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A falta de regulamentação para o recolhimento da CNH e seus efeitos jurídicos

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Academic year: 2021

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CENTRO UNIVERSITÁRIO TABOSA DE ALMEIDA – ASCES/ UNITA

BACHARELADO EM DIREITO

A FALTA DE REGULAMENTAÇÃO PARA O RECOLHIMENTO DA

CNH E SEUS EFEITOS JURÍDICOS

ELDER JANSEN ARAÚJO DA SILVA

CARUARU

2017

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ELDER JANSEN ARAÚJO DA SILVA

A FALTA DE REGULAMENTAÇÃO PARA O RECOLHIMENTO DA

CNH E SEUS EFEITOS JURÍDICOS

Trabalho de Conclusão de Curso, apresentado ao Centro Universitário Tabosa de Almeida - ASCES/ UNITA, como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito.

Orientador: Professor Msc. Luis Felipe Andrade Barbosa

CARUARU

2017

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BANCA EXAMINADORA

Aprovado em: ____/___/_____

_____________________________________________________ Presidente: Prof.

______________________________________________________ Primeiro Avaliador: Prof.

_______________________________________________________ Segundo Avaliador: Prof.

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RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo verificar a ausência, ou deficiência, na regulamentação, da medida administrativa do recolhimento da Carteira Nacional de Habilitação, diante da norma prescrita no Código de Trânsito Brasileiro Lei nº 9.503/97, considerando os efeitos do recolhimento e possíveis irregularidades em sua adoção. Apesar dessa medida se encontrar amparada legalmente, percebe-se que há um problema na regulamentação, o que traz interpretação equivocada por parte de alguns órgãos componentes do Sistema Nacional de Trânsito, sobre o momento em que a medida administrativa deve ser empregada. Ocorre que, quando a medida é adotada no momento da lavratura do auto de infração de trânsito, seus efeitos são semelhantes aos da penalidade de suspensão do direito de dirigir que, diferentemente de uma medida administrativa, manifesta-se através da instauração de um processo administrativo, dando ao suposto condutor infrator o direito de exercício da ampla defesa e contraditório. Vários doutrinadores já se posicionaram contra a adoção da medida administrativa no momento da autuação com base na jurisprudência. Também por ser um documento de identificação, a Carteira Nacional de Habilitação tem sua posse protegida pela Lei nº 5.553, de 06 de dezembro de 1968, que dispõe sobre a apresentação e uso de documentos de identificação pessoal, argumento esse utilizado por alguns doutrinadores para que não se aplique o recolhimento sem a instauração do processo administrativo. Diante dos efeitos produzidos pela medida, visualiza-se que sua implementação, antes do decurso do processo administrativo para imposição da penalidade, pode causar danos de difícil reparação ao condutor infrator ensejando um cenário de abuso de autoridade. Para chegar ao objetivo, através do método indutivo, a pesquisa ampara-se na análise do próprio Código de Trânsito Brasileiro, nas Resoluções do Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN), nos regulamentos do Conselho Estadual de Trânsito (CETRAN) de Pernambuco e de outros estados, além dos posicionamentos de doutrinadores e da jurisprudência.

Palavras chave: Medida administrativa; Auto de infração de trânsito; Penalidade; Efeitos

jurídicos.

ABSTRACT

The purpose of this study is to verify the absence or deficiency in the regulation of the administrative measure for the collection of the National Driver's License in accordance with the Brazilian Transit Code, Law No. 9,503 / 97, considering the effects of collection and possible irregularities in its adoption. Although this measure is legally protected, it is perceived that there is a problem in this regulation, which misinterprets some components of the National Transit System at the moment when the administrative measure is to be used. It occurs that, when the measure is adopted at the time the transit violation notice is drawn up, its effects are similar to those of the penalty of suspension of the right to direct, unlike an administrative measure that manifests itself through the initiation of an administrative proceeding, giving to the alleged infringing driver the right to exercise the ample and contradictory defense. Several legal practitioners have already opposed the adoption of the administrative measure at the time of the assessment on the basis of case law. Also, because it is an identification document, the National Driver's License has its possession protected by Law No. 5.553, dated December 6, 1968, which provides for the presentation and use of personal identification documents, an argument used by some indoctrinators to that the payment is not applied without the institution of the administrative procedure. Given the effects produced by the measure, it is visualized that its implementation before the administrative procedure to impose the penalty can cause damages of difficult repair to the

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violating driver, creating a scenario of abuse of authority. In order to reach the objective, through the inductive method, the research is based on the analysis of the Brazilian Transit Code itself, on the Resolutions of the National Transit Council (CONTRAN), on the regulations of the State Transit Council (CETRAN) of Pernambuco and others States, in addition to the positions of doctrinators and jurisprudence.

