ANTIBIÓTICOS PARA PROFILAXIA DE INFECÇÃO DE SÍTIO CIRÚRGICO (ISC)
Hospital da Criança Conceição Serviço de Controle de Infecção Hospitalar
2014
2
Gerente de Unidades de Internação do HCC Dr. Fernando Anschau
Serviço de Controle de Infecção Hospitalar Equipe de Trabalho
Dra. Márcia M. Marquesan Dra. Patrícia Reis Pereira
Enfa. Agilce R. Franzon Dr. Paulo R. P. Behar
Secretária Nara Maria André Mattos
Hospital da Criança Conceição SCIHHCC
2014
3
Sumário
ANTIBIÓTICOS PARA PROFILAXIA DE INFECÇÃO DE SÍTIO CIRÚRGICO (ISC) ... 1
I
NTRODUÇÃO... 5
1.
N
ORMA ER
OTINAT
ÉCNICO-‐O
PERACIONAL DEA
NTIBIÓTICOS PARAP
ROFILAXIA DEISC
NOHCC ... 5
1.1. Processo decisório: usar ou não antibiótico profilático para ISC ... 6
1.2. Recomendações para uso profilático de antibióticos no HCC ... 8
1.3. Exemplos de prescrição de antibiótico profilático no HCC ... 10
2.
T
EXTOB
ASE DESTAR
OTINA... 11
1.2. Recomendações para uso profilático de antibióticos por procedimento e especialidade ... 12
Pontos Chave do uso de antibióticos para a profilaxia de ISC ... 15
Medidas para a redução de ISC ... 15
Fatores de risco para ISC relacionados ao paciente ... 16
Fatores de risco para endocardite infecciosa ... 17
Patógenos comuns, indicação e seleção do antibiótico ... 18
Via de administração ... 19
Momento da dose pré-‐operatória ... 19
Dose ... 20
Doses adicionais (redosing) ... 20
Duração da Profilaxia ... 20
Considerações específicas sobre procedimentos de especialidades cirúrgicas ... 21
Procedimentos Cardíacos ... 21
Procedimentos Torácicos ... 21
Procedimentos Gastroduodenais ... 22
Procedimentos no Trato Biliar ... 22
Apendicectomia ... 22
Cirurgia de Intestino Delgado ... 23
Procedimentos de Reparo de Hérnia (hernioplastia e herniorrafia) ... 23
Procedimentos Colorretais ... 23
Cirurgia de Cabeça e Pescoço ... 23
Procedimentos Neurocirúrgicos ... 23
Parto Cesáreo ... 23
Histerectomia ... 23
Procedimentos Ortopédicos ... 23
Procedimentos Urológicos ... 23
Procedimentos Vasculares ... 24
Populações especiais de pacientes ... 24
Pacientes Pediátricos ... 24
Pacientes com alergia a β-‐lactâmicos ... 24
Pacientes com implantes de próteses ... 25
Pacientes com disfunção renal ou hepática ... 25
3.
I
NSTITUIÇÃO DAR
OTINA... 26
ANEXOS ... 27
Infecção de Sítio Cirúrgico ... 27
Classificação de ferida por potencial de contaminação e Definições de ISC – ANVISA, 2009 ... 27
Cirurgias Limpas ... 27
Cirurgias Potencialmente Contaminadas ... 28
Cirurgias Contaminadas ... 28
Cirurgias Infectadas ... 28
Classificação e critérios definidores de ISC – ANVISA, 2009 ... 28
Conceitos de Infecção Hospitalar ... 31
Procedimentos mais realizados no HCC ... 33
4
Tabelas e Figuras
Figura 1 – Fluxograma e processo decisório para indicação de antibiótico profilático para infecção de sítio
cirúrgico (ISC) ... 7
Tabela 1 – Indicação de uso profilático de antibióticos para os procedimentos mais realizados no HCC ... 9
Tabela 2 – Doses e intervalos recomendados para antibióticos comumente usados para profilaxia cirúrgica ... 10
Tabela 3 – Recomendações para uso profilático de antibióticos por procedimento e especialidade cirúrgica ... 13
Tabela 4 – Procedimentos com recomendação de profilaxia para endocardite ... 17
Tabela 5 – Procedimentos cuja profilaxia para endocardite não é indicada ... 18
Tabela 6 – Recomendações quanto a alergia à penicilina ... 25
Tabela 7 – Classificação e critérios definidores de infecção cirúrgica ... 29
Tabela 8 – Conceitos de Infecção Hospitalar segundo a ANVISA, 2006 ... 31
Tabela 9 – Procedimentos realizados no HCC em 8,5 meses (01/10/2013 a 12/06/2014) ... 33
5
I NTRODUÇÃO
A Portaria 2.616 do Ministério da Saúde,
1que regulamenta as ações de controle de infecção hospitalar no país, estabelece a organização e as competências da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH), do Serviço de Controle de Infecção Hospitalar (SCIH) e do Programa de Controle de Infecção Hospitalar (PCIH). Uma das competências é “elaborar, implementar, manter e avaliar ações relativas ao uso racional de antimicrobianos” (item 3.1.4 do Anexo I). Outra competência relacionada a este item é “adequar, implementar e supervisionar a aplicação de normas e rotinas técnico-‐operacionais, visando à prevenção e ao tratamento das infecções hospitalares” (item 3.1.6).
