• Nenhum resultado encontrado

MOSQUITO TRANSGÊNICO PARA COMBATE DA DENGUE: ABORDAGEM SANITÁRIA E DE BIOSSEGURANÇA

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "MOSQUITO TRANSGÊNICO PARA COMBATE DA DENGUE: ABORDAGEM SANITÁRIA E DE BIOSSEGURANÇA"

Copied!
21
0
0

Texto

(1)

MOSQUITO TRANSGÊNICO PARA COMBATE DA DENGUE:

ABORDAGEM SANITÁRIA E DE BIOSSEGURANÇA

Luana de Castro Oliveira

¹

Pedro Canisio Binsfeld²

¹ Farmacêutica pela Universidade de Brasília. Aluna do programa de Pós-Graduação em Vigilância Sanitária pelo Instituto de Estudos Farmacêuticos e Pontifícia Universidade Católica de Goiás, Brasília – DF. E-mail: luacoliveira@gmail.com

² Orientador, Pós-Doutor em Biotecnologia e Biossegurança. Docente do Programa de Pós-Graduação em Vigilância Sanitária pelo Instituto de Estudos Farmacêuticos e Pontifícia Universidade Católica de Goiás, GO. E-mail: pedro.binsfeld@terra.com.br.

RESUMO

O presente trabalho visa destacar a importância e o avanço de metodologias alternativas para o controle do mosquito vetor da Dengue, assim como mostrar a importância da abordagem sanitária e de biossegurança sobre o uso dos mosquitos geneticamente modificados para este fim. Apresenta as ferramentas biotecnológicas até então desenvolvidas e empregadas no desenvolvimento de mosquitos machos estéreis (SIT), que culminou com a elaboração da promissora técnica do inseto macho estéril portador de um gene letal (RIDL). Destaca-se testes de meio ambiente em diversos países e a legislação que tem regulamentado até então a liberação dos mosquitos GM no mundo e nos países onde a tecnologia vem sendo avaliada, com destaque para as normas brasileiras.

Palavras-chave: Macho estéril. SIT. RIDL. Vetores da dengue. Saúde Pública.

TRANSGENIC MOSQUITO FOR DENGUE CONTROL: RISK ASSESSMENT AND BIOSAFETY

ABSTRACT

This work aims to highlight the importance and the advance of alternative methodologies used to control the vector mosquito of Dengue, as well as to show the need of the health risk and the biosafety analysis over the use of genetically modified mosquitoes (GM) to this end. Herein we show the biotechnology tools developed and tested to date in the Sterile Insect Technique (SIT), that ended up with the new Release of Insect carrying a Dominant Lethal gene technique (RIDL). Herein we emphasize the open field tests that took place in many countries and the current regulation that ordered until now the release of GM mosquitoes over the world and in the countries where the technology have been evaluated, with emphasis to the Brazilian regulation.

(2)

1 INTRODUÇÃO

Doenças tropicais causadas por patógenos transmitidos por insetos vetores matam milhões de pessoas anualmente, em todo o mundo. As estratégias utilizadas para o controle desses vetores, como inseticidas e drogas, não têm se mostrado eficientes. A dengue é um dos principais problemas de saúde pública não apenas no Brasil, mas também em todo o mundo. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que entre 100 a 200 milhões de pessoas sejam infectadas anualmente, mais de 3 bilhões de pessoas vivem em áreas de risco, em mais de 100 países de todos os continentes, exceto a Europa. Cerca de 550 mil doentes necessitam de hospitalização e 20 mil morrem em consequência da dengue (CAPURRO et al., 2010).

O vírus da dengue é transmitido entre hospedeiros humanos quase exclusivamente pelos mosquitos Aedes aegypti e Aedes albopictus, ambos com fácil adaptação a criadouros larvais artificiais, e por isso muitas áreas urbanas em países tropicais estão sujeitas à transmissão dessa virose (GUBLER, 2002). O aumento da urbanização sem planejamento adequado para o processamento do lixo ou para o sistema hídrico urbano criou condições ideais para a reprodução do mosquito. Apesar de um progresso considerável no desenvolvimento de novas técnicas para o controle do vetor, o conhecimento sobre a extinção do mosquito e do vírus da dengue é pobre (WILLIAMS et al., 2010).

Muitos esforços têm sido direcionados ao desenvolvimento de novas estratégias para o controle da dengue. Uma delas envolve fazer com o que o mosquito vetor seja inóspito ao vírus da dengue por meio da reposição das populações do artrópode, impedindo assim que a doença seja transmitida (PAN et al., 2012). Duas estratégias atualmente têm sido estudadas e pioneiramente testadas em países asiáticos e na Oceania: a liberação do mosquito macho estéril geneticamente modificado e o uso da bactéria endossimbiótica Wolbachia para infectar

A. aegypti, estratégia que diminui o tempo de sobrevivência dos mosquitos e interfere em sua

habilidade de infectar hospedeiros humanos com o vírus da dengue. (OSTERA e GOSTIN, 2011).

Na estratégia do mosquito macho estéril (SIT – Sterile Insect Technique), um transposon é integrado em seu material genético, que codifica uma proteína repressível por tetraciclina, que em altas doses intracelulares é deletéria ao desenvolvimento celular; possibilitando o crescimento dessas espécies na presença do antibiótico ou levando à geração de larvas do mosquito inviáveis em sua ausência (PHUC et al., 2007).

Estudo sobre a análise do risco da liberação desses organismos geneticamente modificados no meio ambiente especulam riscos menores, dentre eles: a alteração da cadeia

(3)

alimentar pela eliminação de A. aegypti, o potencial de menor suscetibilidade do A.aegypti transgênico a inseticidas e a possível transmissão dessa reduzida sensibilidade aos agentes químicos a mosquitos selvagens, e a qualidade do solo e da água, que podem ser potencialmente afetados (BEECH et al., 2009). Proponentes ao uso dos mosquitos geneticamente modificados especulam impactos ecológicos mínimos pelo fato de as espécies de mosquitos alvo ocuparem com grande probabilidade o mesmo nicho ecológico, evitando a dispersão de outras espécies de seus nichos (OSTERA e GOSTIN, 2011).