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SUMÁRIO

RESUMO...4 1. INTRODUÇÃO...7

2. A PREVISÃO DAS MEDIDAS ADMINISTRATIVAS NA

LEGISLAÇÃO...8 3. A INCOMPATIBILIDADE DO PROCEDIMENTO DA SUSPENSÃO DO DIREITO DE DIRIGIR COM OS EFEITOS SUMÁRIOS DO RECOLHIMENTO DA CNH...14

4. EXPERIÊNCIAS, DOUTRINA E O PROBLEMA DOS EFEITOS DO

RECOLHIMENTO...17 CONSIDERAÇÕES FINAIS...22

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1. INTRODUÇÃO

O presente estudo tem por finalidade demonstrar as possíveis lacunas da legislação brasileira de trânsito no tocante à adoção da medida administrativa do recolhimento da Carteira Nacional de Habilitação, no exercício regular de Poder de Polícia Administrativa de Trânsito. Entendendo a necessidade de cessar os efeitos decorrentes do cometimento da infração de trânsito, o legislador prescreveu que a autoridade de trânsito e seus agentes, com o objetivo de proteger a vida e à incolumidade física da pessoa, adotem, entre outras medidas administrativas, o recolhimento da Carteira Nacional de Habilitação ou Permissão Para Dirigir.

Ocorre que tal medida não deve ser confundida com a apreensão do referido documento, tampouco com a suspensão do direito de dirigir, por se tratar de penalidades que só serão impostas ao condutor infrator após instauração de processo administrativo, garantindo-se o contraditório e a ampla defesa ao imputado.

Porém, torna-se relevante observar e questionar que os efeitos jurídicos da adoção da medida administrativa aduzida são semelhantes aos efeitos da penalidade da suspensão do direito de dirigir, ocorrendo de forma sumária no momento que se efetua tal recolhimento, impossibilitando-se ao condutor infrator a possibilidade de interposição de defesa e, assim, sofrendo os efeitos da restrição da posse de seu documento.

É perceptível a problematização na hipótese de um condutor flagrado desrespeitando a norma do Art. 244, inciso II, do Código de Trânsito Brasileiro (CTB), onde se caracteriza infração conduzir motocicleta transportando passageiro sem o capacete de segurança. Como medida administrativa, é recomendado que se faça o recolhimento do documento de habilitação, porém deve-se considerar que esse condutor ficará impedido de dirigir veículo automotor até que se faça a restituição da CNH. Imaginemos que esse condutor seja motorista de transporte coletivo e vá trabalhar no dia seguinte, quais as possíveis repercussões que a restrição em conduzir veículo pode trazer? Na prática o condutor infrator ficará impedido de exercer sua profissão de motorista em virtude da medida administrativa, o que poderá ensejar inclusive sua demissão, percebendo-se de imediato um dano irreparável não pretendido pelo legislador.

Fica evidente a necessidade de se esclarecer se há regulamentação suficiente para amparar essas medidas administrativas considerando a possibilidade dos danos que poderão ser causados com sua adoção, sem perder de vista o objetivo principal da legislação de trânsito no que concerne a proteção à vida e incolumidade das pessoas.

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Diante do panorama em questão, objetiva-se analisar a existência de regulamentação para aplicação da medida administrativa do recolhimento da Carteira Nacional de Habilitação em face da celeuma que envolve os efeitos jurídicos de sua execução no momento da lavratura do Auto de Infração de Trânsito.

2. A PREVISÃO DAS MEDIDAS ADMINISTRATIVAS NA LEGISLAÇÃO

Em face da cinética que envolve a evolução da sociedade e da grande demanda de conflitos em virtude das desarmonias geradas por esse processo evolutivo, novos dispositivos legais são criados e modificados para que se consiga trazer equilíbrio e segurança jurídica às relações entre os indivíduos. Dentre estas normas, encontra-se o Código de Trânsito Brasileiro (CTB), Lei nº 9.503/97, que nesse ano completa 20 anos de sua promulgação e, mesmo com suas alterações mais recentes e regulamentações, ainda apresenta-se insuficiente diante da infinita pluralidade de situações que emergem todos os dias nos casos concretos.

No exercício do poder de polícia administrativa de trânsito cabe a autoridade de trânsito ou seus agentes adotarem as medidas administrativas pertinentes ao caso concreto conforme descreve o rol taxativo do Art. 269 do CTB.

