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Palavras-chave: surdez alfabetização educação inclusiva saber docente

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Academic year: 2021

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ICLUSÃO DE SURDOS A REDE MUICIPAL DE ESIO OVA IGUAÇU: REFLEXÕES A PARTIR DO DISCURSO DOS PROFESSORES

Camila Machado de Lima Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro

Resumo

A respeito da inclusão do aluno surdo o ponto crucial é a interação a ser estabelecida para que lhe sejam assegurados a construção da aprendizagem e acesso ao currículo escolar. Tendo em vista a problemática da comunicação como fator primordial para a relação entre professores/alunos ouvintes e alunos surdos, o presente trabalho pesquisa quais os desafios e propostas encontradas pelos professores entrevistados a fim de apontar as alternativas e intervenções possíveis para o processo de inclusão do aluno surdo no espaço da sala de aula. Quadros (1997); Glat & Blanco (2009); Dias, Silva & Braun (2009); Lodi & Lacerda (2009), entre outros autores, foram utilizados como aportes teóricos para o desenvolvimento desta investigação, relacionando a atual perspectiva de educação de surdos, o bilinguismo, e a educação inclusiva. Foram selecionados dez professores da rede municipal de Nova Iguaçu (RJ) que lecionam ou lecionaram para alunos surdos nas turmas regulares das séries iniciais do Ensino Fundamental. Este município ainda não conta com profissionais de apoio bilíngues e não apresenta, até o momento, um programa ou proposta consolidada para a educação de surdos, entretanto, estes alunos já frequentam as classes comuns. A pesquisa tem abordagem qualitativa por privilegiar uma análise de fenômenos envolvendo as pessoas que atuam no contexto a ser pesquisado e as técnicas utilizadas foram questionário e entrevista almejando sondar aspectos relevantes do processo de inclusão dos surdos, sua aprendizagem e os saberesfazeres dos professores investigados. Os resultados demonstram dificuldades de práticas de leitura e escrita com os alunos, conhecimentos básicos sobre a LIBRAS, algumas adaptações curriculares de acordo com a aprendizagem e condições da surdez e pouca aceitação da política de inclusão do surdo pelos professores, contudo acreditam que é possível sob algumas condições e mudanças na rede de ensino.

Palavras-chave: surdez – alfabetização – educação inclusiva – saber docente

1. Introdução

Com as propostas de inclusão escolar e término gradativo das classes especiais, os alunos com necessidades especiais passam a ingressar nas escolas regulares, como afirma a própria LDB 9.394/96, artigo 4º, inciso III: “atendimento educacional especializado gratuito aos educandos com necessidades especiais, preferencialmente na rede regular de ensino”.

Das dificuldades presentes neste dilema educacional, a entrada de crianças surdas nas turmas regulares requer atenção devido à diferenciação e peculiaridades

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linguísticas. O ponto crucial é a interação a ser estabelecida para que lhe sejam assegurados a construção da aprendizagem e acesso ao currículo escolar, tendo em vista que

A complexidade da questão reside no fato de que a surdez não acarreta apenas uma dificuldade de comunicação, mas afeta o processo “normal” de aquisição da língua oral e, consequentemente, o desenvolvimento do pensamento verbal e da aprendizagem acadêmica, de modo geral, que não podem ser alcançados pelo mesmo caminho que os ouvintes (GLAT, 2009, p. 2).

Ao pensar sobre a inclusão do aluno surdo nas turmas regulares podemos fazer os seguintes questionamentos: Que conhecimentos os professores tem a respeito da Língua de Sinais? A comunicação professsor-aluno surdo e aluno ouvinte-aluno surdo não ficará comprometida? Como alfabetizá-lo em Língua Portuguesa? Existem intérpretes e instrutores surdos suficientes para atender as escolas? Que consequências positivas e negativas podem acarretar à aprendizagem e convivência desse aluno no espaço escolar? Essas são perguntas que não pretendem ter respostas no momento, entretanto nos ajudam a situar a existência de muitas dúvidas, dificuldades e desafios perante a proposta inclusiva, em especial, dos alunos surdos.

