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Inclusão no Mercado de Trabalho: um Estudo com Pessoas Portadoras de Deficiência

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Inclusão no Mercado de Trabalho:

um Estudo com Pessoas Portadoras de Deficiência

Autoria: Maria Nivalda de Carvalho Freitas, Antônio Luiz Marques, Flavia Luciane Scherer

Resumo

O presente artigo tem como objetivos analisar, de um lado, as principais dificuldades encontradas pelas PPDs (pessoas portadoras de deficiência) para a inclusão no mercado de trabalho, principalmente quando da busca de emprego e, de outro, as possibilidades dessas pessoas de ultrapassar essas dificuldades. Em termos teóricos, utilizou-se o conceito de princípios de diferenciação de Bourdieu (1996) e de estigma de Goffman (1989). O estudo foi desenvolvido em duas fases: na primeira, foi realizado um Grupo de Foco com 12 PPDs e, na segunda, foi aplicado um questionário a 121 PPDs, sendo que este instrumento foi composto por questões fechadas com utilização de escala Likert. Os dados coletados foram analisados com suporte do programa estatístico SPSS. O índice de KMO e o teste de esfericidade de Bartlett indicaram a fatorabilidade dos dados. A analise da precisão dos fatores foi realizada através do método de consistência interna, com utilização do coeficiente alfa de Cronbach. Dois dos fatores encontrados se referem as principais dificuldades de inclusão no mercado de trabalho (barreiras a cidadania e discriminação em relação ao trabalho) e outros dois se referem as possibilidades subjetivas dessas pessoas (auto-estima e conhecimento dos direitos).

1. Introdução

Nos dias atuais as organizações se deparam com um novo e importante desafio que é a adaptação às diferenças entre as pessoas. A questão da diversidade da força de trabalho passa a receber a atenção das organizações que, frente à necessidade de acomodar os diferentes grupos de pessoas, busca atuar dentro da lógica da responsabilidade social e da cidadania corporativa (Vergara e Branco, 2001). Nesse sentido, o campo do comportamento organizacional amplia seu escopo de investigação visando a contemplar o impacto da diversidade dos indivíduos e dos grupos sobre o comportamento dentro das organizações.

Atendo-se à diversidade decorrente de deficiências físicas, tem-se observado, nos últimos anos, um esforço ostensivo da mídia e em particular do Ministério da Justiça, através do CONADE - Conselho Nacional dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência, a fim de sensibilizar a população para os direitos e possibilidades de inclusão da Pessoa Portadora de Deficiência – a qual será, a partir de agora, denominada PPD – na sociedade, principalmente através do trabalho. No Decreto nº 3.298, de 20 de dezembro de 1999, que dispõe sobre a Política Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência considera-se que a deficiência é “toda perda ou anormalidade de uma estrutura ou função psicológica, fisiológica ou anatômica que gere incapacidade para o desempenho de atividade, dentro do padrão considerado normal para o ser humano” (Gil, 2002).

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para o portador de deficiência, e pelo Decreto 3.298/99, regulamentando, dentre outras, a forma de acesso às relações de trabalho.

Historicamente, a questão das Pessoas Portadoras de Deficiência sempre foi uma preocupação das áreas de saúde e de educação através do que se denominava Educação Especial e, agora, de toda a rede educativa com a nova LDB. As políticas sociais voltadas às necessidades de PPD foram caracterizadas, durante as décadas de 60 a 90, pelo modelo da

Integração Social que se constituía em uma visão médica da deficiência, dando origem a

práticas sociais que visavam a melhorar a PPD para conviver em sociedade. Somente a partir do final da década de 80, com a participação efetiva das PPDs, é que o paradigma da Inclusão

Social começa a se configurar. Inclusão Social compreendida como um processo bilateral em

que a sociedade se adapta às necessidades das PPDs e essas pessoas buscam o seu desenvolvimento nos setores da sociedade (Sassaki, 1999).

