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Investigação Exegética Relativa ao Pentateuco

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Academic year: 2021

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Investigação Exegética Relativa ao Pentateuco 1. Breve história da investigação

Analisaremos alguns termos técnicos e fundamentais para a compreensão des-te ponto do estudo.

1.1 Tradição, Redação e Composição

Tradição: este termo pode designar, no estudo bíblico, um conteúdo oral ou escri-to que se transmite de uma geração à outra, de um grupo a outro grupo ou de uma pessoa a outra pessoa (cf. Jz 6,13; Sl 44,2; 78,3; Jl 1,3; Est 4,17l/m).

Uma tradição pode pertencer ao gênero narrativo, legislativo, hínico etc.

“tradidi enim vobis in primis quod et accepi quoniam Christus mortuus est pro pec-catis nostris secundum scripturas et quia sepultus est et quia resurrexit tertia die secundum scripturas”.

“porque, primeiramente, eu vos transmiti, como eu mesmo havia recebido, que Cristo morreu por nossos pecados, segundo as Escrituras e que foi sepultado e que foi ressuscitado ao terceiro dia segundo as Escrituras” (1Cor 15,3-4).

Redação: é a formulação literária de uma tradição ou um conjunto de tradições. Um autor, ao receber uma tradição oral ou escrita, a redige, caso seja oral, ou a reescreve, atualizando-a, antes de transmiti-la novamente. Por-tanto, uma mesma tradição pode conhecer redações diferentes e sucessi-vas.

Por exemplo, o relato da idolatria sobre o bezerro de ouro conheceu uma re-dação sacerdotal (cf. Ex 32,1-6) e uma rere-dação deuteronomista (cf. Dt 9,11-21). É o mesmo episódio, narrado, porém, com traços teológicos e vocabulário diferen-tes.

Composição: uma composição literária dispõe livremente de um material tradicio-nal anterior a ela. Os autores das composições não criam o material nar-rativo ou legislativo que reúnem. O trabalho consiste em ordenar e dar forma a esse material segundo uma perspectiva teológica original. Um texto preexistente, pela composição, aparece reformulado, completado e/ou modificado.

Ex 24,15b–40,38 é considerado uma composição sacerdotal, na qual os auto-res reuniram leis e relatos sacerdotais em torno de Ex 32–34 numa composição

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li-terária (tradição Elohista?), onde os elementos formam um quiasmo e Ex 32–34 encontra-se no centro desta estrutura1.

A 24,15b-18: a nuvem sobre o Sinai

B 25,1-31,11: normas para construir o santuário C 31,12-17: normas relativas ao sábado

D 31,18-34,35: ruptura e renovação da aliança C’ 35,1-3: normas relativas ao sábado

B’ 35,4-40-33: construção do santuário A’ 40,34-38: a nuvem sobre a Morada

1.2 Documentos, Complementos e Fragmentos

Na história da investigação sobre o Pentateuco surgiram três modelos teóricos principais que serviram para explicar o processo de formação deste corpus. Estes modelos recorrem à noção de documentos, complementos e fragmentos.

Documentos: é uma obra literária autônoma, procede de um único autor ou de um único grupo de autores. É uma obra que foi realizada em uma época de-terminada a partir de um material tradicional preexistente.

A hipótese documentária, que prevaleceu durante muito tempo como explicação da formação do Pentateuco, postula a existência de documentos que procedem de épocas e meios diferentes, documentos, cuja disposição e fusão progressiva, con-duziu à Torah. O modelo dos documentos-fontes pode ser esquematizado da segu-inte maneira:

Tradições T1 T2 T3

(orais ou escritas)

Documentos D1

(de épocas diferentes) D2

D3

Na fusão de documentos surge o Texto final = D1 + D2 + D3

Complementos: a partir de tradições antigas, orais ou escritas, teria sido composto um documento antigo, que foi recebendo sucessivos complementos. Nes-ta teoria, os complementos se diferenciam dos documentos pelo fato de não terem autonomia literária, pois várias mãos nele trabalharam. Um complemento pressupõe a existência do documento antigo que ele

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pleta e/ou corrige. Esta teoria pode ser esquematizada da seguinte manei-ra: Tradições T1 T2 T3 T4 Documento Antigo D C1 --- Complementos C2 --- C3 --- Texto Final

Fragmentos: nesta teoria, as tradições teriam sido veiculadas independentemente durante muito tempo umas das outras e somente mais tarde foram reuni-das em torno de temas narrativos específicos, originando os fragmentos. Uma composição literária (ou várias composições literárias sucessivas) teria(am) re-agrupado essas tradições e fragmentos. Esta teoria não acei-ta a hipótese da existência de documentos antigos, e pode ser esquemati-zada da seguinte maneira:

Tradições ou

grupos de tradições T1 T2 T3 T4

fragmentos de temas narrativos f1 f2 f3

composição(ões) tardia(as)

a partir de tradições antigas C1

e dos fragmentos

C2

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2. Abordagem Histórica: das Origens à teoria documentária2

A tradição judaica, seguida pela tradição cristã, ensinou que Moisés era o au-tor dos cinco primeiros livros da Bíblia. Essa tradição levou, naturalmente, à desig-nação da Torah/Pentateuco como sendo "os cinco livros de Moisés".

Esta concepção tem um fundamento bíblico, pois em alguns textos encontra-se a atividade legislativa de Moisés. Nas fórmulas introdutórias e conclusivas das seções legais, Moisés aparece como mediador entre o Senhor e o povo: Ex 20,22; 24,12; 31,18; Lv 1,1-2; 6,1-2; 7,28-29; Nm 5,1-2: 30,1-2: Dt 1,1-2; 4,44-45; 31,24."3

O Antigo Testamento, além disso, atribui expressamente a Moisés a redação por escrito de certas passagens: a vitória sobre os filhos de Amalec (cf. Ex 17,14), o Código da Aliança (cf. Ex 24,4), o Decálogo cultual (cf. Ex 34,27), um registro esquemático das etapas da peregrinação (cf. Nm 33,2), e o grande discurso históri-co-legislativo do Deuteronômio (cf. Dt 31,9.22.24-26).