Art. 269. A autoridade de trânsito ou seus agentes, na esfera das competências estabelecidas neste Código e dentro de sua circunscrição, deverá adotar as seguintes medidas administrativas:

I - retenção do veículo; II - remoção do veículo;

III - recolhimento da Carteira Nacional de Habilitação; IV - recolhimento da Permissão para Dirigir;

V - recolhimento do Certificado de Registro;

VI - recolhimento do Certificado de Licenciamento Anual; VII - (VETADO)

VIII - transbordo do excesso de carga;

IX - realização de teste de dosagem de alcoolemia ou perícia de substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica;

X - recolhimento de animais que se encontrem soltos nas vias e na faixa de domínio das vias de circulação, restituindo-os aos seus proprietários, após o pagamento de multas e encargos devidos.

XI - realização de exames de aptidão física, mental, de legislação, de prática de primeiros socorros e de direção veicular.

Visualiza-se, assim, que uma das medidas elencadas no dispositivo é o recolhimento da CNH no ato da lavratura do Auto de Infração de Trânsito (AIT), cabível nas infrações que têm como penalidade a imposição de multa pecuniária e a suspensão do direito de dirigir.

Torna-se relevante ressaltar que o legislador quando prescreveu a adoção das medidas administrativas, externou sua preocupação em coibir a prática reiterada de atos infracionais

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com o objetivo principal de garantir a proteção da vida e a incolumidade física das pessoas, conforme destaca o § 1º do Art. 269 do CTB: “A ordem, o consentimento, a fiscalização, as medidas administrativas e coercitivas adotadas pelas autoridades de trânsito e seus agentes terão por objetivo prioritário a proteção à vida e à incolumidade física da pessoa”.

Aspecto interessante que deve ser considerado sobre as medidas administrativas reside no caráter de complementaridade estando expresso no § 2º Art. 269 do CTB: “As medidas administrativas previstas neste artigo não elidem a aplicação das penalidades impostas por infrações estabelecidas neste Código, possuindo caráter complementar a estas”.

Cabe destacar que, no momento da lavratura do Auto de Infração de Trânsito, não se está aplicando nenhuma penalidade administrativa, quer seja o pagamento do valor pecuniário da multa ou mesmo a suspensão do direito de dirigir, mas sim o cumprimento de um ato administrativo vinculado de comunicação à autoridade de trânsito, por meio da autuação do condutor infrator, como também medidas administrativas de cunho restritivo, a exemplo da remoção do veículo ao depósito ou o recolhimento de documentos de porte obrigatório para condução de veículo automotor – Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e Certificado de Registro e Licenciamento do Veículo (CRLV), restando-se claro que não está sendo imposta nenhuma sanção, mas sim a sua efetiva complementação.

A princípio, percebe-se que a medida administrativa do recolhimento da CNH é legal, tem sua finalidade e natureza definida pelo próprio texto do CTB, porém é necessário ir além para compreender se a implementação dessa medida fere preceitos administrativos ou mesmo constitucionais.

Para adoção do procedimento administrativo, o CTB estabeleceu que o recolhimento da CNH dar-se-á mediante recibo nos casos previstos na referida legislação ou quando houver suspeita da inautenticidade ou adulteração do referido documento, segundo contemplado no Art. 272: “Art. 272. O recolhimento da Carteira Nacional de Habilitação e da Permissão para Dirigir dar-se-á mediante recibo, além dos casos previstos neste Código, quando houver suspeita de sua inautenticidade ou adulteração.”.

Em que pese à existência deste procedimento administrativo, visualiza-se que o mesmo aparentemente não está devidamente regulamentado.

Para exemplificar o problema em questão, verifica-se a hipótese de aplicação da infração prevista no Art. 244, inciso II, do CTB, segundo o qual, constitui infração de trânsito conduzir motocicleta transportando passageiro sem o capacete de segurança. Será imposta ao condutor infrator a penalidade de multa gravíssima no valor pecuniário de R$ 293,47,

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inclusão de 07 (sete) pontos em seu prontuário, além da adoção da medida administrativa do recolhimento da CNH ou Permissão para Dirigir (PPD).

Sugerindo que o condutor que cometeu a infração supracitada, por exemplo, tenha como profissão a de motorista de transporte coletivo. E que em virtude da medida do recolhimento do seu documento de habilitação o mesmo ficará impedido de realizar suas funções laborais até que se tenha restituído sua CNH, podendo ser penalizado por seu contratante com demissão. Torna-se relevante lembrar que a medida administrativa não deve ser confundida com a penalidade da apreensão da CNH, ou mesmo a suspensão do direito de dirigir, pois estas só poderão ser impostas ao condutor infrator após instauração e julgamento de processo administrativo garantindo-se o contraditório e a ampla defesa.