No Brasil, segundo o censo realizado em 2000 pelo IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – existem 24,5 milhões de brasileiros portadores de algum tipo de deficiência. O critério adotado pelo IBGE foi o recomendado pela Organização Mundial de Saúde: a Classificação Internacional de Funcionalidade, Incapacidade e Saúde – CIF. Tendo como referência essa classificação, 14,5% da população brasileira apresentam algum tipo de deficiência. Desse número, 9 milhões de pessoas estão em idade de trabalhar, sendo que 1 milhão (11,1%) exercem alguma atividade remunerada e 200 mil (2,2%) são empregados com registro em Carteira de Trabalho, segundo Gil (2002). Especificamente no Estado de Minas Gerais, no qual foi realizado o presente estudo, existem 2,6 milhões de pessoas portadoras de algum tipo de deficiência, o que representa 15% da população do Estado (IBGE, 2002).

A literatura sobre a inclusão da PPD no mundo do trabalho, desenvolvida marcadamente nas áreas de reabilitação profissional, tem mostrado que muitas das dificuldades do processo de inclusão está em encontrar empregadores disponíveis dado as inúmeras dúvidas que muitos empresários possuem (Pereira, 1977; Oliveira, 1993). Contudo, grande investimento tem sido feito no sentido de conscientizar os empresários e toda a sociedade para a importância que a PPD pode representar para a construção de uma sociedade para todos (Martins, 1996; Gil, 2002). Pesquisas realizadas no Brasil têm constatado que apesar da lei de cotas, vigente desde 1999, ser o principal instrumento disponível às PPDs para barganhar um lugar no mercado de trabalho formal, as leis não são cumpridas (Neri et al, 2003; Heinski e Bignett, 2002). Esta constatação é confirmada por um estudo sobre as possibilidades de inclusão da PPD nas organizações de Minas Gerais que demonstrou que a imposição legal de cotas de PPD não favorece a inclusão, sendo, inclusive, fonte de resistências à política de inclusão. Em contrapartida, a incorporação das práticas de responsabilidade social por parte das empresas tem favorecido a contratação e o desenvolvimento de relações inclusivas no ambiente de trabalho (Batista, 2002).

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2. Referencial Teórico: o conceito de inclusão

Conforme Michaelis (1998, p. 1141) inclusão (lat. inclusione) significa “ato ou efeito de incluir; penetração de uma coisa em outra”, sendo que incluir (lat. includere) significa, em uma de suas acepções, “abranger, compreender”.

Tomando os significados enunciados podemos entender o ato ou efeito de incluir como uma ação que compreende partes separadas que passam a se constituir em um todo, pressupondo o conceito de diferença (“uma coisa em outra”).

Para Bourdieu (1996) diferença é entendida como separação, traço distintivo, propriedade relacional, pois só existe quando relacionamos (comparamos) as propriedades de algo ou alguém. Esse autor propõe dois princípios de diferenciação, que são o capital econômico e o capital cultural, como fundamentos da própria noção de espaço social, entendido como modo pelo qual os agentes ou grupos são distribuídos na sociedade. Para ele a idéia de diferença, de separação, está no fundamento da noção de espaço social. Os agentes são distribuídos no espaço social de acordo com o volume de capital que possuem, sendo os mais eficientes o capital econômico e o capital cultural.

Tomando como referência o conceito de princípios de diferenciação proposto por Bourdieu (1996) para compreender a inclusão da PPD, verifica-se que além da análise da posse diferenciada de capital econômico e capital cultural dessa população, é necessário considerar que a própria definição de Portador de Deficiência remete essas pessoas a um critério de diferenciação das pessoas tidas como normais, dentro dos padrões nos quais a sociedade foi concebida. Essa diferenciação tem sido constatada nas pesquisas que, como a realizada por Batista (2002), indicam contradições por parte das empresas ao contratar PPD que vão desde a segregação, contratando essas pessoas por grupos e categorias, em trabalhos considerados inferiorizados, mantendo atitudes de discriminação, até atitudes de inclusão que reconhecem o desempenho da PPD e a necessidade da empresa se adequar às necessidades diferenciadas das pessoas.

Essas diferenciações, associadas à discriminação, podem ser concebidas, no caso das PPD, segundo o conceito de estigma que, numa primeira acepção, se refere a “sinais corporais com os quais se procurava evidenciar alguma coisa de extraordinário ou mau sobre o status moral de quem os apresentava” (Goffman, 1989, p. 11).