1.2 Educação Bilíngue e Educação Inclusiva: algumas considerações

A política de Educação Inclusiva vem ao longo dos anos proporcionando mudanças significativas no contexto escolar, pois preza pelo acesso, participação e aprendizagem dos alunos com necessidades educacionais especiais. Tal política propõe ainda que esses alunos tenham atendimentos e acompanhamentos educacionais especializados para que os objetivos apresentados sejam alcançados.

Segundo a Resolução nº 4, de 2 de outubro de 2009 (CNE/CEB), o Atendimento Educacional Especializado (AEE) tem a função de “complementar ou suplementar a formação do aluno por meio da disponibilização de serviços, recursos de acessibilidade e estratégias que eliminem as barreiras para sua plena participação na sociedade e desenvolvimento de sua aprendizagem”, desse modo, as Salas de Recursos Multifuncionais contam com materiais didáticos, equipamentos e mobiliários adaptados e elaborados para as diferentes necessidades educacionais especiais dos alunos, visando o desenvolvimento das suas potencialidades.

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A Educação Inclusiva vem proporcionando novas abordagens pedagógicas quanto ao ritmo de aprendizagem dos alunos, quanto ao desenvolvimento das potencialidades e respeito às limitações dos educandos e quanto às diferentes formas dos indivíduos em construir a sua aprendizagem. Seleção de conteúdos, procedimentos de avaliação, recursos e metodologias passam a ser pensados para favorecer a permanência dos alunos na escola com sucesso acadêmico considerando suas peculiaridades. Adequação do ensino e da escola aos alunos.

Paralelo à política de inclusão escolar, no que diz respeito aos surdos, precisamos articulá-la às propostas de educação bilíngue a fim de atender de modo pleno o processo educacional desses alunos.

Na perspectiva de educação bilíngue, tem-se como premissa fundamental que a língua materna do surdo é a língua de sinais, LIBRAS, no Brasil. A alfabetização destinada a este aluno deve atender ao pressuposto de aquisição e compreensão da sua primeira língua (L1) e concomitantemente ou posteriormente à aprendizagem da Língua Portuguesa como sua segunda língua (L2), a língua oficial e de instrução do país em que ele está inserido.

No Brasil ainda existem poucos relatos sobre a Educação Bilíngue para surdos, entretanto, muitos autores brasileiros defendem o bilinguismo e apresentam suas vantagens como um ponto de partida para o sucesso escolar e social destes alunos, pois as pesquisas mostram que, no caso de alunos surdos, o fracasso, o atraso e a evasão escolar são recorrentes no sistema educacional brasileiro, conforme apresenta Quadros (1997, p. 23) que “nas escolas brasileiras, é comum terem surdos com muitos anos de vida escolar nas séries iniciais sem uma produção escrita compatível com a série. Além disso, há defasagens nas demais áreas previstas para as séries considerando o currículo escolar”.

Quadros (1997, p. 27) também compartilha e defende a proposta de Educação Bilíngue haja vista que “(...) propõe a tornar acessível à criança duas línguas no contexto escolar (...). Considera a língua de sinais como língua natural e parte desse pressuposto para o ensino da língua escrita”.

Lodi & Lacerda (2009, p. 12) ressaltam a importância da educação bilíngue para surdos desde a infância para que não haja um atraso significativo na aquisição da linguagem e na construção do pensamento. Segundo elas “estes sujeitos devem interagir com interlocutores usuários da língua de sinais o mais precocemente possível,

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identificada como uma língua passível de ser desenvolvida sem que sejam necessárias condições especiais de ‘aprendizagem’”.

Para Slomski (2010, p. 63), “o bilinguismo reconhece a condição bilíngue dos surdos e o direito que os mesmos têm de serem educados num modelo de educação com o Bilinguismo”. Cabendo à escola, portanto, proporcionar um ambiente linguístico sinalizado segundo as peculiaridades dos alunos surdos para que possam ser incluídos na sociedade e participem ativamente das relações sociais.

Corroborando com esse pensamento, Kelman evidencia que

O Bilinguismo possibilitará a formação de conceitos e a codificar o que lê na língua majoritária através da língua de sinais. Dessa maneira, a aquisição o quanto antes da língua de sinais permite à criança surda um processo mais natural de desenvolvimento (...) a educação com Bilinguismo para surdos é objeto de estudos e pesquisas porque os desafios para educação inclusiva com Bilinguismo são gigantescos (KELMAN, 2010, p. 10).