Testes de biossegurança e eficácia para a supressão da população alvo de A. aegypti têm sido realizados em laboratórios e em ambiente aberto, ou em fase de execução na Malásia, no México, nas Ilhas Caymans, no Brasil e na Índia. No Brasil, por exemplo, sob aprovação da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) como publicado no Diário Oficial da União (DOU, página 48 da seção 1, número 241, de sexta-feira, 17 de dezembro de 2010), foi autorizada a introdução da linhagem transgênica OX513A do mosquito A. aegypti transgênico nos sítios selecionados do município de Juazeiro, Bahia, por meio de uma parceria entre a Universidade de São Paulo (USP) e a empresa britânica Oxitec, e conta com o apoio do Ministério da Saúde, da Secretaria de Saúde do Estado da Bahia e outras entidades locais.

Em vista aos recentes avanços e ao potencial promissor de estratégias de controle de doenças por meio da utilização de vetores geneticamente modificados, muitas considerações devem ser feitas em níveis locais e globais no que diz respeito à ética, biossegurança, aspectos legais, sociais e culturais (LAVERY et al., 2008).

Os protocolos internacionais sobre a regulação de organismos geneticamente modificados que existem até então (como o Protocolo de Cartagena e o grupo AdHoc

Technical Expert - ATHEG) não oferecem clara cobertura à introdução de mosquitos

transgênicos no ambiente. Sendo assim, a comunidade internacional necessita urgentemente de protocolos/normas que disciplinem a pesquisa e o desenvolvimento de artrópodes geneticamente modificados para o controle de doenças (OSTERA e GOSTIN, 2011).

Este trabalho visa destacar a importância de metodologias alternativas para o controle do mosquito vetor da Dengue, assim como mostrar a importância da abordagem sanitária e de biossegurança sobre o uso dos mosquitos geneticamente modificados no controle da dengue, principalmente com relação ao risco à saúde e ao meio ambiente.

(4)

2 METODOLOGIA

O presente trabalho é uma pesquisa qualitativa, de modalidade teórica e com análise da bibliografia formal, discursiva e concludente. O método de abordagem indutivo foi escolhido com procedimento monográfico, realizando o levantamento das publicações em base de dados nacionais e internacionais, como Pubmed e Scielo, com o objetivo de detectar o avanço e os desafios sanitários e de biossegurança relacionados ao uso do mosquito transgênico para controle do mosquito da dengue.

A pesquisa foi realizada de junho de 2012 a fevereiro de 2013 e o período da pesquisa foi concentrado entre 1998 a 2013. Este recorte temporal de 15anos foi escolhido em função da maior disponibilidade de bibliografia, da crescente preocupação com o tema nesta última década e crescentes avanços no campo de desenvolvimento de ferramentas biológicas no combate a vetores de doenças, como é o caso da liberação do mosquito macho estéril geneticamente modificado do vetor Aedes aegypti, estratégia essa que interfere na habilidade do mosquito de infectar hospedeiros humanos com o vírus da dengue.

A busca de artigos científicos e do marco regulatório foi realizada pelo uso de palavras chaves mosquito transgênico, RIDL, dengue, Aedes aegypti. Os trabalhos e as normas encontrados foram avaliados e analisados, o que possibilitou inferências sobre uso e procedimentos a serem adotados para o gerenciamento de riscos associados ao uso da ferramenta do mosquito transgênico para o combate da dengue e ao combate a riscos à saúde pública no Brasil.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Para o Brasil a dengue é um problema de saúde pública visto que entre o ano 2000 e 2010 o Ministério da Saúde contabilizou mais de 4 milhões de casos, com 500 mil internações pelo SUS e mais de 2 mil brasileiros mortos por conta da dengue. Além disso, a dengue representa um custo elevado ao país, fruto de internações, faltas ao trabalho e perda de vidas. A principal dificuldade no controle eficaz desta doença é o fato do aumento populacional, que dificulta o combate efetivo do mosquito transmissor da doença, daí a importância de se buscar no mosquito transgênico uma medida estratégica para o combate da dengue. Em bases de dados como NCBI e Scielo é crescente o número de estudos relatando o uso da técnica do

(5)

mosquito estéril (SIT) no combate ao vetor da dengue, assim como seu avanço desde que começou a ser investigada.

3.1 Mosquito transgênico como estratégia de combate à dengue

O mosquito A. aegypti é uma espécie robusta, adequada à criação em massa, além de apresentar homogeneidade de sua população, sem presença de sub-espécies. Além disso, estudos apontam que a liberação de mosquitos machos é conveniente, visto que somente fêmeas entram em contato com o hospedeiro humano (PHUC et al., 2007).

O uso da estratégia de liberar somente insetos machos transgênicos é interessante por dois motivos principais: a) Primeiro, porque as fêmeas entram em contato direto com o hospedeiro humano por meio da picada e, b) Segundo, a liberação de uma população mista de insetos, ou seja, fêmeas e machos estéreis, poderia afetar a copulação destes e, com isso, manter a população selvagem quase inalterada (ALPHEY e ANDREASEN, 2002).

Foi verificado que este tipo de estratégia, com a manipulação genética para o controle de pragas e vetores, data de 1960, quando a radiação ionizante foi utilizada para gerar machos estéreis e reduzir as populações alvo (ASMAN et al., 1981). No entanto, a irradiação de pupas parece danificar os insetos, apesar de a irradiação de insetos adultos diminuir esse dano, os insetos se tornam menos eficientes e pouco competitivos. A utilização de processos radioativos pode acarretar danos somáticos, interferindo indiretamente na capacidade desses insetos copularem e em sua longevidade (ALPHEY e ANDREASEN, 2002; BENEDICT e ROBINSON, 2003; HELINSKI et al., 2006).

Com o advento das ferramentas da biologia molecular, foram criadas novas técnicas que utilizam mecanismos mais complexos e pontuais para a produção de insetos estéreis. Existem pelo menos duas abordagens: a substituição populacional dos insetos e a eliminação de uma população de insetos selvagens (VONTAS et al., 2010).

No primeiro caso, onde há a substituição da população de insetos, a abordagem consiste na construção de um inseto transgênico que carrega um inserto gênico e assim é capaz de matar ou impedir a replicação ou disseminação de um patógeno específico, ou mesmo capaz de morrer uma vez que é infectado pelo microorganismo em questão (TERENIUS et al., 2008). Por exemplo, a transformação de células de Aedes albopictus (linhagem C3/C6) com um plasmídeo, que transcreve um RNA invertido-repetido (RNAir) derivado do genoma do vírus da dengue tipo 2 (DEN-2), é capaz de gerar um RNA dupla fita,

(6)

que ativa a via de RNA de interferência (RNAi), e é capaz de inibir o ciclo viral por meio da inibição da replicação do vírus no mosquito (ADELMAN et al., 2002). No entanto, o grande problema dessa abordagem ainda é sobre como espalhar os indivíduos geneticamente modificados na população selvagem, a fim de que o transgene seja distribuído e seja efetivo (HAY et al., 2010).