Goffman (1989) se propõe a compreender o estigma como um conceito que se funda numa relação e está referendado por atributos tidos como depreciativos em uma pessoa. Nesse sentido, afirma que o estigma se constrói sobre o que denomina de identidade social virtual (constituída por uma imputação feita por outrem) e identidade social real (constituída pelas características reais do sujeito, aquilo que o sujeito acredita que seja).

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Segundo Neufeldt e Albright (1998) a discriminação em relação à PPD ocorre em três níveis: a discriminação direta que significa tratar pessoas menos favoravelmente que outras por causa da deficiência; discriminação indireta que significa impor exigências ou condições para a realização de um trabalho que dificulta o sucesso da PPD; e cargas desiguais que significa fracassar na remoção de barreiras no ambiente social dificultando a possibilidade de igualdade de participação da PPD.

Contudo, tomando-se a perspectiva de Goffman (1989) como referência, é necessário considerar a legitimação subjetiva das atribuições feitas à PPD. A PPD pode não conferir importância ao que lhe é atribuído e não incorporar os significados pejorativos endereçados a ela, tendo uma identidade social real diferente da social, mesmo que, em muitos casos, necessite dispor de mecanismos de defesa tais como a negação ou a racionalização, por exemplo. Ou, pelo contrário, a despeito de uma ação nomeadamente inclusiva a PPD pode não se sentir valorizada e aceita pelo outro. Então, estudar a questão da inclusão pressupõe considerar ambas as perspectivas.

Figura 1 - Dimensões no estudo da inclusão social

Dessa forma, para compreender a questão da inclusão é necessário contemplar as principais formas de diferenciação adotadas pela sociedade e sua abertura maior ou menor para as mudanças que impliquem em uma adequação da sociedade para todos; os valores internalizados pela PPD e a possibilidade maior ou menor dessa pessoa em superar as dificuldades e restrições sociais.

Reiterando que a presente pesquisa teve por objetivo compreender a questão da inclusão no mercado de trabalho na perspectiva da PPD pode-se pensar num primeiro momento que apenas a dimensão subjetiva esteja sendo contemplada, contudo tomando Bourdieu (1999) como referência admite-se que é possível, através da percepção da PPD, compreender as atribuições sociais feitas a ela, pois

“Isso faz com que, através da narrativa das dificuldades mais ‘pessoais’, das tensões e contradições, na aparência, mais estritamente subjetivas, acabem se exprimindo, muitas vezes, as estruturas mais profundas do mundo social e suas contradições. Isso nunca é tão visível como no caso dos ocupantes de posições instáveis que são extraordinários ‘dispositivos analisadores práticos’: situados em pontos onde as estruturas sociais ‘estão em ação’ e, por esse fato, movidos pelas contradições dessas estruturas, eles são obrigados, para viver ou sobreviver, a praticar uma forma de auto-análise que, muitas vezes, dá acesso

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às contradições objetivas de que são vítimas e às estruturas objetivas que se exprimem através delas” (p. 236).

A partir dessa perspectiva, a proposta da pesquisa é contemplar a questão da inclusão a partir de dois grupos de variáveis: as sociais e as subjetivas e buscar configurar fatores que possam explicar essas variáveis.

3. Metodologia da Pesquisa

A pesquisa foi desenvolvida em duas fases consecutivas: realização de grupo de foco e aplicação de questionários à amostra selecionada. Na primeira fase, foi realizado um grupo de foco com 12 PPDs, escolhidos aleatoriamente dentro de uma Associação de Portadores de Deficiência e tendo como objetivo ratificar ou retificar a premissa de que a PPD estava submetida à princípios de diferenciação que a excluíam em função da deficiência, principalmente quando da busca por emprego.

Segundo Malhotra (2001) algumas das aplicações metodológicas do Grupo de Foco consiste em entender as percepções, preferências e comportamentos dos sujeitos da pesquisa; gerar novas idéias visando a definir o problema da pesquisa com maior precisão e gerar hipóteses que possam ser testadas quantitativamente, dentre outros.

Os dados levantados a partir do Grupo de Foco revelaram que quando as PPDs se referiam à questão da inclusão/exclusão social elas se remetiam às garantias de direitos assegurados ou não pelo Estado, principalmente no que se refere ao trabalho; aos preconceitos sociais; às barreiras que dificultavam o exercício pleno da cidadania e, a despeito de todas as dificuldades que encontravam, afirmavam que gostavam de si mesmas e que eram merecedoras de reconhecimento.

