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AS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E OS GEOPARQUES NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL

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1 REnCiMa, Edição Especial, v. 11, n.2, p. 1-10, 2020 doi.org/10.26843/rencima. eISSN: 2179-426X

AS UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E OS GEOPARQUES NO

CONTEXTO DA EDUCAÇÃO AMBIENTAL

CONSERVATION UNITS AND GEOPARKS IN THE CONTEXT OF ENVIRONMENTAL EDUCATION

Rodrigo Artur Perino Salvetti

Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocínio – CEUNSP, rodrigo.salvetti@ceunsp.edu.br

https://orcid.org/0000-0001-6430-2575

Resumo

Geoparques são áreas delimitadas, criadas com a finalidade de preservar o patrimônio natural – geológico, arqueológico, biológico – de uma região. A principal diferença entre os geoparques e outras unidades de conservação no Brasil é a integração da comunidade com a área protegida, propiciando seu desenvolvimento social e econômico a partir da exploração do geoturismo e da educação ambiental. Este trabalho tem por objetivo discutir a diferença entre as unidades de conservação previstas no SNUC e os geoparques, no conceito estabelecido pela UNESCO, e sua utilização como ferramenta de difusão da educação ambiental.

Palavras-chave: Educação Ambiental; Geoparques; Unidades de Conservação. Abstract

Geoparks are defined areas, created with the purpose of preserving the natural heritage - geological, archaeological, biological - of a region. The main difference between geoparks and other conservation units in Brazil is the integration of the community with the protected area, providing their social and economic development through the exploration of geotourism and environmental education. This work aims to discuss the difference between the conservation units provided for the SNUC and the geoparks, in the concept established by UNESCO, and their use as a tool for the dissemination of environmental education.

Keywords: Environmental Education; Geoparks; Conservation Units.

Introdução

Ao longo das últimas décadas, percebe-se uma crescente preocupação de vários setores da sociedade em relação à preservação ambiental. A criação, no Brasil, de diversas áreas de preservação ambiental, de características geográficas, geológicas e ecológicas variadas, nos diversos governos que se sucederam, resultaram em mais de 2 mil unidades de conservação, em âmbito municipal, estadual e federal (MMA, 2020), e mais de 28 mil sítios protegidos pelo IPHAN (IPHAN, 2014).

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As diversas unidades de conservação criadas no país compõem o SNUC, Sistema Nacional de Unidades de Conservação. O sistema conta com doze categorias de Unidades de Conservação (UC), cujos objetivos específicos se diferenciam quanto à forma de proteção e usos permitidos para cada área protegida (MMA, 2020). O SNUC foi concebido de forma a potencializar o papel das unidades de conservação, de modo que sejam planejadas e administradas, assegurando que amostras significativas e ecologicamente viáveis das diferentes populações, habitats e ecossistemas estejam adequadamente representadas no território nacional e nas águas jurisdicionais (MMA, 2020).

As doze categorias de unidades de conservação existentes no SNUC são suficientes para abranger boa parte dos ecossistemas brasileiros e permitir uma diversidade ampla de usos e pesquisa dessas unidades de conservação em equilíbrio com o meio ambiente. Dentre aquelas categorias figuram os parques de interesse geológico e geográfico, que possuem grande importância na conscientização ambiental e educação da comunidade e promovem a integração do homem com a natureza por meio do ecoturismo. Dentre esses podemos citar o Parque Nacional do Iguaçu, em Foz do Iguaçu (PR), o Parque Geológico do Varvito, em Itu (SP), e o Parque Estadual de Vila Velha, em Ponta Grossa (PR).