Utilizando outra ferramenta molecular, a técnica do inseto estéril (SIT) é um método não poluente ao meio ambiente e que consiste basicamente no crescimento em massa de uma população espécie-específica de insetos, em sua esterilização por irradiação e na liberação de um grande número de insetos. (KNIPLING, 1955). Neste sistema, machos estéreis liberados copulam com fêmeas selvagens, reduzindo assim seu potencial reprodutivo e, caso machos suficientes sejam liberados por um período de tempo adequado, podendo quase erradicar a população de insetos (THOMAS et al., 2000). Programas utilizando a técnica SIT em larga escala eliminaram grande número de pragas agrícolas (DYCK et al., 2005). Alguns fatores limitaram o sucesso desta técnica em mosquitos, como a competitividade para a cópula reduzida e a fertilidade residual dos machos irradiados, limitações que resultaram no desenvolvimento da estratégia RIDL – Release of Insect carrying a Dominant Lethal gene, que compreende a liberação de machos portadores de um gene letal condicionado, onde apenas em uma determinada condição gene será expresso (THOMAS et al., 2000; YAKOB et

al., 2008).

O princípio do RIDL é simples: se os insetos machos liberados são homozigotos para um gene dominante e copulam com fêmeas selvagens, toda a prole será heterozigota para esse gene dominante letal e assim não sobreviverá. O único requerimento dessa abordagem é uma condição permissiva, sob a qual será possível o crescimento da população dos insetos antes que ela seja liberada, e que não esteja disponível no ambiente como, por exemplo, aditivos químicos (ALPHEY e ANDREASEN, 2002).

Baseado nessa tecnologia, a Oxford Insect Technology (Oxitec Ltd., Oxford, Inglaterra), empresa que desenvolve tecnologias para o combate de insetos com o uso de linhagens transgênicas, desenvolveu linhagens para o controle populacional dos vetores. A linhagem de insetos OX513A, originada de um cruzamento entre a linhagem Rockfeller e outra malasiana de A. aegypti, apresentou maior penetrabilidade do transgene e mostrou ser totalmente repressível sob a condição permissiva, além de apresentar um sistema letal dominante e de ação tardia eficientes (PHUC et al., 2007).

O inserto do transgene LA513 (Figura 1) foi microinjetado em embriões larvais de A.

(7)

caso, o transposon baseado no vetor piggyBac não autônomo possui primeiramente um domínio que codifica a proteína marcadora de fluorescência vermelha DsRed2, o que possibilita a identificação dos indivíduos que receberam o vetor transgênico. Em seguida, existe um sistema ativador de transcrição que é repressível por tetraciclina (tTAV), cujo produto (a proteína tTAV) liga-se a tetO, sequência que promove a produção acentuada de tTAV por um sistema de retroalimentação positiva na ausência de tetraciclina. Na presença deste antibiótico, esta se liga a tTAV formando com ele um complexo, que não se liga a tetO e assim não leva à expressão aumentada de tTAV. Sendo assim, esse transgene leva a produção de altos níveis de tTAV na ausência de tetraciclina, enquanto que a administração do antibiótico bloqueia a expressão da proteína. A expressão de altos níveis de tTAV é tóxica à célula, e assim esse vetor transgênico produz um sistema letal repressível por tetraciclina (PHUC et al., 2007).

Figura 01. Representação esquemática do inserto transgene LA513 da linhagem OX513A do mosquito Aedes Aegypti (Adaptado de PHUC et al., 2007).

Esta é uma estratégia considerada pronta para aplicações no meio ambiente, e em um estudo comparativo entre a linhagem OX513A e uma linhagem não-transgênica, o mosquito geneticamente modificado mostrou uma formação das pupas em menor tempo, com o consequente desenvolvimento de adultos de tamanho menor. A formação de pupas em tempo menor, comparado à linhagem que não carrega o transgene, pode ser algo interessante para crescer os insetos em massa antes de sua liberação. Apesar de algumas diferenças no crescimento em massa de insetos geneticamente modificados, aproximadamente 97-99% do genoma desses indivíduos permanece inalterado, possibilitando assim seu uso como possível competidor com mosquitos selvagens (BARGIELOWSKI et al., 2011).

(8)

Com o estabelecimento de linhagens transgênicas, cria-se assim uma nova ferramenta no combate ao vetor da dengue que, após testes iniciais em ambientes naturais, pode ser apresentada às autoridades governamentais como uma nova estratégia no combate à disseminação da dengue.

Além dessas, uma técnica que aborda fêmeas foi também desenvolvida, a construção denominada Flightless (OX3604). Essa linhagem gera insetos fêmeas incapazes de voar, por meio de um transgene que afeta a produção de actina-4, proteína que impulsiona o vôo e é diferencialmente expressa em fêmeas. Dessa forma, é gerado um fenótipo fêmea-especifico repressível também por tetraciclina, que é incapaz de copular, alimentar-se ou realizar atividades do seu ciclo de vida. No entanto, essa linhagem ainda não possui resultados no campo. Uma vantagem desta técnica é que, como os indivíduos geneticamente modificados não conseguem sobreviver, o transgene não é inserido na população e, portanto, sua liberação no campo pode ser controlada pela liberação dos insetos transgênicos (FU et al., 2009).

3.2 Estágios de desenvolvimento da tecnologia do mosquito transgênico para combate ao mosquito da dengue

Estudos sobre a liberação de mosquitos relacionados à técnica SIT datam da década de 60, quando esta técnica ainda era baseada na esterilização dos animais por irradiação, com vários experimentos conduzidos em vários estados dos Estados Unidos da América (EUA), no Quênia e na Índia. No entanto, em muitas dessas tentativas a liberação dos insetos visava responder a questões específicas de pesquisas realizadas, e não necessariamente suprimir a população (BENEDICT e ROBINSON, 2003).

Já estudos de campo utilizando a técnica RIDL datam de poucos anos, sendo que muitos pioneiros foram realizados na Malásia. Os parâmetros de performance chave esperados para machos estéreis liberados no meio ambiente são longevidade, capacidade de dispersão e competitividade pela cópula. O primeiro estudo de campo semi-aberto (compartimento semi-campo ACL-2 – Arthropod level 2 Containment Laboratory) foi realizado nesse país com mosquitos machos da linhagem RIDL-OX513A. Essa linhagem demonstrou excelente competitividade pela cópula quando comparada aos machos selvagens nesse estudo, confirmando achados anteriores realizados em gaiolas de laboratórios de que esta é uma intervenção promissora como uma ferramenta de controle do vetor (LEE et al., 2012).