1O presente texto tem por objetivo padronizar a utilização do uso de antibióticos profiláticos para infecção de sítio cirúrgico promovendo, em parceria com os cirurgiões e anestesistas, as boas práticas nesse campo de atuação, ao mesmo tempo em que busca cada vez mais conformidade com as diretrizes nacionais.
Como diretriz ou regra alguma tem a capacidade de incluir todas as possibilidades clínicas ou médico-‐cirúrgicas de 100% dos pacientes,
2casos cuja condição seja considerada uma exceção à rotina, são descritas na “Solicitação de Antiinfecciosos” do prontuário eletrônico dos pacientes.
A primeira parte deste documento apresenta o processo decisório de antibioticoprofilaxia para infecção de sítio cirúrgico no HCC com o objetivo prático de consulta rápida. A segunda parte detalha e aprofunda a Rotina num texto desenvolvido para disponibilizar maior entendimento dos itens apresentados nos processos decisórios da primeira parte.
1. N ORMA E R OTINA T ÉCNICO -‐O PERACIONAL DE A NTIBIÓTICOS PARA P ROFILAXIA DE
ISC NO HCC
O presente documento, feito em colaboração entre o SCIHHCC e as Equipes Cirúrgicas do HCC, tem por objetivo final a melhor assistência com a menor taxa possível de ISC. Um objetivo secundário é a otimização do uso de antibióticos para desacelerar o desenvolvimento de resistência microbiana.
Primando pela qualidade da assistência e melhor evidência, esta recomendação tem
por documento base principal a diretriz “Clinical practice guidelines for antimicrobial
prophylaxis in surgery”
2, 3publicada na revista “Surgical Infection” de fevereiro de 2013,
cujas recomendações são feitas para pacientes adultos e pediátricos, sem abordarem
6 crianças recém-‐nascidas entretanto. Assim sendo, o presente documento aborda o uso de antibiótico profilático em adultos e crianças, procurando dar ênfase à parte pediátrica. O grau de evidência das recomendações pode ser encontrado na Tabela 1.
21.1. Processo decisório: usar ou não antibiótico profilático para ISC
Para alcançar os objetivos apontados acima, um conjunto de medidas deve ser observado. Alguns exemplos são dados a seguir. Previamente ao procedimento cirúrgico, idealmente desde antes da hospitalização do paciente, as medidas de controle de infecção já se fazem aplicáveis. Quando possível dentro das particularidades locais, em cirurgias eletivas, o período de tempo entre a hospitalização e a cirurgia deve ser curto. E, desde o primeiro dia de hospitalização até o pós-‐operatório e a alta hospitalar, deve-‐se procurar aplicar todas as recomendações de CCIH. Apesar do presente texto não ter por enfoque estas medidas, cabe salientar que elas tem papel fundamental na prevenção de ISC.
Somente depois é que vem a abordagem da prevenção pelo uso de antibióticos, a se somar às demais medidas de CCIH. A Figura 1 apresenta o panorama geral onde o processo decisório de indicação de uso de antibiótico profilático se insere.
7 Figura 1 – Fluxograma e processo decisório para indicação de antibiótico profilático para infecção de sítio cirúrgico (ISC)
A Tabela 1 apresenta os procedimentos mais realizados atualmente no HCC; consultar também a Tabela 3, que apresenta as recomendações da literatura. Referências para Fator de risco do paciente: 2; Fator de risco da cirurgia: 1, 4; Aplicações das recomendações de CIH relacionadas à cirurgia: 4, 5; uso de antibiótico terapêutico: 2.
Obs.: Quando apropriado, avaliar também presença de fator de risco para endocardite 6 – Tabelas 4 e 5.
8
Os fatores de risco do paciente para ISC, referidos na Figura 1, são:
• extremos de idade ou
• imunodepressão (desnutrição, SIDA, uso de corticoide ou outros imunossupressores, neoplasia) ou
• diabete descompensado ou
• > 3 diagnósticos de doença crônica
Constituem-‐se exemplos do item "> 3 diagnósticos de doença crônica": hipoxemia, obesidade, infecção à distância, cirurgia recente, inflamação crônica, irradiação local prévia.