Adicionalmente, existe no Brasil uma área de relevante interesse geológico, delimitada pelo Geoparque Araripe, no Estado do Ceará. Essa denominação de geoparque não advém do SNUC, mas sim de conceitos internacionais instituídos pela UNESCO para a classificação e manutenção de áreas de interesse mundial (BOGGIANI, 2010)

Geoparques são áreas contínuas geograficamente definidas, onde ocorrem feições geológicas de relevância mundial e se pratica a geoconservação e o desenvolvimento sustentável das cidades envolvidas (UNESCO, 2019), cujos elementos paleontológicos ou arqueológicos, paisagens de apelo cênico, expressiva biodiversidade e potencial turístico existam em harmonia com as práticas de educação ambiental e desenvolvimento sustentável (ONARY-ALVES et al., 2009). Apesar de já existirem mais de cinquenta geoparques pelo mundo (BACCI et al., 2009), no Brasil apenas o Geoparque do Araripe conseguiu, até a presente data, o reconhecimento internacional da UNESCO para constar como tal.

O objetivo deste trabalho é discutir a importância dos parques geológicos e geográficos, e dos geoparques, como instrumento de desenvolvimento sustentável de uma região, colaborando com a educação ambiental e integração da sociedade ao projeto de preservação da área.

Metodologia

Este trabalho foi desenvolvido a partir de pesquisas bibliográficas de artigos, teses e dados compilados sobre os parques geológicos e geoparques em sites de órgãos

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brasileiros estaduais e federais, e sites do exterior, por ocasião do I Simpósio de Educação Ambiental – Diferentes Olhares, promovido pela Universidade Cruzeiro do Sul em Outubro de 2019.

A preservação do patrimônio geológico

As primeiras leis de proteção à natureza brasileira surgiram na década de 1930, a partir de instrumentos legais como o Código de Águas, o Código de Minas, o Decreto de Proteção aos Animais e o Código Florestal. Da mesma época é o Decreto-lei nº 25, de 1937 que regulamenta a preservação do patrimônio histórico e artístico brasileiro, definindo-o como o conjunto de bens móveis e imóveis existentes no país, cuja conservação seja de interesse público, quer por sua vinculação a fatos históricos memoráveis, quer por apresentarem excepcional valor arqueológico, etnográfico, bibliográfico ou artístico. São equiparados a esses bens os monumentos naturais, os sítios e as paisagens de feição notável com que foram dotados pela natureza ou agenciados pela indústria humana (IPHAN, 2014).

O Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional – IPHAN, foi criado em 1933 para ser o responsável pelo patrimônio cultural brasileiro. Este instituto, atualmente vinculado ao Ministério da Cultura, tem por finalidade institucional a proteção, fiscalização, promoção, estudos e pesquisas do Patrimônio Cultural Brasileiro (IPHAN, 2014), bem como a coordenação da execução da política de preservação, promoção e proteção do patrimônio em consonância com as diretrizes do Ministério da Cultura (DELPHIM, 2009). O interesse do IPHAN pelo patrimônio geológico foi demonstrado imediatamente após sua criação, com a promoção sistemática de tombamentos de bens de valor geológico, geomorfológico, espeleológico em todo o país (DELPHIM, 2009). Os locais inicialmente escolhidos eram aqueles de grande relevância cultural e turística, como os morros do Pão de Açúcar e os penhascos do Corcovado e Pedra da Gávea na cidade do Rio de Janeiro; as rochas sobre as quais foram erigidas igrejas, como as de Nossa Senhora da Penha no bairro da Penha e de Nossa Senhora da Pena em Jacarepaguá, também no Rio de Janeiro; o pico Dedo de Deus, em Teresópolis (RJ) e os penhascos da Ilha Fernando de Noronha (PE); além do tombamento de todo o município de Porto Seguro (BA) e da região do Monte Pascoal, considerada a primeira porção de terra a ser avistada pelos descobridores do Brasil; as serras de Monte Santo na Bahia e do Curral em Belo Horizonte, dentre tantos outros (IPHAN, 2014).

É notável aqui que muitos dos processos de tombamento aplicados privilegiaram aspectos paisagísticos ou históricos, sem considerar, de forma explícita, fatores científicos atinentes à geologia (DELPHIM, 2009).

