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Desaparecidos políticos pós1964

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Em 1964, os militares tomam o poder no Brasil. Prisões, torturas e mortes são instituídas. No final da década de 1970, tivemos um saldo de mortes

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considerável e muitos desaparecidos. Seus familiares ainda hoje lutam pelo direito

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à reverência aos mortos. Palavras-chaves: Memória; Desaparecidos políticos; Torturas e Mortes

DCBA

D E S A P A R E C ID O S P O L íT IC O S P Ó S - 1 9 6 4

DISAPPEARED POLlTIC/ANS PÓS-1964

RQPONMLKJIHGFEDCBA

J o s é C e r a r d o V a s c o n c e l o s

É Professor Associado da FACED/UFC. Vice-Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Educação Brasileira da UFC. Doutor em Sociologia e Pós-Doutor em Artes Cênicas. E-mai: gerardo.vasconcelos@bol.com.br

R e s u m o

Abstract

In 1964, the military take power in Brazil. Arrests, torture and deaths are imposed. At the end of the 1970s, had a balance of deaths and many disappeared. Their families are still fighting for the right to reverence for the dead.

Key words: Memory; Disappeared Politicians; Torture and Deaths

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Um dos primeiros registros de morte de presos políticos no pe 'o-do 'o-do autoritarismo foi o do sargento do ExércitoRQPONMLKJIHGFEDCBAM a n o e l R a i m u n d o

a-r e s

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1, expu Iso das Forças Armadas em 1964, por motivos pai ítico-ideo ó

-gicos. Como não conseguia emprego no Rio - o que já era esperado -viaja para Porto Alegre, onde vive grandes dificuldades financeiras. o dia 11de março de 1966, foi preso pelo DOPS, por ordem do comandan-te do 111Exército, o General Orlando Geisel. Segundo o

DCBA

J o r n a l da Anistia (1978):

Foi lhe atribuída a posse de uma pasta contendo cerca de 2000 recortes de jornais sobre assuntos políticos, e a ligação com uma' rede de subversão' montada a partir do Uruguai por políticos exi-lados.

Passa a viver de presídio em presídio e, no dia 24 de agosto, seu corpo foi encontrado boiando nas águas do Rio Guaíba. Em face das de-núncias e dos protestos, várias versões foram apresentadas:

o delegado do DOPS, Teobaldo Neuman tentou desculpar-se e dar a versão do fato: o sargento morrera afogado, porque os soldados encarregados de dar-lhe um 'caldo' haviam perdido o controle do corpo. M as surgiram outras versões. Um major que na época ser-via no DOPS confirmou que lá existia uma sala de torturas psico-lógicas, onde fora interrogado o Sargento Soares e um estudante de agronomia, também preso no DOPS (para onde Soares foi leva-do pela última vez no dia 13 de agosto), denunciou que, devido a sucessivas pancadas de cassetete recebidas em um olho, ele esta-va praticamente cego. O jornal gaúcho 'Última Hora' informou que um funcionário do DOPS que estudava M edicina chegou a medicá-Ia dada a "iminência de sua morte" (Jornal da Anistia, 1978,

p. 32).

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A morte'do corpo, a morte da alma, a morte da vida ou a morte da

felicidade. Quantas mortes seriam decretadas? A memória tem uma di-mensão seletiva entre o passado e o futuro (ARENDT, 1992), entre o es-quecimento e a lembrança. É na memória onde devemos encontrar as forças do presente e do futuro. A m e m ó r i a d o s e x c l u í d o s ou dos que não puderam ter voz em determinados períodos, porque estavam amordaça-dos, só poderia ser reconstruída subterraneamente ou no silêncio

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José Gerordo Vasconcelos

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tente, como se o passado representasse o mal e, assim, houvesse a neces-sidade do esquecimento. Uma vez passado o tormento, era necessário continuar vivendo sem que o peso da história representasse um fardo para a continuidade da vida. Pollak ( 1989) lembra as experiências e os

relatos autobiográficos de mulheres sobreviventes nosRQPONMLKJIHGFEDCBAC a m p d e C o n c e n t r a t i o n de A u s c h w i t z - B i r k e n a u que

revela em muitos casos o desejo, simultâneo ao regresso do cam-po, de testemunhar e esquecer para poder retomar uma v i d a "nor-mal". Muitas v e z e s também o silêncio dasv í t i m a s internadas ofici-almente nos campos por m o t i v o s outros que não "políticos" reflete uma necessidade de fazer boa figura diante das representações dominantes que valorizam asv í t i m a s da perseguição política (POLLAK, 1989, p. 12).