Paralelamente à avaliação dos fatores de risco relacionados ao procedimento e ao paciente, os fatores de risco para endocardite devem também ser considerados. São eles:
• prótese valvular cardíaca
• história prévia de endocardite
• cardiopatias congênitas cianóticas
• condutos/ “shunts” sistêmico-‐pulmonares construídos cirurgicamente
• outras malformações cardíacas
• disfunção valvular adquirida
• prolapso mitral com regurgitação
• miocardiopatia hipertrófica
1.2. Recomendações para uso profilático de antibióticos no HCC
A Tabela 1 apresenta os principais procedimentos cirúrgicos (86%) realizados no HCC atualmente (segundo Tabela 9), por ordem de frequência, e aponta os que têm recomendação de uso de antibiótico profilático, e qual o indicado. A recomendação apresentada na Tabela usa o critério “procedimento”. Os demais critérios para uso de antibiótico profilático podem ser encontrados adiante.
9 Tabela 1 – Indicação de uso profilático de antibióticos para os procedimentos mais realizados no HCC
Procedimento No. Antibiótico Profilático alergia a β-
lactâmico * Força de Evidência
TRATAMENTO C/ CIRURGIAS MÚLTIPLAS 232 **
ESOFAGOGASTRODUODENOSCOPIA 163 NI
DISSECCAO DE VEIA / ARTÉRIA 146 NI
APENDICECTOMIA VIDEOLAPAROSCOPICA 140 CFX CLI + GEN A
INCISAO E DRENAGEM DE ABSCESSO 133 AT
PUNÇÃO LOMBAR 110 NI
EXCISAO LESÃO E/OU SUTURA DE FERIMENTO PELE ANEXOS E MUCOSA 110 **
HERNIOPLASTIA INGUINAL / CRURAL (UNILATERAL) 88 CFZ CLI A
AMIGDALECTOMIA C/ ADENOIDECTOMIA 65 NI
BIÓPSIA DE MEDULA ÓSSEA 63 NI
BRONCOSCOPIA (BRONCOFIBROSCOPIA) 63 NI
APENDICECTOMIA 60 CFX CLI + GEN A
LARINGOSCOPIA 53 NI
ORQUIDOPEXIA UNILATERAL 49 CFZ CLI A
REMOÇÃO DE CERUMEN DE CONDUTO AUDITIVO EXT. UNI / BILATERAL 44 NI
DRENAGEM DE ABSCESSO 43 AT
MICROCIRURGIA OTOLÓGICA 40 **
EXCISÃO E/OU SUTURA SIMPLES DE PEQUENAS LESÕES / FERIMENTOS
DE PELE / ANEXOS E MUCOSA 31 **
DERIVAÇÃO VENTRICULAR PARA PERITÔNEO / ÁTRIO / PLEURA / RAQUE 29 CFZ CLI A
POSTECTOMIA 24 NI
HERNIOPLASTIA INGUINAL (BILATERAL) 23 CFZ CLI A
PALATOPLASTIA SECUNDÁRIA EM PACIENTE COM ANOMALIA CRÂNIO E
BUCOMAXILOFACIAL 21 **
IMPLANTAÇÃO DE CATETER DE LONGA PERMANÊNCIA SEMI OU
TOTALMENTE IMPLANTAVEL (PROCEDIMENTO PRINCIPAL) 21 CFZ CLI A (marca-
passo)
EXODONTIA DE DENTE DECÍDUO 21 NI
LAPAROTOMIA EXPLORADORA 19
eletivo, êrisco: NI eletivo, érisco: CFX
NI
CLI + GEN A A RETIRADA DE CORPO ESTRANHO DE OUVIDO/FARINGE/LARINGE/NARIZ 17 SIE
TENOMIOTOMIA / DESINSERÇÃO 17 NI C
RETIRADA DE CATETER DE LONGA PERMANÊNCIA SEMI OU
TOTALMENTE IMPLANTÁVEL 16 SIE
PIELOPLASTIA 14 CFZ GEN + CLI A
CURATIVO GRAU II C/ OU S/ DEBRIDAMENTO 13 NI
LABIOPLASTIA SECUNDÁRIA EM PACIENTE COM ANOMALIA CRÂNIO E
BUCOMAXILOFACIAL 13 **
CORRECAO DE HIPOSPADIA (1o TEMPO) 13 CFX GEN + MET A
ADENOIDECTOMIA 12 NI
TRATAMENTO ODONTOLOGICO P/ PACIENTES C/ NECESSID. ESPECIAIS 11 **
PALATOPLASTIA PRIMÁRIA EM PACIENTE COM ANOMALIA CRÂNIO E
BUCOMAXILOFACIAL 10 CFZ + MET CLI B