A partir da Constituição de 1988, a definição do que é considerado patrimônio cultural e natural brasileiro foi ampliado, se tornando mais completa e abrangente. No artigo 216, que trata sobre a cultura nacional, consta que “constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em

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4 REnCiMa, Edição Especial, v. 11, n.2, p. 1-10, 2020 conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem: I - as formas de expressão; II - os modos de criar, fazer e viver; III - as criações científicas, artísticas e tecnológicas; IV - as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico”.

Embora a Constituição não mencione de forma tão explícita o reconhecimento do patrimônio geológico quanto o faz com o patrimônio paleontológico, percebe-se sua inclusão, de forma implícita, na abrangente referência ao valor científico. A partir de então, os novos processos de tombamentos de sítios de interesse geológico e arqueológico passaram a fundamentar-se em bases científicas, estabelecidas pela Comissão Nacional dos Sítios Geológicos e Paleobiológicos – SIGEP, órgão do DNPM incumbido de reunir os diversos órgãos ou instituições com função, afinidade ou interesse nos sítios geológicos e paleobiológicos do Brasil (SIGEP, 2011).

As unidades de conservação

Conjuntamente à constatação da necessidade da preservação do patrimônio histórico brasileiro, surgiram também, ainda na década de 1930, as primeiras unidades de conservação ambiental (SOUZA, et al., 2011). O primeiro planejamento do sistema de unidades de conservação, porém, foi elaborado somente nos anos 1970 pelo então IBDF – Instituto Brasileiro de Defesa Florestal, sob o título de “Plano do Sistema de Unidades de Conservação do Brasil”. Na ocasião o país possuía apenas dezoito parques nacionais e oito reservas biológicas (PÁDUA, 2011). Em 1982 foi sancionada pelo governo a segunda etapa desse plano, já sob o título de Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC. Ficava evidente, na ocasião, que o país precisava regulamentar o sistema, criando categorias de unidades de conservação e estabelecendo os objetivos gerais de conservação da natureza de cada uma delas (PÁDUA, 2011) sobretudo as que não se enquadravam nas legislações então em vigor (principalmente o Código Florestal de 1965 e a Lei de Proteção à Fauna de 1967).

Após extensas discussões, foi publicado em 1989 o “Sistema Nacional de Unidades de Conservação - SNUC, Aspectos Conceituais e Legais” pelo IBAMA e FUNATURA (SOUZA et al., 2011) contendo uma proposta de Lei para que o sistema de unidades de conservação tivesse a base legal suficiente para ser posto em prática em sua plenitude (PÁDUA, 2011).

Foram aprovadas, segundo as leis do SNUC, categorias de manejo divididas em dois grandes grupos, as Unidades de Proteção Integral e as Unidades de Uso Sustentável, com características específicas (MMA, 2019). As de uso indireto dos recursos naturais, são cinco, sendo elas: Estação Ecológica, Reserva Biológica, Parque Nacional, Monumento Natural e Refúgio de Vida Silvestre e sete categorias de uso direto dos recursos naturais, que são: Área de Proteção Ambiental, Área de Relevante Interesse

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Ecológico, Floresta Nacional, Reserva Extrativista, Reserva de Fauna, Reserva de Desenvolvimento Sustentável e Reserva Particular do Patrimônio Natural. Muitas dessas categorias de manejo têm objetivos bem similares, como as Reservas Biológicas com as Estações Ecológicas, as Reservas Extrativistas com as Reservas de Desenvolvimento Sustentável, as Áreas de Relevante Interesse Ecológico com os Refúgios de Vida Silvestre. Outras são de domínio privado, como as Áreas de Proteção Ambiental e as Reservas Particulares do Patrimônio Natural, embora estas últimas tenham caráter de perpetuidade.