Todavia, a interpretação destas passagens pelos exegetas é alvo de inúmeras discussões e debates. Muito pouco, de fato, poderia ser atribuído às mãos de Moi-sés.

Fora do Pentateuco, outros textos aludem de forma expressa ou mencionam alguma atividade legislativa atribuída a Moisés: Js 1,8; 8,31-35; 23,6; 24,25-26. Vê-se que a Torah estava associada à pessoa de Moisés. Todavia, foi depois do pe-ríodo pós-bíblico que o Pentateuco, como um todo, foi atribuído à pessoa de Moi-sés.

Esta concepção perdurou por toda a Idade Média e predominou até o século XVII, quando a exegese moderna surgiu e questionou, fortemente a autoria mosai-ca do Pentateuco. A história desta pesquisa está dividida em três períodos: a) perío-do pré-crítico; b) períoperío-do crítico; c) períoperío-do pós-crítico.

2.1Período pré-crítico: momento das primeiras intuições. O ponto de partida é a tradição em torno da autoria de Moisés, levando-se em consideração uma ques-tão:

Será que Moisés poderia ter sido inspirado a ponto de poder prever e descre-ver antecipadamente a sua própria morte? (cf. Dt 34)

No final do século XVI algumas vozes surgiram e certo número de observa-ções críticas fragilizavam, progressivamente, a tese clássica, oriunda da tradição judaico-cristã, que considerava Moisés como o autor do Pentateuco:

O Talmud4 diz que Dt 34,5-12 são da autoria de Josué.

2 Sobre esta questão, cf. A. de Pury, O Pentateuco em questão, Petrópolis 1996, 15-85; E. Zenger, Introdução ao Antigo Testamento, Loyola, São Paulo 2003, pp. 81-88.

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A. B. Karlstadt (1486-1541) partindo da diversidade de estilos que se

en-contra nos cinco livros, indaga se as ações pertencem realmente a Moisés ou devem ser atribuídas a outros. Segundo ele, existe um bom fundamento para pensar que o narrador nestes textos não seja o próprio Moisés, o qual, entre outras coisas, não poderia ter narrado a própria morte (cf. Dt 34,5), já que, depois de sua morte, a narração continua no mesmo estilo. No Deute-ronômio, em particular, encontrar-se-ia muita coisa não escrita por Moisés. Todavia, Karlstadt não afirma que Esdras seria o verdadeiro autor do Pen-tateuco, baseando-se em Dt 31,9-11; Js 24,6 e 2Rs 22,3.

Thomas Hobbes, filósofo inglês (1588-1679), afirma que o Pentateuco, em

si mesmo, é um livro pós-mosaico, mas admite que a Moisés pertença tudo aquilo que, expressamente, é apresentado como sendo escrito por ele, in-clusive algumas partes dentro do Deuteronômio (cf. Dt 11-27).

Richard Simon, oratoriano francês (1638-1712), afirma que Moisés não

pode ser o autor dos livros que lhe são atribuídos e postula uma "cadeia de tradição", que vai de Moisés a Esdras, sendo este último o compilador final do Pentateuco.

Baruc Spinoza, judeu e filósofo holandês (1632-1677), mais ou menos na

mesma época de R. Simon, admite que Esdras seja o redator último do

cor-pus do Pentateuco. Ele não nega expressamente o que nos livros aparece

atribuído a Moisés.

Jean le Clerc (1642-1731) postula que o Pentateuco é compilação não de

escritos públicos e oficiais, mas privados. Alguns são até anteriores a Moi-ses (cf. Nm 21,14). Esdras não poderia ser o autor do Pentateuco, pois os samaritanos (século VIII-IV) conservaram um Pentateuco praticamente idêntico ao dos judeus. Este parecer pode ser criticado, pois o Pentateuco Samaritano é posterior ao texto editado pelos judeus.

2.2Período "crítico": a partir do século XVII, os críticos colocaram várias obje-ções em torno da pessoa e da autoria de Moisés, fazendo surgir novas dúvidas e tendo como ponto de partida uma questão condicional:

Se Moisés não é o autor do Pentateuco, então, quem seria?

4 A palavra talmud significa "estudo", "ensino", mas também a "doutrina tradicional" ou o "estudo da

tradição", e neste sentido designou o comentário à Mishná. Mishná vem da raiz hebraica , que significa "repetir". A repetição era o sistema de ensino e de aprendizagem na transmissão oral. Por isto, o verbo, em época rabínica, adquire o significado de "estudar", "memorizar", "ensinar pela repetição", com referência à tradição oral.

A Mishná passará a designar um livro, cuja reconpilação remonta ao início do século III d.C. na Galiléia. Teve por base a autoridade de Rabbi Yehudah ha-Nasi, que é considerado seu editor ou responsável. A obra adquiriu imediatamente uma autoridade canônica dentro do judaísmo, pois viu-se nela a formulação da Lei Oral que, na compreensão judaica da revelação, acompanha a Lei Escrita (cf. Miguel PÉREZ FERNÁNDEZ, "Literatura rabínica", in G. ARANDA PÉREZ, Literatura Judaica Intertestamentária, São Paulo, Ave-Maria, 2000, 389-426).

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Este período da investigação interessar-se-á, particularmente, pelo problema da unidade literária dos cinco primeiros livros da Bíblia. Surgirão algumas hipóte-ses, que confluirão no sistema de Karl H. Graf (1815-1869) e Julius Wellhausen (1844-1918).

Durante o séc. XVIII e no início do sé. XIX, a questão da autoria cedeu lugar ao grande problema das Fontes do Pentateuco. As observações que dependem da lógica literária levaram os exegetas à questão das “Fontes”.

Henning Bernhard. Witter (1683-1715) se apóia em dois pontos:

crítica literária: constata o aparecimento de dois nomes diferentes para

Deus no relato da criação (hwhy e ~yhil{a/). A partir disto, postulou a existência de duas fontes distintas no Gênesis. Se Witter tivesse ampliado a sua constatação, ele teria sido o fundador da teoria das fontes;

crítica histórica: parte da necessidade de se verificar o "Sitz im Leben".