A realização do Grupo de Foco permitiu a elaboração do instrumento de pesquisa, o qual foi posteriormente submetido a um pré-teste com 10 PPDs, cujos resultados levaram a modificações na redação de algumas questões, a fim de propiciar melhor entendimento por parte dos sujeitos pesquisados. O questionário definitivo foi composto por questões fechadas, com a utilização da escala Likert para medição, considerando-se uma variação de 1 (discorda totalmente) a 5 (concorda totalmente).

A segunda fase da pesquisa compreendeu a aplicação desse questionário nas pessoas cadastradas em uma Associação de PPDs de uma cidade do interior do estado de Minas Gerais. A amostragem por conveniência foi escolhida em razão da dificuldade de acesso aos endereços de todas as PPD da cidade e consequentemente da composição de uma amostra aleatória. Os dados foram coletados no período de outubro de 2003 a janeiro de 2004, com a participação de assistentes de pesquisa, que foram responsáveis pela aplicação do questionário a todos os sujeitos pesquisados.

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diferentemente dos censos anteriores que consideravam PPD apenas àquelas pessoas que se consideravam incapazes.

Como estratégia de pesquisa escolhemos para compor a amostra de PPD somente aquelas que possuíam limitações mais severas, isto é pessoas perceptoras de incapacidade, que são indivíduos com pelo menos alguma incapacidade de andar, ouvir ou enxergar, deficientes mentais, paraplégicos, falta de membro ou parte dele, o que no país corresponde a 2,5% das PPDs. Caso fosse aplicado esse percentual à população da cidade estudada e utilizado o critério de proporções para cálculo do tamanho da amostra, já que o critério de distribuição da população pode ser considerado dicotômico para o estudo de PPD, cerca de 50 pessoas seria suficiente para representar a população em estudo. Levando em consideração as dificuldades para selecionar aleatoriamente os indivíduos que comporiam a amostra, optou-se por um processo de seleção por conveniência, o qual tomou por base somente os indivíduos cadastrados na Associação de PPDs das cidades, que por definição são pessoas perceptoras de incapacidade. A amostra efetivamente pesquisada (121 PPDs) supera o tamanho da amostra que seria indicado caso o critério de aleatoriedade tivesse sido utilizado.

Os dados coletados foram analisados com o suporte do programa estatístico SPSS. Esse exame constituiu na análise descritiva dos dados e na análise fatorial, posto que se buscava identificar fatores que explicassem o construto inclusão no mercado de trabalho. O tratamento preliminar dos dados resultou na exclusão das questões para as quais foi identificada ocorrência de missing values superior a 30% do total de respostas. O índice de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO = 0,621) e o teste de esfericidade de Bartlett (significativo a p < 0,001) indicaram a fatorabilidade dos dados.

Com relação ao instrumento de coleta de dados, procedeu-se a análise de sua precisão, através do método de consistência interna, considerando o coeficiente alfa de

Cronbach. Dos 5 fatores encontrados, 4 apresentaram consistência interna superior a 0,66, o

que, de acordo com Malhotra (2001, p.265) pode indicar confiabilidade satisfatória da consistência interna. Em relação ao quinto fator extraído, foi encontrado o coeficiente alfa de

Cronbach de 0,22, o que motivou sua exclusão da análise.

4. Apresentação e Análise dos Resultados

Os resultados obtidos serão apresentados em três partes: na primeira, será apresentada a caracterização da amostra, com o auxílio da estatística descritiva; na segunda, serão descritos os fatores e sua interpretação, obtidos através da análise fatorial que buscava verificar a validade do instrumento proposto; na terceira, a correlação entre os fatores e variáveis demográficas será investigada.

a) Caracterização da amostra

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Tabela 1 – Caracterização da Amostra Pesquisada (n=121 PPDs)

Variável Observações Variável Observações Idade Média = 44,69 anos N° de filhos Média = 1,12 filhos