(9)

Um dos primeiros estudos de campo aberto com mosquitos OX513A foi realizado no Grande Cayman, Ilhas Cayman, conduzidos em dois estágios. No primeiro deles, de menor escala, os insetos foram liberados durante quatro semanas a partir de novembro de 2009, e foi investigada a capacidade que os mosquitos transgênicos teriam de sobreviver no meio “selvagem” e de copular com as fêmeas nele existentes. Os resultados mostraram que os machos transgênicos liberados são competitivos com os selvagens e são capazes de copular com as fêmeas (HARRIS et al., 2011). Esses resultados foram a base para o segundo estágio do estudo, por um período de 23 semanas, em 2010, com 3,3 milhões de machos OX513A liberados nas Ilhas Cayman, que investigou a capacidade de os insetos suprimirem a população de mosquitos selvagens. Os resultados mostraram uma redução de 80% do número de mosquitos selvagens 11 semanas após a liberação dos insetos no campo, que foi sustentada por até 7 semanas após o fim do experimento e, dessa forma, validou o uso dessa abordagem de controle de vetores como potencial supressor populacional (HARRIS et al., 2012).

Um estudo posterior em campo aberto, na Malásia, feito com o intuito de investigar a dispersão e longevidade dos insetos machos OX513A mostrou que a presença do transgene não parece exercer um efeito significativo sobre a longevidade dos mosquitos após sua liberação. Além disso, apesar de a dispersão mínima e a dispersão média da linhagem OX513A se apresentarem significativamente menores quando comparadas à linhagem selvagem testada, o mosquito transgênico apresenta capacidade de dispersão adequada ao uso pretendido em um programa de liberação de mosquitos estéreis (LACROIX et al., 2012).

No Brasil, a linhagem OX513A passou primeiramente por testes de competitividade entre machos transgênicos e selvagens por linhagens Higgs de fêmeas selvagens. Foi observado que não existe diferença significativa entre a preferência das fêmeas da linhagem de laboratório (Higgs) pelos machos Higgs selvagens ou pelos machos transgênicos OX513A (OLIVEIRA et al., 2011). Em fevereiro de 2011 foram autorizados pela Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio testes no município de Juazeiro do Norte, na Bahia, mas os dados referentes aos testes de campo com o mosquito transgênico ainda não foram publicados (OLIVEIRA et al., 2011).

3.3 Abordagem sanitária do uso do mosquito transgênico

Todas as expectativas e até a presente data os dados indicam que a técnica do inseto macho estéril é um método de controle de vetores de doenças de baixo impacto negativo ao

(10)

meio ambiente e dirigido a uma espécie-específica. A produção de mosquitos modificados pelo uso de irradiação para gerar insetos estéreis pode ser um empecilho, já que alguns indivíduos podem ter danos em vista das doses radioativas para a esterilização dos machos. O mosquito A. aegypti é uma espécie relativamente robusta e de fácil crescimento em massa, e assim não existem barreiras para a sua produção em larga escala. O uso potencial da tecnologia de mosquitos machos estéreis carregando um gene letal (RIDL), seguindo um princípio similar ao SIT, parece adequado como uma estratégia para programas de controle da dengue (BENEDICT e ROBINSON, 2003; DYCK et al., 2005; HARRIS et al., 2012).

Em estudos de liberação dos insetos transgênicos é comum a observação que o transgene desaparece completamente da população rapidamente, como esperado, e não é detectado em áreas que circundam os locais onde os experimentos de liberação foram realizados. Isso porque indivíduos da prole dos mosquitos RIDL liberados morrem como consequência da herança de uma mutação genética dominante letal. Sendo assim, é possível controlar a presença da mutação na população apenas pela liberação do mosquito transgênico no ambiente. Além disso, uma grande vantagem do uso do macho geneticamente modificado é o fato de ele não entrar em contato com o sangue humano, já que somente fêmeas picam, e por isso não transmitir a doença ou efeitos adversos relacionados à mutação a humanos (PHUC et al., 2007; HARRIS et al., 2011; LACROIX et al., 2012).

Consistente com o gerenciamento de risco dessa abordagem, nenhuma característica sugerindo efeitos adversos ao meio ambiente ou à saúde humana foi revelada nos estudos de campo realizados (LACROIX et al., 2012). Nos estudos de liberação de mosquitos transgênicos em campo aberto nas Ilhas Cayman foi observada uma supressão populacional significativa, revelando o potencial em controlar a população de A. aegypti, principal vetor da dengue, e assim diminuir sua disseminação (HARRIS et al., 2012).

Assim, considerando os dados disponíveis e com os experimentos realizados, infere-se que há baixo impacto ambiental pelo uso dos mosquitos transgênicos no combate à dengue. Os estudos apresentados por diversos autores sugerem que a metodologia é eficaz para o controle do mosquito vetor da dengue, que do ponto de vista sanitário e de saúde pública é altamente desejável. Entretanto, no Brasil, para poder afirmar o mesmo, é preciso que os estudos autorizados pelas autoridades competentes sejam concluídos e devidamente avalizados para que se possa concluir sobre o aspecto sanitário e a eficácia desta metodologia como ferramenta auxiliar no combate da dengue.

(11)

3.4 Considerações de biossegurança associadas ao uso do mosquito transgênico

O conceito de Biossegurança descrito na Convenção em Diversidade Biológica (CBD, 1993) requer segurança e adequados níveis de proteção no transporte, manipulação e uso de organismos vivos geneticamente modificados que resultam de processos biotecnológicos modernos. Reconhece a possibilidade de efeitos adversos na conservação e no uso sustentável da diversidade biológica e da saúde humana (WHO, 1993).

O gerenciamento de risco ensina que deve haver um balanceamento entre custo/benefício, ou seja, os benefícios esperados dados pela eficácia da introdução de um novo organismo geneticamente modificado e os custos que representam para a sociedade, que incluem não apenas indicadores econômicos, mas também questões ambientais, sociais, éticas e culturais (BEECH et al., 2009).