Jean Astruc era médico do rei francês Luiz XV, filho de pastor

convertido ao catolicismo e biblista (1684-1766). Ele também constatou a dupla formulação dos nomes divinos no Pentateuco e emitiu a hipótese da existência de três fontes (memórias), que, combinadas, teríam conduzido à formação do texto atual. Partindo da mudança dos nomes divinos, Astruc dividiu o livro do Genesis em duas fontes principais: fonte A = Elohim e fonte B = YHWH.

 Com exceção da dualidade dos nomes divinos, antigos estudiosos já se mostravam atentos à existência das duplicatas e das tensões narrativas nos relatos:

> dois relatos da criação: Gn 1,1-2,4a e 2,4b-25;

> dois relatos da manifestação divina a Moisés: Ex 3,1-4,17 e 6,2-7,7. > a discordância de dados e cifras no relato do dilúvio: Gn 6-9.

Johann Gottfried Eichhorn (1752-1827), a partir da observações

de Astruc, estendeu a tese das fontes A e B e de fontes fragmentárias a todo o Pentateuco.

Wilhelm Martin Leberecht de Wette (1780-1849) destacando as relações entre algumas seções do texto num contexto histórico determinado (da-tação), associou o livro encontrado no Templo sob Josias (cf. 2Rs 22-23) com o livro do Deuteronômio. O conteúdo legislativo de Dt 12 é muito próximo das leis praticadas por Josias em 2Rs 23. Não basta distinguir os documentos, é pre-ciso datá-los, isto é, aproximar o “mundo do texto” ao “mundo real” que o ori-ginou.

Assim, a questão das fontes passou a ser a questão do devir do Pentateuco. Durante os séc XIX–XX, três modelos teóricos serão desenvolvidos para se tentar explicar a presença de dados literários com origem diversas em um único e mesmo

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relato que se apresenta de uma forma continuada, isto é, uma história da Lei de

Is-rael.

A Hipótese dos Documentos: na base do nosso Pentateuco se percebem duas, três

ou mais tramas narrativas contínuas ("fontes" ou "documentos") que, redigidas em épocas diferentes e com ideologias diferentes, teriam sido justapostas ou imbrica-das umas às outras por redatores sucessivos.

A Hipótese dos Fragmentos: é uma reação à hipótese anterior; supõe que existia

originalmente um número indeterminado de relatos esparsos e de textos isolados sem continuidade narrativa. Estes teriam sido reunidos ulteriormente por um ou vá-rios redatores-compiladores.

A Hipótese dos Complementos: admite-se inicialmente a existência de uma única

trama narrativa contínua. No curso dos séculos, esta trama teria recebido, ao longo do tempo, inúmeros acréscimos e complementos.

2.3Período "pós-crítico": o sistema de Graf-Wellhausen passa a ser atacado e pro-fundamente questionado por novos estudiosos, dando início a uma nova época de abordagem sobre o Pentateuco.

2.3.1 A elaboração da teoria dos documentos: as Quatro Fontes.

Julius Wellhausen (1844-1918) sistematizou, no final do séc. XIX, os dados dos estudos anteriores e propõe uma teoria que, mesmo conhecendo retoques nos decênios posteriores, será aceita em suas linhas gerais até 1975.

Wellhausen distingue três documentos sucessivos. A fusão destes está na

ori-gem do Pentateuco: um documento Jehowista (JE) é o mais antigo, pré-exílico (fins do séc. VIII a.C.), o Deuteronômio (Dt) relacionado com a época de Josias e um documento sacerdotal (P = Priestercodex) de época exílica/pós-exílica, que é, essencialmente, o autor das partes legislativas do Pentateuco.

Obs 1: o Jahwista (J) e o Elohista (E), segundo Wellhausen, não são fontes de fácil reconstrução. Elas passaram por muitas fases e mãos antes de assumir a sua forma atual. O JE é o resultado final da fusão do J e do E, mas separá-las não é possível. Obs 2: O Sacerdotal (P) é uma compilação de documentos: Ph Heiligkeitsgesetz ou lei da santidade (cf. Lv 17–26), Pg Grundschrift ou escrito fundamental (narrativa

da criação Gn 1,1–2,4a; história dos patriarcas, pragas do Egito e Ex 24,15b-40,38 e livro dos Números até a Morte de Moisés e a conquista da Terra Prometida), Ps Supplement ou suplementos diversos (lei sobre os sacrifícios, cf. Lv 1–7, a lei da

pureza e várias normas contidas no livro dos Números).

O primeiro (JE) e o terceiro (P) abarcam de Gênesis até o final do Tetrateuco (Nm), o segundo é o Deuteronômio. Wellhausen propõe que se fale de um Hexa-teuco ao invés de um PentaHexa-teuco, pois há um projeto historiográfico até Josué. Esta opinião será seguida por G. von Rad e não será contestada até os trabalhos de Mar-tin Noth.

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A hipótese documentária de Wellhausen [JEDP] será retomada e completada. Por um lado, se assiste uma tentativa de dar precisão à definição e à delimita-ção das fontes de Wellhausen. Os documentos Jahwista (J) e Elohista (E) passam a ser distinguíveis. No próprio seio do documento Jahvista se delimitam dois estra-tos: uma fonte considerada “laica” (Laienquelle – L) e uma outra fonte de releitura

J2.

Por outro lado, mesmo que a teoria de Wellhausen não inclua dados relativos ao período pré-literário ou às tradições orais de Israel da época pré-monárquica, a investigação da primeira metade do séc. XX se desenvolverá neste sentido, com as pesquisas de Hermann Gunkel (1862-1932)5, Albrecht Alt (1883-1956), e, mais

tar-de, com os trabalhos de Gerhard von Rad (1901-1971) e Martin Noth (1902-1968). Os dois últimos elaborarão a hipótese documentária na sua forma mais acaba-da. Salvo as divergências relativas à delimitação do Pentateuco: Hexateuco para G. von Rad e Tetrateuco para M. Noth, os dois estudiosos convergem no enfoque so-bre a história da composição do texto.