CORRECAO CIRURGICA DO ESTRABISMO (ATE 2 MUSCULOS) 10 SIE
TRATAMENTO CIRURGICO DE ANOMALIAS CONGENITAS ANUS E RETO 10 CFX CLI + GEN A
COLECISTECTOMIA VIDEOLAPAROSCOPICA 10 CFX CLI + GEN A
HERNIOPLASTIA UMBILICAL 10 CFZ CLI A
COLONOSCOPIA (COLOSCOPIA) 9 NI
RESSUTURA DE PAREDE ABDOMINAL (P/ DEISCÊNCIA TOTAL/EVISCER.) 9 SIE
TRAQUEOSTOMIA 8 NI
PAN-FOTOCOAGULAÇÃO DE RETINA A LASER 8 NI
HERNIOPLASTIA EPIGÁSTRICA 8 CFZ CLI A
BIÓPSIA DE FÍGADO POR PUNÇÃO 7 NI
FRENECTOMIA 7 SIE
EXÉRESE DE CISTO TIREOGLOSSO 7 **
TRATAMENTO CIRÚRGICO DO SINUS PRÉ-AURICULAR 7 CFZ + MET CLI B
TRATAMENTO CIRÚRGICO DE DISRAFISMO ABERTO 7 SIE
ESPLENECTOMIA 7 CFZ CLI -
No.: número de procedimentos realizados entre 01/10/13 e 12/06/14. * Baseada na Tabela 3. ** A decisão de usar antibiótico profilático depende de quais cirurgias serão realizadas e se além da incisão de pele, há também envolvimento de mucosa no procedimento, se já há infecção local ou à distância presente, qual o grau de contaminação, dentre outras possibilidades – consultar também a Tabela 2; NI: não indicado antibiótico profilático; AT: avaliar se indicado antibiótico terapêutico; SIE: sem informação específica da literatura no texto utilizado como base do presente documento.2 CFZ:
cefazolina; CFX: cefoxitina; CLI: clindamicina; GEN: gentamicina; MET: metronidazol. Para procedimentos aqui não contemplados, consultar a Tabela 3.
10 Tabela 2 – Doses e intervalos recomendados para antibióticos comumente usados para
profilaxia cirúrgica
Antibiótico Dose para Adultos Dose Pediátrica T 1/2 Intervalo
ANTIBIÓTICOS I.V.
amoxicilina 2 g 50 mg/kg 0,8-‐1,3 2
ampicilina 2 g 50 mg/kg 1-‐1,9 2
ampicilina-‐sulbactam 3 g (2 g / 1 g) 50 mg/kg de
ampicilina 0,8-‐1,3 2
cefazolina 2 g; 3 g se > 120 kg 30 mg/kg 1,2-‐2,2 4
cefuroxima 1,5 g 50 mg/kg 1-‐2 4
cefoxitina 2 g 40 mg/kg 0,7-‐1,1 2
clindamicina 900 mg 10 mg/kg 2-‐4 6
gentamicina 5 mg/kg 2,5 mg/kg 2-‐3 NA
metronidazol 500 mg 15 mg/kg
(neonatos < 1200 g:
7,5 mg/kg)
6-‐8 NA
vancomicina 15 mg/kg 15 mg/kg 4-‐8 NA
ANTIBIÓTICOS V.O.**
eritromicina 1 g 20 mg/kg 0,8-‐3 NA
metronidazol 1 g 15 mg/kg 6-‐10 NA
neomicina 1 g 15 mg/kg 2-‐3 (3%
absorvido) NA
* T1/2: Meia-‐vida em Adultos com função renal normal; ** Para cirurgia colorretal, usada em conjunto com a preparação mecânica do cólon.
NA: não se aplica. Vancomicina não deve ser utilizada de rotina segundo a Padronização do GHC, o Programa de Antibióticos do HCC, CDC e textos sobre antibiótico profilático. Quando houver algum motivo específico eventual para considerar o seu uso, contatar o SCIH previamente. Para detalhes da sua utilização, vide item momento da dose pré-‐operatória.
1.3. Exemplos de prescrição de antibiótico profilático no HCC
Para fins práticos de protocolo, são disponibilizados, a seguir, dois exemplos de prescrição, na parte de antibiótico profilático da Solicitação de Antiinfecciosos do GHC, para criança sem outros fatores de risco para ISC nem para Endocardite Infecciosa.