Parques X Geoparques

Após a criação do Geoparque do Araripe no Ceará, o primeiro em todo o continente americano a ser reconhecido pela UNESCO no ano de 2006 (OLIVEIRA, 2014) o conceito de geoparque passou a ser mais discutido em nosso país (BOGGIANI, 2010). Para a UNESCO, um geoparque é uma área delimitada que tenha significativas exposições geológicas, paleontológicas ou geomorfológicas, que seja grande o suficiente para o desenvolvimento sustentável e que haja uma população no seu interior que, necessariamente, deverá ser beneficiada com sua criação (UNESCO, 2019). Essas áreas devem ser necessariamente locais com dimensões suficientes para abarcar a integração de todas essas características (biodiversidade, geodiversidade e cultura), podendo, às vezes, ultrapassar limites estaduais. Essa junção de características, consequentemente, acaba por propiciar aos visitantes conhecimento para que seja desenvolvida a educação ambiental e patrimonial, despertando neles a consciência da conservação de identidade cultural e ambiental.

Para uma área passar a integrar a Rede Global de Geoparques da UNESCO, deve seguir as recomendações do documento “Operational guideline for National Geoparks seeking UNESCO's assistance” (UNESCO, 2019).

De acordo com Oliveira (2014), o conceito de Geoparque tem foco principal na geologia de uma região, mas contempla também dois outros aspectos fundamentais, o humano e o educacional, englobando, portanto, a geoconservação, o geoturismo e a geoeducação na região, além de estimular a economia local das comunidades localizadas na área do geossítio (Brilha, 2009). Portanto, a criação de um geoparque deve, além de motivar a preservação da paisagem e da geodiversidade de uma região, inspirar a comunidade local a dar importância a seu patrimônio através do desenvolvimento da economia local por meio do geoturismo e da educação ambiental (BOGGIANI, 2010; OLIVEIRA, 2014).

É interessante notar, porém, que a modalidade de manejo de um geoparque é completamente díspar daquelas propostas nas diversas unidades de conservação constantes do SNUC. De modo geral as categorias de unidades de conservação previstas na legislação brasileira possuem forte apelo ecológico, guardando relação direta com a proteção da fauna, da flora e dos ecossistemas. Assim, é muito comum que essas áreas

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possuam ampla restrição quanto ao seu uso e exploração, de modo que muitos pesquisadores entendem que um geoparque não pode ser criado no Brasil uma vez que sua prática de manejo não está previsto no SNUC (BOGGIANI, 2010).

Dentre as categorias atualmente existentes, talvez a que mais se aproxime do objetivo de preservar esse tipo de patrimônio seja a categoria dos parques nacionais. Os parques (Nacionais, Estaduais ou Municipais) são áreas sujeitas a um uso ou ocupação especial, normalmente protegendo ecossistemas únicos e recursos ambientais de valor paisagístico (MOREIRA, 2008), que tem como objetivo a preservação integral de áreas naturais com características de grande relevância sob os aspectos ecológico, cênico, científico, cultural, educativo e recreativo, sendo proibidas as modificações ambientais e a interferência humana direta, mas permitindo o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação ambiental, de recreação em contato com a natureza e de turismo ecológico (BERNARDO, 2004). No entanto, a liberdade das comunidades eventualmente presentes nessas áreas é muito restringida pelos planos de manejo dos parques nacionais e pelas normas estabelecidas pelo órgão responsável por sua administração.

Diferentemente do proposto durante a criação de uma unidade de conservação, as bases que direcionam a criação de um geoparque são justamente, através do apelo geológico, a de promover uma nova ordem de desenvolvimento econômico para a região, atrelada à proteção ambiental (geológica e biológica) e ao resgate, valorização e preservação da cultura (BOGGIANI, 2010). Assim, apesar de os parques nacionais, como unidade de conservação, promoverem indiretamente a preservação de recursos geológicos e paleontológicos, essa categoria de unidade de conservação não possui as características gerais englobadas em um geoparque, sobretudo em relação a exploração consciente do geoturismo integrando as diversas comunidades que ali residem. Uma estratégia de geoconservação bem implementada permite a criação de riqueza através da instituição de atividades geoturísticas garantindo, simultaneamente, um recurso educativo de inegável importância social (BRILHA, 2009).