Para G. von Rad, seguidor do método da história das formas, o núcleo original do Hexateuco está preservado nos “credos históricos”: Dt 26,5b-9; 6,20-24; Js 24,2b-13. Este é o elemento estável. O “credo histórico” pode ser considerado como sumário da história salvífica celebrada com caráter de profissão de fé.

No epicentro destes credos se encontram os temas do êxodo e do dom da terra

prometida. A pré-história patriarcal se percebe na tênue menção ao “meu pai era um arameu errante”. A raiz destes credos é cultual e se dava na festa das Semanas,

quando se apresentavam as primícias, e estaria relacionada com a festa da Aliança em Siquém (cf. Dt 16,16)6. Estes temas da tradição foram se desenvolvendo,

for-mando pequenas unidades literárias e recebendo elaboração e aprofundamento teo-lógico.

Js 24,2b-13 é um olhar retrospectivo para os fatos que compõem a história e não é uma criação literária autônoma, mas evolução de uma forma já estavelmente evoluída (isto lembra a teoria da composição). Neste texto, porém, não há alusão

5 Simultaneamente ao aparecimento das obras fundamentais de Wellhausen, uma outra "escola" começa a

surgir, a Religionsgeschichte ("história das religiões").

Gunkel vai se interrogar sobre a natureza dos relatos, dos ciclos e dos conjuntos literários que se encontram, segundo ele, por detrás das fontes reconhecidas pelos críticos. Aplicando especialmente em seus trabalhos sobre o Gn e os Sl, vai fundar a Formegeschichte ("história das formas") fundamental para os gêneros literários.

Wellhausen e sua escola, admitindo o aporte das fontes escritas anteriores, consideravam os autores das fontes como ESCRITORES, Gunkel os concebe como COLECIONADORES de relatos populares, de ciclos de lendas e de tradições orais, que estão enraizadas em um contexto sociológico particular e até numa situação precisa. Na base dos colecionadores está a Tradição Oral.

6 Era celebrada sete semanas depois da festa da Páscoa (cf. Nm 28,26; Dt 16,9-10). Originalmente era a

fes-ta da colheifes-ta (cf. Ex 23,16) na qual se ofereciam as primícias do pão feito com o novo grão. No judaísmo posterior à conquista de Alexandre Magno, começou a ser chamada de Pentecostes, isto é, cinqüenta dias após a Páscoa e se torna o dia memorial do dom da Aliança e da Lei no Sinai.

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aos fatos do Sinai e denota que o esquema tradicional ou fundamental não permitia uma mudança essencial. A primeira alusão ao Sinai neste esquema aparecerá em Ne 9,6-15, mas este é obra do Cronista e se inspira na narrativa sacerdotal (Ex 24– 40).

Para von Rad, existem quatro grandes tradições ou ciclos tradicionais que se desenvolveram em torno do credo cultual e para o qual convergem vários outros temas subordinados. Os quatro ciclos são: a tradição do êxodo e da conquista, a

tradição do Sinai, a história dos patriarcas e a história das origens. O Sitz im Le-ben destas tradições é o culto.

A empresa literária, que reuniu num escrito as tradições dispersas do povo, aconteceu no início da monarquia, quando já se verificam sinais de crise em certas práticas cultuais que coincidia, de certo modo, com o surgimento do desejo de mai-or estabilidade estatal. São os indícios de amadurecimento dos tempos em que se dará a passagem de um sistema tribal para o sistema monárquico.

Em última análise, o Jahwista, do século X a.C., foi o primeiro grande compi-lador das tradições, e incluiu na sua obra as novas tendências. O Elohista, que vem dois séculos depois, é mais apegado às antigas tradições que o Jahwista, principal-mente devido à atividade dos profetas Elias e Eliseu. O Deuteronomista é um reto-cador de índole barroca, que deve a sua forma literária singular ao culto. O

Sacer-dotal não é uma simples obra narrativa, mas um complexo teológico que engloba

diversas épocas de atuação sacerdotal. Esta última obra é de cunho doutrinal e o que coloca na sua narrativa histórica é fruto dos ensinamentos divinos.

O Hexateuco é o resultado da confluência destes quatro documentos-fontes que buscou conservar as características de cada um. É preciso levar em considera-ção e não esquecer que o Hexateuco é uma obra conjunta, fruto de várias épocas e autores, com muitas tradições e teologias que confluíram na sua elaboração final.

A base do Hexateuco são as festas religiosas e os credos históricos que as rit-mava, centrada nos temas da conquista e do Sinai. As profissões de fé serviram de moldura para que as diversas tradições fossem sendo inseridas. As obras redacio-nais que foram surgindo mantiveram e delinearam o Hexateuco como um docu-mento de fé.

Para M. Noth, diversas tradições geram várias fontes. As tradições orais, antes de serem consignadas por escrito, tiveram uma longa história. A sua contribuição se refere essencialmente a três pontos:

a- A delimitação do Pentateuco: prefere um Tetrateuco a um

Hexateuco;

b- A fonte "P" possui um caráter mais de relato que de Lei; c- A história pré-literária: o Pentateuco foi construído a partir

de tradições orais que foram re-agrupadas em torno de cinco grandes temas narrativos fundamentais:

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dois temas principais: Êxodo do Egito e entrada na terra de Canaã; depois, a promessa feita aos patriarcas (para explicar o sentido dado à conquista), a condu-ção do povo através do deserto (luta pela sobrevivência: aqui se encaixa a sua teo-ria Anficcionista7, isto é, a confederação das 12 tribos) e a revelação no Sinai.

Segundo M. Noth, o tema da conquista desapareceu por ocasião da redação final. A estes temas fundamentais foram sendo enriquecidos com outras tradições secundárias: as pragas do Egito e a celebração da páscoa; episódios da conquista,

a presença de Jacó em Siquém e na Transjordania, Isaac e Abraão, o Sinai como montanha de Deus e a presença dos madianitas.

