mestrado surgiu na cadeira de projeto VI, onde foi proposta a intervenção num bairro pericentral de Luanda, criando uma nova centralidade para a cidade. Tendo como base o estudo do desenho urbano da cidade, a sua morfologia e a sua história, o enunciado pedia uma intervenção regulada pelo fluxo viário e articulada através de um programa que servisse a cidade e fizesse jus à grande potência político-económica internacional, a capital de Angola. Uma das premissas do trabalho seria que as pessoas que ali vivessem (no local de intervenção, bairro da Chicala), fossem realojadas noutro local. Esta premissa, ao longo do caminho que percorri na busca do melhor projeto, suscitou algumas questões, que proponho abordar e responder no presente trabalho.

Já dentro do tema e intrigado/interessado com este, a pesquisa aconteceu naturalmente e a cada passo que era dado mais se consolidava a minha vontade de conhecer este assunto e este modo de vida não-convencional, mas não menos real.

Cruzando a minha busca de conhecimento com a experiência de algumas pessoas, foi-me dado a conhecer um mundo completamente diferente, paralelo ao ocidental, a autoconstrução.

Estudos indicam que cerca de 95% da construção em África é feita pelos próprios moradores, e cerca de um terço do planeta Terra obedece também a este modo de construir, confirmando a pertinência do assunto, que apesar de bastante exposto, ainda é por muitos desconhecido e desconsiderado.

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1.NeoColonialismo

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“Terminologias estranhas como ‘classe mundial’ formam parte do material promocional de novas cidades que são pouco mais do que formas abstratas, economias simplistas (geralmente direcionadas para o Estado e promotores), tráfego (sempre internacional) e fantasias de produtividade capitalista. Nestas condições, o propósito ou significado de ‘cidade’ perdeu-se ou tornou-se submerso num paradigma económico, presumivelmente gerida como qualquer entidade de negócio.”

(CARL¹, 2015)

¹ - Peter Carl. Arquiteto. Graduou-se em Princeton em 1973, onde também colaborou com Michael Graves, antes de exercer o Prix de Rome até 1976. Leccionou na University of Kentucky, Lexington até 1979, depois na University of Cambridge até 2009, quando assumiu a sua função atual de Diretor do programa de Douturamento na Cass School of Arquitecture, London Metropolitan University. Foi conferencista e lecionou internacionalmente. Escreve sobre história e o significado das condições arquitetónicas e urbanas na praxis. (biografia apresentada por Paulo

(16)

Moreira) Este pequeno excerto foi retirado do livro de Paulo Moreira referido na bibliografia.

A arquitetura aterra (n)o musseque¹

A arquitetura aterra no musseque. Planos de arquitetura urbana Euro-americanos aterram nos países Africanos, como aviões aterram nos aeroportos. Planos que são pensados para determinado contexto são transplantados para outros.

Estes processos de neocolonização, que se baseiam em transportar modelos urbanísticos, de cidade em cidade, país em país ou ainda de continente em continente não funcionam pois o local, as pessoas, culturas, modos de vida, clima, são diferentes.

“ (...) a teoria sustém e informa a aplicação, mas quando as teorias de outros climas são transplantados para serem aplicados noutros, o resultado não pode ser senão desastroso (…) O planeamento é a ferramenta mais importante que os governantes têm à sua disposição para manusear o rápido crescimento e expansão da população urbana (...) ” (AGBOLA e WATSON², 2014)

Uma das razões pela qual este fenómeno acontece é porque o projetista está cada vez mais afastado do local de intervenção, pois estamos num mundo onde as tecnologias, assim o permitem. Este é um facto que está associado ao fenómeno de globalização, fenómeno perigoso segundo a perspetiva da cultura, porque facilmente pode homogeneizar todo o mundo, pondo em causa as características que diferenciam e identificam cada povo. A raiz deste último são as decisões estatais de legislação, que muitas vezes não veem os melhores fatores como prioridades. São este tipo de temas que iremos tentar aprofundar com vista a encontrar a melhor decisão de projeto.

Além disto, para esta solução, ser alcançada, propomo-nos também fazer um zoom a uma localização escolhida (bairro da Chicala, Luanda) para um sério conhecimento, pois acreditamos que se estes planos forem contextualizados, problemas de identidade deste e de outros tipos poderão ocorrer. Se este não for o primordial objetivo, à parte de interesses económicos ou políticos, acabamos por assistir a verdadeiras tragédias sociais, processos de exclusão social e fenómenos de perda cultural, entre outros, abordados de seguida.

Fig. 02 e 03 | Futuro centro financeiro de Luanda | Fonte: www.opcaoturismo.pt

¹ - Do quimbundo (dialeto africano) mu seke, é o nome dado aos terrenos arenosos de Luanda de cor avermelhada, e é mais tarde associado aos bairros informais por estes serem feitos com este material.

² - Babatunde Agbola e Vanessa Watson- Ambos professores de escolas de urbanismo africano, baseiam os seus estudos nos planos urbanísticos em Africa e chamam a atenção para a aplicação de teorias urbanísticas de cidades Euro-Americanas no continente Africano, pois estes planos

(17)

não se adaptam às verdadeiras necessidades, aspirações e realidades das populações de Africa.

2. A Cidade Marginal

“ (...) a construção de um aldeamento para os agricultores, em Porto Quipiri (Angola), encomendado para albergar agricultores. O aldeamento foi entregue, mas realmente não tinha nada a ver com as pessoas que iam lá morar, que são homens, mulheres, crianças, que têm formas de apropriação do espaço completamente distintas das da cidade. As casas não tinham sequer um pequeno quintal, onde se pudesse ter uma couve, uma hortaliça, um porco ou uma galinha. Entretanto tinham um mobiliário urbano muito interessante, bons arruamentos, uns largos, uma escola, etc...O que acontece um ano depois de instalada a população? O lugar que encontramos é completamente diferente, não tinha nada a ver com o assentamento, porque os pequenos muros das casas foram abaixo, as ruas foram atravessadas por cordas para estender a roupa...Porque é que isto aconteceu? Porque nada disto foi previsto e porque não se teve em conta a forma como essas pessoas usam o espaço. É preciso saber construir para as pessoas que vão realmente viver nestes lugares. E por isso eu tenho muito medo... (...) cuidado com as novas propostas. Não podemos atropelar os homens; temos que ser sensíveis a essas comunidades. (...) ” ( MARTINS¹, 2012)

(18)

pela Universidade do Porto. É Chefe do Departamento de Arquitetura da Universidade Agostinho Neto, Luanda (Angola). Este pequeno excerto foi retirado do livro de Paulo Moreira referido na bibliografia.

A arquitetura aterra (aterroriza) o musseque

A arquitetura aterra o musseque, aterrorizando quem lá vive. A arquitetura vertical assombra quem por ali perto vive, esperando que nenhum destes gigantes edifícios “nasça por baixo dos seus pés”.

