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Novas perspectivas da tutela jurídica dos animais: o reconhecimento como sujeitos de direitos

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Academic year: 2021

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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

INSTITUTO DE CIÊNCIAS DA SOCIEDADE - MACAÉ

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

LARISSA BASTOS RODRIGUES

NOVAS PERSPECTIVAS DA TUTELA JURÍDICA DOS ANIMAIS:

O reconhecimento como Sujeitos de Direitos

MACAÉ 2019

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LARISSA BASTOS RODRIGUES

NOVAS PERSPECTIVAS DA TUTELA JURÍDICA DOS ANIMAIS:

O reconhecimento como Sujeitos de Direitos

Trabalho de Conclusão de Curso de Graduação em Direito no Instituto de Ciências Sociais da Universidade Federal Fluminense como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito

Orientador:

Prof. Dr. Heron Abdon Souza

MACAÉ 2019

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LARISSA BASTOS RODRIGUES

NOVAS PERSPECTIVAS DA TUTELA JURÍDICA DOS ANIMAIS:

O reconhecimento como Sujeitos de Direitos

Trabalho de Conclusão de Curso de Direito no Instituto de Ciências Sociais da Universidade Federal Fluminense como requisito para obtenção do título de Bacharel em Direito Macaé, ____ de _______de _______.

BANCA EXAMINADORA

Prof. Dr. Heron Abdon Souza - UFF Orientador

_________________________________

Profa. Dra. Fabianne Manhães - UFF

_________________________________________ Luidgi Silva Almeida – Mestrando PPGDC-UFF

MACAÉ 2019

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AGRADECIMENTOS

Chega ao fim uma importante fase da minha vida e não poderia deixar de agradecer àqueles que foram essenciais nesta trajetória, primeiramente a Deus, pelo dom da vida, por me conceder saúde e plenitude para realizar essa etapa.

Agradeço aos meus pais, Rosana e João, que para mim sempre foram exemplos de garra e determinação a serem seguidos e que nunca mediram esforços para que eu chegasse até aqui. Obrigada por serem meu apoio em todos os momentos difíceis e por estarem sempre comigo para compartilhar as vitórias. Sem vocês eu nada seria. Agradeço também por me apresentarem o amor aos animais, que me permitiu explorar e apresentar este tema com mais afinco e determinação. Obrigada mãe, por me apresentar o Direito, e a capacidade de aplicar a justiça mesmo no mundo atual.

Agradeço a toda a minha família que de certa forma são um pedacinho de mim e da minha história, em especial aos meus tios Coca, Patrícia, Marilene, Sérgio, meus avós, Rosa e Manoel, e minhas primas Natália e Elaine.

Agradeço ao meu namorado, Diego, por sempre aguentar meus momentos de desespero e acreditar sempre em mim, mesmo quando eu não acreditava.

Agradeço ao meu orientador, Heron, que me mostrou desde sempre o mundo acadêmico, desde a monitoria até a monografia. Obrigada pela paciência e disponibilidade.

Agradeço a todo o corpo docente da UFF que contribuiu para a minha formação acadêmica e como pessoa. Agradeço também a todos os mestres que tive durante a vida, sem vocês eu também não chegaria até aqui.

Agradeço as minhas companhias da UFF. Luísa e Mariana, não tenho palavras para descrever o quanto são importantes para mim. Obrigada pelo companheirismo durante esses cinco anos juntas. Agradeço também à Isabella, Mariana, Luciana, Carol e João, por dividirem comigo os dias de universitária.

Agradeço à todos os amigos que fiz na 1ª VT de Macaé. Obrigada pela oportunidade de aprender muito com vocês! Nos encontraremos novamente em breve, se Deus quiser.

Agradeço as minhas amigas de infância, Luciana, Pietra, Evellyn, Paula, Camila e Isabella, que estiveram presentes em praticamente todos os momentos da minha vida. Vocês, mesmo de longe, foram essenciais, obrigada por torcerem sempre por mim.

Agradeço por fim, a todos os animais que um dia passaram pela minha vida e que são os verdadeiros influenciadores para a escolha e defesa desse tema.

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RESUMO

A presente monografia tem como objetivo demonstrar a atual tutela jurídica dos animais no Brasil em contraposição ao direito comparado e internacional. Com isso, explicitar novos direitos aplicados atualmente aos animais e as necessárias mudanças legislativas em razão das novas relações sociais existentes. Ao longo da história os animais ocuparam diversos lugares na sociedade. Antigamente eram utilizados somente como meio econômicos e de subsistência, no entanto, é possível perceber que hoje há verdadeiras relações afetivas entre os homens e os animais. Essa evolução exige que o Direito a acompanhe ao propiciar novos direitos a esses animais, no entanto é possível perceber legislações ultrapassadas e pouco aplicáveis na atualidade. Sendo assim, as leis positivas atuais não são capazes de regulamentar as novas relações existentes. Assim, os Tribunais Superiores estão constantemente se posicionando em casos concretos, o que por diversas vezes resultaram em decisões controversas e por consequência uma insegurança jurídica. Por fim, é preciso analisar se a tutela jurídica existente hoje é eficaz na proteção animal.

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ABSTRACT

The present article has like objective demonstrated the current legal protection of the animals in Brazil in counterposition to the compared and international rights. With that, set out new rights devoted at present to the animals and the necessary legislative changes on account of the new existent social relations. Along the history the animals occupied several places in the society. Formerly they were used only like way economical and of subsistence, however, it is possible today realize true affectionate relations between the men and the animals. This evolution demands that the Law accompanies it while favoring new rights to these animals meantime there is perceptible the validity of outdated and not much applicable legislation in the present. Being so, the current positive laws are not able to regularize the new existent relations. So, the Superior Courts are constantly positioning in concrete cases, what for several times they turned in controversial decisions and consequently a legal insecurity. For end, it is necessary to analyse if the existent legal protection today is efficient in the animal protection.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO...9

1. A Proteção Animal à luz do Direito Comparado e do Direito Internacional...14

1.1 A Tutela Jurídica Internacional dos Animais ... 14

1.2 A Proteção Legislativa dos Animais através do Direito Comparado ... 17

2. A Tutela Jurídica dos Animais no Brasil ... 24

2.1. Evolução legislativa infraconstitucional do Brasil na tutela dos animais ... 24

2.2. A propriedade: status jurídico do animal não humano no Código Civil Brasileiro ... 28

2.3. Proteção dos animais na Constituição Federal de 1988: o direito constitucional ao meio ambiente ... 30

2.4. Projeto de lei 27/2018 ... 35

3. Os Animais como Sujeitos de Direitos: Uma análise de casos concretos ... 38

3.1 A celeuma entre os direitos do homem e o direito animal ... 38

3.1.1 Manifestações culturais X Direito animal: vaquejadas e rodeios ... 38

3.1.2 Direito à cultura e lazer X Direito animal: o entretenimento de animais em circos, zoológicos e aquários ... 41

3.1.3 Direito à ciência X Direito animal: a experimentação animal em pesquisas científicas ... 43

3.1.4 Liberdade religiosa X Direito dos animais: o uso de animais em cultos religiosos 46 3.2 Uma luz no fim do túnel: o início do reconhecimento dos animais como sujeitos de direitos ... 48

3.2.1 Direito à dignidade animal ... 49

3.2.2 Direito a uma identidade e o registro público ... 50

3.2.3 Direito à liberdade ... 51

3.2.4 Direito à família,guarda e pensão ... 53

CONCLUSÃO ... 57

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INTRODUÇÃO

As relações entre homens e animais evoluíram ao longo da história. Antes eram considerados apenas como meios de produção, locomoção ou moedas de troca. Esses seres não humanos exerceram papéis de suprema importância, seja na alimentação, vestuário, transporte, tração e em alguns casos, por se constituírem como ponto central de adoração religiosa. (DOVAL apud WILLIS e ROBINSON, 2000).