Dessa forma, torna-se importante esclarecer acerca dos efeitos da adoção da medida administrativa, pois são imediatos e podem trazer resultados indesejados considerando a ótica do legislador que quis garantir que a conduta infracional cessasse naquele momento, sob o argumento de que por se tratar de uma concessão que é dada ao particular para que se possa conduzir veículos automotores em via pública, poderá ser restringida em obediência a princípios constitucionais e administrativos da Supremacia do interesse coletivo, ou proporcionalidade, proteção à vida e a incolumidade.

Tendo emergido o caso, faz-se necessário responder a algumas indagações a respeito do procedimento de recolhimento da CNH ou PPD, como: Qual o prazo para restituição do documento? Quem fará a restituição, o órgão autuador ou o órgão executivo de trânsito responsável por sua expedição? O recibo de recolhimento da CNH substitui o documento enquanto não se efetua a restituição? Existe conflito com os preceitos da Lei Federal nº 5.553, de 06 de dezembro de 1968, por ser a CNH um documento de identificação?

Diante das dúvidas quanto ao procedimento, fica clara a necessidade de uma regulamentação específica, papel desempenhado pelos órgãos normativos do Sistema Nacional de Trânsito (SNT). Neste panorama, identifica-se que o Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN), na esfera de suas competências, constitui o órgão máximo consultivo e normativo, cabendo-lhe a coordenação e direção do SNT, solucionando-se os questionamentos e uniformizando-se os procedimentos das normas contidas no CTB e nas resoluções complementares, de acordo com o Art. 12 do CTB:

Art. 12. Compete ao CONTRAN:

I - estabelecer as normas regulamentares referidas neste Código e as diretrizes da Política Nacional de Trânsito;

II - coordenar os órgãos do Sistema Nacional de Trânsito, objetivando a integração de suas atividades;

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VII - zelar pela uniformidade e cumprimento das normas contidas neste Código e nas resoluções complementares;

IX - responder às consultas que lhe forem formuladas, relativas à aplicação da legislação de trânsito;

X - normatizar os procedimentos sobre a aprendizagem, habilitação, expedição de documentos de condutores, e registro e licenciamento de veículos;

A partir da previsão das principais funções, normativa e jurisdicional, cabe ao CONTRAN regulamentar as disposições do CTB por meio de Resoluções, Portarias e Circulares, com vistas a sanar as indagações levantadas sobre os procedimentos que serão adotados onde a legislação for omissa.

A Resolução nº 432, de 23 de janeiro de 2013 do CONTRAN, estabeleceu os procedimentos a serem adotados pelas autoridades de trânsito e seus agentes na fiscalização para aplicação do disposto no art. 165 do CTB, que trata do consumo de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência. O Art. 10 do referido dispositivo prescreve:

Art. 10. O documento de habilitação será recolhido pelo agente, mediante recibo, e ficará sob custódia do órgão ou entidade de trânsito responsável pela autuação até que o condutor comprove que não está com a capacidade psicomotora alterada, nos termos desta Resolução.

§ 1º Caso o condutor não compareça ao órgão ou entidade de trânsito responsável pela autuação no prazo de 5 (cinco) dias da data do cometimento da infração, o documento será encaminhado ao órgão executivo de trânsito responsável pelo seu registro, onde o condutor deverá buscar seu documento. § 2º A informação de que trata o § 1º deverá constar no recibo de recolhimento do documento de habilitação.

Com a edição da Resolução nº 432/13 do CONTRAN1, percebe-se que o legislador regulamentou os procedimentos fiscalizatórios da norma contida no Art. 165 do CTB, porém é discutível a constitucionalidade do recolhimento da CNH uma vez que os efeitos da medida são os mesmo da penalidade da suspensão do direito de dirigir, sem que se garanta, naquele momento, ao suposto infrator qualquer direito de defesa em face da constrição do seu direito.

Ademais, registra-se que não há especificação com relação ao prazo para restituição do documento, pode-se entender que a devolução poderá ser feita a partir do dia seguinte junto ao órgão que lavrou o AIT, seja qual for a esfera de atuação, e que após cinco dias da data que se procedeu a autuação e conseqüente recolhimento do documento, a CNH ou PPD será remetida para a sede do órgão executivo de trânsito responsável por sua expedição, o que não responde o questionamento do prazo limite para sua efetiva entrega ao condutor.