Foi no início da época monárquica que, pela primeira vez, as tradições orais foram colocadas por escrito por um autor – o Jahwista – que é o responsável pelo surgimento do primeiro documento. O específico dos diferentes documentos, as re-lações de dependência que alguns mantiveram entre si e os processos que conduzi-ram à sua fusão literária podem ser esquematizados, na teoria documentária clássi-ca, da seguinte maneira:

A) O documento Jahwista (J) data dos inícios da monarquia (séc. X a.C.). O Jahwista é um escritor/redator do sul (Jerusalém) que desenvolve uma ideologia monárquica. Pode-se atribuir ao “J” textos como Ex 2,1-10 ou Gn 18. Moisés e Abraão – mediadores eleitos por Deus – representam nestes relatos a futura e em-blemática figura do rei.

B) O documento Elohista (E) vem do reino do norte8 (séc. IX-VIII a.C.). Esta tradição é mais reservada no que diz respeito à monarquia e retoma teses teológi-cas relacionadas com os profetas do reino do norte.

C) Os documentos Jahwista e Elohista foram fundidos provavelmente depois da queda do reino da Samaria (721a.C.) e de israelitas em fuga para Judá. Unidos, formarão o documento Jehowista (JE).

7 Anficcionia: M. Noth e von Rad tentaram identificar o contexto vital (Sitz im Leben) no qual se

produziu o nascimento e o desenvolvimento das tradições orais do Israel pré-monárquico. A liturgia constitui, para estes autores, o marco específico da proclamação das tradições orais. O relato da aliança de Siquém (cf. Js 24), seria o reflexo de uma prática litúrgica pela qual as tribos de Israel proclamam sua história comum de salvação e selam novamente a aliança. A história comum está condensada nos credos históricos: Dt 6,21-23; 26,5-9; Jos 24,2-13, que seriam os antigos núcleos narrativos a partir dos quais se teria desenvolvido o Pentateuco. As tribos teriam formado uma anficcionia, comunidade sacral unida pela adoração ao Senhor e para manter um santuário comum.

Na Grécia antiga, uma anficcionia era a associação cultual sagrada de várias cidades vizinhas. Os limites desta teoria estão no fato de transplantar para o Israel pré-monárquico uma prática sócio-religiosa helenista estranha à cultura semítica. (Para um aprofundamento, veja-se G. von RAD, Teologia do Antigo Testamento, vol. I-II, Aste, São Paulo 1973 (nova edição em um único volume).

8 O reino unido se dividiu: o norte ficou com Jeroboão (Israel com capital em Samaria) e o Sul com

Roboão (Judá com capital em Jerusalém) após a morte do rei Salomão (cf. 1Rs 12). O reino do norte foi destruído por Sargão II em 722/721a.C. (cf. 2Rs 17).

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D) O deuteronomista (D) faz sua aparição durante o reinado de Josias, no final do século VII a.C., por ocasião da descoberta do livro da Lei. A sua inspiração vem deste livro que pautará toda a reforma empreendida por Josias.

E) O documento sacerdotal (P, de Priesterschrift, escrito sacerdotal, ou me-lhor, Pg, Priesterschrift Geschichte, história sacerdotal) é, originalmente um relato

independente, com teologia específica e sua fonte narrativa está representada pelo documento Jehowista. O P Teria sido redigido durante os anos do exílio em Babi-lônia pelos círculos sacerdotais deportados de Judá (597 a.C.).

F) O documento sacerdotal recebeu, após do exílio, suplementos legislativos

(Ps).

G) O documento sacerdotal e o documento JE foram fundidos para formar o

Tetrateuco (JEP).

H) O Tetrateuco e o Deuteronômio se fundem e formam o Pentateuco (JEDP). Eis o prospecto esquemático:

FONTES ORAIS e ESCRITAS ↓ ↓ ↓ ↓ 922 a.C. [ J ] [ E ] ↓ ↓ 722 a.C. [ JE ] [ D ] + + [ P ] 538 a.C. ↓ ↓ ↓ [ J E P D] 400 a.C.

2.3.2 Na origem das novas hipóteses

Até mesmo os que ainda defendiam o modelo de Wellhausen começaram a ver, com uma clareza cada vez maior, as dificuldades e aporias (conflito de opões) que tal modelo tinha na aplicação de seus princípios. O modelo foi criado, ini-cialmente, para explicar a composição de Gênesis e Ex 1–15 e depois foi aplicado a todo Pentateuco, porque era aceito, por hipótese, que a  formava um todo único.

H. Gunkel, M. Noth e G. von Rad, que trabalhavam com os métodos da

Formgeschichte (história das formas) e da Überlieferungsgeschichte (história das

tradições), começaram a pesquisar o percurso histórico-literário das fontes, pois identificaram tais falhas no modelo de Wellhausen. Eles aceitando as fontes como

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origem do Pentateuco, chegaram a três interessantes observações com seus estu-dos:

a) No começo da formação das tradições existem pequenas narrativas com diferen-tes Sitz im Leben (contribuição de H. Gunkel);

b) Os diferentes temas de tradições (Abraão, Êxodo, Sinai etc) tiveram uma origem regional e histórica diferentes (contribuição de M. Noth);

c) A reunião dos diferentes temas de tradições independentes foi realizada no culto pré-estatal. A fonte mais antiga, «J», teria sido uma construção literária dessas tra-dições cúlticas (contribuição de von Rad).

2.3.3 Limites apontados sobre a teoria dos documentos

O modelo de Wellhausen foi aceito até os anos 70, apesar de todos os proble-mas que tinha para explicar e determinar a posição e enquadramento dos diversos textos dentro das fontes. Nos últimos trinta anos, a teoria dos documentos-fontes deixou de ser o orgulho da exegese moderna e começou a receber diversos questio-namentos e ataques que tornaram patentes as fraquezas metodológicas e ideológi-cas deste sistema.

Na crítica ao modelo de Wellhausen surgiram alguns pontos em comum entre os exegetas. Em primeiro lugar, percebeu-se que em vez da mecânica fragmenta-ção dos textos para atribuí-los às diferentes fontes, era necessário levar em conta

o processo vivo da formação das tradições (cf. von Rad e M. Noth).