A arquitetura emergente em Angola, de origem privada, aterroriza, assusta, intimida. Há um enorme receio e insegurança por parte de quem habita estas áreas informais, face à sua possibilidade eminente de expropriação. São projetos numa macro escala e não são sensíveis às realidades locais. É pertinente, mais uma vez, ter um cuidado redobrado na sua análise e leitura, pois estamos a fazer habitações para pessoas que são, na verdade, diferentes de nós, e vivem de maneiras diferentes das nossas.

Quando a guerra civil terminou (2002), o Estado Angolano quis acabar com as edificações informais de Luanda e lançou um programa¹ que visava construir um milhão de habitações com o propósito de realojar os habitantes destas zonas, como é o caso da cidade do Kilamba. Aqui a ação do governo é chamada de expansão urbana mercantilizável, que consiste em processos de “tábula rasa” ², onde são construídos bairros com o objetivo de alojar também os habitantes expropriados. É, também nalguns casos, proposta a renovação urbana, que apresenta, como veremos mais à frente, vários problemas. Outro tipo de ação do governo é a de realojar/reassentar os expropriados em módulos habitacionais que desconsideram os modos de vida dos seus futuros inquilinos e que, como as outras ações, leva a uma exclusão e fragmentação socio-espacial.

Fig. 04 | Fonte: Viegas³, 2015

¹ - Programa Nacional de Urbanismo e Habitação do Governo de Angola: Um milhão de casas até 2012

(19)

³ - Sílvia Leiria Viegas. Arquiteta, licenciada pela Universidade Lusíada de Lisboa, em 1999. Concluiu o mestrado em Cultura Arquitetónica Contemporânea e Construção da Sociedade Moderna na FAUT. Doutorou-se em 2015.

Expansão Urbana Mercantilizável

“ (…) Não se pode pensar em transformar uma cidade fazendo aquilo que é quase anti cidade, que são os condomínios fechados, que não têm relação com as vizinhanças, ruas, comércio...As cidades são feitas dessa diversidade de programas.” (MOREIRA¹, 2012)

Não quer dizer que as pessoas que vivem em bairros informais não queiram viver com melhores condições de vida, mas valorizam muito as qualidades de relações sociais e humanas destas zonas, que se perderam depois das expropriações. Condomínios fechados, embora às vezes insiram no programa serviços públicos variados, e comércio de retalho, estão pouco dotados de riqueza social e “denotam a ausência de valores, concretude e vitalidade encontrados em algumas das melhores comunidades informais." (CARL, 2015) Aqui o estilo de vida dos habitantes é muito solitário e individual, o que, embora atraia uma percentagem da população, é uma solução descontextualizada da vida dos habitantes dos musseques, onde há um sentido de comunidade, entreajuda e troca de serviços entre a população.

Estas pessoas, embora originárias de locais diferentes, partilham os mesmos hábitos, costumes, modos de vida. Com agregados familiares com uma média de seis ou sete pessoas, a maioria é desempregada, e o pouco dinheiro que é conseguido é através de “biscates”. Por exemplo, algumas mulheres trabalham no sector doméstico em casas de pessoas de classes média e alta, outras montam uma pequena barraca em frente da habitação e vendem um pouco de tudo, e outras ainda ganham o seu dinheiro vendendo produtos em mercados informais. Como consequência, os habitantes dos bairros informais, descontentes por terem perdido a casa que construíram com o seu suor e a terra que consideram sua (pois alguns compraram e investiram nessas terras) e/ou por terem sido vítimas de expropriação muitas vezes sem aviso prévio, voltam para os musseques perto do centro, onde conseguem todas as condições de vivência, à parte da habitação.

“O afastamento destas áreas de realojamento em relação aos bairros de origem dificulta o processo de atribuição de habitação, uma vez que as comunidades tendem a regressar para os musseques mais centrais, ainda que piorem as suas condições de vida. Desta forma, apesar da eliminação de alguns assentamentos informais, o número de habitantes em área de musseque não sofre uma redução significativa e podem ainda surgir novas áreas de musseque.”

(VIEGAS, 2015)

Fig. 05 e 06 | Cidade do Kilamba | Fontes: http://4.bp.blogspot.com/; www.upload.wikimedia.org)

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Faculty of Art, Architecture and Design, London Metropolitan University (onde concluíu Mestrado em 2009). Estagiou com Herzog & de Meuron em 2003/04 e estudou com Peter Zumthor na Accademia di architettura di Mendrisio em 2002/03.

Existe um incentivo do estado, com conivência do governo, para que os privados construam, argumentando que só assim se irá acabar com a pobreza de Luanda:

“É uma espécie de magia. Isso vem decorrente das teorias económicas, a dinamização da economia através da construção civil. O discurso era esse, vamos construir porque ao construir criamos empregos dentro da construção civil, o que faz com que as pessoas possam entrar no circuito formal do vencimento e ascenderem à classe média. Não digo que não fosse essa a vontade mas não funcionou.” (VIEGAS, 2015)

Sendo os principais investidores estrangeiros, fica sem efeito a proposta do governo de criar empregos através da construção civil pois na prática só os chineses e os portugueses é que estão a construir.

O principal investidor em Angola é a China. A China lançou em 2006, um plano, com o nome “Plano da Nova cidade de Luanda” , parte deste plano consistia em habitação de luxo, hoje conhecida como cidade do Kilamba(fig.05 e 06). ¹ Este plano tem uma escala enorme, e uma adaptação local muito pequena. É desconsiderante da realidade, desligado da sensibilidade arquitetónica necessária neste tipo de planos de grande escala, e aterroriza os habitantes das zonas informais.

“ (…)um governo autocrático que não controla o seu território, não controla os seus cidadãos e este governo quer controlar os seus cidadãos através do controlo do espaço. Por isso, este governo quer transformar cidadãos irregulares em cidadãos regulares e quer fazer a mesma coisa com o território.”

(VIEGAS, 2015)

Renovação Urbana

A renovação urbana é um processo de qualificação de zonas urbanas que se encontram em situações precárias, através da atribuição de infraestruturas de água, saneamento e esgotos, melhorando a qualidade de vida no local. Este tipo de intervenções tem a vantagem de não expulsar os habitantes das suas casas, e todos os benefícios que isso suporta, referidas noutros capítulos.

Por outro lado, ao mantermos estas habitações, os problemas que elas tem, mantêm-se. A sua maioria é deficitária em termos de desenho, método construtivo, resposta bioclimática, etc., pois estas pessoas embora tenham grande capacidade para a construção não tem a sensibilidade e o conhecimento técnico, que um arquiteto tem. Outra desvantagem é a de esta intervenção poder ter que “tirar do caminho” algumas habitações, por necessidades várias e práticas, como por exemplo a passagem de tubagens ou estradas, devido à elevada densidade de edificação verificada nestes bairros. Assim, algumas habitações são mantidas e outras destruídas e as pessoas expropriadas para outros locais, que muitas vezes não são nas redondezas. Estas desigualdades podem gerar conflitos entre os habitantes.

Assim, na presente proposta, terá de haver uma simbiose entre o processo de requalificação e o melhoramento das casas e por outro lado terá que ser tido em conta a igualdade das ofertas entre moradores.