De acordo com os autores mencionados, a Educação Bilíngue se apresenta hoje como a atual proposta educacional capaz de reconhecer as particularidades linguísticas e culturais dos surdos considerando a sua inserção, inclusão e participação no contexto escolar e social. Já a relação Bilinguismo e Educação Inclusiva para surdos se revela como um grande desafio. Ambas as propostas se caracterizam como novidades no contexto educacional, porém elas precisam caminhar juntas para que a inserção, convívio e aprendizagem dos alunos surdos sejam plenas e satisfatórias conforme defendem os estudiosos da área da educação de surdos. Neste sentido, a escola precisa abrir as portas para a presença e utilização de outra língua no seu espaço e novas construções e aprendizagens são possibilitadas por intermédio do outro, do diferente.

2. A pesquisa e o contexto educacional

A pesquisa terá abordagem qualitativa por privilegiar uma análise de fenômenos envolvendo as pessoas que atuam no contexto a ser pesquisado (GONZAGA, p. 73), no nosso caso, o fenômeno educacional em questão se refere os

saberesfazeres envolvidos nas práticas de ensino com alunos surdos e ouvintes.

Entre as técnicas de pesquisa qualitativa adotamos a análise de conteúdo, em especial, as narrativas dos professores. A escolha pela investigação narrativa se justifica

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pela necessidade de dar voz ao professor que está atuando com alunos surdos e ouvintes numa mesma classe e que estão em processo de alfabetização, pois segundo Rabelo (2011, p. 184) “a análise narrativa insere-se nos campos de investigação educacional com grande força, por possibilitar a compreensão das práticas, motivações e escolhas que são amplamente calcadas na experiência humana”. Perante o dilema da inclusão escolar e social do aluno surdo, quais são as expectativas e desafios deste professor? A investigação narrativa na educação “significa um impacto na pratica educativa, envolvendo os professores como ‘sócios’ da pesquisa.” (RABELO, 2011, p. 186). Trata-se então de uma pesquisa colaborativa e dialógica sobre os saberesfazeres nas práticas pedagógicas com surdos e ouvintes.

Durante a pesquisa adotaremos como referenciais teóricos sobre a educação bilíngue de crianças surdas os autores: Quadros (1997), Slomski (2010), Goldfield (2002), Lacerda & Lodi (2010), Kelman (2010) e Dias, Silva e Braun (2009) e sobre educação especial e inclusão escolar, Glat (2007).

O campo de estudo da pesquisa é a rede municipal de ensino de Nova Iguaçu e é importante enfatizar que a rede não conta ainda com a presença de profissionais de apoio bilíngue como intérpretes de Língua Portuguesa/LIBRAS e assistentes surdos. Os alunos surdos contam apenas com o atendimento na Sala de Recursos no contra-turno. Sendo assim, maiores são as dificuldades do professor regente em estabelecer práticas de ensino condizentes com a política educacional de inclusão devido a ausência dos profissionais, que segundo Lodi & Lacerda (2010), são fundamentais para dar suporte ao trabalho desenvolvido pelo professor, estabelecer comunicação e informação numa língua acessível ao surdo e oportunizar a esse aluno o contato direto com sua primeira língua.

Apesar da falta de profissionais bilíngues e atendimentos específicos para surdos, estes alunos já estão nas salas de aula e precisamos pensar, refletir e estudar o agora, o momento e situações atuais. Os professores estão questionando suas práticas? Estão criando alternativas pedagógicas? Estão fazendo perguntas? Quais os recursos, estratégias e intervenções pedagógicas que os professores estão adotando? Perguntas como essas só poderão ser respondidas com base nas narrativas docentes e numa investigação conjunta com esses professores.

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O presente trabalho monográfico optou por uma proposta teórico-metodológica de pesquisa qualitativa, onde estabeleceu como técnicas a utilização de questionário e de entrevista que foram aplicados a dez professores da rede municipal de ensino do Município de Nova Iguaçu no estado do Rio de Janeiro, atuantes nas séries iniciais do Ensino Fundamental e que tenham ou já tiveram alunos surdos incluídos em suas turmas.

Tanto o questionário quanto a entrevista tiveram como objetivo sondar:

• as necessidades, desafios e dúvidas no processo de alfabetização e letramento de crianças surdas;

• a existência de currículo escolar diferenciado para atender às peculiaridades linguísticas do aluno surdo;

• opiniões a cerca da proposta e processo de inclusão desses alunos nas classes regulares.