Hoje, com a evolução das relações sociais, até mesmo com admissão da pluralidade de entidades familiares (TARTUCE, 2018), os animais não mais são tratados como mero fator econômico. Mais que isso, o princípio da afetividade atualmente se estende a figura desses seres não humanos, que muitas vezes são considerados verdadeiros membros familiares.

Nesse sentido que surge o desafio de que as leis positivadas e as aplicações concretas sejam capazes de regular e garantir essas novas relações.

Quais são as legislações que protegem os animais? A proteção animal existente hoje no Brasil é suficiente? Como se dá a tutela jurídica dos animais em outros países? Como estão sendo regulamentados os casos concretos envolvendo os animais? Que direitos podem ser garantidos e aplicados aos animais? Como tratar os animais no mundo jurídico frente às relações atuais?

Diante de todo o exposto, é preciso demonstrar a tutela jurídica existente hoje aos animais, com a exposição das legislações existentes em âmbito internacional e interno. Somente assim, será possível analisar e concluir se, diante das novas perspectivas nas relações entre os animais e os seres humanos, estas são eficazes.

Em observância a tutela internacional, é possível mencionar a Declaração Universal dos Direitos dos Animais da UNESCO (1972), que equipara direitos fundamentais, adotados internamente no ordenamento jurídico brasileiro, aos direitos aplicáveis aos animais, como disserta o art. 14, inc. 2º “Os direitos do animal devem ser defendidos pela lei como os direitos do homem”. Apesar da Declaração não vincular o posicionamento dos países, tendo apenas status de soft law sua discussão deu ensejo a diversos debates internos, a exemplo da Conferência do Meio Ambiente do rio de Janeiro (ECO-92) que destacou o valor intrínseco da diversidade biológica. (FREITAS, 2012, p. 14)

A luz do direito comparado, a Constituição Federal Suíça de 1999, em vigência estabelece como deveres do Estado a tutela do meio ambiente, da natureza e da terra pátria, bem como trata especificamente da tutela da dignidade da criatura. (CARVALHO, 2015).

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No ordenamento jurídico brasileiro, acredita-se que a primeira menção legislativa a proteção dos animais foi o Código de Posturas de 1886 do Município de São Paulo que proibia os cocheiros e condutores de carroças a maltratar os animais. (FREITAS apud LEVAI, 2012). Somente em 1924 que é promulgada a primeira legislação em âmbito federal (Decreto Lei 16590/1924) que visava coibir os maus-tratos proibindo corridas de touros, brigas de galo entre outras atividades. No entanto, ainda era minimalista no que tange a necessária proteção.

O reconhecimento mais próximo do necessário no que se refere à tutela jurídica dos animais é visto dez anos depois, no Decreto Lei 24645/1934 conhecida com Lei de Proteção aos Animais, editado pelo então Presidente Getúlio Vargas. Neste Decreto eram especificadas as práticas a serem consideradas maus-tratos, bem como suas respectivas penas. É a primeira legislação a tratar de crimes contra os animais. Entretanto, como foi editada na vigência da ditadura no Brasil, onde o Poder Executivo exercia também o Poder Legislativo, muito se discute sobre a sua revogação.

Com a promulgação da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/88) a proteção aos animais foi timidamente abordada no capítulo acerca do Meio Ambiente. O art. 225 § 1º, VII descreve a seguinte premissa:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá- lo para as presentes e futuras gerações.

§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao Poder Público:

VII - proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em risco sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.

É preciso reconhecer que frente à avançada tutela internacional dos animais, a previsão constitucional já é uma conquista ao estabelecer o meio ambiente equilibrado como um direito de todos, bem como atribuir ao poder público o dever de proteger a fauna e a flora. No entanto, diante das atuais relações não esgota toda a necessária gama de direitos a esses seres não humanos.

Não obstante, em 1998 foi editada a lei 9605, que elenca rol de crimes ambientais e suas penas.

À contrario sensu, no Código Civil Brasileiro de 2002 os animais são classificados como bens móveis, também conhecidos como semoventes. “Os semoventes são os bens que se movem de um lugar para outro, por movimento próprio, como é o caso dos animais”

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(CARDOSO apud PAMPLONA FILHO, 2017, p.25). Dessa forma, na esfera civilista não há qualquer proteção ao animal, como ser vivo.

Contudo ainda que não seja possível negar a existência de legislações que compreendam o tema dos animais, faz-se mister, que as relações atuais exigem mais que a tutela de um meio ambiente ecologicamente equilibrado. A posição do animal frente a atual sociedade requer a aplicação também de direitos constitucionalmente previstos ao homem, resultando em uma tutela jurídica mais específica e eficiente.

Surgem nos Tribunais Superiores demandas que objetivam a regulamentação dos direitos dos animais em casos concretos.

A dicotomia entre proteção dos animais e a livre manifestação cultural é constantemente discutida pelos ministros. No julgamento do RE 153.531/SC, rel. Min. Marco Aurélio, que trata da “Farra do Boi”, a Corte Suprema entendeu que a valoração da proteção constitucional dos animais se sobrepõe a essa manifestação cultural. No mesmo sentido, a ADIn 4983/CE, rel. Min. Marco Aurélio, declarava a inconstitucionalidade de uma lei cearense que tratava a vaquejada como manifestação cultural. Entretanto, em relação a este último caso, em 2016 o Congresso Nacional editou a lei 13.364 sancionada pelo Presidente Michel Temer, que elevou a vaquejada a condição de manifestação cultural e patrimônio histórico imaterial. Diante da contrariedade da Lei com a Constituição, uma emenda constitucional foi aprovada em 2017 alterando o art. 225, § 7º, que passou a ter a seguinte redação:

Art. 1º O art. 225 da Constituição Federal passa a vigorar acrescido do seguinte § 7º: Art.

.225... ...

§ 7º Para fins do disposto na parte final do inciso VII do § 1º deste artigo, não se consideram cruéis as práticas desportivas que utilizem animais, desde que sejam manifestações culturais, conforme o § 1º do art. 215 desta Constituição Federal, registradas como bem de natureza imaterial integrante do patrimônio cultural brasileiro, devendo ser regulamentadas por lei específica que assegure o bem-estar dos animais envolvidos.

Em se tratando de decisões do STF, há ainda o RE 494601, de relatoria do Ministro Marco Aurélio, que visava declarar a inconstitucionalidade da Lei 12.131/2004 do Rio Grande do Sul, que afasta a proibição das práticas de que submetem os animais à maus – tratos, no caso de sacrifício de animais em cultos e celebrações de religiões de matriz africanas.

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No entanto, no julgamento em 28 de março de 2019, o Supremo Tribunal Federal, fixou o entendimento de que é possível a realização de cultos religiosos de matrizes africanas em que há o sacrifício de animais, desde que não os submetam à crueldade.

No entanto, resta claro que prevaleceu a liberdade religiosa, sobre o direito dos animais, ainda que se fale de sofrimento, dor e dignidade dos animais.

Com isso, ratifica-se que as legislações existentes não esgotam a tutela necessária, e com isso abrem margem para interpretações contraditórias dos Tribunais Superiores.

No Supremo Tribunal de Justiça foi julgado o RESP 1713167- SP Relator: Min Luís Felipe Salomão, onde foi reconhecido o valor único dos animais domésticos. Nesse sentido foi reconhecida a relação de um animal de estimação com os cônjuges, e por esse motivo foi regulamentada visita ao animal em razão da dissolução conjugal.

Esse julgado anteriormente mencionado demonstra a imprescindibilidade de que outros direitos sejam também resguardados aos animais. Igualmente, demostra que a legislação que se refere ao tema é ultrapassada frente a atual conjuntura da sociedade e as novas relações afetivas.

Igualmente, também há discussões no âmbito do Poder Legislativo. A Câmara dos vereadores de Petrópolis-RJ convocou um plebiscito na cidade para que a população votasse acerca do fim da tração animal nas charretes na atividade turística da região. Cabe mencionar que os votos válidos contra o uso dos cavalos representaram 68,57%.1

Na seara administrativa, Cartórios de Registro em diversos estados do Brasil já estão aptos a emitir registro de animais de estimação. Como uma espécie de certidão de nascimento, o documento traz informações e foto do animal e tem como objetivo ajudar na busca de animais perdidos e roubados.