(21)

¹ - O mesmo projeto foi apresentado na Venezuela, mas o presidente Hugo Chavez recusou.

Reassentamentos

Fig. 07 | Materialização dos processos de expropriação Fig. 08 | Bairro do Panguila | Fonte: Sílvia Leiria Viegas Fonte: Sílvia Leiria Viegas

“O que acontece na prática é a periferização da pobreza, para zonas longínquas, 40, 50, 100 quilómetros, e depois as pessoas continuam a ir onde têm de ir, que é ao centro da cidade” (VIEGAS, 2015)

Mais uma vez, porque estes realojamentos são, regra geral, afastados dos centros urbanos e consequentemente dos serviços e locais de emprego das populações expropriadas, onde na verdade seria benéfico.

“preservar e valorizar relações sociais de vizinhança e as vivências da população da área, a sua estrutura social e de trabalho.” (BETTENCOURT¹, 2011)

Este processo tem a vantagem de articular muitas vezes uma proposta de autoconstrução dirigida, (no novo sítio) reduzindo os custos adjacentes. É atribuído uma parte da casa, e é sugerida a construção da restante. No entanto na prática nem tudo corre como o esperado, pois estes processos são, quando existentes, apenas financiados pelo governo, (em geral, os privados não tem interesse, pela razão de que não é muito lucrativo) e carecem de dinheiros para a construção das condições básicas: bloco técnico preparado para a ligação à rede pública e parte da construção iniciada. Sendo muitas vezes apenas entregue o lote de terreno.

Outro problema ainda prende-se com o limite territorial, este é um espaço abstrato. O que agora são bairros periféricos estarão dentro da cidade dentro de 10 anos. No caso do reassentamento do Panguila, o processo foi bastante descontrolado:

“grandes arbitrariedades na forma como as pessoas foram realojadas, em descontrolo nos próprios processos. No Panguila, as pessoas foram colocadas, imagine, três famílias, uma em cada quarto na mesma casa. As pessoas é que se organizaram para trocar os quartos, para pelo menos na mesma casa ter uma família com os seus primos e não um vizinho que nunca viram.” (VIEGAS, 2015)

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¹ - Andrea Carina de Almeida Bettencourt – Arquiteta, adquiriu o seu mestrado pela Universidade Técnica de Lisboa, Faculdade de Arquitetura, com a dissertação: Qualificação e reabilitação de áreas urbanas críticas - Os musseques de Luanda, em 2011.

3.Paradigmas de Intervenção

Fig. 09 | “Cultura Africana insatisfeita” | Fonte: www.f508.com.br

“ (...) Uma definição frutuosa de urbanismo deveria não apenas assinalar as características essenciais que todas as cidades (…) têm em comum, mas também permitir identificar aquilo em que se distinguem. (...) ” (WIRTH¹, 1964)

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¹ - Louis Wirth - Sociólogo alemão, membro da escola de Chicago. Escreveu a obra literária: “Urbanismo como modo de vida” (1964)

Cultura de um povo

Enfatizar as diferenças, dar Identidade. Cultura arquitetónica. Uma questão de orgulho.

Ao avançarmos com propostas projetuais que pouco ou nada respeitam as realidades existentes, estamos também a acabar com a “cultura local, aspeto crucial para a identidade de um povo” (MINGAS¹, 2012). Num continente como Africa, onde chegam até nós inúmeros exemplos de culturas ancestrais, assistimos agora a um neocolonialismo por parte doutros continentes, que, se não for travado, pode estar a acabar com este fator chave de transmissão de conhecimento entre gerações, a cultura, que engloba tudo o que é identitário de um povo, desde o conhecimento, a moral, a arte, a gastronomia, as crenças, os costumes, o vestuário, e que está presente, não na arquitetura colonial, não nos novos edifícios coloniais que se aproximam da baía, mas sim nas construções autóctones.

A arquiteta diz-nos que os políticos do governo Luandino defendem as construções em betão, pois agora: “ é o momento na história de Luanda de abandonarmos as antigas construções em adobe” ²,vendo este tipo de construções mais vernaculares como algo não-civilizado, sentindo, diz a arquiteta, alguma vergonha pela sua própria herança cultural. Mas no entanto a arquiteta discorda, e vê o musseque como parte da história de Angola: “um lugar de depósitos de memória, da sua identidade humana e lugar de transculturalidade absorvendo a diversidade cultural e propondo novas identidades culturais urbanas” (MINGAS¹, 2012). A arquiteta Ângela Mingas defende o musseque como património cultural.

Fig. 10 | Larabanga Mosque - Ghana | Fonte:http://muslimheritage.com/ Fig. 11 | Casa no Burkina Faso | Fonte: http://www.amusingplanet.com/

¹ - Ângela Mingas - Nascida em Angola é licenciada em Arquitetura pela Universidade Agostinho Neto, doutorada na especialidade de História de Arquitetura pela Universidade do Porto. É Chefe do departamento de Arquitetura da Universidade Agostinho Neto, Luanda (Angola). Estes pequeno excerto foi retirado do livro de Paulo Moreira referido na bibliografia.

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² - Excerto de uma revista online: http://www.uncubemagazine.com/

Direito à Cidade

“Direito à Cidade” é um conceito introduzido por Henri Lefebvre, filósofo francês, no seu livro “Le Droit à la Ville”, de 1969, onde Lefebvre aborda o tema das cidades industriais, o seu crescimento derivado da revolução industrial e as consequências socioeconómicas no espaço urbano.

Nesta época observamos o fenómeno da centralização do poder. É nos centros urbanos que são tomadas as grandes decisões institucionais, que existe a formação e a informação, e, segundo o autor do livro, o centro:”(…) torna-se assim produto de consumo de alta qualidade para estrangeiros, turistas, pessoas oriundas da periferia, suburbanos. Sobrevive graças a este duplo papel: lugar de consumo e consumo de lugar.” (LEFEBVRE¹, 1969). E é assim, diz Lefebvre, que é vendido o conceito de felicidade ao Homem urbano: “um lugar de felicidade numa vida cotidiana miraculosa e maravilhosamente transformada”, mas, na verdade: “existe uma dominação perfeita, para uma exploração apurada das pessoas, ao mesmo tempo como produtores, como consumidores de produtos, como consumidores de espaço.” (LEFEBVRE, 1969)

Algo começa a falhar, algo que não estava programado. Pois falta, a estes planos urbanos, contextualizar com a realidade:“ (…) as questões relativas à Cidade, e à realidade urbana não são plenamente conhecidas e reconhecidas; ainda não assumiram politicamente a importância e o significado que tem no pensamento (na ideologia) e na prática.” (LEFEBVRE, 1969)

O ser humano tem vontades concretas que vão além dos bens materiais em geral, e, diz-nos o autor: “ Tem necessidade de ver, de ouvir, de tocar, de degustar, e a necessidade de reunir essas perceções num “mundo”(…) necessidades específicas, que não satisfazem os equipamentos comerciais e culturais que são mais ou menos parcimoniosamente levados em consideração pelos urbanistas.(…) necessidades de informação, de simbolismo, de imaginário, de atividades lúdicas.” (LEFEBVRE, 1969)