O gerenciamento de risco e estudos de biossegurança adequados são a base para a decisão em se tratando de experimentos envolvendo o meio ambiente e a saúde pública. É necessário que se estabeleça procedimentos para minimizar os potencias efeitos adversos em humanos e ao meio ambiente, antecipando alguns possíveis efeitos que podem ser agregados à liberação de organismos geneticamente modificados durante as fases de experimentação, desenhando sistemas de monitoramento capazes de detectar e avaliar precocemente resultados não esperados e planejando estratégias de intervenção, para que as informações possam ser analisadas e interpretadas a fim de dar solução a efeitos inesperados. A análise de risco e avaliação da biossegurança para saúde humana e impactos ambientais devem prover informações para a tomada de decisões e para a comunicação do risco (WHEELIS et al., 1998).

Esta tecnologia interessa a muitos países que possuem dengue endêmica, e estes têm grandes expectativas sobre os possíveis benefícios dos métodos inovadores de controle de disseminação de doenças que envolvem insetos vetores de doenças humanas (BEECH et al., 2009). Em um workshop realizado na Malásia em novembro de 2008, os riscos e os benefícios da liberação de mosquitos A. aegypti geneticamente modificados, especificamente os que carregam o transgene com sistema letal e portador de fluorescência, foi extensivamente analisados. Para uma liberação hipotética em larga escala dos insetos, em um ambiente específico, a conclusão dos participantes foi de que o risco à saúde humana ou ao meio ambiente seria de risco praticamente negligenciável, com classificação de nível 4 (não importante). Alguns riscos de baixo nível, entretanto, foram identificados como relevantes e de importância (BEECH et al., 2009).

(12)

O primeiro deles diz respeito à espécie Aedes albopictus, onde em um extenso período de tempo, ao invés do contexto de um único experimento, pode apresentar tanto o potencial risco de aumento da transmissão da doença por essa espécie como uma mudança do nicho ecológico. O segundo relata a possível alteração de cadeias alimentares pela introdução do A.

aegypti transgênico, considerado de baixo risco já que essa espécie não é nativa da Ásia, onde

a análise foi realizada e como também é o caso do Brasil, e assim predadores não dependem somente dessa espécie para o seu ciclo alimentar (BEECH et al., 2009).

Outro risco considerado foi o potencial de A. aegypti transgênico ser menos suscetível a inseticidas usados nos regimes de controle e poder transferir essa resistência à população selvagem. Essa informação sobre a possível resistência da linhagem transgênica a inseticidas comumente utilizados foi sugerida como um fato a ser determinado, pois seria útil para determinar formas de controlar a forma transgênica do mosquito. No entanto, os primeiros experimentos já realizados sobre a liberação dos mosquitos no ambiente revelaram que a prole da população liberada e os próprios progenitores, ambos sem a condição permissiva, não são capazes de sobreviver por períodos prolongados, e desaparecem da população poucas semanas após o cessar de sua liberação (PHUC et al., 2007; BEECH et al., 2009; HARRIS et

al., 2012).

Por fim, a hipótese de que a qualidade do solo e da água pode ser afetada foi levantada, não como um risco que impediria a liberação dos insetos geneticamente modificados, mas como uma recomendação para a obtenção de informações importantes, já que é improvável que a qualidade do solo seja afetada pela liberação dos mosquitos devido ao fato de as proteínas presentes no indivíduo serem rapidamente degradadas no trato gastrointestinal dos mamíferos e predadores. Além disso, os genes incorporados aos mosquitos já se encontram presentes no meio ambiente. Com relação à qualidade da água, existe a questão da escolha de qual fonte deve ser investigada e quais parâmetros serão testados. No entanto, esse último risco não foi investigado em estudos de liberação já realizados (BEECH et al., 2009; HARRIS et al., 2012).

O método RIDL, que está sendo desenvolvido e testado por vários laboratórios no mundo, aplica avanços recentes de engenharia genética que oferecem soluções a algumas questões não favoráveis ao uso dos primeiros SITs, como a separação de machos e fêmeas e a necessidade de esterilização por irradiação (PHUC et al., 2007; BEECH et al., 2009).

Estratégias de supressão populacional de insetos que utilizam RIDL e sistemas similares autolimitantes são considerados de menor risco, quando comparados a tecnologias auto-sustentáveis. O sistema RIDL nunca será fixado na população selvagem, e qualquer

(13)

efeito não esperado pode ser revertido simplesmente com a supressão da liberação dos insetos no meio ambiente. Em qualquer caso, entretanto, é importante enfatizar que possíveis riscos associados à liberação dos mosquitos geneticamente modificados devem ser analisados caso a caso (BEECH et al., 2009).

3.5 Normas e exigências regulatórias necessárias para o uso da tecnologia

O protocolo de Cartagena em Biossegurança da Organização das Nações Unidas (ONU) é um tratado multilateral que preconiza o uso responsável de organismos geneticamente modificados (OGM) (WHO, 2003). É um acordo internacional que entrou em vigor em 2003, com 168 países participantes, e visa garantir o manuseio, transporte e uso seguros de organismos vivos modificados (OVM) (MARSHALL, 2010; OSTERA e GOSTIN, 2011).

Embora o protocolo se aplique a mosquitos geneticamente modificados (mosquitos GM), este é apenas um instrumento geral, que estabelece regras básicas internacionalmente aceitas, mas que exigem uma complementação regulatória nacional, ou seja, cada país estabelece regras específicas para pesquisa e desenvolvimento tecnológico de novos produtos ou organismos GM, incluindo artrópodes geneticamente modificados para o controle de doenças, como é o caso do mosquito transgênico para o controle da dengue (OSTERA e GOSTIN, 2011).

O primeiro documento que guia o gerenciamento de risco direcionado ao uso de mosquitos GM foi publicado por um grupo de trabalho denominado Ad Hoc Technical Expert

Group (AHTEG) após uma reunião em abril de 2010 em Ljubljana, na Eslovênia. O

documento guia representou um importante passo inicial para orientação das questões de biossegurança sobre o uso de mosquitos GM no âmbito do protocolo de Cartagena, levantando muitas considerações importantes sobre o adequado gerenciamento de risco associado ao uso dos mosquitos como estratégia de combate a dengue, no qual recomenda-se a necessidade de um balanço entre princípios de segurança, soberania dos Estados e ética (MARSHALL, 2010).

O programa especial de Pesquisa e Treinamento em Doenças tropicais da ONU (WHO/TDR) fundou em 2008 um projeto de três anos, designado MosqGuide, a fim de desenvolver um guia para o desenvolvimento em potencial de diferentes tipos de mosquitos GM destinados ao controle de doenças, especialmente malária e dengue. É um guia que

(14)

pretende dar apoio aos países endêmicos com relação a aspectos de biossegurança, legais, regulatórios, éticos, culturais e sócias no que tange ao desenvolvimento dessa tecnologia. A comissão, formada por integrantes do Reino Unido, Panamá, Brasil, México, Tailândia, Quênia e Índia, teve por objetivo a elaboração de sete módulos de guias com boas práticas revisadas na literatura, provenientes de práticas já realizadas e dados emergentes sobre o assunto (MUMFORD et al., 2009).