Procedimento Antibiótico Dose Momento Duração
Apendicectomia Cefoxitina 40 mg/kg 60 min antes da incisão
APENAS 1 MOMENTO (DOSE ÚNICA)
Hernioplastia Cefazolina 30 mg/kg 60 min antes
da incisão APENAS 1 MOMENTO (DOSE ÚNICA)
No caso de apendicite aguda, além do antibiótico profilático para ISC, metronidazol +
gentamicina são classicamente utilizados como antibioticoterapia da apendicite. Exemplo de
dose adicional e seu intervalo: em procedimento para o qual foi indicada cefoxitina, caso o
procedimento demore mais do que 2 horas, uma dose adicional de cefoxitina na 2
a. hora do
transoperatório.
11
2. T EXTO B ASE DESTA R OTINA
Esta rotina tem por objetivo disponibilizar aos Profissionais do HCC uma abordagem racional, segura e padronizada sobre o uso efetivo de antibióticos na prevenção de infecções de sítio cirúrgico. É baseada nas evidências clínicas correntes, internacionais e nacionais, assim também como na legislação Brasileira.
1, 4, 7-‐9E, por ser o assunto, de interesse principal do Cirurgião, a literatura desta área foi aqui privilegiada.
2As definições de Infecção de Sítio Cirúrgico (ISC) são apresentadas no item 3; nesta parte iniciamos apresentando conceitos sobre o uso profilático de antibióticos. O Consenso Brasileiro de uso de Antibióticos
9, elaborado pela ANVISA, faz recomendações interessantes sobre o uso destes medicamentos no contexto da profilaxia de infecções de sítio cirúrgico.
Essas recomendações são de 2001 e comportam alguns comentários, feitos posteriormente na sequência do texto.
1. “A profilaxia é utilizada para reduzir os riscos de infecção no sítio da cirurgia. Não tem como finalidade reduzir o risco de infecção em outros sítios.”
2. “A profilaxia antimicrobiana não funciona como substituto para antissepsia adequada, técnica cirúrgica correta e avaliação precisa do paciente.”
3. “O espectro do antimicrobiano deve ser relacionado com a microbiota do sítio cirúrgico e compatível com o perfil de sensibilidade do hospital.”
4. “Não há indicação de profilaxia antimicrobiana na maioria das cirurgias limpas e potencialmente contaminadas porque sua utilização não determina redução da taxa de infecção da ferida.”
5. “A profilaxia antimicrobiana é indicada em:
• intervenções cirúrgicas em pacientes idosos, imunodeprimidos, portadores de mais de três diagnósticos ou diabéticos descompensados;
• cirurgias contaminadas, exceto em cirurgia proctológica orificial e na drenagem de abscessos localizados em pacientes clinicamente estáveis;
• cirurgias cardíacas com uso de circulação extracorpórea;
• cirurgias ortopédicas (limpas, com prótese);
• cirurgias vasculares periféricas (limpas, com prótese);
• cirurgias torácicas;
• cesariana antes da incisão (atualizado segundo referência atual)
2;
• histerectomias;
• cirurgias especiais como:
• hérnias multi-‐recidivadas
• hérnias incisionais volumosas
• implantes de próteses
• esplenectomia, na hipertensão portal;
• cirurgias neurológicas limpas e potencialmente contaminadas;
• cirurgias urológicas.”
6. “O uso prologado de antibiótico no pós-‐operatório não reduz o risco de infecção e
aumenta o custo, a resistência bacteriana e os efeitos colaterais indesejáveis.”
12 7. “Não é recomendado estender a profilaxia além do tempo transcorrido da cirurgia.”
8. “A profilaxia antimicrobiana em cirurgia tem início na indução anestésica. Duração: dose única que cubra o tempo da intervenção.”
9. “As cefalosporinas de I geração são as drogas de escolha para a maioria das especialidades cirúrgicas.”
10. “A cefazolina tem meia vida de duas horas e cobre, portanto, cirurgias de até 3-‐4 horas de duração.”
11. “A cefalotina possui meia vida mais curta (28 minutos) obrigando à reutilização a cada uma hora de cirurgia.”
12. “Padronizar antimicrobianos usados no hospital e implantar rotinas de antibioticoprofilaxia clínica e cirúrgica são medidas que contribuem para o uso racional de antimicrobianos.”
Essas recomendações apontam para o conhecimento cerne em termos de uso de antibióticos profiláticos. A seguir o tema encontra-‐se mais extensamente apresentado.