Para que as diferentes dinâmicas sociais coabitem nas Cidades, é assim fulcral que os vários órgãos técnicos responsáveis pelo seu planeamento, incluam os seus habitantes na discussão e planeamento do crescimento da mesma. O que não acontece em Luanda: “o facto de não se ouvir as populações na construção de um território que é maioritariamente dito informal, (…) (o governo) está a tentar construir uma nova cidade e 80 por cento não está a ser ouvido, não está a influir no processo” (VIEGAS, 2015)

Henri Lefebvre divide o direito à cidade em dois direitos: direito ao produto e direito à obra. O produto é o material, como a habitação, as infraestruturas, os edifícios de serviços. A obra é o imaterial, as relações humanas, a participação do povo no crescimento da cidade, tanto a nível político (democracia), como ao nível prático, no modo de vida, nas necessidades, vontades, costumes, cultura. Ou seja, além do direito aos bens físicos, o direito também a ter opinião no processo de crescimento da cidade, pois as cidades são para as pessoas, então estas têm algo a dizer.

“Apenas a força social capaz de se investir a si mesma no espaço urbano, no decorrer de uma longa experiencia política, pode se encarregar da realização de um programa referente à sociedade urbana.(…) Esse fundamento e essa base, (…) impedem que a reflexão se perca no programático puro” (LEFEBVRE, 1969)

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livros, onde aborda o tema capitalismo, e a influência deste na sociedade urbana. É conhecido pelo seu otimismo e sentido poético.

Luanda vs. Maputo

O governo de Moçambique privilegia a autoconstrução.

Em Moçambique toda a terra: “é propriedade do Estado e não pode ser vendida ou, por qualquer outra forma, alienada, hipotecada ou penhorada” (cap.II art.3 ¹), tal como em Angola, mas no entanto: “ Podem ser sujeitos do direito de uso e aproveitamento da terra as pessoas nacionais, coletivas e singulares, homens e mulheres, bem como as comunidades locais.” (cap.III, art 10 ¹).

Para tal é necessário serem cumpridos os seguintes requisitos:”(…) ocupação por pessoas singulares e comunidades locais, segundo as normas e práticas costumeiras (…);” ou “ (…) ocupação por pessoas singulares nacionais que, de boa-fé, estejam a utilizar a terra há pelo menos dez anos;” ou ainda por “ autorização de pedido apresentado por pessoas singulares ou coletivas (…) “. Não existem complicações de maior na aquisição dos títulos e registos, estes podem ser transmitidos por herança, existem diferentes usos, como por exemplo, a habitação, mas também atividades económicas. De de um modo geral este pacote Legislativo vem facilitar os processos de assentamentos que ocorrem por todo o país, controlando assim a gestão das terras e visa: “ a consolidação da paz, com vista alcançar o desenvolvimento sustentável em Moçambique.” (prefácio ¹).

Em Angola, o caso é diferente. Desde o período colonial que leis e regulamentos pretendiam em geral facilitar os processos de assentamento não planificado do solo. Mas a partir de 2004, tudo mudou e o Estado passou a ser gestor e proprietário primário de todos os recursos fundiários, sendo: “o seu uso pode ser transmitido para pessoas singulares ou coletivas, tendo em vista o seu racional e integral aproveitamento” (BETTENCOURT, 2011), mas no entanto finaliza dizendo: “sem prejuízo da possibilidade de expropriação para utilidade pública.” (BETTENCOURT, 2011). Como resultado, existe uma fraca segurança na posse de terra, por parte da população urbana. O governo Luandino afirma o controlo em relação à gestão das terras, no entanto potencia a ação dos privados pois a sua máxima é limpar da vista da cidade o musseque.

“Todos os moradores urbanos precisam ter acesso seguro à terra para evitar precariedade da sua condição de vida (…) Para as famílias mais carenciadas, a sua habitação, e as terras que ocupam, muitas vezes representam as suas poupanças e bens adquiridos ao longo da vida.” (CAIN², 2013)

Fig. 12 | Legislação excludente de Luanda - 2010 Fig. 13 | Caniço de Maputo | Fonte: www.sosescolas.wordpress.com Fonte: VIEGAS, 2015

¹ - Legislação das terras de Moçambique, Lei nº 19/97 de 1 de Outubro.

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referido na bibliografia.

“contestar as práticas do Estado e, de alguma forma, são estas associações que lhes dão voz (ONG’s) (…) são muito importantes porque quebram o silêncio de uma sociedade que está muito fechada em si mesmo.” (VIEGAS, 2015)

Uma ONG chamada Development Workshop afirma que esta lei: “ignora, assim, as experiências de outros países de África e os múltiplos defeitos dos sistemas de gestão centralizada. “(DW, 2005). É fundamental que sejam integradas na legislação várias nuances socio-agregadoras, como por exemplo: “gestão participativa da terra, ou mesmo as obrigações sociais dos proprietários das terras – um princípio de propriedade da terra mais ou menos universalmente aceite hoje em dia (…) o acesso dos pobres urbanos é terra, a segurança da sua propriedade e o seu envolvimento na planificação e gestão das suas próprias comunidades urbanas” (DW, 2005)

Mercados de habitação informais

O acesso à terra em Luanda é feito através de mercados formais e mercados informais, sendo o último mais recorrente. A maior parte do financiamento para a construção das habitações vem da família (62%) e a restante e amigos (28%). Os pobres não tem acesso a crédito bancário por várias razões, sendo a mais flagrante, o facto dos seus terrenos e habitações não serem considerados como seus.

“O pobre não tem acesso à linha de crédito como meio de melhorar o negócio ou melhorar a subsistência e são obrigados a pagar taxas de juros extremamente altas nos mercados paralelos com período de pagamento muito curto, deixando- -os com dívidas prolongadas.” (CAIN, 2013)

Estudos deste autor dizem-nos que 61,3% dos processos de compra e venda nas áreas informais tem registos de pagamentos financeiros. Cerca de 85% da população quando adquire a sua habitação, fica confiante que a sua compra é oficial, mas apenas 6,8% das transações são de facto seguras e legítimas. (fig.14)

Em suma, Allan Cain recomenda que: “é pertinente também que uma Lei semelhante à Lei de Maputo seja incorporada na legislação de Luanda e que, consequentemente, seja validada as ações de compra que tiveram base num processo legal. “(CAIN, 2013)E que outros métodos económicos sejam mais inclusivos: “Mecanismo de crédito e assistência financeira – para a eficácia de programas de reabilitação urbana sustentáveis, urge a criação de regimes de acesso ao crédito e ao micro crédito, que facilitem a melhoria do padrão de vida dos grupos menos favorecidos, na aquisição e manutenção da habitação.”(CAIN, 2013)

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Fig. 14 | Allan Cain, um curso para Administradores dos Municípios Urbanos 2013, Instituto de Formação da Administração Local (IFAL)

4. Como intervir?

“Temos sobretudo exemplos de urbanismo que não são sustentáveis; é neste contexto que o assentamento informal desperta interesse.(…) ‘sustentabilidade’ não é uma questão técnica ou económica mas sim ético-política, tanto no que diz respeito ao tipo de condições naturais que servem a vida cívica, como no que diz respeito a necessidades essenciais como o empoderamento coletivo, a igualdade, a generosidade, o sentido da existência. Por sua vez, isto representa um tipo de conhecimento diferente, que requer um modo de investigar distinto do que é costumeiro em escolas de arquitetura (demasiado dependentes de generalizações abstratas como ‘espaço’ e ‘forma’) ou em disciplinas como a sociologia, economia e antropologia (cujas apreciações quantitativas não têm em conta as implicações morais e políticas inerentes incontornavelmente aos resultados).”