Porém, essa suposta volta ànormalidade que se encontra no desejo dos militantes de esquerda é aniquilada quando este é exterminado. Ao mesmo tempo aparece, desaparece e reaparece na memória coletiva sub-terrânea. Transforma-se em h e r o i , em divindade que não pode mais se contentar com o simplesmente humano, pois seu ato de morrer passa a ser um ato sagrado, porquanto os deuses não morrem da mesma forma, são lançados no tempo e ultrapassam a história. Q u a n d o d e u s e s m o r r e m , e l e s s e m p r e m o r r e m m u i t a s e s p é c i e s d e m o r t e (NIETZSCHE, 1983c, p. 257).

Matar o indivíduo ou colocá-Io sob torturas reforçava a "nova" ética da morte tematizada por FOUCAULT(1986), que atravessa os corpos dos suplicantes, dando publicidade àdor e, ao mesmo tempo, transformando a violência física em espetáculo. Diminuir, portanto, o sofrimento, não se adequava aos rituais do autoritarismo no Brasil. O outro pode ser punido por não se enquadrar no espírito de seita que, nesse caso, marca a renún-cia à universalidade. Éentão que

os partidos e as sociedades abertas, geralmente, só consideram ini-migos aqueles que se lhe opõe expressivamente, enquanto o prin-cípio das sociedades secretas sempre foi que "aquele que não esti-v e r expressamente incluído, está excluído" (ARENDT, 1990:427).

A exclusão, contudo, chegava ao nível de brutalidade em que a morte do indivíduo deveria ser sucedida da morte da alma e das lembran-ças. Era matar e impedir a reverência aos mortos, transformar a morte

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p. 80 a 96

Desaparecidos políti~ pos-l

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numa imagem difusa, sem que se saiba ao certo se a alegria ou a tristeza poderia conviver numa esperança remota, em que a morte ritual se per-deria e o direito à embriaguez emergiria pelo instante lúdico que não mais poderia ser habitado pelos vivos. Como tenta mostrar MAFFESOLl(1985),

o

lúdico, vale lembrar, é constantemente habitado pela ideia da morte. Sejam as festas primitivas, sejam mesmo simples folguedos, sobre todas as manifestações festivas paira, de modo mais ou me-nos aparente, a sombra carregada de finitude. Estas manifestações cristalizam assim a angústia do tempo que passa a integrar num ritual, que a torna aceitável (MAFFESOLl, 1985, p. 90 e 91).

o

desaparecido não poderia preencher a aceitação da finitude hu-mana. É sempre uma esperança acompanhada de constantes ilusões. É,

ao mesmo tempo, uma incógnita. Por mais que se queira saber do seu paradeiro, fica sempre uma hipótese muito provável de morte. Essa "cer-teza" que não se realiza reafirma, a cada instante, a cada rasgo de

possibi-lidade, a esperança da vida, mesmo que todas as circunstâncias apontem

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a morte como o mais provável.

A ausência de corpo sugere morte, mas não permite a realização desta no imaginário (...). No caso do desaparecido, o não reconhe-cimento da morte nos remeteàdimensão essencialmente humana e simbólica. Ora, a vida subentende a morte, que é prenhe de significados e valores. A morte de uma única pessoa não se resume num único acontecimento. Constitui tantos acontecimentos quantos forem seus elos sociais: seu cônjuge, seus pais, seus filhos, seus amigos, seus companheiros de militância ... Muitas ligações se rom-pem numa única morte, e tudo ao mesmo tempo. A eliminação do ser social atinge o mundo ao qual ele pertence e que precisa, em virtude disso, ser regenerado porque se perdem alguns esquemas que dão sentido à vida do grupo social ou da sociedade em geral (PIETROCOLLA, 1995/1996, p. 66).

o

aniquilamento do indivíduo representa a quebra de infinitos elos sociais. Isso deve ser marcado pelo ritual da morte; quando não acontece

écomo se suas ligações não se desfizessem de forma satisfatória. O Car-deal Arns, no prefácio do livro Brasil nunca mais, afirmava categorica-mente que

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José Gerardo Vasconcelos

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não há ninguém na terra que consiga descrever a dor de quem viu um ente querido desaparecer atrás das grades da cadeia, sem mes-mo poder adivinhar o que lhe aconteceu. O 'desaparecido' trans-forma-se numa sombra que ao escurecer-se vai encobrindo a últi-ma luminosidade da existência terrena (ARNS, 1989, p. 12).