Ressalta-‐se que, além do uso apropriado de antibióticos profiláticos, um conjunto de medidas deve ser observado para poder-‐se alcançar uma prevenção apropriada, tanto a nível de paciente individual, quanto no nível coletivo dos pacientes cirúrgicos do hospital. Desde antes da hospitalização, as medidas de controle de infecção já se fazem aplicáveis. Exemplo disso é o planejamento do intervalo de tempo entre a hospitalização e o procedimento, que deve ser o menor possível. E, desde o momento da hospitalização até o pós-‐operatório e até a alta hospitalar, deve-‐se procurar aplicar todas as recomendações de CCIH.
1, 4, 7, 8Somente depois desses cuidados todos é que vem a abordagem da prevenção pelo uso de antibióticos, a se somar às demais medidas de CCIH. O Fluxograma 1 apresenta o panorama geral onde o processo decisório de indicação de uso de antibiótico profilático se insere.
Outra visão importante a ser considerada é que “As recomendações podem não ser apropriadas em todas as situações clínicas. A decisão de seguir as recomendações deve ser baseada no julgamento clínico e em considerações das circunstâncias individuais do paciente e dos recursos disponíveis.”
21.2. Recomendações para uso profilático de antibióticos por procedimento e especialidade
A recomendação sobre os antibióticos de escolha é apresentada na Tabela 2, que agrupa os procedimentos por especialidade cirúrgica, para então propor o antibiótico de escolha, e a alternativa para o caso de alergia, para procedimentos realizados no HCC. Outros antibióticos não disponíveis no Brasil ou não padronizados no GHC, foram retirados da tabela originalmente publicada
2.
13
Tabela 3 – Recomendações para uso profilático de antibióticos por procedimento e especialidade cirúrgica
Especialidade/Procedimento Antibiótico Se alergia a β-‐
lactâmico Força da Evidência
Cardíaca
“by-‐pass” arterial coronariano Cefazolina Clindamicina A
Inserção de dispositivo cardíaco (ex.: marca-‐
passo) Cefazolina Clindamicina A
Dispositivo de assistência ventricular Cefazolina Clindamicina C
Torácica
Procedimentos não-‐cardíacos, incluindo
lobectomia, pneumectomia, ressecção pulmonar e toracotomia
Cefazolina,
Ampicilina/sulbactam
Clindamicina A
Cirurgia toracoscópica vídeo-‐assistida Cefazolina,
Ampicilina/sulbactam
Clindamicina C
Gastroduodenal
Procedimentos envolvendo entrada na luz do trato gastrintestinal (bariátrica,
pancreaticoduodenectomia)
Cefazolina Clindamicina +
Gentamicina A
Procedimentos sem entrada na luz do trato gastrintestinal (vagotomia altamente seletiva, antirrefluxo) para pacientes de alto risco
Cefazolina Clindamicina +
Gentamicina A
Trato biliar
Procedimento aberto Cefazolina, Cefoxitina Clindamicina +
Gentamicina
A
Procedimento laparoscópico, eletivo, baixo risco nenhum nenhum A
Procedimento laparoscópico, eletivo, alto risco Cefazolina, Cefoxitina Clindamicina +
Gentamicina A
Geral
Apendicectomia para apendicite não complicada Cefoxitina Clindamicina +
Gentamicina A
Intestino delgado não obstruído Cefazolina Clindamicina +
Gentamicina C
Intestino delgado obstruído Cefazolina +
Metronidazol
Metronidazol + Gentamicina
C Reparo de hérnia (hernioplastia e herniorrafia) Cefazolina Clindamicina A
Colorretal Cefazolina +
Metronidazol, Cefoxitina
Clindamicina +
Gentamicina A
Cabeça e pescoço
Limpa nenhum nenhum B
Limpa com colocação de prótese (exclui tubos de
timpanostomia) Cefazolina Clindamicina C
Cirurgia oncológica limpa-‐contaminada Cefazolina + Metronidazol
Clindamicina A
Outros procedimentos limpo-‐contaminados exceto tonsilectomia e procedimentos funcionais endoscópicos de seios da face
Cefazolina +
Metronidazol Clindamicina B
Neurocirurgia
14 Craniotomia eletiva e procedimentos de shunt de
líquido cefalorraquidiano Cefazolina Clindamicina A
Implante de válvulas intratecais Cefazolina Clindamicina C
Ginecologia e Obstetrícia
Parto Cesáreo Cefazolina Clindamicina +
Gentamicina A
Histerectomia (vaginal ou abdominal) Cefazolina, Cefoxitina Clindamicina +
Gentamicina A
Oftalmológica Neomicina-‐polimixina
B-‐gramicidina
*nenhum B
Ortopédica