Diante de todo o exposto, a presente monografia será realizada em consonância ao modo dedutivo, que tem como propósito explicar o conteúdo das premissas (LAKATOS; MARCONI,2003, p.92), através de uma abordagem qualitativa.

Desta forma, de forma a analisar as legislações vigentes existentes em outros países, bem como no Brasil, que de certa forma tentam atribuir uma tutela jurídica aos animais. O objetivo, ainda é demonstrar que as poucas legislações existentes no Brasil, se mostram insuficientes para a gama de casos envolvendo animais na atualidade.

Não obstante, é preciso expor o entendimento dos doutrinadores acerca da temática, além de jurisprudências.

1 Disponível em:

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O propósito ainda é demonstrar a partir da apresentação de casos concretos, que chegam as autoridades administrativas, judiciárias e executivas, a necessidade de reconhecer os animais como sujeitos de direitos. Mais que isso, os diversos julgados tendem a demonstrar como a ausência de uma legislação eficaz e específica a tutelar direitos aos animais, acaba por gerar insegurança jurídica e permitir a prática de atos que submetam os animais a crueldade.

Portanto, o presente trabalho tem como objetivo precípuo, analisar a atual tutela jurídica dos animais no direito positivado e demonstrar a necessidade de mudanças legislativas que compreendam as relações atuais com os animais.

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1. A Proteção do Animal à luz do Direito Internacional e Direito Comparado. 1.1. Tutela Jurídica Internacional do Animal

Inicialmente cumpre mencionar que a preocupação com os animais como seres vivos é mundialmente muito recente, uma vez que o viés econômico sempre esteve embutido no conceito de animais, que por vezes são exterminados para a concretização do lucro (CAMATTA, DE SOUZA E JUNIOR, 2014). Dessa forma, o animal era e ainda é considerado fator essencial à cadeia produtiva, retrato perfeito de uma sociedade estritamente capitalista.

No entanto, a utilização exacerbada dos recursos naturais no mundo, sem a devida preocupação com a escassez, e a extinção de espécies resultou, em um desequilíbrio ambiental significativo para a sadia qualidade de vida. Ao mesmo tempo em que a raça humana necessita dos ecossistemas equilibrados para a sua própria sobrevivência, estabelece uma relação parasitária e predatória com o meio a que circunda. (DE MEDEIROS e ALBUQUERQUE, 2013).

Dessa forma, a questão ambiental, incluindo a proteção dos animais começou a ser abordada nos organismos internacionais. Três convenções foram consideradas de maior importância no direito internacional, uma vez que aludiram políticas ambientais e planejamentos governamentais voltados aos animais (CAMATTA, DE SOUZA E JUNIOR, 2014).

A primeira das Convenções é a União Internacional para a Conservação da Natureza e seus Recursos Naturais (UICN), criada em 1948, possui como principal objetivo a proteção da biodiversidade mundial. Atualmente, a UICN é reconhecida por ter criado a chamada Lista Vermelha de Espécies Ameaçadas, onde as espécies animais são classificadas em nove grupos em que é possível identificar seu grau de extinção, desde pouco preocupante a extinto. 2

É possível concluir, que a UICN é de suma importância, porque além de promover reuniões a cada quatro anos em várias regiões do mundo, elabora encontros temáticos periódicos e destaca-se por sua ampla influência nos rumos das políticas públicas e ações destinadas à conservação da biodiversidade (CAMATTA, DE SOUZA E JUNIOR, 2014).

Mais tarde, em 1975, entrou em vigor a Convenção Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagens Ameaçadas de Extinção (CITES). Essa convenção se conceitua

2 Entenda a classificação da Lista Vermelha da IUCN, disponível em:

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como um acordo formado por diversos governos com objetivo principal de fiscalizar e atuar no comércio internacional de espécies animais. O debate acerca da proteção dos animais frente ao comércio internacional era inovador para a década de 60 (CAMATTA, DE SOUZA E JUNIOR, 2014).

Entretanto, apesar de 160 países ratificarem a CITES, a ONU realizou uma pesquisa em 2002 onde foi possível concluir que a época, ainda diversos países não haviam internalizado a convenção a fim de tornar o contrabando de animais um crime grave. (CHUAHY, 2009).

Somente em 1978, que foi criada a Declaração dos Direitos dos Animais, documento internacional de maior expressividade para a tutela jurídica dos animais. A Declaração foi criada na UNESCO (Organização das Nações Unidas para Educação a Ciência e a Cultura), com objetivo de incentivar e recomendar que os países signatários adotem normas eficazes de proteção aos animais, principalmente no que se refere aos maus – tratos. Ela reconhece que os animais também têm direitos, e estes devem ser cumpridos (CHUAHY, 2009).

É possível observar que esta declaração muito se assemelha a Declaração de Direitos Humanos, de forma a tratar os animais como sujeitos de direitos como a vida, dignidade e bem estar. O próprio art. 1º da Declaração dos Direitos dos Animais possui semelhança semântica e contextual em relação ao art. 1° da Declaração Universal dos Direitos Humanos (ONU, 1948).

O art. 1° da Declaração Universal dos Direitos dos Animais (UNESCO, 1978) dispõe que “todos os animais nascem iguais perante a vida e têm os mesmos direitos à existência”. No mesmo sentido, o art. 1º da Declaração Universal de Direitos Humanos (ONU, 1948) prevê que “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade”.

A semelhança apesar de sutil já demonstra a preocupação de que direitos primeiramente estabelecidos exclusivamente para o homem também sejam aplicados aos animais.

Ademais, este documento internacional reconhece os animais como seres sencientes, ou seja, seres vivos capazes de sentir, o que justifica uma tutela jurídica mais abrangente.

A Declaração de Direitos dos Animais preocupa-se com a exploração agrícola, comercial e cultural dos animais de forma gravosa e desnecessária. Dessa forma traz em sua redação diversos artigos que tutelam a dignidade do animal e coíbem a prática de atividades que os colocam em situações de maus tratos.

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O próprio preâmbulo da Declaração atribui a titularidades de direitos aos animais ao mencionar:

Considerando que todo o animal possui direitos;

Considerando que o desconhecimento e o desprezo desses direitos têm levado e continuam a levar o homem a cometer crimes contra os animais e contra a natureza; Considerando que o reconhecimento pela espécie humana do direito à existência das outras espécies animais constitui o fundamento da coexistência das outras espécies no mundo;

Considerando que os genocídios são perpetrados pelo homem e há o perigo de continuar a perpetrar outros;

Considerando que o respeito dos homens pelos animais está ligado ao respeito dos homens pelo seu semelhante;

Considerando que a educação deve ensinar desde a infância a observar, a compreender, a respeitar e a amar os animais. (DECLARAÇÃO UNIVERSAL DOS DIREITOS DOS ANIMAIS, 1978).

No entanto, apesar de ser um documento de enorme importância para iniciar o debate normativo acerca da garantia dos direitos dos animais, a Declaração Universal dos Direitos dos Animais não apresenta penalidades ou sanções a fim de punir e coibir atos de maus tratos. (MOTTA e RODRIGUES, 2018). Mais que isso, esta declaração não tem o caráter de vincular o posicionamento dos países signatários, classificada majoritariamente como norma de soft law, uma vez que não foi aprovada no ordenamento jurídico interno brasileiro.

Após esse marco legislativo, em 1983, foi criada a Convenção de Bonn (Convenção das espécies Migratórias de Animais Silvestres), atualmente conta com 108 países membros, e tem como propósito a proteção das espécies que migram, seus habitats e suas rotas de migração. Essas espécies desconsideram os limites entre os países, por isso a necessidade de um documento internacional de proteção.