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ARQPONMLKJIHGFEDCBAs o m b r a , incluída na fala do Cardeal Arns, por um lado constrói, de maneira objetiva, a memória subterrânea. Por outro, protege o desa-parecido da morte, ressuscitando-o. Ele passa a ser um imortal, vivendo nas lembranças e recordações, principalmente da sua família. Pode tam-bém sobreviver na memória coletiva. Essa fumaça de vida é alimentada e preservada pelo fogo da dúvida e da possibilidade construída como vontade. Éum movimento sempre incerto. Não se pode imaginar a certe-za quando se fala de d e s a p a r e c i d o s . A dúvida só poderia cessar com a vida ou com a morte. Só nessa realidade é que se poderia falar com o b j e -t i v i d a d e .

Toda essa situação é acompanhada com grande sofrimento para amigos e parentes. Resgatar a memória de uma sombra, falar de vida quando não se tem certeza, ou de morte quando não se quer, é sempre um desesperado sofrimento humano. Nessas circunstâncias, viveram muitas famílias no Brasil.

O irmão de A n a R o s a K u c i n s k y ' procurava pelo seu paradeiro. De-saparecida no dia 22 de abril de 1974, juntamente com seu marido Wil-son da Silva, era mais um dentre tantos casos de desaparecidos. Seu ir-mão expressava o drama da família diante da incerteza.

É um sofrimento maior do que a certeza da morte, dizia Bernardo Kucisnski. A certeza da morte já é um sofrimento suficiente, por assim dizer, um sofrimento brutal. Agora, a incerteza de uma mor-te, que no fundo, é certeza, mas formalmente não é, é muito pior. Passam-se anos até que as pessoas comecem a pensar que houve morte mesmo. E os pais, principalmente, já mais idosos, nunca conseguem enfrentar essa situação com realismo (Jornal da Anis-tia, 1978, p.34).

É uma situação que leva a família a buscar a menor possibilidade de paradeiro possível. Felícia Mardini de Oliveira teve a filha lsis de Oli-veira" desaparecida em 1972. Tentou reconstruir o paradeiro por conta própria. Constatou a passagem da filha pelo DOI-CODI do I Exército,

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Desaparecidos políticos pés-I

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pela OBAN em São Paulo, retornou ao Rio de Janeiro para o Presídio Ilha das Flores, onde ficou incomunicável, sendo em seguida transferida para o Centro de Informações da Marinha (CENIMAR) e finalmente para o Centro de Informações da Aeronáutica - ClSA. Aí desapareceu. Nessa busca desesperada, a mãe soube que existia uma brasileira chamada íSIS em Londres.

Ela não desistiu, como também não vacilou em vender tudo o que possuía para viajar até Londres, atrás de uma pista do paradeiro de ísis: fora informada de que trabalhava como garçonete num bar londrino uma brasileira com o mesmo nome de sua filha. Na In-glaterra, Felícia realmente encontrou uma brasileira mas de nome íRIS de Oliveira (Jornal da Anistia, 1978, p. 33).

Da mesma forma que a mãe de ísis, outras também seguiram trilhas e atalhos em busca de um sinal, de uma possibilidade. Foi o caso de Zuzu Angel, mãe de Stuart Edgar Angel lones, cujo filho morreu no Centro de Informações da Aeronáutica (ClSA) em 1973, mas que não é oficialmente

dado como morto. Mesmo assim, empenhou-se em campanhas que de-

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nunciavam o Estado Militar e a violência. Morreu em um misterioso aci-dente automobilístico, pouco depois de ter escrito carta em que se dizia ameaçada pela repressão.

Além das rosas vermelhas que lhe cobriam o corpo e do retrato do filho Stuart que lhe colocaram sobre o peito, Zuzu levou também consigo, naquele enterro mais tenso do que triste, o segredo da sua própria morte. Até hoje não se tem certeza de como, de fato, ela morreu (VALLI, 1987, p. 23).

Várias outras mães que buscavam o paradeiro de seus filhos tam-bém foram ameaçadas e perseguidas pelos órgãos de repressão, como sinal contundente de que o pânico continuaria instalado, o medo perse-guiria qualquer opositor.