Na Malásia, por exemplo, para a aprovação dos estudos em campo aberto com os mosquitos GM A. aegypti, uma série de normas regulatórias foram atendidas. No país existem dois processos regulatórios essenciais: a aprovação e a notificação. O Conselho Nacional de Biossegurança (NBB), autoridade competente que regulamenta atividades em pesquisa e desenvolvimento que envolvem biotecnologia moderna, deve ser notificado quanto ao uso contido em laboratório. Para a liberação dos mosquitos GM na natureza é necessário certificado de aprovação pelo NBB, acompanhado de gerenciamento de risco que pode ser causado pelo uso do OGM. A importação da linhagem OX513A para o país e seus testes foi precedida por aprovações regulatórias apropriadas de autoridades competentes, incluindo o Comitê Nacional Conselheiro de Modificações Genéticas (GMAC). As autoridades competentes revisaram as propostas da pesquisa, os aspectos de biocontenção durante o crescimento em massa em laboratório e nos estudos abertos e semiabertos, e um formulário contendo todos os detalhes da técnica e dos experimentos realizados foram enviados ao NBB. Além de inúmeros estudos realizados sobre a análise de possível risco da tecnologia, os estudos nas Ilhas Cayman também foram levados em consideração. Na Malásia, a participação do público no conhecimento do experimento realizado no país também foi um passo importante para a realização dos estudos de campo aberto (SUBRAMANIAM et al., 2009).

No Brasil, a instância que trata de assuntos relacionados a biossegurança da biotecnologia é a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), criada pela Lei nº 8.974 de 5 de janeiro de 1995, que foi a primeira legislação regulamentar sobre pesquisa e produção de OGMs no país, substituída pela Lei nº 11.105 de 24 de março de 2005, atualmente em vigor, e vinculada ao Ministério da Ciência e Tecnologia. A CTNBio é responsável pelo suporte técnico e pela assistência ao governo federal no que tange à formulação, atualização e implementação da Política Nacional de Biossegurança (PNB) para OGMs e seus derivados. Entre as competências inclui a identificação de atividades e produtos decorrentes do uso de OGMs e seus derivados potencialmente causadores de degradação do meio ambiente ou que possam causar riscos à saúde humana, bem como o estabelecimento de

(15)

normas técnicas de segurança e de pareceres técnicos referentes à autorização para atividades que envolvam pesquisa e uso comercial de OGMs e seus derivados. Além disso, a lei também cria o Conselho Nacional de Biossegurança (CNBS), órgão de assessoramento superior do Presidente da República para a formulação e implementação da PNB (BRASIL, 2005).

A nova lei incorpora princípios fixados no Protocolo de Cartagena, mas acima de tudo conferiu à CTNBio a formulação de normas específicas que tratem da biossegurança de todas as atividades relacionados a OGMS no país. Isso significa que a CTNBio deve publicar resoluções específicas, quando a lei não seja específico, como é o caso para insetos geneticamente modificados, neste caso, talvez seja necessário que seja criada uma resolução normativa específica. Isso não significa que o uso deste OGM não esteja regulado, mas talvez seja mais eficaz se houver resolução específica.

O decreto nº 5.991, de 22 de novembro de 2005, traz em seu anexo a classificação de vetores ou insertos utilizados no desenvolvimento de OGMs. Vetores que são adequadamente caracterizados e desprovidos de sequências nocivas conhecidas, além de um tamanho limitado às sequências genéticas necessárias para realizar a função projetada, são classificados com Classe de Risco I. Aqui pode ser classificado o inserto introduzido nos mosquitos machos OX513A (CTNBio, DECRETO 5.991/2005).

Já a Resolução Normativa nº 05, de 12 de março de 2008, estabelece regras para a liberação comercial de OGMs e seus derivados, que deverá ser autorizada pela CTNBio após a realização de avaliação de risco, caso a caso, sobre os potenciais efeitos da liberação comercial do OGM e seus derivados sobre o ambiente e a saúde humana e animal. O Anexo IV dessa resolução diz respeito aos itens que devem ser informados para a avaliação de risco ao meio ambiente de algumas classes de OGMs. Tratando-se de organismos utilizados para controle biológico, é necessário informar, conforme descrito na resolução normativa 05/2008:

1. A espécie alvo do controle biológico e os efeitos diretos do OGM sobre ela comparados aos efeitos sobre o organismo parental;

2. O espectro de organismos suscetíveis ao OGM e a susceptibilidade de organismos não-alvo ao OGM, descrevendo critérios empregados na escolha nos organismos avaliados;

3. Os modos de ocorrência de dispersão dos OGM de um indivíduo para outro e fatores que afetam esta dispersão;

4. Os efeitos secundários que podem ocorres nos predadores, presas, competidores e parasitas da espécie alvo;

5. Os metabólitos produzidos pelo OGM que podem causar efeitos deletérios diretos ou indiretos a outras espécies através da concentração na cadeia alimentar;

6. Os efeitos resultantes da transferência horizontal para outro organismo, caso ocorra; 7. As possíveis modificações genéticas que podem ocorrer em populações de organismo

(16)

A Resolução Normativa nº 07, de 27 de abril de 2009, define os procedimentos para autorizações de liberações planejadas no meio ambiente de microorganismos e animais geneticamente modificados de Classe de Risco I e seus derivados pela CTNBio, com base nas avaliações de risco dispostas nas Resoluções Normativas 05/2008 e 06/2008. O requerente da autorização deverá manter registro de acompanhamento individual da liberação planejado de animais ou microorganismos geneticamente modificados no meio ambiente, detalhando as práticas utilizadas nos experimentos e as medidas de biossegurança aplicadas. A proposta deve ser apresentada ao CTNBio acompanhada dos documentos descritos na resolução normativa, e será analisada por diferentes comissões setoriais da CTNBio (CTNBio, RN 07/2009).