Já em 2015, foi criada em Haia, a Comissão de Justiça para a Vida Selvagem com o objetivo de combater caçadores ilegais e contrabandistas em todo o mundo. Através do uso de novas tecnologias, como rastreio por GPS e análise de DNA, a Comissão busca reunir dados sobre o tráfico e a caça de espécies de animais ameaçadas de extinção, e de certa forma responsabilizar o governo que adota uma postura de inércia frente a esse combate (PERRASSO, 2015).

A Comissão de Justiça para Vida Selvagem, também conhecida pela sigla WJC não pode realizar julgamentos, nem aplicar penas de prisão, e da mesma forma que a Declaração dos Direitos dos Animais suas normas não tem força legal e não vinculam os países, sendo consideradas apenas recomendações (PERASSO, 2015).

Um dos casos no âmbito na WJC que gerou grande repercussão pela mídia internacional foi a interceptação realizada durante a tentativa de venda de 55 tartarugas-

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manchadas- asiáticas que estavam em duas malas em posse de um homem na Malásia. O homem havia anunciado em suas redes sociais que tinha répteis para a venda, um suposto comprador iniciou as negociações, mas na verdade este negociador era um agente infiltrado da Comissão de Justiça para a Vida Selvagem. O cidadão indiano foi condenado na Malásia a 24 anos de prisão (MARON, 2018).

É perceptível que a tutela internacional dos animais é bastante ampla, contudo, na maioria dos casos, não há uma obrigatoriedade de cumprimento dos países que ratificam essas convenções. Dessa forma, há uma dificuldade de efetivar essas legislações e recomendações no cenário interno de cada país.

No entanto, a alguns países que se destacam pela legislação efetiva e revolucionária na proteção dos animais, e na concessão do status de sujeitos de direitos.

1.2. Proteção Legislativa dos Animais através do Direito Comparado

Diante da gama de recomendações na seara internacional, alguns países vivenciam uma evolução gradativa no que se refere à tutela jurídica dos animais.

A atual Constituição da Suíça foi aprovada pelo voto popular em 1999 e contém várias menções a tutela jurídica dos animais.

A Suíça atualmente possui um sistema de notória participação da população nas tomadas de decisões políticas, nesse sentido, a consulta popular é prática recorrente, e é caracterizada como instância política suprema (ROMANO, 2018).

Cumpre mencionar, que a Suíça “é uma república composta por 26 estados, que são chamados de cantões” (ROMANO, 2018, p.1).

A Constituição Suíça, além de outros artigos que mencionam o meio ambiente e as políticas exploratórias, possui um artigo voltado unicamente para a proteção dos animais. O art. 80 prevê:

Art. 80º Protecção de animais

1 A Confederação prescreve disposições sobre a protecção dos animais. 2 Em particular, disciplina:

a. a manutenção e o cuidado de animais;

b. as experiências com animais e as intervenções em animais vivos; c. a utilização de animais;

d. a importação de animais e produtos de origem animal; e. o comércio e transporte de animais;

f. a matança de animais.

3 A execução das disposições é da competência dos cantões, desde que a lei não a reserve para a Confederação. (CONSTITUIÇÃO FEDERAL DA SUÍÇA, 1999).

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Em relação à tutela jurídica dos animais, é possível perceber que é responsabilidade de cada estado garantir a aplicação da lei e atuar pela proteção dos animais. Já no que se referem ao processo legislativo, os artigos 74 e 80 da Constituição dispõem que a União é competente para legislar sobre meio ambiente e proteção dos animais.

Apesar de apresentar diversos artigos que dispõem sobre os animais, segundo Grabriela F.S.S, a Constituição emprega vocábulos jurídicos indeterminados (SANTOS, 2015, p.31)

No entanto, diferentemente da Constituição Brasileira de 1988 que será abordada em momento oportuno, a Constituição Suíça possui preocupação direta com a proteção do animal como ser vivo, e não somente como componente de um meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Nesse sentido, o art. 120 da Constituição da Suíça ao prescrever disposições a respeito da manipulação e utilização de materiais genéticos de animais, trata especificamente da dignidade da criatura, como se depreende a seguir:

Art. 120º Engenharia genética no âmbito não-humano

1 O homem e seu ambiente são protegidos dos abusos da engenharia genética. 2 A Confederação prescreve disposições sobre a manipulação com material embrionário e genético de animais, plantas e outros organismos. Para isto, leva em conta a dignidade da criatura, assim como a segurança do homem, dos animais e do meio-ambiente e protege a variedade genética das espécies de animais e vegetais. Dessa forma, conforme preleciona Gabriela F. S.S, a Constituição Federal Suíça diferencia a proteção do meio ambiente sadio e equilibrado, da proteção do animal como ser dotado de vida e direitos. (SANTOS, 2015, p.31)

As legislações infraconstitucionais suíças também regulam as relações entre os animais, o meio ambiente e o homem. Conforme dispõe Gabriela F.S.S, essas previsões estão em diversas modalidades legislativas, sejam elas decretos, leis federais, regulamentos, leis estaduais, leis municipais e instruções normativas. (SANTOS, 2015, p. 50).

À exemplo, é possível destacar a Lei Federal de Proteção dos Animais que é “chamada de “lei quadro”, pois regulamenta o tratamento jurídico dos animais apenas em linhas gerais” (SANTOS, 2015, p.50).

Do mesmo modo que o Código Civil Brasileiro (2002), o Código Civil da Suíça também traz menção os animais. Todavia no Direito Suíço, após referendo popular que ocorreu em 2003 os animais deixaram de serem caracterizados e tutelados como coisas para o direito. Nesse sentido expõe Gabriela F. S.S: “[...] Esse estatuto jurídico foi alterado devido a

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um referendum popular e com o objetivo de adaptar o estatuto jurídico dos animais ao art. 120 da constituição concernente à tutela da dignidade da criatura.” (SANTOS, 2015, p.51).

Já na República Francesa, a legislação é mais abrangente no que se refere à proteção e tutela dos animais. No entanto, ao contrário da Constituição Suíça, a Constituição Francesa de 1946 muito pouco foi dialogada com a população. Segundo Bruna Martins Gomes: “... o trabalho preparatório sobre a Constituição da V República desdobrou-se de forma confidencial. Não foi publicada, tampouco debatida.” (GOMES, 2014).

Na Constituição Francesa não há menção direta aos direitos dos animais ou a proteção da fauna, o art. 34 apenas preleciona que lei determinará os princípios fundamentais, entre eles a preservação do meio ambiente (FRANÇA, 1946).

Entretanto, outras legislações francesas abordam o tema com maior afinco. A lei 76-629 de 1976 determina que “todo animal é um ser sensível que deve ser cuidado por seu proprietário sob as condições compatíveis com os imperativos biológicos de sua espécie.” (COSTA, VELOSO e COSTA, 2018, p.27).

Semelhante à legislação brasileira, o Código Civil Francês somente tutelava os animais como mera propriedade, em contrario as demais legislações francesas referentes aos temas. No entanto, uma emenda em 2015 alterou o Código que passou a considerar os animais como seres dotados de sensibilidade. (COSTA, VELOSO e COSTA, 2018, p.27).

O Código Penal Francês por sua vez, tipifica como crime atos de crueldade contra os animais, o art. 521-1 dispõe que aquele que comete ato de crueldade contra um animal estará sujeito a uma pena de dois anos de prisão e terá que pagar multa no valor de trinta mil euros. Ademais, pode ainda ser proibido de ter um animal a título definitivo. Contudo, a contrário sensu, o mesmo artigo permite as “corridas de touro” e “brigas de galo”, considerando-os como tradições. (FRANÇA, 1994).

Na Itália, a lei de maior importância na tutela dos animais, foi aprovada em 2004 e tipifica como crime submeter os animais a condições degradantes. No entanto, desobriga os circos e zoológicos de seguirem essas normas. (CHUAHY, 2009).