A seguir apresentaremos os resultados encontrados por meio das técnicas de pesquisa utilizadas buscando articular as respostas dos professores aos estudos atuais sobre educação inclusiva e educação de surdos.

3. Resultados

3.1 Um aluno surdo na turma regular: Inclusão?

“Acreditaria na inclusão se ela acontecesse de uma forma de fato justa! Com professor capacitado para receber este aluno ou, pelo menos, com intérprete na sala de aula. No entanto, lamento perceber que meus alunos estão muito mais inseridos do que incluídos.” (Professora 3)

“A inclusão é possível desde que o professor seja capacitado, lecione para um número regular de alunos e possua recursos apropriados.” (Professora 1)

Os professores entrevistados, em sua maioria, não se sentem preparados para atender um aluno surdo na turma regular devido às dificuldades de comunicação entre eles e o aluno. Para eles, a inclusão dos alunos surdos vem acontecendo por meio da mera matrícula na classe comum e o único suporte e atendimento aos surdos é a sala de recursos a qual eles frequentam duas vezes por semana no contra-turno.

Sobre a atual inclusão destes alunos, todos os professores apresentaram-se insatisfeitos e até consideram a inclusão, da forma que está sendo feita no município,

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desrespeitosa com o aluno e com o professor, porém acreditam que é possível a efetivação da inclusão escolar sob algumas condições: formação continuada dos professores regentes, redução da quantidade de alunos na turma, recursos didáticos específicos para o atendimento ao aluno surdo, presença de professores bilíngues, intérpretes, instrutores surdos.

“Sei que todos devem ter acesso a escola e que a inclusão é um direito, mas da forma que está acontecendo na rede municipal de Nova Iguaçu, por exemplo, é desrespeitoso com o aluno e com o professor. O aluno que é incluído na classe regular, raramente estuda com um professor bilíngue e a rede não dispõe da intérpretes nas salas de aula.” (Professora 9)

Alguns professores entrevistados constatam ainda a existência de alunos que acabam desistindo da escola por falta de identificação com os professores, com os demais alunos, com a estrutura da escola e do sistema educacional, pois são apenas inseridos e não incluídos.

Glat & Blanco (2009, p. 17) apontam que a proposta de Educação Inclusiva implica “um processo de reestruturação de todos os aspectos constitutivos da escola, envolvendo a gestão de cada unidade escolar e dos próprios sistemas educacionais”, isto é, também é papel da escola auxiliar no processo de inclusão destes alunos articulando todos os atores educativos, desde a família até a secretaria de educação.

3.2 – O papel da LIBRAS na sala de aula

“No início eu gritava como se ele tivesse baixa audição. Hoje eu não faço mais isso, porém falo olhando para ele e vou aprendendo a utilizar recursos mais visuais e lúdicos.” (Professora 5)

“Meu conhecimento em LIBRAS é bem pequeno e fruto de muita tentativa de promover avanços na aprendizagem de meus alunos. Infelizmente ainda não tenho tempo de fazer um curso de LIBRAS, mas isso está nos meus planos.” (Professora 3)

Os professores atentam para a necessidade de conhecer mais sobre a Língua Brasileira de Sinais como a primeira alternativa de contato com os alunos surdos. Por mais que o aluno não saiba a LIBRAS, o professor regente pode auxiliá-lo a aprender alguns sinais. Entretanto, esse auxílio e suporte que o professor pode oferecer ao aluno em relação à língua de sinais não são suficientes visto que o fundamental seria o contato com profissionais bilíngues e instrutores surdos a fim de construir sua identidade cultural e desenvolver sua linguagem.