(CARL, 2015)¹

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A arquitetura aterra (nivela) o musseque

A arquitetura aterra o musseque, nivelando-o. Planificando as ideias, corrigindo os erros, resolvendo os problemas.

A arquitetura teve, tem e terá sempre o dever de estudar o meio ambiente, as pessoas, os contextos, e criar no plano físico, as ideias pré-concebidas que visavam criar as melhores condições de habitabilidade de determinado espaço. Acreditamos que quanto maior é a preocupação e a dedicação do arquiteto, face ao seu objeto de estudo, melhor intervenção será realizada.

Assim, neste trabalho, apresentamos uma proposta ativa que reflete este pensamento. Vários autores mostram a sua opinião, relativamente aos métodos de intervenção na Chicala, ou semelhantes:

“-Haver entendimento e conhecimento aprofundado do local, da população e das suas necessidades; -Ganhar proximidade e facilidade de comunicação com a população residente e de todos os beneficiários; -Incentivar a participação ativa dos beneficiários da intervenção desde a conceção à construção; -Desenvolver infraestruturas urbanas e sociais que promovam a integração social (…);

-Definir e regularizar os direitos da ocupação da terra;

-Reconhecer a importância da parceria público-privada para investimento da intervenção.” (BETTENCOURT, 2011) “1º Cultura: A preservação da identidade cultural da população originária do bairro “Chicala I”;

2º Ambiental: A Acão construtiva está anulando a entidade lagunar (baía do Samba) 3º Social: Qualidade de vida através de um uso de solos equilibrado;

4º Económico: valorização do terreno urbano através de ações de melhoria infraestrutural”. (MINGAS¹, 2012)

“Com um colossal património natural e histórico, e uma sociedade vivaz e ativa, Angola terá os fundamentos de um país de se impor na região. O turismo, a agricultura e o desenvolvimento industrial deverão ser os pilares dum modelo alternativo de crescimento, mais sensível às necessidades duma sociedade rica e diversa. Mas para que algum destes modelos crie raiz será necessária – mais do que a mudança política – uma transformação cultural no sentido duma

crescente humanização de ideias e prioridades.“ (BONIFÁCIO², 2012)

“(…) aceitação de uma mudança de paradigma no que respeita à forma como pensamos e respondemos à complexa e desafiadora realidade. (…) a fonte de oportunidades e recursos para (tentar) resolver esta crise urbana está com a população de lugares como o Cazenga ou a Chicala (…) a arquitetura pode funcionar ‘de baixo para cima’ – pode reconhecer a energia e a inteligência que estas comunidades possuem para conseguir sobreviver.” (NASCIMENTO³, 2015)

¹ - Este pequeno excerto foi retirado do livro de Paulo Moreira referido na bibliografia.

² - Luca Bonifácio -É arquiteto freelancer e investigador sobre temáticas relacionadas com desenvolvimento e habitat humano. É co-fundador da plataforma hopeandspace (www.hopeandspace.org). Este pequeno excerto foi retirado do livro de Paulo Moreira referido na bibliografia. ³ - Paula Nascimento - Nasceu em 1981, Luanda. Formou-se na Architectural Association School of Architecture e na London Southpark University. Co-fundadora de Beyond Entropy África. Este pequeno excerto foi retirado do livro de Paulo Moreira referido na bibliografia.

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Autoconstrução, a força local, Chile

“ Cada “objeto” construído será por sua vez submetido ao exame crítico. Na medida do possível, será realizado e submetido à verificação experimental. A ciência da cidade exige um período histórico para se construir e para orientar a prática social. “ (LEFEBVRE, 1696)

Estima-se que em 2030, a população mundial a viver em cidades irá crescer de 3 biliões para 5 biliões, com os estimados 2 biliões a viver abaixo do limiar da pobreza. Para Alejandro Aravena¹, dois critérios essenciais serão a base do esforço para realojar todas estas pessoas: Escala e Rapidez. A equação que o mundo precisa de resolver é: construir 1 milhão de cidades habitadas, por semana, nos próximos 20 anos com o orçamento de 8,000 euros por família. Tal, só será possível, diz Aravena, com uma mudança de mentalidade mundial, um esforço geral de todos os governos e construtores de cada cidade. O atelier ELEMENTAL², trabalha hoje num nível internacional, tentando aplicar a sua estratégia de Escala e rapidez ao serviço de comunidades pobres, analisando sempre as políticas existentes e as condições do mercado local, usando a cidade como ferramenta para corrigir desigualdades, através do desenvolvimento de habitações, espaço público, infraestruturas e projetos de realojamento.

Na década de 60, existia na cidade de Iquique, com cerca de 1\4 de milhão de habitantes, situado no norte do Chile, um acampamento clandestino que foi crescendo e ganhando forma de bairro informal, de malha labiríntica e inseguro, ocupando uma área de terreno de mais de 5000m2, ganhando o nome de Quinta Monroy. A câmara local tentou melhor a situação destas 93 famílias que viviam de forma precária, oferecendo o realojamento noutro local, em vivendas novas, fora de Iquique, porém, os moradores rejeitaram alegando que não queriam sair daquele mesmo lugar, lugar onde, durante três décadas viveram numa habitação construída por si mesmos e onde criaram relações sociais, e que oferecia uma proximidade privilegiada às principais zonas da cidade.

Em 2001, através de um programa chamado Chile Bárrio, foi proposta ao atelier ELEMENTAL o projeto de desenhar uma solução habitacional nesse mesmo sítio, em vez do realojamento noutro local. O desafio era grande: num terreno com 5025m2 dar abrigo a 93 famílias, apenas com um orçamento de 5,500 euros por família, valor que tinha de pagar o terreno, a infraestruturas e a arquitetura. O atelier surgiu com o conceito de desenhar projetos participativos, onde a própria comunidade é chamada a participar, usando a sua capacidade de construção para criar uma nova e inovadora forma de projetar. Assim, como o orçamento apenas permitia construir 40m2 de habitação e o essencial para uma família de classe média viver são 80m2, o atelier avançou com a brilhante ideia de, em vez de criar uma casa mais pequena com os 40m2, criar metade duma grande, dando a possibilidade da própria família construir o resto. Essa metade era a metade que as famílias não poderiam fazer por si próprias, como cozinhas, casas de banho, escadas e paredes divisórias, restando apenas o que poderia ser feito com 800 euros. Esta solução possibilita ainda a cada família personalizar a sua casa e a diversidade estética da fachada, onde existe regra mas também identidade.