Nesta linha, alguns exegetas começaram a aceitar, além das fontes, os

proces-sos de redação como forças paralelas que, tendo estilo, linguagem e perspectivas

teológicas próprias, contribuíram também na formação do Pentateuco. Outros exe-getas preferiram abandonar totalmente a teoria dos documentos-fontes e reassumir o modelo dos ciclos de tradições (fragmentos) ou o modelo de um escrito básico (complementos).

 A teoria dos documentos recebera em 1938 os seus primeiros e fortes ataques. Para certos estudiosos, a dificuldade para se distinguir os documentos «J» e «E» fez com que se questionasse a necessidade de se admitir a existência da fon-te «E» como sendo um documento separado e autônomo.

Por exemplo, W. RUDOLPH e P. Volz constataram que os elementos classica-mente reunidos debaixo da designação Elohista não constituíam uma trama narra-tiva contínua, coerente e homogênea. Eles começaram, então, a negar a existência de um documento que corresponda à fonte Elohista.

 Outros estudiosos afirmam que a teoria dos documentos ou modelo das fontes na prática funciona “bem”, como método, no livro de Gênesis e na primeira metade do livro do Êxodo (cf. Ex 1–15), mas fracassa quando aplicado ao restante dos textos. Ao lado disto, mais da metade do material contido no livro dos Núme-ros não poderia ser estudado segundo o modelo de Wellhausen. O próprio M. Noth

(13)

reconhece que o livro dos Números é uma composição a partir de tradições dife-rentes.

 Ao compararmos o estudo de dois exegetas sobre o material atribuído às fontes «J», «E» e «P», percebe-se, claramente, que não existe entre eles uma correspondência.

Os credos históricos (cf. Dt 6,21-23; 26,5-9; Js 24,2-13), considerados como sendo os antigos núcleos de tradições orais por von Rad, se tornam objetos de uma nova avaliação crítica e passam a ser atribuídos aos autores deuteronomis-tas. Isto leva a supor uma datação muito mais tardia para estas passagens.

 Outra crítica feita à teoria dos documentos diz respeito à delimitação e à datação do documento Jahwista. Não parece possível alcançar nenhum consenso quanto à delimitação exata deste documento. Os séculos X-IX a.C. não ofereceri-am as condições necessárias para que surgisse uma teologia da história que abar-casse um arco temporal tão abrangente.

Martin Rose9, por exemplo, considera que o relato Jahwista é posterior ao

re-lato de Dt 1-3 (que é seu paralelo). Por isto, situa o Jahwista em uma época mais tardia e não nos inícios da monarquia unida com Davi.

Logo, o «J» veio depois do «Dt» e compôs a sua historiografia andando para trás. O «J» reconstrói a história, da criação à morte de Moisés com as tradições orais e escritas existentes (teoria dos complementos). O «J» atuou e escreveu de-pois do Deuteronômio o que aconteceu antes dele, isto é, antes da conquista. Para M. Rose, o «J» seria uma síntese e ele seria o «pai» da teologia da história do Pen-tateuco.

M. Rose desenvolveu as suas teorias à luz das intuições do seu mestre Sch-mid10. Reconheceu que o núcleo de «Dt» seria pré-exílico (Dt 12-26). Ele também

contesta a datação salomônica para o Jahwista e encontra que a tese tradicional «J» «E» «D» «P» é demasiada simplória para explicar a formação do Pentateuco11.

9 Cf. PURY, A. de, O Pentateuco em questão, Vozes, Petrópolis 1996, 65-67; 100-117.

10 M. Rose foi discípulo de H. H. Schmid (cf. PURY, A. de, O Pentateuco em questão, 297-322), que

contestou as hipóteses de G. von Rad e de M. Noth no que diz respeito a redação do pentateuco. Foi o primeiro a dirigir seu ataque ao consenso – dos documentos – como um todo. Ele se aproxima de Rendtorff no conjunto das suas várias hipóteses, diferenciando-se a propósito do seu trabalho de base: onde Rendtorff abordava em seus estudos as “unidades mais largas”, Schmid retarda o processo e a época da colocação destas unidades para o “círculo deutreronomista”.

11 O Jahwista, pós-exílico, é visto sob o ângulo dum processo de redação e interpretação do depósito

deixado sobretudo para o desenvolvimento do material tradicional da época pré-exílica. Este material não procede para Schmid de um teólogo no sentido que von Rad entendia, mas por um processo redacional e interpretativo. Ele conclui, portanto, a existência de um teólogo javista, mas situa-o na época exílica ou pós-exílica (contrário a von Rad que o situava na época de Salomão). Isto porque, para Schmid, a

maior parte dos textos identificados como sendo «J» têm, com efeito, um parentesco estreito com a literatura dt/dtr. Além disso, ele apresenta como argumento, que a maior parte das tradições,

aparentemente fundamentais no Pentateuco, não são nunca mencionadas nos textos pré-exílicos, especialmente entre os profetas dos séculos VIII-VII a.C. Todavia, Schmid não conseguiu apresentar um modelo explicativo que fosse realmente novo e capaz de substituir o modelo dos documentos-fontes (cf.

(14)

Para M. Rose, a questão da redação do Pentateuco sempre ficou por conta da determinação quanto às fontes, fazendo com que os critérios do trabalho científico fossem obtidos a partir das observações do livro do Gênesis. Com isso, grandes es-forços foram feitos para seguir de perto os “documentos” descobertos neste livro.

Todavia, pode-se dizer que se os diferentes elementos dos novos rumos da pesquisa questionaram este ou aquele aspecto da teoria documentaria (datação, na-tureza e delimitação dos documentos), mas não a debilitam em seu princípio.