Sexo Masculino= 56,2% Feminino = 43,8% Estado civil Casado = 30,0% Solteiro = 55,0% Viúvo = 6,7% Divorciado = 4,2% Outros = 4,2% Renda familiar Até 1 s. m. = 22,9% De 1 a 3 s.m. = 53,4% De 3 a 5 s.m. = 13,6% Mais de 5 s.m. = 10,2% Nível de Escolaridade Analfabeto = 20,0% Primário = 37,5% Ensino fund. inc. = 11,7% Ensino fund. completo = 4,2% Ensino médio inc. = 11,7 % Ensino médio comp. = 12,5% Superior incompleto = 1,7% Superior completo = 3,3% Pós-graduação = 4,2% Tipo de Deficiência Auditiva = 6,6% Física = 60,3% Mental = 13,2% Motora = 3,3% Multideficiências = 13,2% Visual = 3,3% Tipo de Atividade Não trabalha = 40,4% Atividade formal = 21,3% Atividade informal = 22,3% Atividade voluntária = 13,8% Ativ.formal e outro = 2,1%

Os dados apresentados demonstram que a idade média dos pesquisados era de aproximadamente 45 anos, caracterizando uma amostra de pessoas maduras. Em relação ao sexo, percebe-se leve predominância de PPDs do sexo masculino. Os sujeitos da pesquisa eram, em sua maioria, solteira e declararam renda familiar de até três salários mínimos (76,3%). O nível de escolaridade é predominantemente baixo, com 20% de analfabetos e 37,5% de pessoas que possuem apenas o nível primário, mas indivíduos com ensino superior completo ou em curso (5,0%) e portadores de diploma de pós-graduação (4,2%) também fizeram parte da amostra. Sobre o tipo de deficiência que possuíam, identificou-se que as deficiências físicas eram as mais freqüentes entre os sujeitos pesquisados. Por fim, observou-se expressivo percentual de pessoas que não trabalhavam (40,4%) ou que deobservou-senvolviam atividades informais – “bico” – (22,3%). Apenas pouco mais de 20% dos pesquisados declararam desenvolver atividade remunerada formalmente registrada. Com esse quadro de referência, tem-se, portanto, a caracterização dos sujeitos que foram pesquisados.

b) Os Fatores e sua Interpretação

Os resultados estatísticos da pesquisa indicaram, em princípio, a existência de cinco fatores com eigenvalue superior a 1,0, o que sugeriu o ajustamento a uma solução de cinco fatores, os quais explicaram 61,65% da variância total. Os itens que não apresentaram carga fatorial superior a 0,30 e/ou apresentaram ambigüidade foram retirados da análise.

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itens, a carga fatorial, sua comunalidade (h²), a média dos valores encontrados para o item e sua descrição. Ademais, apresentam a consistência interna (alfa de Cronbach) para o fator. Tabela 2 – Matriz Fatorial do Fator Barreiras à Cidadania

Item Carga h² x Descrição

06 0,54 0,33 3,85 Tive mais dificuldades em conseguir aquilo que desejo do que as pessoas não portadoras de deficiência.

13 0,58 0,38 3,58 Não tenho garantido meus direitos de ir e vir devido às barreiras arquitetônicas urbanas.

17 0,79 0,64 3,69 Acho difícil me candidatar a emprego por ser PPD.

Alfa = 0,67

Esse fator representa o construto que expressa a percepção da PPD sobre barreiras à cidadania, principalmente no que se refere às dificuldades em realizar seus projetos, às barreiras arquitetônicas urbanas e às dificuldades em se candidatar a um emprego, o que dá ao portador de deficiência menores possibilidades de exercer sua cidadania em plenitude, principalmente no que se refere ao trabalho.

Em relação à amostra pesquisada, as médias encontradas demonstram uma tendência à concordância quanto à presença dessas barreiras em seu cotidiano.

Tabela 3 – Matriz Fatorial do Fator Auto-Estima

Item Carga h² x Descrição

16 0,39 0,17 4,78 O trabalho é importante na minha vida 19 0,83 0,75 4,83 Gosto de viver

23 0,95 0,94 4,89 Gosto de mim mesmo

Alfa = 0,72

Uma boa estima caracteriza os sujeitos com escore alto nesse fator. O sujeito associa o gostar de viver, o gostar de si mesmo e a relevância do trabalho em sua vida. Por outro lado, um baixo escore nesse fator indicará baixa auto-estima.

As médias encontradas na amostra pesquisada evidenciam elevada concordância com os itens, o que revela boa auto-estima por parte dos sujeitos pesquisados.