Já a Bélgica, que é dividida em três grandes regiões, Bruxelas, Flandres e Valônia, cada uma dessas regiões possui seu parlamento e possuem maior autonomia do que um estado federativo, também tem grande destaque na tutela jurídica dos animais. (MOUALLEN, 2019)

A alteração legislativa belga de maior importância na defesa dos animais como sujeitos de direito ocorreu em 2017 quando foi aprovada no parlamento de Flandres, uma lei que passou a vigorar em 1º de janeiro de 2019, que proibiu o abate de carnes de acordo com o judaísmo e o islamismo.

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Segundo os ideais judaicos e islãs para o consumo de carne, o animal deve estar em perfeitas condições de saúde no momento do abate, o que não permite a utilização de sedativos e processos de insensibilização. Os alimentos que seguem as regras judaicas são chamados de “kosher”, enquanto que aqueles que seguem as regras islãs são chamados de “halal”. (MOUALLEN, 2019).

A legislação é consequência dos crescentes movimentos ativistas que defendem os direitos dos animais e acreditam que nas regras religiosas para o abate há violação do direito à vida e dignidade do animal. (MOUALLEN, 2019)

É importante mencionar, que em setembro de 2019, também foi aprovada essa lei na região de Valônia. Contudo, a Bélgica adota o princípio da subsidiariedade, de forma que as legislações locais não influem na legislação nacional, o que significa que a lei não é aplicada na região de Bruxelas, que é capital do país. (MOUALLEN, 2019).

No que se refere à África do Sul, foi promulgada em 1996 a Carta Constitucional símbolo da democracia após o período do apartheid 3, que defendia em suma a proteção e eficácia dos direitos fundamentais.(PAUMGARTTEN, 2012).

A Constituição Sul Africana assim como as demais citadas também só faz menção a proteção do ambiente para as atuais e futuras gerações de forma genérica, sem abordar especificamente a relação com os animais. (ÁFRICA DO SUL, 1996).

No entanto, também possui legislação a fim de evitar os atos de crueldade contra os animais. O Ato de Proteção Animal (1962) aborda a proibição de possíveis práticas que poderiam causar sofrimento aos animais não humanos, o que de certa maneira reconhece a possibilidade dos animais possuírem consciência e sentimentos. (COSTA, VELOSO e COSTA, 2018).

A contrario sensu, é preciso destacar que no que se refere à relação com os animais, a África do Sul é mundialmente conhecida pelos seus safáris, que é uma atividade de importância para a economia local. Nessa atividade, a caça dos animais é permitida dentro de poucos limites, como a espécie, meio pelo qual é realizado a caça e o local. (COSTA, VELOSO e COSTA, 2018 apud ÁFRICA DO SUL, 2004, Seção 1).

Não obstante a existência de legislações sul africana de proteção animal, a população de elefantes na África diminui de 1,3 milhões em 1979 para 600 mil em 1987. A caça ilegal

3 “O Apartheid foi uma política de segregação social ocorrida na África do Sul entre 1948 e 1994, com a

ascensão do Partido Nacional, cujo governo foi composto por uma minoria branca.” DE ANDRADE, Ana Luísa Mello Santiago. Apartheid. Disponível em: <https://www.infoescola.com/historia/apartheid/>. Acesso em: 02 de set. 2019.

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dos elefantes e rinocerontes é prática recorrente no continente africano em razão do comércio de marfim para o uso em ornamentos e joias. (CHUAHY, 2009)

Na Inglaterra, não há uma Constituição formal, escrita, sua legislação esparsa desenvolvida com base nas tradições históricas compreende o chamado Direito Constitucional inglês. (GODOY, 2010).

Uma das leis existentes na Inglaterra é o Ato de Bem-Estar Animal de 2006 que aborda práticas de abuso e crueldade que podem gerar sofrimentos físicos e psíquicos nos animais, reconhecendo-os como seres vivos senciêntes. (COSTA, VELOSO e COSTA, 2018 apud INGLATERRA, 2006, Seção 62.1.b).

Os Países de Gales também adotam esse Ato de Bem Estar Animal (2006), que prevê a responsabilização de tutores e responsáveis que por ação ou omissão causam ou não evitam qualquer tipo de sofrimento a esses seres. Essa legislação também proíbe as práticas que no Brasil já foram consideradas como culturais, como a rinha de galo. No entanto, somente tutela os animais domesticados, aqueles que guardam estrita relação com o ser humano. (COSTA, VELOSO e COSTA, 2018).

A Escócia e Irlanda do Norte possuem legislação similar ao Ato de Bem Estar Animal promulgado pela Inglaterra em 2006, as leis desses países somente diferem-se no que tange o quantum de pena aplicável para as condutas ou omissões que resultem em sofrimento ao animal não humano. (COSTA, VELOSO e COSTA, 2018).

Na América do Norte, os países sempre foram conhecidos por adotarem poucas legislações de proteção aos animais. No entanto, algumas decisões tomadas no âmbito dos estados americanos demonstram o início de uma preocupação com o bem-estar animal, conforme expõe Rafaela Chuahy em seu livro Manifesto pelos Direitos dos Animais (2009, p. 56):

“[...] Em 2004, na Califórnia e no estado de Washington, os juízes votaram a favor da manutenção da lei que protege animais selvagens e domesticados contra armadilhas cruéis, envenenamento e perseguições. A Suprema Corte de Oklahoma confirmou a constitucionalidade da lei que proíbe rinhas de galo, e a de Nova Jersey proibiu a caça de ursos em todos os estados americanos.”

Os países asiáticos também são conhecidos pela precária legislação que atribui direitos aos animais. No Japão, por exemplo, apesar de existir uma lei que busca tutelar o bem-estar animal, ela praticamente não é utilizada. É recorrente a prática de testes de laboratórios com os animais e a exposição a situações degradantes em circos e zoológicos sem quaisquer regulamentações. (CHUAHY, 2009).

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Na China, as legislações se limitavam aos animais em extinção. Somente em 2004 após o extermínio em massa de animais em razão do surto da síndrome respiratória aguda severa (SARS), que se começou a discutir legislações que proíbam os maus-tratos. (CHUAHY, 2009).

O Chile por sua vez, assim como muitos dos países citados, prevê em sua Constituição a proteção do meio ambiente como um direito constitucional de todos e determina que é dever do Estado “velar para que este direito não seja afetado e tutelar pela preservação da natureza” (tradução nossa) (CHILE, 1980).

Dessa forma é possível perceber que não há uma tutela específica constitucional acerca dos direitos dos animais, mas apenas previsão da necessidade de proteção do meio ambiente de uma forma geral.

Entretanto, o Código Civil Chileno (1855) classifica os animais como bens corpóreos, apesar de aborda-los como propriedade, como o Código Civil Brasileiro (2002) o conceituam como semoventes, ou seja, são capazes de se moverem por si mesmos, sem quaisquer forças externas. (COSTA, VELOSO e COSTA, 2018 apud CHILE, 1855).

O Código Penal do Chile (1874) também tipifica como crime a prática de atos de maus- tratos e crueldade contra os animais. Contudo o código é superficial ao determinar apenas que aqueles que cometem esses atos estão sujeitos à prisão, sem determinar o quantum ou a forma que essa punição deve ocorrer. (COSTA, VELOSO e COSTA, 2018 apud CHILE, 1874).

Essa inclusão da tipificação de crimes contra os animais no Código Penal do Chile ocorreu com o advento da lei 20.380 de 2009, denominada Lei de Proteção dos Animais, que apesar de por um lado, inovadora, com a previsão do ensino quanto à proteção animal nas escolas, por outro lado, não proíbe práticas “culturais/esportivas” usuais que expõem os animais ao risco, degradação e sofrimento, como por exemplo, a rinha de galo. (COSTA, VELOSO e COSTA, 2018 apud CHILE, 2009).

Diante de todo exposto é possível perceber inicialmente que a legislação internacional de proteção animal, principalmente a Declaração dos Direitos dos Animais, que é o documento de maior relevância internacional sobre o tema, animais é muito ampla e revolucionária ao estabelecer o animal como detentor de direitos fundamentais que ainda são conhecidos como direitos de titularidade exclusiva do homem.