Outra vantagem de um geoparque é justamente a liberdade jurídica associada a sua criação. Quando uma unidade de conservação é criada dentro do regime do SNUC, é automaticamente atrelada a uma instituição que irá gerenciá-la, o que ocorre, na maioria das vezes, sem muita participação da comunidade diretamente afetada por sua criação. Se a unidade for federal, é o Instituto Chico Mendes de Biodiversidade o responsável por sua gestão; se for estadual, os respectivos órgãos estaduais e assim por diante (BOGGIANI, 2010). Já nos geoparques esse vínculo inexiste. Os serviços geológicos, como a CPRM (Serviço Geológico do Brasil), têm a função indutora de criação de um geoparque, mas universidades, prefeituras, ONGs e empresas privadas podem participar do processo de criação e gestão da área, com apoio do IPHAN.

É preciso ressaltar que a criação de geoparques não se contrapõe aos propósitos do SNUC, cujos conceitos se aplicam muito bem para a necessária proteção da biodiversidade (BOGGIANI, 2010). O que se pretende com os geoparques é apresentar uma nova maneira de uso do território, valorizando a participação da comunidade local, o

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que pode muito bem se aplicar para áreas de entorno de algumas unidades de conservação. É, portanto, uma proposta que pode muito bem complementar as unidades de conservação e proteção de biodiversidade do SNUC.

A geoconservação e a educação ambiental

Um dos vieses da educação ambiental atualmente a considera uma prática social transformadora, comprometida com a justiça ambiental e com o respeito às diferenças culturais e biológicas (TRISTÃO, 2012). A consciência ambiental na sociedade é alicerçada pelo seu comprometimento e preocupação com as diversas variações culturais existentes e o entendimento de seu papel no mundo.

As unidades de conservação, de maneira geral, servem como elemento para despertar a preocupação na preservação ambiental. No entanto, por serem em geral áreas de acesso e uso restrito, passam a ser pouco efetivas no entendimento do ser comum em relação ao entendimento do meio ambiente.

A criação de geoparques, porém, veio revolucionar o modo como se divulga as geociências em todo o mundo (BRILHA, 2009) e se tornou importante ferramenta de educação e conscientização ambiental. Ao integrar na estratégia de gestão de um geoparque não só o patrimônio geológico como também a biodiversidade, a arqueologia e outros aspectos da herança cultural das comunidades ali presentes, a educação ambiental como um todo, e em especial a das geociências, ganham visibilidade pública (ONARY-ALVES et al., 2015). O cidadão comum, normalmente com um baixo conhecimento sobre o meio ambiente que o cerca e qual a sua importância para a sociedade (BRILHA, 2009), tem agora a possibilidade de se aperceber do modo como a geodiversidade condiciona todo o desenvolvimento natural e humano. Uma paisagem, por exemplo, deixa apenas de ser apreciada pelo seu valor estético, mas também por aquilo que ela representa em termos de evolução dos processos geológicos, biológicos e humanos (CARVALHO, 2017).

A relação entre geoconservação e ciência é estabelecida em dois sentidos. Por um lado, a geoconservação deve ser sempre suportada e justificada nos aspectos geocientíficos que vão definir, antes de tudo, o reconhecimento de um determinado geossítio (BRILHA, 2009). Por outro lado, a geoconservação assegura a manutenção do valor científico dos geossítios, permitindo que as futuras gerações continuem a ter acesso aos melhores e mais completos testemunhos da história geológica do nosso planeta, fazendo desta forma progredir o conhecimento científico (BOGGIANI, 2010).

A importância da conservação do patrimônio geológico de valor educativo é destacada por Van Loon (2008). Este autor lembra que a crescente escassez de locais com potencial para uso educativo compromete a educação científica geral da população e, por consequência, sua conscientização ambiental. Com efeito, em algumas regiões do globo, o crescimento urbano e o desenvolvimento das respectivas estruturas de apoio têm levado à destruição de geossítios, muitas vezes por simples incúria das respectivas

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autoridades (BRILHA, 2009), prejudicando o aprendizado e a conscientização da população (VAN LOON, 2008).