Temos ainda o caso do deputadoRQPONMLKJIHGFEDCBAA l e n c a r F u r t a d o , do M o v i m e n t o D e m o c r á t i c o B r a s i l e i r o - M D B , punido com a cassação de seu mandato e suspensão dos direitos políticos quando denunciava o desaparecimento de militantes em cadeia nacional de Rádio e Televisão.

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Jose Gerardo Vasconcelos

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Filhos órfãos de pais vivos - quem sabe mortos, talvez? órfãos do talvez e do quem sabe. Para que não haja esposas que enviuvem com maridos vivos - ou mortos talvez, quem sabe? viúvas do quem sabe e do talvez (Jornal da Anistia, 1978, p. 33).

o

pronunciamento oficial do governo, em relação ao problema, coube ao ministro da Justiça Armando Falcão. A nota que pretendia ex-plicar e esclarecer o paradeiro nada explicou e nada esclareceu. A referi-da nota dizia o seguinte:

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o

Ministério da Justiça em face de notícias recentemente divulgadas pela imprensa, inclusive no exterior, e de apelos feitos às autorida-des para a localização de pessoas apontadas como autorida-desaparecidas, na sua quase totalidade vinculadas à subversão, esclarece: as 27 pessoas citadas na nota oficial haviam sido presas e postas em li-berdade, estavam vivendo clandestinamente ou haviam 'deixado o país'. Quanto a outras dezenas de pessoas reclamadas por seus familiares - recentemente uma lista de 42 nomes ficou em exposi-ção no Museu de Arte Moderna, no Rio de Janeiro -, o ministro Armando Falcão preferiu nada declarar (Jornal da Anistia, 1978,

p. 33).

A resposta evasiva do ministro militar já começava a causar um certo transtorno à sociedade. Não era mais possível encobrir o terror com uma cortina de fumaça, como se nada estivesse acontecendo, principal-mente porque a sociedade civil vinha paulatinamente trilhando cami-nhos de fortalecimento. Era o silêncio como forma de impor um silêncio coletivo, ou um simples esquecimento dos parentes desaparecidos, con-duzindo seus espaços institucionais de forma cada vez mais larga e, esca-pando, paulatinamente, da perseguição e do autoritarismo.

Os atores que retornavam, começavam a falar. Os sobreviventes passavam a denunciar as torturas, a mostrar as pistas e paradeiros dos companheiros que não puderam sobreviver. No início, de forma muito tímida, mas em meio ao silêncio continuado, as vozes começavam a eco-ar de canto a canto, como se formassem um grande coro de dezenas, centenas, milhares de gritos e gemidos que se somavam às palavras de ordem no retorno das mobilizações.

FOUCAULT(1986), ao se referir ao tema "morte", lembra o caráter é-moderno dos suplícios corporais e, ao mesmo tempo, a dimensão

'-i a e iolenta que integra a Justiça. Essa mesma dimensão, porém,

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Desaparecidos políticos -

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universalizava as regras de punição através de um espaço institucional marcado pela força. Mesmo assim, o ato de punir não é tão glorioso e apavora até mesmo a própria justiça.

o

escândalo e a luz serão partilhados de outra forma; é a própria condenação que marcará o delinquente com o sinal negativo e unívoco: publicidade, portanto, dos debates e da sentença. Quan-to a execução, elaécomo uma vergonha suplementar que a justi-ça tem vergonha de impor ao condenado (FOUCAULT, 1986, p.

15).

No Brasil pós 64, a pena poderia ser sempre complementada. Do clandestino com a prisão, do preso com a tortura ou a morte, do morto com a desaparecimento do corpo, das famílias dos desaparecidos com a impossibilidade de reverenciar seu ente querido, e do delator com a mar-ca perpétua da traição. Isso poderia ser complementado com a tentativa do autoritarismo de matar a pessoa moral do homem, que, segundo Arendt, se alcançado, tornaria

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i m p o s s í v e l , p e l a p r i m e i r a v e z n a h i s t ó r i a , o s u r g i m e n t o d a c o n d i ç ã o d e m á r t i r (ARENDT, 1990, p. 502).

A impossibilidade da l e g a l i z a ç ã o d a m o r t e é que gerou um processo no interior da vida política no sentido do reconhecimento da violência, que não poderia existir transparentemente. Isso porque o reconhecimento da morte em determinados casos era o reconhecimento das torturas e isso revelaria a grande mentira que o Estado militar tentava passar àsociedade, chegando muitas vezes a se apresentar como vítima dos t e r r o r i s t a s .