Contudo considerando de forma genérica certa evolução legislativa no que se refere à tutela dos direitos dos animais é importante mencionar que as relações atuais existentes entre o homem e o animal muitas das vezes exigem mais do que o que as legislações dispõem.

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Não obstante a isso, cada país de acordo com suas características, tem buscado uma legislação mais abrangente e eficaz quanto a proteção dos animais. Enquanto “uns são mais protetivos outros ainda possuem limitada referência ao direito dos animais”. (COSTA, VELOSO e COSTA, 2018).

É possível perceber que ainda existem países que consideram os animais como sinônimo de propriedade, uma vez que estão sob o controle do homem. Esses países ainda estão regidos pela visão antropocêntrica em que o homem é o centro de todas as relações. Já outros países que adotam uma visão mais contemporânea das relações sociais, titulam os animais como seres senciêntes, capazes de terem sentimentos. (COSTA, VELOSO e COSTA, 2018, p. 68).

A última concepção de animal mostra-se mais conveniente a alcançar todos os vínculos existentes na atualidade entre o animal humano e o animal não humano. É preciso ratificar que hoje, o animal não se limita a mero meio produtivo e exploratório, e é extremamente necessário que o Direito acompanhe essas mudanças de convívio da sociedade.

Nesse sentido, é imprescindível superar a visão antropocêntrica, porque conforme dispõem Fabricio Costa, Natielli Veloso e Janaina Costa (Direitos dos Animais no Brasil e no Direito Comparado: a problemática da busca do reconhecimento da senciência, 2018, p.76):

[...] os sujeitos de direitos são todos aqueles que possuem o direito fundamental de proteção jurídica da vida e de sua dignidade. Os animais não humanos, embora não tenham sido categorizados como seres dotados de personalidade jurídica, gozam do direito de terem tutelada sua vida e dignidade, o que exige uma proteção jurídica específica no que atine à sua integridade.

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2. A Tutela Jurídica dos Animais no Brasil

2.1 A Evolução da Legislação Infraconstitucional do Brasil na Tutela dos Animais

É certo que o Direito deve ser compatível com a sociedade em que se insere, seja em aspectos culturais, ideológicos ou sociais.

No que se refere às legislações brasileiras acerca da tutela dos direitos dos animais, essa premissa não é honrada. As leis de proteção dos animais quase nunca estiveram em consonância com as relações sociais entre o homem e o animal. (COSTA, VELOSO e COSTA, 2018).

Dessa forma, as normas infraconstitucionais do nosso país retratam a conceituação do animal a partir da coisificação, resumindo-o em muitos casos em mero direito de propriedade. É o que dispõem Fabricio Costa, Natielli Veloso e Janaina Costa (Direitos dos Animais no Brasil e no Direito Comparado: a problemática da busca do reconhecimento da senciência, 2018, p.76)

[...] o direito vigente reproduz em muitos pontos a doutrina da coisificação dos animais não humanos, fundado da clássica premissa da ausência de personalidade jurídica e racionalidade, como se esses fossem os únicos e exclusivos referenciais teóricos hábeis a legitimar o estudo do tema.

Em 1893, um caso de violência a um cavalo na cidade de São Paulo fez com que a sociedade se preocupasse com a ausência de legislação que resguardasse os direitos dos animais.

Nesse sentido, em 06 de outubro de 1886 foi criado o Código de Posturas do Município de São Paulo, que é apontado como a primeira norma a estabelecer regras de proteção aos animais. Dentre outras medidas, o código proibia a prática de atos de maus-tratos, principalmente aos condutores de carroças e criadores de porcos. (FREITAS, 2012).

O decreto n º 14.529 de 1920 foi o primeiro instrumento normativo em âmbito nacional a fazer menção à proteção animal. (COSTA, VELOSO e COSTA, 2018).

Apesar de ter como tema precípuo as casas de diversões e espetáculos públicos, o decreto nº 14.529 também vedava espetáculos e formas de entretenimento que expusessem os animais a sofrimento. O art. 5º previa: “Não será concedida licença para corridas de touros, garraios e novilhos, nem briga de gallos e canarios ou quaesquer outras diversões desse genero que causem soffrimentos aos animaes”. (BRASIL, 1920)

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Já em 1924, durante a República Velha, foi elaborado o Decreto 16.590 que trouxe diversas proibições da realização de atividades antes consideradas culturais e de entretenimento, como as rinhas de galo e canário e corridas de touro. (FREITAS, 2012).

No entanto, o instrumento normativo apresentado nos anos 1924 era extremamente restrito no que consiste na proteção dos animais, vez que somente abrangia algumas práticas de exposição e maus-tratos e apenas considerava certas espécies.

Em 1934 foi aprovado o decreto 24.645, que por sua vez, era mais abrangente e próprio para a tutela dos animais. A própria descrição do decreto traz a expressão: “Estabelece medidas de proteção aos animais” (BRASIL, 1934).

Nesse sentido, o decreto 24.645 estipulou diversas práticas a serem consideradas como maus tratos aos animais e ainda determinava a aplicação de multas em razão da execução desses atos. (COSTA, VELOSO e COSTA, 2018). Em seus artigos, 1º e 2º é possível perceber o início de uma preocupação com a tutela dos animais:

Art. 1º Todos os animais existentes no País são tutelados do Estado.

Art. 2º Aquele que, em lugar público ou privado, aplicar ou fizer aplicar maus tratos aos animais, incorrerá em multa de 20$000 a 500$000 e na pena de prisão celular de 2 a 15 dias, quer o delinquêntes seja ou não o respectivo proprietário, sem prejuízo da ação civil que possa caber.

§ 1º A critério da autoridade que verificar a infração da presente lei, será imposta qualquer das penalidades acima estatuídas, ou ambas.

§ 2º A pena a aplicar dependerá da gravidade do delito, a juízo da autoridade. § 3º Os animais serão assistidos em juízo pelos representantes do Ministério Público, seus substitutos legais e pelos membros das sociedades protetoras de animais. Assim, o decreto supracitado destaca-se pela percepção da aplicabilidade de direitos aos animais. O próprio § 3º do art. 2º dispõe que o Ministério Público irá assistir os animais em juízo. (FREITAS, 2012).

É possível perceber que o decreto demonstra uma inclinação do legislador para o reconhecimento dos animais como sujeitos de direito. Nesse sentido, Fabricio Costa, Natielli Veloso e Janaina Costa (Direitos dos Animais no Brasil e no Direito Comparado: a problemática da busca do reconhecimento da senciência, 2018, p.77) expõem que:

Evidencia-se, a partir do diploma legal acima citado, uma preocupação do legislador brasileiro com o bem-estar animal, especialmente no que atine a sua dignidade, embora tais premissas legais ainda são incipientes em razão da cultura que ainda reproduz hábitos que colocam os animais não humanos em posição de absoluta desigualdade estrutural em relação ao homem.

Em 1941, com a promulgação da Lei de Contravenções Penais (Lei 3.688/41), a prática de atos de crueldade e maus-tratos contra os animais passou a ser considerada uma contravenção penal.

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Dessa forma, conforme dispõe o art. 64 da Lei 3.688/41, aquele que trata o animal com crueldade incorrerá na pena de prisão ou multa:

Art. 64. Tratar animal com crueldade ou submetê-lo a trabalho excessivo:

Pena – prisão simples, de dez dias a um mês, ou multa, de cem a quinhentos mil réis. § 1º Na mesma pena incorre aquele que, embora para fins didáticos ou científicos, realiza em lugar público ou exposto ao publico, experiência dolorosa ou cruel em animal vivo.

§ 2º Aplica-se a pena com aumento de metade, se o animal é submetido a trabalho excessivo ou tratado com crueldade, em exibição ou espetáculo público.

Já a lei 5.197 de 1967, mais conhecida como Código de Pesca, trouxe novas regulamentações à proteção dos animais, e cuidou de tratar separadamente a fauna silvestre, buscando alcançar as diferentes espécies de animais existentes em cada região do país. (FIORILLO e FERREIRA, 2019).