E por fim, a Resolução Normativa nº 08, de 03 de junho de 2009, define que para a liberação planejada de OGMs de Classe de Risco I e seus derivados no meio ambiente, só que de forma simplificada e destinada aos organismos transgênicos que tenham obtido aprovações anteriores da CTNBio, para fins de avaliações experimentais. Mas este não é o caso específico ainda do mosquito trasngênico, visto que este está apenas nas suas primeiras autorizações de pesquisa, tanto em laboratório quanto em liberações planejadas. E a Resolução Normativa nº 08 se aplica quando já há grande quantidade de referências (CTNBio, RN 08/2009).

Examinado o marco regulatório nacional, mais o Protocolo de Cartagena, do qual o Brasil é signatário também, infere-se que há um ambiente regulatório contemplativo para as atividades de pesquisa e uso comercial de OGMs, incluindo os mosquitos transgênicos objeto deste trabalho. Isso não significa que o regulatório não necessite de ajustes ou mesmo revisões das resoluções em função dos novos conhecimentos gerados e dos avanços científicos e tecnológicos. Em outras palavras, o marco regulatório é suficiente e abrangente para garantir a segurança biológica do uso de OGMs. O que é necessário é que autoridades, CNBS, CTNBio e órgãos de fiscalização atuem de forma sistêmica para que o sistema nacional de biossegurança de OGMs seja eficaz, e a sociedade possa se valer dos benefícios da biotecnologia e dos OGMs.

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pelo presente trabalho foi possível verificar o grande interesse e expectativas associadas à produção de mosquitos geneticamente modificados para o combate da disseminação de doenças através de seus vetores. O uso de insetos machos estéreis apareceu

(17)

como uma abordagem bastante vantajosa, uma vez que esses insetos não picam humanos e, portanto, não transmitem a doença.

A irradiação para obtenção de insetos machos estéreis, como começou a ser desenvolvida a abordagem SIT, foi amplamente utilizada por muitas décadas como abordagem para a eliminação de pestes agrícolas. No entanto, essa metodologia sempre apresentou algumas desvantagens importantes no desenvolvimento da técnica: o uso da irradiação, que pode danificar os insetos além da esterilidade, e a dificuldade em separar machos de fêmeas.

A abordagem do mosquito transgênico RIDL, seguindo os princípios do SIT, tem sido desenvolvida com grande sucesso, e muitos experimentos têm sido realizados em diversos países, como Malásia, Ilhas Cayman, EUA e Brasil. Os estudos mais avançados e expressivos até o momento foram realizados nas Ilhas Cayman, que mostraram significativa redução da população de A. aegypti selvagem, sem danos aparente ao meio ambiente.

Os experimentos em campo, com liberação planejada, mostram resultados promissores, mas ressalta-se que não são estudos finais, e é preciso estar atento para a avaliação de risco tanto do ponto de vista sanitário quanto do ponto de vista de biossegurança. Politicamente, todas as autoridades sanitárias dos mais de 100 países que se encontram nas áreas de risco de epidemia da dengue saúdam a possibilidade de tecnologias alternativas, como é o caso do mosquito transgênico para o controle da dengue. E do ponto de vista sanitário e de biossegurança há esforços em âmbito multilateral, como é o caso do Protocolo de Cartagena sobre biossegurança e também da OMS pela elaboração do MosqGuide, que se preocupa em prover orientações que sejam seguras para esta tecnologia. No âmbito nacional o Brasil possui um sistema nacional de biossegurança muito bem estruturado, assim como autoridades e órgãos sanitários e de meio ambiente que são capazes de prover segurança e eficácia de novos produtos e tecnologias usadas na saúde.

A validação desta tecnologia como ferramenta de controle ou combate da dengue depende basicamente dos resultados das pesquisas de campo que estão sendo desenvolvidas em diversos países do mundo. Estes experimentos de campo são destinados a avaliar a tecnologia do ponto de vista de biossegurança, ou seja, se é seguro usar mosquitos transgênicos do ponto de vista de saúde e do meio ambiente. Outra resposta que se busca com estes experimentos de campo é a avaliação da eficácia epidemiológica, ou seja, se os mosquitos transgênicos são eficazes no combate à dengue não apenas em ambiente limitado, mas de uma forma geral para as áreas de risco. Há vários indicadores que a apontam como uma tecnologia com potencial. É necessário, entretanto, que se aguarde a conclusão dos

(18)

estudos pelos pesquisadores para a obtenção de uma perspectiva da relação de custos/benefícios que o uso do mosquito transgênico representa como estratégia para combater a dengue.

(19)

5 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ADELMAN, Z. N. et al. RNA silencing of dengue virus type 2 replication in transformed C6/36 mosquito cells transcribing an inverted-repeat RNA derived from the virus genome. J Virol, v. 76, n. 24, p. 12925-12933, 2002.

ALPHEY, L., ANDREASEN, M. H. Dominant lethality and insect population control. Mol Biochem Parasitol, v. 121, p. 173-178, 2002.

ASMAN, S. M. et al. Field studies of genetic control systems for mosquitoes. Annu. Rev. Entomol., v. 26, p. 289-318, 1981.

BARGIELOWSKI, I. et al. Comparison of Life History Characteristics of the Genetically Modified OX513A Line and a Wild Type Strain of Aedes aegypti. PLoS ONE, v. 6, n. 6, p. e20699, 2011.

BEECH, C. et al. Risk analysis of a hypothetical open field release of a self-limiting transgenic Aedes aegypti mosquito strain to combat dengue. AsPac J Mol Biol Biotechnol, v. 17, n. 3, p. 99-11, 2009.

BEECH, C. J. et al. Deployment of Innovative Genetic Vector Control Strategies: Progress on Regulatory and Biosafety Aspects, Capacity Building and Development of Best-Practice Guidance. AsPac J. Mol. Biol. Biotechnol., v. 17, n. 9, p. 75-85, 2009.

BENEDICT, M., ROBINSON, A. The first releases of transgenic mosquitoes: an argument for the sterile insect technique. Trends Parasitol, v. 19, n. 8, p. 349-355, 2003.

BRASIL. Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio. Resolução Normativa número 05, de 12 de março de 2008.

BRASIL. Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio. Resolução Normativa número 07, de 27 de abril de 2009.

BRASIL. Comissão Técnica Nacional de Biossegurança – CTNBio. Resolução Normativa número 08, de 03 de junho de 2009.

BRASIL. Lei número 11.105, de 24 de março de 2005.

CAPURRO, M. de L. et al. Mosquitos transgênicos para o controle de doenças tropicais. Tópicos Avançados em Entomologia Molecular. Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia

em Entomologia Molecular, 2012. Disponível em:

<http://www.inctem.bioqmed.ufrj.br/biblioteca/arthrolivro-1/capitulo-18-mosquitos-transgenicos-para-o-controle-de-doencas-tropicais/view>. Acesso em 06 out.2012.