O desaparecimento era um corpo jurídico estranho. Convivia com o fantasma do terror, das torturas, da violência e das mortes, continuan-do, assim, a atormentar simbolicamente os vivos, principalmente a famí-lia que o aguardava e sofria pelo retorno esperado, sabendo, contudo, que ele nunca chegaria. Sendo assim, restariam as imagens, que poderi-am ficar cada vez mais difusas e apagadas com o sopro da temporal idade.

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a esposa de um desaparecido não é nada, não é solteira, não é

casada nem viúva. Não tem direito. Não pode movimentar even-tualmente contas em bancos sem procuração do marido, não pode vender um bem ... nada. Tudo porque as autoridades não assumem o que aconteceu. Só depois de alguns anoséque a família acaba-va, relutantemente, abrindo processo para que o desaparecido seja juridicamente declarado ausente. Aí começa a se regulamentar a situação (Jornal da Anistia, 1978).

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Até O reconhecimento por parte da família de que o desaparecido está morto, lá se vão vários anos. De um lado, a esperança de vida que alimentava a ilusão e a fantasia cotidiana. De outro lado, ter que conviver com a amargura da dor, do sofrimento da morte, da qual não se tem certeza se existiu. M esmo assumindo juridicamente a figura da morte, a família continuava mergulhando na tensão entre a finitude e a infinitude ,ou, como afirmaria NIETZSCHE (1983d), entre o bem e o mal.

O Cardeal Arns lembra que um dia, ao abrir a porta do seu gabine-te, encontrou duas senhoras: uma jovem e uma idosa. A primeira colo-cou um anel em sua frente dizendo que era a aliança do marido desapa-recido encontrada na porta da sua casa. Perguntava ao Cardeal sobre o significado da devolução.

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Éo significado da vida ou da morte? A resposta não poderia ser dada naquelas condições. A segunda, mais idosa, fazia a mesma pergunta há meses sobre o paradeiro de seu filho.

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Logo após o seqüestro, ela vinha todas as semanas. Depois reapa-recia de mês em mês. Sua figura parecia sempre mais com a de todas as mães de desaparecidos. Durante mais de cinco anos, acom-panhei a busca de seu filho através da Comissão Justiça e Paz e mesmo o Chefe da Casa Civil da Presidência da República. O corpo da mãe parecia diminuir de visita em visita. Um dia ela desapareceu. M as seu olhar suplicante de mãe jamais se apagará de minha retina (ARNS, 1989, p. 11 e 12).

A busca dos desaparecidos é a busca dos direitos desaparecidos ou roubados pelo autoritarismo. Na medida em que a sociedade civil se for-talecia, mais reforçava a luta pelos direitos políticos, fazendo com que o homem se afirmasse como pressuposto da liberdade. O Estado militar não poderia matar a alma nem a memória dos desaparecidos, essa dispu-ta de memórias que se iniciaria já na década de 70, reforçando a constru-ção de uma identidade da família dos desaparecidos. A possibilidade orgânica no interior da sociedade civil já era uma realidade, pois já na segunda metade dos anos 70 as demonstrações de recuperação faziam-se visíveis nas falas dos perseguidos e pessoas da família.

A busca do filho ou do marido desaparecido reacende a imagem do pior tormento: a da incerteza. M as, ao construir uma identidade

cole-i a, fortaleccole-iam-se as buscas no sentido de descobrir as cavernas,

fazen-do altar das sombras réstias de luzes, conforme a metáfora do

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m i t o d a ca erna(PLATÃO, 1983). M as, essas luzes necessitavam de

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Desopored ospoIítims

DCBA

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das reconstruções e referências simbólicas; para que a vida pudesse pros-seguir, teriam que construir os rituais de passagem entre a vida e a morte, entre o sonho e a realidade:

o caso dos desaparecidos, a negação da morte impede a ocor-rência deles(. ..), O luto é um estado ( implica sentimentos, dor, sofrimento e readequação) e um período de desadequação e bus-ca de adequação. Não poder viver o luto, como no bus-caso do desa-parecido, significa não ter chance de reorganizar os esquemas sim-bólicos que perderam o sentido. É por isso que as famílias dos desaparecidos políticos no Brasil continuam pedindo o 'corpo' de seus mortos (PIETROCOLLA, 1995/1996, p. 66 e 67).