Uma nova aproximação sincrônica12 no estudo do Pentateuco levou ainda

mais, a partir de 1975, ao questionamento da eficácia do modelo documentário. Com efeito, a teoria documentaria privilegiou, na análise do texto, um caminho que consiste em delimitar documentos que se estendem desde o princípio até o fi-nal do Tetrateuco, ou do Pentateuco, ou do Hexateuco e que provêm de épocas, meios e ambientes diferentes: trata-se de um caminho, a priori, diacrônico.

Numa aproximação, porém, meramente sincrônica, se nos interessarmos pela coerência narrativa dos documentos assim delimitados, surgem novos problemas.

Como resolver, por exemplo, a cisão que separa o ciclo das origens (Gn 1-11) da história dos patriarcas (Gn 12-50)? Verifica-se que a leitura de Gn 12-50 não exige, necessariamente, o conteúdo que lhe precede. Em Gn 12 parece realmente que temos o começo de um novo relato com a aparição do personagem de Abraão.

A relação entre Gn 12–50 e Gn 1-11 está assegurada somente por uma genea-logia (Gn 11,10-32), cuja origem é sacerdotal «P», e que todos reconhecem.

O mesmo poder-se-ia dizer a propósito da cisão entre Gn 50 e Ex 1. O suma-rio histórico de Ex 1,1-17 que assegura a transição entre estes dois conjuntos narra-tivos mostra que estes textos poderiam ser considerados independentes um do ou-tro. Com isto se questiona: é possível seguir falando de documentos na formação do Pentateuco?

Em relação à camada textual, que se baseia em uma teologia sacerdotal e, por isso recebeu a sigla «P» datada entre 550 e 400 a.C. há um certo consenso entre os exegetas. A discussão sobre se essa camada, contudo, postula se ela seria obra de um único autor ou de um círculo de autores, se deve ser considerada uma fonte, isto é, uma obra independente, ou se é apenas uma camada redacional ainda conti-nua aberta. Diante do consenso básico sobre a existência desse escrito ou camada R. DAVID, Le Pentateuque: Tendances actuelles concernant les traditions littéraires, in LD 163: ACEBAC, “De Bien des Manières”: La Recherche Biblique aux abords du XXIe Siècle, FIDES et CERF, 1995, 28-30).

12 Existem dois tipos diferentes de abordagem do Pentateuco na exegese moderna: diacrônico e

sincrônico. No tipo diacrônico utiliza-se o método exegético da Redaktionsgeschichte (história da

redação). Neste método, o processo de composição do Pentateuco é visto a partir das diversas camadas

redacionais, que foram usadas na composição do atual Pentateuco. É de fato um processo analítico,

diacrônico e histórico. No tipo sincrônico se utiliza, em vez da crítica de tipo histórico, os instrumentos

da crítica estilística e literária. A abordagem do Pentateuco se inicia pela redação final do Pentateuco. É de fato um processo sintético, sincrônico e literário.

(15)

sacerdotal, deve-se dar uma certa prioridade na pesquisa do Pentateuco a esse con-senso e distinguir uma camada Sacerdotal e uma camada não-sacerdotal.

Uma futura teoria sobre a composição do Pentateuco deve considerar, mais do que se fez até hoje, o processo de composição das diferentes camadas do Pentateu-co dentro do Pentateu-conjunto do AT, especialmente dos livros Js–2Rs e dos Livros Profé-ticos. Ao mesmo tempo, uma nova teoria deve dar uma atenção maior ao processo de composição das diferentes coleções legais (Código da Aliança, Leis Deuteronô-micas, Código de Santidade etc.).

Não temos como objetivo oferecer uma visão exaustiva sobre as novas hipóte-ses de investigação relativas à história da composição do Pentateuco. As hipótehipóte-ses desenvolvidas por R. Rendtorff e E. Blum são agora privilegiadas na medida em que renovaram profundamente a aproximação literária ao Pentateuco.

Rendtorff, ao constatar as poucas relações que uniam as diferentes subunida-des narrativas que compõem o Pentateuco, emitiu a hipótese de que estas subuni-dades constituíram primeiramente tradições escritas que foram transmitidas inde-pendente-mente umas das outras. Ele chama estes conjuntos tradicionais de gran-des unidagran-des literárias (história das origens, história dos patriarcas, Moisés e o êxodo do Egito, o Sinai, a caminhada pelo deserto e a conquista da terra)13. A

rela-ção entre estas grandes unidades teria sido assegurada por duas composições tardi-as e pós-exílictardi-as. Assim, para compreender a história da composição literária do Pentateuco, Rendtorff substitui o modelo dos documentos-fontes pelo modelo dos

fragmentos.

E. Blum se interessa pela segunda parte da hipótese de Rendtorff. Ele averi-gua sobre o processo de composição que conduz ao entrelaçamento das grandes unidades literárias. Blum, no seu estudo, identifica duas composições sucessivas: a) composição KD (komposition em alemão), que mantém certa familiaridade com

a teologia deuteronômica-deuteronomista, sem, contudo, se reduzir a ela.

b) composição KP («P» = sacerdotal), de época mais tardia e que tomou como ponto de partida a composição KD, completando-a e modificando-a.

Esta teoria busca mostrar que a última fase da composição do Pentateuco é o resultado do diálogo entre dois grupos principais – o sacerdotal e o

deuteronomis-ta (leigo) – apresendeuteronomis-ta, porém, vários problemas:

 Por um lado, o texto do Pentateuco é repartido somente entre as duas composições que Blum acredita poder identificar. O caráter limitado desta elei-ção pode conduzir a subestimar a complexidade do processo de composielei-ção do Pentateuco e a recair nas mesmas dificuldades e críticas que foram feitas à teo-ria documentáteo-ria.

(16)

 Por outro lado, Blum reconhece a existência dum escrito sacerdotal in-dependente, o que parece contradizer os dados da análise literária de alguns tex-tos.

 Enfim, mesmo incluindo o manifesto interesse literário e teológico das últimas etapas da composição do Pentateuco (pós-exílicas), a crise da teoria documentária deve conduzir o exegeta a renunciar a novas hipóteses literárias relativas ao período pré-exílico?