Cirurgias limpas envolvendo mão, joelho ou pé e
não envolvendo implante de material estranho nenhum nenhum C
Procedimentos espinais com ou sem
instrumentação Cefazolina Clindamicina A
Reparo de fratura de bacia Cefazolina Clindamicina A
Implante de dispositivos de fixação interna Cefazolina Clindamicina C
Recolocação total de articulação Cefazolina Clindamicina A
Urológica
Instrumentação do trato urinário baixo com fator de risco para infecção (inclui biópsia transretal de próstata)
Cefazolina Gentamicina
com ou sem Clindamicina
A
Limpa sem entrada no trato urinário Cefazolina
( + gentamicinase colocação de prótese)
Clindamicina A
Limpa sem entrada no trato urinário envolvendo
prótese implantada Cefazolina +
gentamicina Clindamicina +
Gentamicina A
Limpa com entrada no trato urinário Cefazolina
( + gentamicinase colocação de prótese)
Gentamicina + Clindamicina
A
Limpa-‐contaminada Cefazolina +
Metronidazol, Cefoxitina
Gentamicina + Metronidazol ou
Clindamicina
A
Vascular Cefazolina Clindamicina A
Transplante
Transplante de coração -‐ coração, pulmão, coração-‐pulmão
Cefazolina Clindamicina A
**Transplante de pulmão e coração-‐pulmão Cefazolina Clindamicina A
**Transplante de fígado Piperacilina-‐
tazobactam Clindamicina +
Gentamicina B
Transplante de pâncreas e pâncreas-‐rim Cefazolina, fluconazol
(p/ pacientes com alto risco de infecção fúngica)
Clindamicina + Gentamicina
A
Cirurgia Plástica
Limpa com fator de risco ou limpa-‐contaminada Cefazolina Clindamicina C
* ou fluoroquinolona de 4a. Geração tópica 1 gota cada 5 – 15 min por 5 doses. Adição de cefazolina 100 mg subconjuntival 1 – 2,5 mg no final do procedimento é opcional ; ** força da evidência baseada em procedimentos cardíacos
15
Pontos Chave do uso de antibióticos para a profilaxia de ISC
Passamos agora, a considerar os pontos chave do uso de antibióticos na profilaxia de ISC.
2Quanto à aplicação das Diretrizes na Prática Clínica da fonte mais utilizada na confecção desta presente Rotina,
2ela visa pacientes adultos (> 19 anos) e pacientes pediátricos (1-‐ 18 anos); não incluindo menores de 1 ano. Uma série de princípios, evidências deve ser considerada, assim também como especificidades do paciente, do procedimento, da instituição incluindo os padrões locais de resistência a antibióticos.
Medidas para a redução de ISC
As estratégias, listadas a seguir, são realizadas para reduzir ISC, e devem ser consideradas em conjunto:
- atenção a estratégias básicas de controle de infecção - experiência do cirurgião
- técnica
- duração do procedimento
- ambiente hospitalar e da sala cirúrgica - esterilização dos instrumentos
- preparação pré-‐operatória - manejo perioperatório
- condição clínica subjacente do paciente
- antibiótico profilático, quando indicado (Tabela 1)
O Screening pré-‐operatório e descolonização com mupirocina é um assunto ainda em aberto na literatura. S. aureus é o patógeno mais comum em ISC nos EUA. E, colonização nasal por S. aureus, tanto MSSA quanto MRSA, aumenta o risco de ISC. A vigilância de carreador de S. aureus pode ser feita através de swab nasal, mas sítios adicionais podem ser usados como faringe, região inguinal, reto e feridas. Screening tem sido advogado para identificar candidatos à descolonização e seleção do antibiótico profilático (cefazolina x vancomicina). O Food and Drug Administration (FDA) aprovou a mupirocina intranasal pra erradicar a colonização de MRSA nasal em adultos e em profissionais da saúde, nos Estados Unidos da América. Dados mais recentes são melhores para pacientes com cirurgia cardíaca ou ortopédica, mas outros estudos não demonstram redução de ISC com o uso de mupirocina. Apesar de haver estudos que mostram um potencial de redução de ISC com uso de mupirocina, a dose ótima e duração não estão estabelecidas. A maioria dos estudos usou mupirocina nos 5 dias prévios à cirurgia. Terapia de descolonização com mupirocina é usada como medida adicional (além das demais medidas) para prevenir ISC por S. aureus. Uso universal não é encorajado pela literatura, e, no HCC, este uso também não é recomendado no momento.