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Nos questionários e entrevistas foi possível notar uma preocupação dos professores quanto ao ensino de conteúdos, principalmente quando se trata de questões abstratas nas quais os gestos e mímicas (muitas vezes citados pelos professores que não sabem a LIBRAS) não dão conta de transmitir informações adequadas:

“O meu pouco conhecimento em Língua Brasileira de Sinais me permitiu utilizar a linguagem apenas em determinados momentos. Grande parte dos conteúdos escolares, principalmente aqueles ligados à assuntos abstratos, não consigo relacionar com os gestos.” (Professora 1)

De acordo com os dados coletados faz-se necessário destacar que a Língua Brasileira de Sinais não é uma tradução da Língua Portuguesa para sinais, gestos, mímicas e símbolos, todavia, uma língua reconhecida oficialmente (Lei nº 10.436/2002) que transmite e produz significados e culturas. O reconhecimento e valorização desta língua na escola oferecem segurança ao surdo ampliando as oportunidades de atuação, pois conforme Lodi & Lacerda (2009, p. 21) a circulação efetiva da LIBRAS no espaço escolar é requisito para uma proposta inclusiva bilíngue.

3.3 – Alfabetização de alunos surdos

A fase de escolarização de todo aluno inicia-se pelo processo de alfabetização haja vista a importância de aprender a ler e a escrever. Esta é uma fase que também faz parte da escolarização dos alunos surdos e para que possam ter resultados satisfatórios acreditamos que o ponto de partida deva ser a sua língua materna, a língua de sinais, pois é por meio dela que os surdos podem se expressar, dialogar e contextualizar os acontecimentos ao seu redor.

Os professores entrevistados apontaram como principal desafio no processo de alfabetização dos alunos surdos, a oralidade. Os estudos de alfabetização se baseiam, em geral, em conceitos e práticas de linguagem com ênfase na oralidade. Tais estudos possuem enorme relevância para compreender a construção e aquisição da língua pela criança, porém para compreender a construção inicial de leitura e escrita pelos alunos surdos é necessário conhecer também a composição de elementos viso-espaciais e não-sonoros presentes na língua de sinais.

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“A Alfabetização em si é pautada na oralidade. Sendo assim, o aluno surdo precisa se alfabetizar de outras formas. A maior dificuldade encontrada é a associação de fonemas e grafemas, mas tento basear a minha prática na escrita da Língua Portuguesa por causa do canal e aspecto visual da escrita.” (Professora 8)

“É preciso alfabetizar os alunos surdos nas duas língua, depois incluí-los com a presença de intérpretes (...). Atualmente, quando o surdo chega à escola é analfabeto das duas línguas” (Professora 4)

Deste modo, quando se trata de alfabetização travam-se grandes dilemas, pois como afirma Quadros (1997, p. 5) “um grafema, uma sílaba, uma palavra escrita no português não apresentam nenhuma analogia com um fonema, uma sílaba e uma palavra na LIBRAS, mas sim com o português falado. A Língua Portuguesa não é uma língua natural da criança surda”. Peixoto (2006) também enfatiza que as “palavras”, na língua de sinais, não se constroem através da combinação de fonemas, e sim do movimento das mãos no espaço e se organizam de maneira simultânea e não-linear.

Sendo necessário e fundamental alfabetizar o aluno surdo, alguns professores apontam algumas propostas a fim de possibilitar a ele a construção da escrita e a habilidade da leitura. A escrita está sempre associada a figuras e imagens. Quanto à leitura, de acordo com o nível da aprendizagem e o ano de escolaridade do aluno, é constatada por meio de desenhos e sinais que para o surdo parecem estar relacionados ao que compreendeu da leitura feita pelo professor (leitura dinamizada com imagens e dramatizações).

Portanto, as construções e associações realizadas pelos alunos surdos no processo inicial de alfabetização bilíngue são importantes para compreender as relações e as compreensões que eles fazem referentes às línguas. Isso também é fator terminante para a avaliação com base na continuidade e nas potencialidades das crianças.

3.4 – O ponto de partida: as adaptações curriculares

“Dedico em todas as aulas um tempo para a aluna surda (...) todos os dias acompanho seu desenvolvimento de perto, nem que seja só para ter certeza de que ela entendeu.” (Professora 3)

“Primeiro eu explico de modo geral para todos, procurando falar de modo bem articulado. Depois, uso o pouco que seu da língua de sinais, e explico as atividades para eles falando bem devagar e dramatizando muito” (Professora 4)

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“Uso ditado visual, atividades dinâmicas envolvendo a datilologia e o aluno pegar a imagem ou fazer o sinal ou o aluno pegar a palavra da imagem que estou mostrando.” (Professora 7)

Incluir um aluno surdo em uma turma que contém majoritariamente ouvintes requer uma nova abordagem de conteúdos, novas estratégias para aproximar os alunos e adaptações curriculares a fim de que a criança surda tenha desenvolvimento satisfatório e os demais alunos sejam capazes de aprender com o outro. O processo de inclusão não almeja apenas a matrícula e ingresso de alunos com necessidades educacionais especiais nas turmas regulares, entretanto um conjunto de ações e práticas que envolvam todo o espaço escolar.