Tabela 4 – Matriz Fatorial do Fator Conhecimento dos Direitos

Item Carga h² x Descrição

26 0,74 0,56 2,15 Conheço meus direitos de participar de programas de habilitação e de reabilitação

30 0,80 0,74 2,46 Conheço as leis que garantem o acesso da PPD ao mercado de trabalho

Alfa = 0,74

O desconhecimento em relação aos direitos relativos ao trabalho caracteriza sujeitos com baixo escore nesse fator.

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Tabela 5 – Matriz Fatorial do Fator Discriminação em Relação ao Trabalho

Item Carga h² x Descrição

12 0,45 0,44 3,81 Acho que perdi oportunidades de emprego por ser PPD 33 0,93 0,85 2,94 Já me senti discriminado ao procurar emprego

35 0,54 0,50 3,58 Tive dificuldades de conseguir um emprego por ser uma PPD

Alfa = 0,75

Esse fator representa o construto que indica a percepção da PPD sobre discriminação em relação ao trabalho. Um alto escore indica uma elevada percepção de discriminação.

A média dos sujeitos da pesquisa indica uma tendência à concordância nos itens 12 e 35 e uma tendência à neutralidade em relação ao item 33.

c) Correlação entre os fatores

A Tabela 6 mostra a relação entre os fatores medidos entre si, bem como com duas variáveis demográficas: renda familiar e grau de escolaridade.

Tabela 6 – Correlação de Pearson entre os Fatores de Inclusão no Mercado de Trabalho

e Variáveis Demográficas

F1 F2 F3 F4

Renda familiar -0,205* - - -0,263*

Escolaridade -0,234* - 0,404** -

* Correlação é significante ao nível de 0,05 (2-tailed) ** Correlação é significante ao nível de 0,01 (2-tailed) F1= Barreiras à cidadania

F2= Auto-estima

F3= Conhecimento dos Direitos

F4 = Discriminação em Relação ao Trabalho

Quanto aos fatores sócio-demográficos em relação à inclusão no mercado de trabalho, observa-se na Tabela 6 que:

1) Com o aumento da renda familiar, decresce a percepção quanto às barreiras à cidadania e quanto à discriminação em relação ao trabalho;

2) Quanto maior o nível de escolaridade, menor a percepção quanto às barreiras à cidadania e maior o conhecimento dos direitos da PPD.

5. Considerações Finais

Tomando o conjunto de dados dessa pesquisa foi possível constatar que as PPDs, apesar da lei de cotas para a sua contratação, continuam tendo dificuldades para ingressar no mercado de trabalho e ainda se sentem discriminadas quando da busca de emprego.

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Analisando os ítens do instrumento de pesquisa foram encontrados quatro fatores principais no que se refere à inclusão no mercado de trabalho: barreiras à cidadania,

auto-estima; conhecimento dos direitos e discriminação em relação ao trabalho. Esses quatro

fatores podem ser compreendidos em suas dimensões relacionais ou subjetivas conforme sugere a literatura (Figura 1). Quando se analisa o fator barreiras à cidadania e discriminação

em relação ao trabalho pode-se concebê-los como oriundos de ações e atitudes da sociedade

que dificultam a inclusão da PPD. Por outro lado, quando se analisa auto-estima e

conhecimento dos direitos percebe-se uma clara determinação subjetiva desses fatores, o que

significa dizer que eles são provenientes de ações e atitudes do próprio sujeito.

O fator barreiras à cidadania identifica as dificuldades da sociedade em promover

possibilidades iguais de participação para todos, tornando mais custosa a realização dos projetos da PPD; negando a possibilidade de ir e vir devido às barreiras arquitetônicas e dificultando o ingresso da PPD no mercado de trabalho. Nesse sentido, a sociedade ao não facilitar a inclusão da PPD transforma a deficiência em um fator de distinção que nega à PPD um lugar de igualdade no exercício de sua cidadania. Contudo, a percepção dessas barreiras fica minimizada com o aumento da renda familiar e da escolaridade, sendo essas características facilitadoras da inclusão no mercado de trabalho. Essa constatação confirma que os principais princípios de diferenciação da sociedade são o capital econômico e o capital cultural, conforme proposto por Bourdieu (1996), mais do que ser portador de uma deficiência.