DYCK, V. A., HENDRICHS, J., ROBINSON, A. S. Sterile Insect Technique: Principles and practice in Area-Wide Integrated Pest Management. Springer, The Netherlands, 787 p., 2005. FU, G. et al. Female-specific insect lethality engineered using alternative splicing. Nat Biotechnol, v. 25, n. 3, p. 353-357, 2007.

GUBLER, D. J. Epidemic dengue/dengue hemorrhagic fever as a public health, social and economic problem in the 21st century. Trends in Microbiology, v. 10, p. 100–103, 2002. HARRIS, A. F. et al. Field performance of engineered male mosquitoes. Nat Biotechnol, v. 29, p. 1034–1037, 2011.

HARRIS, A. F. et al. Successful suppression of a field mosquito population by sustained release of engineered male mosquitoes. Nat Biotech, v. 30, n. 9, p. 828-830, 2012.

(20)

HAY, B. A., et al. Engineering the genomes of wild insect populations: challenges, and opportunities provided by synthetic Medea selfish genetic elements. J Insect Physiol, v. 56, n. 10, p. 1402-1413, 2010.

HELINSKI, M., PARKER, A., KNOLS, B. G. J. Radiation-induced sterility for pupal and adult stages of the malaria vector Anopheles arabiensis. Malaria Journal, v. 5, p. 41, 2006. JASINSKIENE, N., et al. Microinjection of A. aegypti embryos to obtain transgenic mosquitoes. J Vis Exp, v. 5, p. 219, 2007.

KNIPLING, E. Possibilities of insect control or eradication through use of sexually sterile males. J. Econ. Entomol., v. 48, p. 459–462, 1955.

LACROIX, R. et al. Open Field Release of Genetically Engineered Sterile Male Aedes

aegypti in Malaysia. PLoS ONE, v. 7, n. 8, p. e42771, 2012.

LAVERY, J. V., HARRINGTON, L. C., SCOTT, T. W. Ethical, Social, and Cultural Considerations for Site Selection for Research with Genetically Modified Mosquitoes. Am J Trop Med Hyg, v. 79, n. 3, p. 312–318, 2008.

LEE, H.L. et al. Mating compatibility and competitiveness of transgenic and wild type Aedes

aegypti (L.) under contained semi-field conditions. Transgenic Res., v. 22, n. 1, p. 47-57,

2012.

MARSHALL, J. M. The Cartagena Protocol and genetically modified mosquitoes. Nat Biotechnol, v. 28, n. 9, p. 896-897, 2010.

MUMFORD, J. et al. MosqGuide: A project to develop best practice guidance for the deployment of innovative genetic vector control strategies for malaria and dengue. AsPac J. Mol. Biol. Biotechnol., v. 17, n. 3, p. 93-95, 2009.

OLIVEIRA, S. L., CARVALHO, D.O., CAPURRO, L. C. Mosquito transgênico: do paper para a realidade. Revista da Biologia, v. 6b, p. 38-43, 2011.

OSTERA, G. R., GOSTIN, L. O. Biosafety Concerns Involving Genetically Modified Mosquitoes to Combat Malaria and Dengue in Developing Countries. JAMA, v. 305, n. 9, 2011.

PAN, X. et al. Wolbachia induces reactive oxygen species (ROS)-dependent activation of the Toll pathway to control dengue virus in the mosquito Aedes aegypti. PNAS, v. 109, n. 1, p. E23-E31, 2012.

PHUC, K. H. et al. Late-acting dominant lethal genetic systems and mosquito control. BMC Biology., v. 5, p. 1-11, 2007.

SUBRAMANIAM, T. S. S. et al. Genetically modified mosquito: The Malaysian public engagement experience Biotechnol. J., v. 7, p. 1321–1327, 2012.

TERENIUS, O. et al. Molecular genetic manipulation of vector mosquitoes. Cell Host Microbe, v. 4, p. 417-423, 2008.

THOMAS, D. D. et al. Insect population control using a dominant, repressible, lethal genetic system. Science, v. 287, n. 5462, p. 2474-2476, 2000.

VONTAS, J., et al. Transcriptomics and disease vector control. BMC Biol, v. 8, p. 52, 2010. WHEELIS, M. et al., 1998. Manual for assessing ecological and human health effects of genetically engineered organisms. The Edmonds Institute, Washington, USA, 1998. <http://www.edmonds-institute.org/manual.html> Acesso em 10 fev.2013;

(21)

WORD HEALTH ORGANIZATION – WHO. Cartagena Protocol. <http://www.cbd.int/biosafey> Acesso em 20. Jan. 2012.

WORD HEALTH ORGANIZATION – WHO. Convention on Biological Diversity, 1993. <http://www.cbd.int/convention/convention.shtml>. Acesso em 05. Fev. 2013.

WILLIAMS C. R., et al. The Extinction of Dengue through Natural Vulnerability of Its Vectors. PLoS Negl Trop Dis, v. 4, n. 12, p. e922, 2010.

YAKOB, L., ALPHEY, L., BONSALL, M. Aedes aegypti control: The concomitant role of competition, space and transgenic technologies. J Appl Ecol v. 45, p. 1258–1265, 2008.

Referências

Documentos relacionados

Cattle ranching intensifi cation is a necessary condition both to ensure the expansion of agricultural production (with the target to eliminate deforestation in 2020), and for

CRES MUNICÍPIO INSTITUIÇÃO PROFISSIONAL CAPACITADO 10ª LIMOEIRO DO NORTE HOSP.. BENEFICIENTE SÃO CAMILO

Although there are some examples of genetic resistance to disease in livestock (see later), in most cases this is not achievable; instead, we should focus on reducing the impact

Portanto, mesmo percebendo a presença da música em diferentes situações no ambiente de educação infantil, percebe-se que as atividades relacionadas ao fazer musical ainda são

O direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, essencial à sadia qualidade de vida, encontra disciplinado de forma expressa na Constituição Federal de 1988,

O objetivo do curso foi oportunizar aos participantes, um contato direto com as plantas nativas do Cerrado para identificação de espécies com potencial

Recentemente, PUPO et alii (10),usando método de macera- ção em soluções de NaHC03 0 , 08 % e soluções de NaOH 0,05 N, verificaram que as amostras de « leite de soja » obtidas

Os conteúdos programáticos permitem atingir os objectivos formulados para a unidade curricular, uma vez que se estuda a normalização nacional e internacional aplicável ao