Entendemos o currículo como um conjunto de práticas, conceitos, conteúdos e construções que são formuladas no espaço escolar. E no processo de inclusão o currículo precisa ser aberto e flexível oferecendo ao aluno com necessidades educacionais especiais a possibilidade de aprender em seu próprio ritmo. A adaptação não deve partir do aluno, mas da escola que o recebe; pois é ela a responsável por proporcionar subsídios para a aprendizagem dos alunos nas variadas diferenças e necessidades apresentadas por eles.

Os professores criam, conforme seus saberes docentes, alternativas pedagógicas que vão de encontro com a capacidade e necessidade dos alunos surdos. É importante destacar que os surdos não são ignorados pelos professores e, com base nas entrevistas e questionários, foi possível constatar uma preocupação por parte dos docentes sobre como proceder, o que fazer, o que não fazer, o que preciso aprender.

Perante as problematizações da inclusão do aluno surdo, das adaptações curriculares, das práticas e metodologias que atendam às singularidades e necessidades desta clientela, a formação do professor precisa ser contínua e neste caso específico, a LIBRAS presente no espaço escolar fará toda a diferença para o aluno e já é um ponto de partida para bem acolhê-lo.

Considerações Finais

A educação tem dentre as suas finalidades o pleno desenvolvimento do educando. Sob a perspectiva da educação bilíngue para surdos o seu desenvolvimento pleno inclui proporcionar habilidades em sua língua primária de sinais e na secundária escrita, ou seja, desempenho e competência nas duas línguas (Slomski, 2010, p. 20). E o professor além de estar consciente do seu papel social necessita ter sensibilidade para

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acompanhar os passos, avanços, dificuldades e particularidades do aluno surdo considerando a sua inclusão em sala de aula. É importante ressaltar que a surdez por si só não compromete o desenvolvimento cognitivo do aluno surdo, ele apenas apresenta, como todo ser humano, uma maneira própria de construir a aprendizagem.

A Língua Brasileira de Sinais inserida no contexto escolar apresenta-se fundamental para quebrar as barreiras iniciais da comunicação, mesmo nos casos em que a criança chega à escola sem conhecer ou dominar esta língua. Contudo, não pode ser considerada como a única alternativa para a inclusão do surdo, são necessários outros meios que beneficiem a sua inclusão, participação e aprendizagem. Sendo assim, esses alunos precisam mais do que o uso da LIBRAS, um ambiente educacional que estimule e desafie o pensamento e favoreça a descoberta e aprimoramento das capacidades dos educandos surdos.

O mais favorável para a criança surda seria um ambiente educacional com língua de sinais, pois, segundo Slomski (2010, p. 108) o perfil de uma escola bilíngue se caracteriza por um corpo docente composto por surdos e ouvintes fluentes em LIBRAS haja vista que é nesta língua que serão desenvolvidas as habilidades de leitura e escrita bem como serão apresentados os conteúdos curriculares a estes alunos. Contudo, não é esta a realidade das escolas públicas regulares.

Os professores, mesmo com pouco conhecimento a respeito da LIBRAS (cuja língua não se faz presente no currículo escolar da educação básica e apenas recentemente foi incluídas na grade dos cursos de licenciatura), apresentem uma postura ativa e preocupação com o processo ensino-aprendizagem, procuram compreender esse aluno e proporcionar, na medida do possível, uma aprendizagem significativa. Porém, é preciso ratificar que cabe aos professores, da turma regular e da sala de recursos, articular estratégias e procedimentos didáticos que além de considerar as limitações do aluno surdo, ampliem as habilidades e capacidades que ele possui. O trabalho desenvolvido na sala de recursos, para que efetivamente proporcione a aprendizagem e inclusão desses alunos, precisa ser dialogado com o ensino regular, pois o aluno participa em ambas as classes de estudo e a atuação de ambos os profissionais com este aluno depende do envolvimento e articulação das atividades, necessidades e avanços por eles sinalizados.

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