Ademais, a legislação ratificou o decreto 24.645/34 ao expor já em seu art.1º que a fauna é propriedade do Estado.

Dessa forma, é possível concluir que por mais que a lei 5.197/67 signifique uma evolução na tutela jurídica dos animais, o legislador ainda aborda o animal como mera propriedade, um bem móvel de domínio de alguém, nesse caso, do Estado. (FIORILLO e FERREIRA, 2019).

Em 1891, temos a criação da Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81), que ainda parcialmente vigente, tem por objetivo melhorar a qualidade de vida ambiental para um desenvolvimento econômico-social do país. (BRASIL, 1981).

Essa política é ainda responsável por criar o CONAMA, Conselho Nacional do Meio Ambiente, que tem como fim precípuo fiscalizar e regulamentar a preservação do meio ambiente e a utilização racional de recursos ambientais. (FIORILLO e FERREIRA, 2019).

No entanto, apesar de ser uma legislação de extrema importância para a conservação do meio ambiente de forma generalizada, pouco aborda a situação dos animais e seus direitos.

Já em 1998 foi promulgada a lei 9.605, que é a chamada Lei de Crimes Ambientais, que atualmente é uma das mais conhecidas norma de proteção e tutela dos animais não humanos. (FREITAS, 2012).

A Lei 9605/98 traz uma seção (Seção II) exclusivamente para a previsão de crimes contra a fauna. Esse segmento da norma contém 17 artigos que exemplificam atos de crueldade e maus tratos com os animais e estipulam penas para quem os pratica. (BRASIL, 1998).

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As penas consistem em sua maioria em prisão, seja detenção ou reclusão. Esse posicionamento do legislador demonstra uma preocupação maior do que nas legislações anteriores ao respeito à dignidade do animal.

O artigo 29 da Lei 9605/98 trata como infração penal a caça, o uso, a perseguição de espécies animais sem a devida permissão e licença, e em dissonância com a legislação. Da mesma forma, o artigo condena a interferência do homem no habitat animal. (BRASIL, 1998)

Faz-se mister destacar que o parágrafo 3º deste artigo dispõe acerca do conceito de fauna silvestre: “São espécimes da fauna silvestre todos aqueles pertencentes às espécies nativas, migratórias e quaisquer outras, aquáticas ou terrestres, que tenham todo ou parte de seu ciclo de vida ocorrendo dentro dos limites do território brasileiro, ou águas jurisdicionais brasileiras.” (BRASIL, 1998).

Apesar de este artigo compelir a crer que a Lei 9605/98 somente é aplicável aos animais silvestres, o art. 32 constata que a legislação também é extensível aos animais domésticos, domesticados, nativos e exóticos (BRASIL, 1998):

Art. 32. Praticar ato de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos:

Pena - detenção, de três meses a um ano, e multa.

§ 1º Incorre nas mesmas penas quem realiza experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos.

§ 2º A pena é aumentada de um sexto a um terço, se ocorre morte do animal.

É possível perceber que o art. 32 também faz menção a tipificação do uso de animais em pesquisas científicas. Entretanto, essa regra foi mitigada com o advento da Lei nº 11.794 de 2008 que regulamenta o inciso VII do parágrafo 1º do art. 225 da Constituição Federal, que será abordado em momento oportuno. (ANTUNES, 2015).

Diante do exposto, a Lei nº 9605/1998 destaca-se por não somente criminalizar as práticas humanas, mas também abordar o animal como além de um bem a ser útil ao homem. (FREITAS, 2012).

No entanto, a contrario sensu, o art. 37 apresenta exceções ao crime de abate ao animal (BRASIL, 1998):

Art. 37. Não é crime o abate de animal, quando realizado:

I - em estado de necessidade, para saciar a fome do agente ou de sua família; II - para proteger lavouras, pomares e rebanhos da ação predatória ou destruidora de animais, desde que legal e expressamente autorizado pela autoridade competente; III – (VETADO)

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É notório que principalmente o inciso II deste artigo, demonstra uma legislação ainda retrógrada, ao sobrepor o direito de propriedade ao direito à vida do animal.

É possível perceber, portanto, que apesar de termos normas amplas sobre a tutela dos animais, em sua maioria não os conferem direitos. Nesse sentido, expõem:

“[...] nem todos esses diplomas visam proteger os animais da interferência do homem. Várias normas, embora elas regulamentem o uso de animais, têm um enfoque econômico, com pouca preocupação com o animal não-humano.” (SANTOS, 2015 apud MEDEIROS, 2013).

2.2 A Propriedade: Status Jurídico do Animal Não-Humano no Código Civil Brasileiro. Desde o advento do Código Civil de 1916 a sociedade passou a discutir o status jurídico dos animais não-humanos.

O Código Civil de 1916 definiu em seu art. 47, bens móveis como “bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia” (BRASIL, 1916). Nesse sentido, a doutrina da época passou a considerar os animais como bens móveis que são suscetíveis de remoção por força alheia, os chamados semoventes (FIORILLO e FERREIRA, 2019, p. 115).

Diante disso, ao tutelá-los como meros bens móveis, “os animais estavam submetidos não só ao regime da propriedade como ao regime de aquisição e perda de propriedade móvel” (FIORILLO e FERREIRA, 2019, p. 104).

Por conseguinte, sob a égide do Código Civil de 1916, “os animais tinham dono sendo certo que o proprietário poderia usar, gozar e dispor de seu semovente” (FIORILLO e FERREIRA, 2019, p. 115).

Esse tratamento de propriedade aplicado aos animais, pode ser ratificado pelos artigos 593 à 596 do Código Civil de 1916 que previam a possibilidade de apropriação desses seres vivos em certos casos:

Art.593. São coisas sem dono e sujeitas à apropriação: I - os animais bravios, enquanto entregues à sua natural liberdade; II - os mansos e domesticados que não forem assinalados, se tiverem perdido o hábito de voltar ao lugar onde costumam recolher-se, salvo a hipótese do art. 596; III - os enxames de abelhas, anteriormente apropriados, se o dono da colmeia, a que pertenciam, os não reclamar imediatamente;

IV - as pedras, conchas e outras substâncias minerais, vegetais ou animais arrojadas às praias pelo mar, se não apresentarem sinal de domínio anterior.

O atual Código Civil de 2002 deveria estar em consonância com os preceitos constitucionais da Constituição Federal de 1988, no entanto, não foi isso que aconteceu.

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O novo, mas não evoluído, Código Civil de 2002 “no que se refere ao balizamento dos animais repetiu exatamente o mesmo conteúdo do Código Civil de 1916” (FIORILLO e FERREIRA, 2019, p. 116).

Assim, o art. 82 do Código Civil de 2002 também definiu o que seriam bens móveis: “São móveis os bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social.” (BRASIL, 2002).

Da mesma forma a doutrina também manteve o posicionamento ao considerar os animais como seres semoventes, bens móveis suscetíveis de movimento próprio ou de remoção por força alheia. (FIORILLO e FERREIRA, 2019).

Dessa forma, o Código Civil de 2002 continua por submeter os animais ao regime da propriedade, da aquisição, e da perda de propriedade.

Caso necessário demonstrar uma mudança vantajosa para os animais com o advento do “novo” Código Civil, é possível citar o parágrafo 1º do art. 1228, que determina parâmetros para o uso da propriedade, por conseguinte determina parâmetros para o uso do animal (FIORILLO e FERREIRA, 2019).

Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha. § 1 o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas

finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas. (BRASIL, 2002).

Ademais, para a legislação civilista “os animais são considerados objetos, não sujeitos de direito (titulares de direito), ou seja, não são considerados entes suscetíveis de direitos e obrigações, não são sujeitos da relação jurídica” (SANTOS, 2015 apud BLANCO, 2013; p. 35). A coisificação do animal ignora o fato destes serem seres sencientes, ou seja, capazes de sentir (LEITE, 2013).