Os geoparques, ao inventariar e conservar sítios com potencial educacional, passam a promover a conscientização ambiental e o desenvolvimento das comunidades ali presentes por meio do ensino das geociências e ciências correlatas, do desenvolvimento do geoturismo e da exploração sustentável da geodiversidade (DELPHIN, 2009). O simples fato de serem identificados geossítios de valor educativo já é uma relevante contribuição para o ensino ambiental, facilitando a atividade dos professores que se sentem, frequentemente, inseguros no que diz respeito a efetuar aulas de campo, e despertando em toda a comunidade o senso comum de entendimento e preservação ambiental.

O desenvolvimento de estratégias de promoção educativa recorrendo ao patrimônio geológico de uma região, com a disponibilização de guias devidamente treinados e de recursos educativos apropriados, tem-se revelado como um fator essencial para incentivar os professores a promoverem aulas de campo com os seus alunos, de diversos graus de ensino, particularmente pré-universitário (BRILHA, 2009).

Os geoparques estão em condições privilegiadas para desempenhar este papel de promotores da educação ambiental para o desenvolvimento sustentável, dirigida a todo o tipo de público (BRILHA, 2009). Construídos sobre estratégias integradoras dos diversos tipos de aspectos físicos, biológicos, patrimoniais e culturais de uma região, os geoparques conseguem demonstrar a interdependência destes aspectos, conceito essencial para o paradigma da sustentabilidade (UNESCO, 2019). Recorrendo a conteúdos apropriados de informação e interpretação, os visitantes de um geoparque podem facilmente compreender a influência da paisagem e dos aspectos geográficos e geológicos na vida de uma comunidade (DELPHIN, 2009), determinando, por exemplo, os tipos de solos presentes e suas características, o que determinará o tipo de agricultura existente e a gastronomia local. A divulgação pública das geodiversidade local só tem a beneficiar a região quando se consegue estabelecer relações diretas e indiretas, quer com a biodiversidade, com a cultura ou com outros aspectos do nosso cotidiano (BRILHA, 2009). Para tanto, são formulados projetos educacionais, geralmente aplicados na forma de museus, locais de visitação (geossítios) e ampla produção de folhetos, publicações, materiais didáticos e documentários.

O conceito final de um geoparque não é definitivo, e por isso associá-lo a uma conotação legislativa é errônea. Os projetos de criação e manutenção de geoparques deve ser adaptado às realidades locais, ser difundido e analisado por todos que procuram um mundo melhor (BOGGIANI, 2010). Cabe lembrar também que o reconhecimento de um geoparque pela UNESCO não é permanente, sendo revisto periodicamente. Se a área não cumprir com as funções previstas para um geoparque, pode perder o título da UNESCO (UNESCO, 2019).

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Considerações finais

A legislação brasileira não prevê a existência de geoparques como unidade de conservação nas categorias estabelecidas pelo SNUC, o que em princípio pode criar um impasse jurídico para sua demarcação e criação. Apesar dos parques nacionais e geoparques possuírem nomes semelhantes, suas funções sociais, ambientais e educativas são muito diferentes. A demarcação legal de áreas como Unidades de Conservação, como a exemplo dos parques, apesar de não se ajustar integralmente às finalidades e “filosofia” de preservação dos geoparques, em nada impede que se reconheça ali, pela UNESCO, um geoparque. Contudo, é necessário frisar, como visto, que um geoparque não é uma unidade de conservação no sentido do Sistema Nacional de Unidades de Conservação.

Uma vez que os geoparques possibilitam a integração das comunidades locais com o meio ambiente, os mecanismos de conscientização ambiental da sociedade e dos visitantes da área fica intensificado, promovendo a educação ambiental em sua plenitude a partir da exploração sustentável dos sítios geológicos preservados.

A associação de áreas de geoparque com unidades de conservação já consagradas ou que venham a ser criadas no futuro pode ser uma opção jurídica e ambiental muito interessante, facilitando o trâmite junto aos órgãos reguladores e propiciando maior interesse das comunidades locais e regionais pela preservação da fauna, flora e patrimônios culturais, geológicos e arqueológicos do país.

Referências

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Referências

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