É nesse sentido que mais um móvel da sociedade civil seria incor-porado ao ideário de esperança e da busca dos direitos usurpados que, naquele momento, seria representado por movimentos das famílias que conseguissem um nível mínimo de questionamento a este autoritarismo. Isso reforçaria simbolicamente a luta coletiva que, de alguma forma, ain-da estava presa àesfera privada da famíl ia, mas marcaria profundamente os homens e mulheres daquela época, mesmo que fosse em um contexto autoritário.

A busca incansável de um mundo justo era o melhor alento de que os revolucionários dispunham naquele momento, levando-os a sobres-saltos, despertando-os melhor para a dura realidade que se desenhava à

sua frente. Era sempre um novo começo, uma nova luta. Vitórias, quem sabe? O certo era o grande turbilhão que jorrava e devorava as vidas e as mortes, deixando apenas a teimosia e a esperança da família.

Os donos do poder não se contentavam mais em matar os revolu-cionários, necessitavam continuar matando tudo o que se aproximasse pela frente, devorando os filhos, desaparecendo nos porões, esconden-do-se da vida, sem que o direito ao luto, à sepultura, ao túmulo, ao velório, ao ritual da morte fossem assegurados. Nas trilhas da vida, pas-savam necessariamente as trilhas da morte, do mesmo jeito que, segun-do Morin (1995),

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...0regresso da morte éum grande acontecimento civilizacional e

o problema de conviver com a morte vai inscrever-se cada vez mais profundamente no nosso viver. E isso vai levar-nos a um modo de viver de dimensão simultaneamente pessoal e social. Mais uma

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vez, o caminho da morte deve levar-nos mais fundo na vida, como

o caminho da vida nos deve levar mais fundo na morte (MORIN,

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1995, p. 11)

José Gerardo Vasconcelos

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Gerordo Vasconcelos

Notas

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Militante do Movimento Revolucionário 26 de Março ( MR- 26), nas-ceu a 15 de março de 1936, em Belém do Pará. Aos 17, anos vai para o Rio de Janeiro. Em 1955 ingressou no Exército. Em 25 de agosto de 1963, foi transferido do Rio de Janeiro para Mato Grosso como repre-sália àsua participação na vida política e social do País. Logo após o golpe, tem sua prisão decretada e passa a viver na clandestinidade. Foi preso no dia 11 de março de 1966 em Porto Alegre. No DOPS, foi torturado pelo Delegado Itamar Fernandes de Souza e José Morsch, entre outros. Segundo o Dossiê dos mortos e desaparecidos polí-ticos a partir de 64, "No dia 24 de agosto de 1966, seu corpo foi encontrado boiando no Rio Jacuí. Segundo depoimentos de testemu-nhas ouvidas no inquérito instaurado para esclarecimento da prisão, tortura e morte do Sargento Manoel Raimundo, sua via crucis pelos órgãos de repressão foi a seguinte: até o dia 19 de março, esteve detido no DOPS; em seguida, foi transferido para a ilha-presídio existente no Rio Guaíba; em 13 de agosto foi recambiado para o DOPS e, em 24 de agosto, foi encontrado boiando no Rio Iacuf" (Dossiê dos mortos e desaparecidos políticos a partir de 64, 1995: 48 e 49).

2 Da literatura consultada, podemos destacar, sobre a morte, os

seguin-tes autores: AIRES(1977); ARENDT (1990); BAUDRILLARD (1996); BOEMER (1989); CASSORLA(1991), (1992); EPICURO(1984); FAUSTO NETO (1991); FAUSTO (1984); MARTINS(1983), (1992); MARTIN(1993); MAFFESOLl (1985); MARANHÃO (1987); MÉNARD (1991); MORIN (1995); NIETZSCHE (1983a), (1983b), (1983c); PLATÃO (1987).