3. Estado atual da investigação e questões em debate

Os estudiosos concordam e reconhecem a existência plausível de antigas tra-dições escritas pré-exílicas, que proporcionaram o surgimento das fontes, a partir das quais foram compostos os escritos mais tardios, de época exílica e pós-exílica.

Todavia, depois do exílio, os textos do Pentateuco refletem o diálogo ou o de-bate entre duas diferentes correntes teológicas: a Teologia Deuteronomista e a Te-ologia Sacerdotal. Sobre elas, pergunta-se: é possível alcançar uma maior precisão sobre estas duas teologias? Pode-se chegar a um consenso mínimo entre as duas?

1) É possível avançar em hipóteses mais precisas quanto aos textos an-tigos?

2) Os textos sacerdotais formaram um documento independente ou seria melhor falar em composição sacerdotal?

3) Que abarca, exatamente, o adjetivo deuteronomista?

4) Como se processou afinal a formação do texto definitivo do Pentateuco?

3.1 Hipóteses mais precisas sobre os textos mais antigos?

É difícil dizer se as antigas tradições narrativas circularam independentemente umas das outras ou foram re-agrupadas em uma ou várias coleções (ou documen-tos).

Estas tradições expressam teologias diferentes (monárquicas e antimonárqui-cas) e, por isso, provêm de ambientes e meios diversificados (cortesãos, proféticos, laicos, cultuais etc). Erich Zenger acredita que, inicialmente, várias tradições foram re-agrupadas no seio de um único documento já no final do séc. VIII a.C., denomi-nado Obra Jerusalimitana de História14.

No que diz respeito aos textos de cunho legislativo, a coleção mais antiga está representada pelo Código da Aliança (cf. Ex 20,22–23,19).

Por último, o núcleo mais antigo do Deuteronômio é exclusivamente legislati-vo: é o Código Deuteronômio. Utiliza como fonte literária as leis do Código da

(17)

Aliança e poderia ser contemporâneo do reinado de Ezequias, rei de Judá entre

716-687 a.C.

3.2Textos sacerdotais: documentos ou composição?

A análise diacrônica do Tetrateuco (Gn – Lv), por um lado, permite aceitar a existência de relatos sacerdotais independentes ou autônomos. O conjunto destes relatos parece formar uma trama narrativa muito coerente:

à história sacerdotal das origens (Gn 1,1–2,4a) segue-se o relato sacerdotal da queda e o castigo da humanidade, continuada, por sua vez, pelo relato da primeira aliança proposta por Deus a Noé (cf. Gn 6,5–9,17P)15. Depois, a história sacerdotal

apresenta a aliança com Abraão (Gn 17 P), a revelação do nome de YHWH a

Moi-sés (Ex 6-7P), a saída do Egito (Ex 14P), o dom do maná (Ex 16P), a desobediência

do povo no deserto (Nm 13-14 P; 20,1-13 P), e por último a chegada aos limites da

terra prometida, com a devida entrada em Canaã, no princípio do livro de Josué. Esta lista não pretende ser exaustiva, mas tão somente mencionar as principais articulações do relato sacerdotal, manifestando assim que aparece formado por dois ciclos narrativos, cuja estrutura é paralela: dom de Deus, desobediência do

homem, renovação da relação entre Deus e os eleitos (Gn 1–9P, depois Gn

12ssP)16. Estes dados literários advogam pela existência de um escrito sacerdotal

in-dependente.

Por outro lado, outras tradições sacerdotais parecem ter sido integradas em composições literárias complexas que articulam textos sacerdotais e textos não sa-cerdotais. É o caso do conjunto Ex 24,15b–40,38. Assim, a existência de um escri-to sacerdotal independente não contradiz a existência de composições sacerdotais. A formação do Pentateuco aparece demasiadamente complexa para que um único modelo teórico possa chegar a abarcá-la totalmente, pois a cada seção do texto lhe corresponde uma história literária específica. Os resultados obtidos para uma perícope determinada não podem ser generalizados.

Concluindo, parece legítimo ficar com a hipótese da existência de um escrito sacerdotal independente que depois recebeu tradições anteriores a ele. Algumas coleções de leis sacerdotais foram integradas ao Tetrateuco, que, na sua forma de-finitiva, reflete um influxo de autores sacerdotais (composição).

3.3Que significa “deuteronomista” (Dtr)?

N. Lohfink pergunta pelos critérios que permitem atribuir um texto a autores deuteronomistas. A teologia Dtr é específica de uma época limitada: durante e de-pois do exílio babilônico. Os Dtr acrescentam alguns complementos ao núcleo an-tigo do Deuteronômio (Dt 12-26) e dão forma à historia deuteronomista (Js a 2Rs).

15 A sigla P designa as seções sacerdotais da perícope indicada.

16 Cf. N. LOHFINK, “El escrito sacerdotal y la historia”, en Las tradiciones del Pentateuco en la época del exilio (Cuadernos bíblicos 97; Estella, Verbo Divino, 1999) 9-25.

(18)

Todavia, não é possível atribuir-lhes, na base de simples critérios de seme-lhança de vocabulário e estilo com o Deuteronômio, textos mais tardios do Tetra-teuco. Na análise, é importante distinguir entre literatura deuteronomista propria-mente dita (Dtr) e releituras tardias que pressupõem semelhante literatura (releitu-ras posteriores). Algo parecido pode ser dito também a respeito da literatura sacer-dotal.

3.4A formação do texto definitivo

É difícil de se determinar, com precisão, a maneira como se articularam, por um lado, as intervenções dos autores sacerdotais, e, por outro lado, a ação dos autores deuteronomistas depois do exílio.

Quanto a isto, pergunta-se: teriam “tais autores” trabalhado de forma simultânea ou um após o outro? Pode-se falar de círculos teológicos deuteronomistas e sacerdotais ou deve-se ver, simplesmente, a ação de escribas exilados?

As opiniões a este respeito são divergentes. Seja como for, a formação do Pentateuco como um texto unificado procede quer pela intervenção dos meios deuteronomistas, quer por meios sacerdotais, supondo, igualmente, várias releituras tardias: pós-deuteronomistas e pós-sacerdotais.

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