Passados cinco anos, cada habitação foi avaliada em 16,000 euros o que provou o principal ponto do atelier ELEMENTAL, além de resolver problemas arquitetónicos da cidade, esta solução resolve também a questão da discrepância social, aproximando os dois extremos que cada vez mais vemos a afastarem-se e transformando estas operações, não em despesa social, mas sim um investimento rentável.

¹ - Arquiteto chileno, diretor executivo do escritório Elemental S.A. Aravena. Vencedor do prémio Pritzker em 2016. ² - Atelier de arquitetura e construção localizado em Bogotá, Colombia.

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Fig. 15 | Esquiço de Alexandro Aravena | Fonte: http://himawari8.com.br

Fig. 16 | Tipologia desenvolvida pelo arquiteto, baseado na autoconstrução, no Chile Fonte: monsieurmiranda.com

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1.Construir nos trópicos

“Os edifícios designados para a sustentabilidade são construídos e operados para minimizar todos os impactos negativos nos ocupantes (em termos de saúde, conforto e produtividade), e no ambiente (uso de energia, recursos naturais e poluição) ”. (PLAINIOTIS¹, 2006)

Climas tropicais são caracterizados pela sua frequente temperatura elevada e também, elevada humidade relativa e absoluta. Aqui a função térmica dos edifícios durante a maior parte do ano é manter a temperatura o mais baixo possível. Em Angola, o clima é classificado como subtropical, quente e húmido, na maior parte do território, e semiárido e subúmido seco no Sul e faixa litoral até à província de Luanda.

Fig. 17 | Gráficos relativos ao regime pluviométrico anual. (à esquerda) e aos ventos dominantes (à direita) em Luanda | Fonte: climate-data.org

Como se pode observar, em Luanda, os níveis de pluviosidade são bastante altos nos meses de março e abril (alcançando o valor máximo em Abril, com uma média de 144 mm), e as temperaturas médias anuais nunca são inferiores a 20 graus Celcius e os ventos são predominantes de oeste.

Neste contexto é crucial o uso estratégias bioclimáticas², que são, durante a vida do edifício, as mais eficientes. Por um lado são reduzidos os custos: de compra de equipamentos, de utilização dos mesmos - fator económico; e por outro é reduzida a emissão de gases como o hidrofluorcarbono (HFC), que pode ser milhares de vezes mais poluente que o dióxido de carbono – fator ecológico. A obtenção deste tipo de equipamentos é cada vez mais frequente, sobretudo em países de climas quentes.

Duas das mais importantes soluções são: a utilização da iluminação natural e a ventilação transversal; pois desta maneira é reduzida a frequência de utilização da luz artificial, e de aparelhos de refrigeração do ar. Para a ventilação natural ser mais eficaz é aconselhável orientar o edifício consoante a orientação dos ventos

¹ - Stellios Plainiotis - é fundador da NEAPOLI, uma empresa de consultoria de desenho e engenharia ambiental. É também um dos escritores do livro:“Design for Sustainability “ (2006)

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Fig. 18 e 19 | Uso excessivo de aparelhos de ar condiciona em Luanda | Fontes: Arquitetura Sustentável em Angola - manual de boas práticas; http://luandahistoriadeumaarquitectura.blogspot.pt

“O hiperconsumismo não deve ser um modelo a seguir pelos países em desenvolvimento que por vezes erradamente prescrevem as tendências ocidentais. Há uma necessidade latente de não seguir os maus exemplos do mundo industrializado e preservar uma qualidade, que podemos considerar como intrínseca à falta de riqueza financeira, que é a capacidade de reciclar e aproveitar os recursos existentes.” (LOPES¹, 2009)

Com níveis de pobreza, fome e doenças endémicas elevado, os países africanos terão de hierarquizar prioridades, e desenhar o edifício de forma ecológica, ou seja, tirando partido da sua forma, implantação, materiais, para atribuir-lhe uma boa resposta ao nível climatérico, poupando assim nos gastos energéticos e, consequentemente, económicos, que advém da obtenção de equipamentos artificiais. Outra estratégia de especial interesse é a autossuficiência: métodos de captação da água das chuvas ou cultivo de alimentos são algumas das soluções que podem fazer a diferença significativa. Este tipo de técnicas, já muito utilizadas pela arquitetura vernacular, proporcionam também uma qualidade de vida superior aos seus moradores. São exemplo disso: a utilização do colmo nas coberturas, isolante térmico excelente, a sobrelevação para ventilação rasteira, a terra com a sua elevada massa térmica na construção das paredes, o que faz reduzir bastante a temperatura no interior, ou a utilização de janelas pequenas, apenas para ventilar, não deixando entrar demasiada luz solar direta.

Fig. 20 e 21 | Métodos bioclimáticos e passivos usados na arquitetura vernacular | Fonte: africavernaculararchitecture.com; edukavita.blogspot.pt

¹ - Leão Lopes – Realizador de cinema, escritor, artista plástico e professor cabo-verdiano. É reitor e professor no Instituto Universitário de

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2. A terra

“ El futuro está en la tierra” (ALVA¹)

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Há aproximadamente 10 mil anos atrás, quando o Homem deixou a vida de nómada e se instalou durante períodos de tempo mais longos, apareceu a necessidade da criação de abrigo e nasceu a arquitetura. As primeiras construções foram feitas essencialmente com materiais naturais, como por exemplo a terra.

É um material que tem várias qualidades e vantagens, como por exemplo: é reutilizável, é abundante, é orgânica, é plástica, é ecológica, é natural, é isoladora térmica e acústica, entre outras, mas é também um“(…) material de conotação erroneamente depreciativa.” (MENDES¹, 2005) desconfianças derivadas de escassa informação, e que estão na base do desuso do material, nomeadamente em relação à durabilidade, resistência estrutual, impermebealidade, isolamento térmico, acústico, sendo considerado por muitos um material pobre.

Características da terra na construção - durabilidade

Alguns destes “mitos” podem ser comprovados pelos vários exemplos de construções que chegaram aos nossos dias. Deste são exemplo o templo de Ramsés no Egipto ou a muralha da China, ou mesmo cidades inteiras como por exemplo a cidade de Ouarzazate, Marrocos ou Shibam no Yemen.

Fig. 22 | Partes da muralha da China foram contruídos em terra Fig. 23 | Templo Ramsés II ( 3000 a.c.) Fontes: www.arcaterrablog.wordpress.com Fonte: http://www.descobriregipto.com/

Fig. 24 | Ouarzazate, Marrocos | Fonte: http://www.suggest-keywords.com/

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Fig. 25 | Shibam no Yemen | Fonte: http://www.easyvoyage.co.uk/

Fig. 26 | Shibam | Fonte:http://d1vmp8zzttzftq.cloudfront.net/

Resistência estrutural

A resistencia estrutural é comprovada pela fotografia acima com o exemplo da cidade de Shibam, no Yemen, que:”é totalmente erguida em tijolos secos ao sol e chega a atingir os 30 metros de altura, com 8 andares, constituindo as mais altas construções em terra do mundo.” (PONTE¹, 2012)

Além disto, a terra pode sofrer alterações das suas propriedades, ou ser adicionado ferro, como acontece no betão comum, e ganhar grandes capacidades mecânicas, podendo ser utilizada como pavimento ou lajes. (betão de argila) Destaca-se o revestimento com cal das coberturas, a fim de ganharem estanquidade.