Quanto ao fator relacionado à auto-estima constata-se uma boa percepção de si mesmo por parte da PPD que, apesar das dificuldades encontradas em sua inclusão no mercado de trabalho, continua com uma relação positiva consigo mesma e com a própria vida. É importante ressaltar a interdependência da importância do trabalho com o gostar de si mesmo e da própria vida. Isso confirma o valor que o trabalho representa nas sociedades ocidentais contemporâneas. Ainda que a maioria das PPDs continue fora do mercado formal de trabalho, ele continua sendo um alvo almejado por elas. Conforme Martins (1996) o trabalho é visto como uma forma de obtenção de reconhecimento social, recompensa econômica e mesmo de manutenção da sobrevivência por parte da PPD. Os altos escores obtidos nesse fator indicam a liberdade dos sujeitos que, como afirma Sartre (1967)

“dizer de um homem o que ele ‘é’, é dizer ao mesmo tempo o que ele pode e reciprocamente dizer sobre as condições materiais de sua existência que circunscrevem seu campo de possibilidades... Assim, o campo dos possíveis é o objetivo em direção ao qual o agente supera sua situação objetiva (p.78).

Então podemos reconhecer a plasticidade dessas PPDs ao fazer uma clivagem entre a dimensão social e subjetiva em proveito delas próprias, conseguindo forças para seguir em frente, persistir, conforme explicitado por elas no Grupo de Foco, apesar das restrições que lhe são impostas.

O conhecimento dos direitos relativos ao trabalho dos sujeitos da pesquisa é

relativamente baixo. Esse fator tem uma relação positiva direta com o nível de escolaridade. Às pessoas com baixa escolaridade também se espera um baixo conhecimento de seus direitos, o que dificulta ainda mais a inclusão no mercado de trabalho.

O fator discriminação em relação ao trabalho representa a percepção da PPD

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relato de algumas delas, durante o Grupo de Foco, sobre situações vivenciadas em que o próprio pleito de um trabalho foi objeto de completa desvalorização, tomando a deficiência como impossibilidade da PPD de realizar uma atividade produtiva. É interessante notar que a percepção dessa discriminação diminui com o aumento da renda familiar, o que confirma que o capital econômico, segundo Bourdieu (1996), é um princípio de diferenciação privilegiado pelas sociedades ocidentais, minimizando, quando de sua presença, o próprio estigma decorrente da deficiência.

Além disso, os resultados dessa pesquisa indicam que os órgãos de Recrutamento e Seleção precisam repensar suas estratégias para não se constituírem em reprodutores da lógica excludente ainda predominante em nossa sociedade.

Por outro lado, a conscientização por parte dos gestores da importância da diversidade da mão-de-obra nas empresas possibilita a construção de uma atitude ética que se amplia e passa a ser adotada como valor e prática nos negócios (Heinski e Bignetti, 2002). Segundo Vergara e Branco (2001), uma empresa humanizada é aquela que “voltada para seus funcionários e/ou para o ambiente, agrega outros valores que não somente a maximização do retorno para os acionistas” (p. 21, 22).

Assim, a pesquisa indica a necessidade de se repensar as práticas de Recrutamento e Seleção no sentido de efetivamente se trabalhar com o paradigma da diversidade e da responsabilidade social por parte das empresas e confirma que a deficiência continua sendo um princípio de diferenciação que confere menores possibilidades de inclusão no mercado formal de trabalho para seus possuidores. Além disso, talvez seja necessário repensar a Gestão de Pessoas, mais especificamente no que diz respeito ao impacto da diversidade dos indivíduos e dos grupos sobre o comportamento dentro das organizações, já que o Recrutamento e a Seleção refletem a política de recursos humanos adotada.

Finalmente, é importante salientar que os resultados consistentes e avaliados como fidedignos e representativos da realidade estudada garante credibilidade à linha de pesquisa comportamental e contribui para uma nova possibilidade de diagnóstico da questão da inclusão da PPD no mercado de trabalho, trazendo um novo instrumento de pesquisa que pode auxiliar tanto os órgãos de Recrutamento e Seleção quanto as próprias Associações de Portadores de Deficiência no intuito de construir uma sociedade para todos. Contudo, são necessárias novas pesquisas para que possam ser incluídos outros fatores explicativos à questão da inclusão no mercado de trabalho, ampliando seu escopo e sua capacidade de diagnóstico.

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