O Código Civil de 2002 ainda não tutela os animais considerando o papel que possuem hoje na sociedade, que também é muito diferente do que era em 1916. Nesse sentido, conforme dispõe Ana Carla Patriota Leite (Sujeitos ou Coisa: Os animais segundo o Código Civil, 2013, p. 5) é possível destacar que:

O homem peca ao interpretar de maneira avessa sobre o direito e propriedade dos seres sencientes, não é porque são donos/proprietários que deve usar como bem entender desta vida. O termo correto na verdade, deveria ser guardião ou tutor, como acontece com crianças, incapazes, onde são resguardados e protegidos de abusos e demais atrocidades. O animal humano precisa compreender que a lei os protege [os animais] não contra a sua morte ou uso físico e psíquico, mas apenas contra o sofrimento, e, com isso, os protege debilmente contra as ações dos seres humanos.

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Além disso, o enquadramento dos animais como propriedade traz diversos conflitos jurídicos para a sociedade.

Nessa perspectiva os animais de rua podem ser sujeitos a apropriação de quaisquer pessoas, uma vez que são considerados “res nullius”, ou seja coisas de ninguém. Da mesma forma, os animais de estimação em uma dissolução conjugal seriam objeto da partilha como qualquer outro bem móvel ou imóvel, sem considerar a relação afetiva com o animal. (SANTOS, 2015)

Por outro lado, considerando a existência de leis específicas acerca da fauna e em razão do princípio da especialidade, a propriedade do animal também é limitada por outros instrumentos legislativos (SANTOS, 2015).

Especificamente na área do Direito de Família, é possível perceber uma discreta tendência para o reconhecimento dos animais como sujeitos de direito.

Apesar de não haver respaldo legislativo, a doutrina reconhece a possibilidade de um tipo familiar denominado família multiespécie. Nessa nova concepção, o animal de estimação passa a ser um membro da família. (CARDOSO, 2017)

Dessa forma, “alguns casos o vínculo afetivo entre humano e animal é tão grande que se comparam ao afeto existente entre pais e filhos.” (CARDOSO, 2017, p. 13).

A Pesquisa Nacional de Saúde (PNS, 2013), realizada pelo IBGE estimou a população de cachorros em domicílios brasileiros em 52,2 milhões, o dado mostra que, no Brasil, existem mais cachorros de estimação do que crianças, em 2013, havia 44,9 milhões de crianças de até 14 anos de acordo com outra pesquisa do IBGE, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD). (CARDOSO, 2017 apud IBGE, 2013)

A constatação de que um animal de estimação pode ter a mesma importância no seio familiar do que uma pessoa, conclui que a estes também devem ser aplicados direitos de âmbito familiar, como guarda, convívio, proteção e amor. (CARDOSO, 2017).

Casos entre o Direito de Família e os animais já chegaram aos Tribunais Superiores Brasileiros, e serão abordados em momento oportuno.

2.3 Proteção dos Animais na Constituição Federal de 1988: o direito constitucional ao meio ambiente.

A Constituição da República Federativa do Brasil (CRFB/88), promulgada em 5 de outubro de 1988, foi elaborada por uma Assembleia Constituinte composta de 559

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parlamentares, é a sétima constituição brasileira e encarregada de restabelecer a ordem democrática após o regime militar.

Ademais, a Constituição de 1988 é responsável por trazer um rol de direitos individuais, como a igualdade de gêneros, proibição da tortura; e direitos sociais, como educação, saúde e meio ambiente. Esse viés democrático e igualitário garantiu a ela o status de “constituição cidadã”.

Dos artigos 5º e 6º é possível depreender o espírito da Constituição de 1988. O imprescindível art. 5º, conhecido pela premissa de que “todos são iguais perante a lei”, contém setenta e oito incisos, quatro parágrafos e o caput; e expressam diversos direitos fundamentais, hoje, aplicados exclusivamente ao homem. (BRASIL, 1988).

É necessário destacar o inciso III do art. 5º que preleciona acerca da vedação à tortura: “III - ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante” (BRASIL, 1988). Como observado anteriormente, os direitos individuais constantes na norma constitucional são apenas aplicados aos seres humanos, restando aos animais, a única legislação infraconstitucional de vedação aos maus tratos.

Já, o art. 6 da CRFB/ 88 coaduna com os direitos sociais, conforme o caput: “Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição”. (BRASIL, 1988)

No mesmo sentido, os direitos sociais constitucionais também somente são aplicados aos seres humanas. Dessa forma, não há garantia constitucional de que aos animais também seja garantido a saúde, alimentação, ou segurança. Será que esses seres vivos também não deveriam ser sujeitos de direitos constitucionais?

Nesse sentido é possível destacar:

[...] a evolução mostra-se possível e desejável de dotar de proteção estes seres sencientes que por muito vem sendo excluídos e colocados às margens da sociedade. Não se há um argumento lógico para não conceder aos animais não humanos direitos fundamentais, que num primeiro momento foram criados para o animal humano. Veja, que aqui se defende alguns direitos do ser humano ao ser animal não humano, tão somente aqueles que lhe sirvam e que possam ser usados pelos mesmos [...] (ABÍLIO, 2017?, p.32)

Outro destaque da Constituição Federal de 1988 é o princípio da dignidade da pessoa humana, previsto no art. 1º, II e remete a importante garantia constitucional (BRASIL, 1998). Trata-se de um princípio considerado como absoluto, intrínseco ao home, que o garante respeito pelo Estado, sociedade. Sendo direito-dever capaz de proteger o homem de qualquer ato vexatório ou degradante. (SANTANA 2010 apud SARLET, 2001).

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Entretanto não há também, apesar de necessária, e indiscutivelmente possível de ser aplicada, uma previsão extensiva desse princípio, de forma a garantir também a dignidade do animal. Ademais, não há ainda, na legislação brasileira o abandono por completo da visão antropocêntrica, para dar lugar à visão biocêntrica, ensejando na proteção de quaisquer modalidades de vida. (FREITAS, 2012)

Dessa forma, é possível destacar que:

[...] todas as concepções que sustentem ser a dignidade atributo exclusivo da pessoa humana – encontram-se, ao menos em tese, sujeitas à crítica de um excessivo antropocentrismo, notadamente naquilo em que sustentam que a pessoa humana, em função de sua racionalidade (...) ocupa um lugar privilegiado em relação aos demais seres vivos. Para além disso, sempre haverá como sustentar a dignidade da própria vida de um modo geral, ainda mais numa época em que o reconhecimento da proteção do meio ambiente como valor fundamental indicia que não está em causa apenas a vida humana, mas a preservação de todos os recursos naturais, incluindo todas as formas de vida existentes o planeta, ainda que se possa argumentar que tal proteção da vida em geral constitua, em última análise, exigência da vida humana e de uma vida humana com dignidade. (ABÍLIO, 2017?, p.35 apud SARLET, 2006) À contrário sensu, de forma preocupante, a Constituição Federal de 1988 é atualmente, a legislação brasileira que estabelece maior proteção aos animais. Somente com o advento da Constituição de 1988, normas ambientais passaram a ter previsão constitucional. (FREITAS, 2012).

Em sede comparativa, as Constituições anteriores não abordavam o tema animal, e também não determinavam a proteção ambiental. (SANTOS, 2015).

Nesse sentido, primeiramente, o art. 23, VII da CRFB/88 expõe acerca da competência comum da União, Estados, Distrito Federal e Municípios para preservar a fauna. Dessa forma, é dever de todos os entes federados, zelar pela proteção dos animais. (BRASIL, 1988)

Além disso, o art. 24, VI, determina a competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal para legislar sobre caça, pesca, e fauna. Com isso, tem-se, em síntese, que à União competirá normas de caráter geral, e aos Estados e Distrito Federal, normas suplementares. (BRASIL, 1988)

A previsão constitucional de maior importância para o meio ambiente é o art. 225, que dispõe sobre a flora e a fauna e é o único artigo do Capítulo VI do Título VII, denominado meio ambiente:

Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao poder público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Referências

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