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Desempenho térmico

A terra apresenta uma grande capacidade térmica, isto é, uma forte resposta de isolamento face a temperaturas extremas, tanto altas, como baixas.

Métodos de construção em que a terra é compactada e prensada apresentam naturalmente uma grande densidade, maior resistência mecânica e impermeabilidade em relação aos restantes métodos. Quanto maior a espessura e densidade do elemento, parede ou cobertura, menor a sua condutividade e maior a sua capacidade de isolamento térmico.

Por ter uma inércia térmica grande, a terra prolonga o tempo de transmissão de calor por condução para o ar interior. Desta maneira durante o dia o calor do exterior é acumulado pelas paredes, num processo relativamente lento e dificultando o trespasse do mesmo, mantendo o interior fresco e durante a noite é libertado através da ventilação noturna, pois a temperatura do ar desce consideravelmente e atua como dissipador do calor acumulado durante o dia, evitando o sobreaquecimento no dia seguinte. Em suma, a terra mantém por algum tempo uma amplitude térmica entre o interior e o exterior, elevada.

(Im)permeabilidade

A terra é um material estanque face a reduzida ação da chuva. Quandos os níveis de pluviosidade são elevados são adicionados componentes estabilizadores, como a cal. Estes estabilizadores aumentam ou diminuem a capacidade de agregação dos materiais e a sua coesão e diminuem a baridade. Existem exemplos de terra nas coberturas, que serão mais à frente apresentados.

Economia

Como veremos mais adiante, o processo de construção em terra tem de passar por muitos caminhos que outros materiais correntes não necessitam de passar, como uma legislação excludente, a não existência de uma mão-de-obra especializada no mercado¹, a falta de competitividade, o que, quando não extingue a ideia a priori, pode originar bastantes custos de nível financeiro.

Não obstante, se pusermos na balança os custos relativos ao consumo de energia e água na produção do material, transporte do material, a terra é significamente mais barata. Estes custos de obra podem ser bastante reduzidos por exemplo com a autoconstrução da habitação ou o desenho bioclimático da mesma.

“Diante da preocupação atual com construções ecologicamente corretas, ecovilas e bioarquitetura, o adobe surge como importante opção em edificações de baixo custo, por economizar em transporte, quando a terra adequada encontra–se disponível no próprio local da obra; não requerer mão–de–obra especializada; possuir excelente conforto térmico; e não consumir energia para sua fabricação. O consumo de água para a sua produção é sessenta vezes menor que para a do cimento. Não gera vapores contaminantes e não apresenta perigo na sua manipulação.” (CORRÊA², 2006)

¹ - Não existe mão-de-obra especializada na construção em terra, no entanto sublinha-se que as técnicas de construção em terra são de fácil aprendizagem e qualquer trabalhador não especializado nesta técnica que tenha competência construtiva rapidamente se especializa. ² - Andréa Aparecida Ribeiro Corrêa– Concluiu o seu mestrado em Engenharia Agrícola com a dissertação: “Avaliação das propriedades físicas e mecânicas do adobe (tijolo de terra crua)”, apresentada na Universidade Federal de Lavras, Minas Gerais, Brasil.

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Técnicas

A Taipa

É feita uma fundação com pedras para evitar que a humidade do chão se propague por capilaridade. Recolhe-se a terra, desfaz-se os torrões, de seguida é amassada, adicionada alguma água caso seja necessário para fazer uma massa homogénea e é posta em repousa alguns dias. De seguida é montada uma estrutura em madeira (taipal) apoiada nas pedras que sustenta a base e procede-se ao enchimento das cofragens com a massa de terra. Este enchimento terá que ser compactado, batendo com um pilão. Estando pronto um bloco, o taipal é mudado de sítio e é repetido o processo. Por vezes estas paredes são rebocadas com cal.

Este tipo de processo era muito frequente em Portugal, na região do Alentejo e no Algarve (sobretudo nas paredes exteriores), sendo até utilizados na construção de muralhas, no castelo de Moura, Juromenha ou Paderne.

Fig. 27 | Técnica da construção | Fonte:www.coisasdaarquitetura.files.wordpress.com

Fig. 28 | Construção em taipa Fig. 29 | Exemplo de uso contemporâneo - Odemira, arquiteto Alexandre Bastos Fonte:www.bp.blogspot.com Fonte: www.alexandrebastos.eu

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O Adobe ou adobo

Esta técnica consiste na construção de tijolos, manualmente ou com a ajuda de um molde em madeira, que posteriormente são postos ao sol, onde secam e ganham presa, e são amontoados uns em cimas dos outros construindo paredes, ou até tetos abobadados. Ao nível da sua resistência estrutural, existem exemplos que nos mostram que estas construções chegam a atingir alturas superiores a 10 metros

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Fig. 30 | Técnica de construção | Fonte: www.coisasdaarquitetura.files.wordpress.com

Fig. 32 | Técnica construtiva Fig. 33 | Secagem Fig. 34 | Aplicação

Fonte: www.assimquefaz.com Fonte: www.recriarcomvoce.com.br Fonte: arquitecturasdeterra.blogspot.pt

Fig. 35 | A Mesquita de Djenné tem cerca de 16 metros Fig. 36 | Museu em Pojoaque, Novo México, cerca de 12 metros Fonte: www.arquigravura.wordpress.com Fonte: www.en. Wikipedia.org

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O Tabique ou pau-a-pique

O tabique, também conhecido por pau-a-pique, é uma técnica de construção em terra que tem origem (em Portugal) antes do século XVII. Nesta técnica é construída uma estrutura de madeira emparelhada, compreendida entre as vigas e os pilares estruturais e posteriormente é preenchida com terra, que, para que fique bem agregada, se pretende argilosa. Por vezes esta pode conter fibras vegetais. Após a terra secar é aplicada uma camada de argamassa de cal. Em Portugal esta técnica é bastante frequente em edificações antigas do norte do país.

Na Índia, Colômbia, Japão ou Filipinas, a madeira é substituída por bambu. Apesar da sua aparente fragilidade, existem exemplos em Portugal que datam do século XVII. Além disto, estas construções apresentam um bom comportamento em situação de sismo. A seguir ao terramoto de 1755, grande parte das edificações caíram registando-se um grande número de construções de tabique como fazendo parte das que ficaram em pé. Tal acontece porque estas construções são bastante flexíveis, condição crucial na resistência aos terramotos.