3 Militante da Ação Libertadora Nacional (ALN), nasceu no dia 12 de janeiro de 1942, em São Paulo. Professora universitária no Instituto de Química da Universidade de São Paulo. Conforme depoimento de seu irmão, Bernardo Kucinsky, transcrito pelo Dossiê dos mortos e desa-parecidos políticos a partir de 1964, temos a marca da angústia e do sofrimento: "Minha irmã, Ana Rosa Kucinsky, e meu cunhado Wil-son Silva, foram presos e desaparecidos em São Paulo, na tarde de 22 de abril de 1974. Nesse dia, Wilson Silva e seu colega de trabalho Osmar Miranda Dias foram fazer um trabalho de rotina, saindo do escritório da Av. Paulista para o centro da cidade, um pouco antes da hora do almoço, após o que Wilson se separou de Osmar dizendo que

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iria se encontrar com sua esposa Ana Rosa, na Praça da República. partir desta tarde, nunca mais foram vistos. A família tomou conheci-mento, através de colegas, da ausência de Ana Rosa da Universidade e, de imediato, passou a tomar providências no sentido de localizar o casal." (Dossiê dos Mortos e desaparecidos a partir de 64, 1995: 256)zyxwvutsrqponmlkjihgfedcbaZYXWVUTSRQPONMLKJIHGFEDCBA

4 Militante da Ação Libertadora Nacional- ALN. Nasceu em 29 de agosto de 1941. Desaparecida desde 1972, quando tinha 31 anos. Em 1965, iniciou o curso de Ciências Sociais na Faculdade de Filosofia Ciências e Letras da Universidade de São Paulo e, em 1967, tranca a matrícula. Em 1970, passou a morar no Rio de Janeiro, onde foi presa no dia 30 de janeiro de 1972. No depoimento de sua mãe, Felícia Mardini de Oliveira, temos o seguinte: "em 16 de junho de 1970, lsis foi morar no Rio de Janeiro. A princípio vinha sempre visitar-nos em São Paulo. Outras vezes, nós a encontrávamos no Rio, em lugares pré combina-dos. Um dia, ao despedir-se ela disse: "Mãe, se alguma coisa me acon-tecer, uma companheira dará notícias para você". Eu fiquei muito ner-vosa com essa informação. No dia seguinte, conforme havíamos

com-bi nado, eu fu i ao seu encontro. Esperei por várias horas, ísis não apare-

95

ceu. Nunca mais a vi" (Dossiê dos mortos e desaparecidos a partir

de 64, 1995: 307).

Figurinista, morta em circunstâncias ainda não esclarecidas, em 1976, relata ao historiador Hélio Silva o desaparecimento de seu filho, di-vulgado pela Folha de São Paulo de 02/09/79, no artigo assinado por Tamar de Castro, intitulado - Seu filho está sendo morto agora. No livro de VALLI(1987), intitulado: Eu, Zuzu Angel, procuro meu fi-lho, encontramos o seguinte depoimento: "eu sou mineira jeca. Agora virei uma negocista( ... ) Agora tenho que entrar nessa política e virar militante. Que jeito? A procura do meu filho, e depois dos filhos das outras, me envolveu completamente. Quando a minha moda já estava fazendo sucesso e parecia, finalmente, que ia dar certo financeiramen-te( .. .). Como não viver o drama das outras mães que não tinham cora-gem ou, às vezes, nem tinham dinheiro para sair pelo mundo gritando, como eu fazia para procurar meu filho desaparecido, isto é, assassina-do na tortura? Que toassassina-do munassassina-do sabia e fingia que não sabia: torturaassassina-do e assassinado nos porões da PE da Rua Barão de Mesquita, no ClSA ou no CENIMAR, nessas milhares de masmorras que a ditadura criou pelo Brasil afora. Nós, como loucas, indo a todos os lugares( ... ). A tortura era isso também. A incerteza. Vivo e morto ao mesmo tempo.

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José Gerardo Vasconcelos

quer pista que davam eu seguia em frente, procurava pessoas estra-nhas, parentes de presos, querendo saber mais. Sofrer mais".

6 M ilitante do M ovimento Revolucionário 8 de Outubro - M R-8, nasceu

em 11 de janeiro de 1946, na Bahia, desapareceu desde 1971, aos 26 anos de idade. Estudante de economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro, foi preso no Grajaú, no Rio de Janeiro. Segundo relato do Dossiê dos M ortos e desaparecidos políticos a partir de 64, (1995, 388 e 389), "Ao cair da noite, após inúmeras sessões de tortura, já

com o corpo esfolado, foi amarrado

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àtraseira de um jipe da Aeronáu-tica e arrastado pelo pátio com a boca colada ao cano de descarga do

veículo, o que ocasionou sua morte por asfixia e intoxicação por monóxido de carbono".

96

Enviado poro publicaçõo: 05.01.2010

Aceito poro publkoçõo. 30.04.2010

DCBA

Referências

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