16
Fatores de risco para ISC relacionados ao paciente
Os fatores de risco para Infecção de Sítio Cirúrgico relacionados ao paciente são:
- Extremos de idade
- Status nutricional comprometido (desnutrição) - Obesidade
- Diabete mélito - Neoplasia
- Irradiação local prévia - Tabagismo
- Coexistência de infecção à distância
- Resposta imune alterada (incluindo SIDA, uso de agentes imunossupressores, neutropenia)
- Terapia corticosteroide - Inflamação crônica - Hipoxemia
- Procedimento cirúrgico recente
- Duração prolongada da hospitalização pré-‐operatória - Colonização prévia com micro-‐organismos
A presença de fatores de risco do paciente para infecção, por si só, independentemente do tipo de procedimento, pode indicar o uso de antibiótico profilático.
Assim, a profilaxia com antibiótico pode ser justificada para qualquer procedimento se o paciente tem uma condição médica associada com risco aumentado para ISC ou se o paciente é imunocomprometido (desnutrido, neutropênico, recebendo agentes imunossuproessores).
Em cirurgia limpa com três ou mais desses diagnósticos, fica indicada a antibioticoprofilaxia para infecção pós-‐operatória. Assim, independentemente das indicações listadas na Tabela 1, na presença desses fatores, está indicado o uso profilático. Não muda entretanto, a posologia da administração, estabelecida para cada especialidade. Em relação à idade, é reconhecido aumento do fator de risco para acima de 60 anos.
Sob outro ponto de vista, antibiótico profilático pode ser benéfico em procedimentos cirúrgicos associados à taxa elevada de infecção como procedimentos limpo-‐contaminados ou contaminados e em certos procedimentos onde há consequências graves de infecção (implantes prostéticos), mesmo que infecção seja improvável.
Antibiótico profilático não é indicado para procedimentos cirúrgicos limpos, salvo algumas considerações descritas mais à frente neste documento; mas justifica-‐se para a maioria dos procedimentos limpo-‐contaminados. O uso de antibióticos em procedimentos sujos ou em infecções estabelecidas é classificado como tratamento de infecção presumida, não como profilaxia.
17 Fatores de risco para endocardite infecciosa
Quanto ao risco para endocardite infecciosa, os pacientes podem ser estratificados em risco alto, moderado e baixo. Pacientes de alto risco para endocardite
6: pacientes com prótese valvular cardíaca, história prévia de endocardite, cardiopatias congênitas cianóticas ou condutos/ “shunts” sistêmico-‐pulmonares construídos cirurgicamente.
Os pacientes com risco moderado para endocardite são aqueles com outras malformações cardíacas, disfunção valvular adquirida, prolapso mitral com regurgitação e miocardiopatia hipertrófica. Pertencem ao grupo de baixo risco para endocardite (PROFILAXIA NÃO RECOMENDADA) os pacientes com defeito de septo atrial isolado; defeito de septo atrial, ventricular ou de ducto arterioso corrigidos cirurgicamente; prolapso mitral sem disfunção valvular; sopro cardíaco inocente funcional ou fisiológico; Doença de Kawasaki prévia sem disfunção valvular; Febre Reumática prévia sem disfunção valvular.
É indicado o uso de antibiótico profilático quando o risco para endocardite é alto ou moderado. O mesmo antibiótico utilizado para profilaxia de infecção de sítio cirúrgico, conforme a Tabela 1, previne também endocardite. Assim, há pacientes com indicação de antibiótico profilático segundo os procedimentos descritos na Tabela 1 ou os fatores de risco gerais, e, ao mesmo tempo, indicação de profilaxia para endocardite por causa de risco alto ou moderado para esta infecção. Nestes casos, o antibiótico recomendado é o da Tabela 1, que é direcionado primariamente aos patógenos mais comumente encontrados por tipo de procedimento. As Tabelas 4 e 5 apresentam os procedimentos com recomendação de uso de antibiótico profilático; assim também como aqueles procedimentos onde o antibiótico profilático não é recomendado
6.
Tabela 4 – Procedimentos com recomendação de profilaxia para endocardite
Procedimento Antibiótico
Procedimentos odontológicos Amoxicilina v.o. ou ampicilina i.v.
Tonsilectomia e/ou adenoidectomia Clindamicina Cirurgias que envolvem a mucosa respiratória Cefazolina Broncoscopia com broncoscópio rígido Cefazolina Escleroterapia para varizes de esôfago Cefazolina
Dilatação esofágica Cefazolina
CPRE com obstrução biliar* Cefazolina
Cirurgia do trato biliar Cefazolina
Cirurgias que envolvem mucosa intestinal Cefoxitina ou Metronidazol + Gentamicina
Cirurgia de próstata Cefazolina
Cistoscopia Cefazolina
Dilatação uretral Cefazolina
*Colangiopancreatografia endoscópica retrógrada