Fig. 36 | Técnica de construção | Fonte: www.patricultufes.blogspot.pt

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O Btc (bloco de terra comprimida)

Esta técnica tem todas as vantagens da utilização em terra, como a massa térmica, baixa energia na sua produção, presença abundante na natureza, e é feita uma “modernização” no seu processo de execução: a uniformização. Neste método construtivo são usadas duas máquinas: um pulverizador, “que uniformiza a granulometria e retira as impurezas da mistura” (QUINTINO, 2005), e uma compactadora. Segundo este autor, eram assim criados blocos de dimensões iguais, peso igual e comportamentos mecânicos, térmicos e acústicos iguais. Após a sua criação, os blocos necessitam de quinze dias de repouso a fim de ganharam presa. Esta uniformização faz deste método construtivo o mais fácil de executar. Com apenas dois trabalhadores é possível a produção de 2500 blocos por dia. Na criação de blocos para paredes autoportantes, é adicionada uma percentagem (6%) de cal e também de cimento (3%). Assim, estes blocos tem uma resistência à compressão de 100/110 kg/cm² e uma resistência à flexão de 10kg/cm² o que torna possível a construção em altura. Acrescenta-se ainda que na sua produção é gasta aproximadamente 100 kw/h, por tonelada, valor muito inferior quando comparado à produção de tijolos cerâmicos, onde se utiliza cerca de 1220 kw/h referente ao mesmo peso.

É um material com muitas vantagens, embora ainda seja pouco difundido, o que gera pouca mão-de-obra especializada disponível no mercado de construção. Este é o método construtivo usado na proposta de projeto apresentada neste trabalho, apenas com algumas modificações, como veremos mais adiante.

Fig. 39 | Fábrica de produção em Aljezur | Fonte: www.fotos.sapo.pt Fig. 40 | Secagem e armazenamento | Fonte: www.fotos.sapo.pt

Fig. 41 | Construção em altura Fig. 42 | Aplicação dos blocos

Fonte: http://produto.mercadolivre.com.br/ Fonte: www.arquitecturasdeterra.blogspot.pt ¹ -. Arquiteto. Doutor em Arquitetura na Open University, Reino Unido

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Composição

A terra varia os seus componentes de lugar para lugar, sendo uns mais densos, outros mais porosos, o que para a construção é fundamental analisar, pois a sua capacidade mecânica varia também. Estes componentes são minerais que vem da sua rocha mãe, mas no entanto podem ter constituições muito diferentes, resultado de todas as suas “viagens”, pelos rios, pelo ar, onde se degradam e sofrem alterações químicas, granulométrica e mineralógica. A terra duma maneira geral é composta por ar, água, e matéria orgânica e mineral.

Para que seja usada na construção a terra terá ter um equilíbrio dos seus componentes gasosos, líquidos e sólidos. O ar pretende-se normalmente numa percentagem baixa, de preferência nula, e para isso usa-se em muitos métodos o processo de compactação.

É necessária água na quantidade certa de modo a criar uma massa homogénea e plástica, misturando os diferentes componentes da terra, antes de criar os blocos. No caso do adobe é utilizada uma maior percentagem de água. Dos componentes sólidos pretende-se um equilíbrio entre a areia, a argila e o silte: (55% a 75% de areia, 10% a 28% de siltes e 15% a 18% de argila) ¹ Argila Terra argilosa Terra Silte Terra siltosa % Areia % Argila Terra silto-argilosa

Silte argiloso Areia Terra arenosa Terra areno-argilosa Areia argilosa % Silte

Fig. 43 | Diagrama Tri.axial de classificação da terra (adaptado de Moran, 1984)

Ambos os processos devem ter em conta a quantidade de argila, silte e areia existente na terra. A argila funciona como ligante do material e por isso é muito importante ter em conta a sua percentagem. Quando a sua percentagem é muito baixa, pode ser adicionada cal aérea, melhorando assim a sua resistência mecânica. Se a argila tiver níveis superiores aos ideais, pode originar retração do material. A retração é originada pela perda de água durante a secagem, e pode causar fissuras. Para inverter isso é necessário adicionar palha ou qualquer outro elemento que absorva as tensões que se geram na retração.

A argila, que no processo de construção absorveu muita água, voltou a secar mas nunca completamente. Isto faz com que existam sempre níveis de água numa parede feita de terra, que vão se ajustando aos níveis de humidade do ar do exterior. Depois de seca, a terra, ganha uma resistência considerável, tanto como níveis de resistência e isolamento altos. Em Portugal a maioria das paredes feitas com terra são caiadas¹ o que confere uma camada protetora face aos elementos deterioradores da intempérie. Mas caso as paredes estejam bem protegidas, por um beiral ou cobertura longa, esta aplicação é dispensável, pois a terra tem capacidade impermeável quando é exposta a níveis baixos de água.

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Terra na construção de coberturas

A terra pode também ser usada na cobertura, funcionando como material estanque, em zonas com clima seco e baixa pluviosidade, e tem uma grande capacidade térmica face a temperaturas, extremas.

Na Madeira são exemplo deste uso as casas salão¹, feitas com paredes de pedra, são lançadas, sobre estas, estruturas de madeira cruzadas onde posteriormente é colocada uma camada com cerca de 10 cm de um tipo de solo, com o nome: salão². Estas coberturas encontram-se quase sempre secas e abrem fendas no barro, criando ventilação dentro da habitação. Com a presença de água estas fendas fecham-se e tornam o material impermeável. Estas coberturas são assim ideais para este tipo de clima, somando ainda a sua forte resistência, pelo seu considerável peso, aos ventos fortes da ilha. No Egipto, Hassan Fathy³ projetou coberturas com a forma abobadada usando adobe, onde aplicou uma técnica de construção que não necessitava de armação de madeira para apoio dos tijolos, simplesmente estes apoiam-se uns nos outros, como demostra a imagem. Este método construtivo mostra a ampla capacidade mecânica da terra, quando o engenho assim o permite. Antes de Hassan Fathy a terra já era usada na construção de abóbadas e cúpulas, por exemplo em Assuão, cidade do Sul do Egipto, onde Fathy se terá inspirado (Fig.10). Neste caso a terra comporta-se de maneira semelhante frente à chuva, é impermeável, pois o regime pluviométrico no Egipto apresenta valores baixos.

Fig. 44 | Casas Salão no Porto Santo, Madeira | Fontes: www.patrising.com; www.davidfrancisco.foto

Fig. 45 | Hassan Fathy – Abóbada núbia construída com adobe. Fig. 46 | Empreendimento na costa Norte, Sidi Krier, Egipto Fonte: www.photos1.blogger.com Fonte: www.syrianvoicesmediationandart.wordpress.com

¹ - Casas típicas da madeira, com cobertura de salão.

² - Tipo de soloda ilha da Madeira, de cor amarelada, composto por matérias vulcânicas e com uma estrutura muito argilosa, o que o torna excelente agregador em contacto com a água.

³ - Hassan Fathy foi um arquiteto egípcio que fez vários projetos utilizando a terra como material de construção. Responsável por reutilizar também técnicas autóctones esquecidas na construção com o adobe.

Referências

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