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Outra questão que está ligada à questão do prazo para restituição do documento, é o fato da CNH também ser um documento de identificação, é o que estabelece o caput do Art. 159 do CTB:

Art. 159. A Carteira Nacional de Habilitação, expedida em modelo único e de acordo com as especificações do CONTRAN, atendidos os pré-requisitos estabelecidos neste Código, conterá fotografia, identificação e CPF do condutor, terá fé pública e equivalerá a documento de identidade em todo o território nacional.

Sendo a CNH um documento de identificação, torna-se relevante percebermos que a Lei nº 5.553, de 06 de dezembro de 19682, que dispõe sobre a apresentação e uso de documentos de identificação pessoal, prescreve em seu art. 1º a proibição da retenção de qualquer documento de identificação pessoal, seja por pessoa física, pessoa jurídica de direito público ou de direito privado. Porém, o mesmo dispositivo possibilita que o documento seja retido, por um prazo máximo de até 5 (cinco) dias, quando para realização de algum ato for exigida a apresentação do documento de identificação, para coleta dos dados que interessarem, e que após decorrido o referido prazo o documento deverá ser devolvido ao seu exibidor, é o que dispõe o caput do Art. 2º, da referida lei.

Observa-se que, o documento de identificação, nesse caso a CNH, poderá ser retido, para a extração de dados, e que o prazo da retenção deve ser o tempo suficiente para que se efetue a coleta das informações necessárias, não excedendo o prazo de 5 (cinco) dias. Ocorre que, na prática, os dados que interessam ser colhidos da CNH são as informações constantes no próprio auto de infração as quais serão suficientes para análise de consistência do auto de infração, e caso haja previsão, instauração de processo administrativo para possível imposição de penalidade. Percebe-se assim um aparente conflito da Resolução nº 432/13 do CONTRAN com a Lei nº 5.553/68.

Outra dúvida que surgiu com a edição da Resolução nº 432/13 do CONTRAN, no que toca ao recolhimento da CNH, é se o recibo dado no momento da autuação, conforme ordena o Art. 272 do CTB, supre a ausência do documento recolhido. Tendo em vista o efeito danoso inerente ao recolhimento do documento de habilitação, poderia o legislador ter assinalado que o recibo suplementará a ausência do documento até que o mesmo fosse restituído, afastando assim, qualquer possibilidade de dano que pudesse ser causado pela ausência da CNH.

Percebe-se até aqui, que não há resolução do CONTRAN que regulamente o recolhimento da CNH de uma forma geral, e que a única resolução que menciona tal medida

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administrativa contempla apenas os procedimentos para lavratura do AIT nas hipóteses do Art. 165 do CTB, e mesmo assim levantam-se dúvidas sobre sua legalidade e eficácia.

O CTB delegou também aos Estados papel similar ao do CONTRAN, cabendo-lhes, na esfera de suas competências, a regulamentação de normas e procedimentos para solucionar os possíveis questionamentos a respeito da legislação vigente. Esta delegação está prevista no seu Art. 14, in verbis:

Art. 14. Compete aos Conselhos Estaduais de Trânsito - CETRAN e ao Conselho de Trânsito do Distrito Federal - CONTRANDIFE:

I - cumprir e fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito, no âmbito das respectivas atribuições;

II - elaborar normas no âmbito das respectivas competências;

III - responder a consultas relativas à aplicação da legislação e dos procedimentos normativos de trânsito;

Buscando amparo de norma que regulamente o recolhimento da CNH ou PPD, na esfera de competência estadual, percebeu-se que o CETRAN de Pernambuco não editou nenhuma resolução ou dispositivo com força de lei que verse sobre o procedimento, existindo apenas “Notas Técnicas” que tratem do tema.

A Nota Técnica nº 003/12 do CETRAN/PE3 versa sobre a legalidade do recolhimento do documento de habilitação, principalmente durante a fiscalização do Art. 165 do CTB. Corresponde à resposta à consulta formulada pela Comandante do 1º BPTRAN/PE em 06/12/2011, onde em suas conclusões aponta como legítimo o recolhimento da CNH ou PPD, no momento da lavratura do auto de infração de trânsito, afirmando que tal recolhimento deve ser procedido mediante recibo, possibilitando ao condutor reavê-la no dia seguinte.

Em seu corpo argumentativo, a Nota Técnica do CETRAN/PE aduz um posicionamento pouco convincente quanto à legalidade da adoção do recolhimento da CNH, os quais se baseiam na interpretação de normas contidas nos artigos 1º, 140, 159, 265, 269, do CTB e o disposto na Lei Federal nº 5.553/68, sem mesmo considerar princípios constitucionais ou administrativos, ou mesmo os efeitos produzidos pela medida administrativa, tomando, de certa forma, um caráter de recomendação, pois, não determina uma regra, trás apenas um viés interpretativo da legislação existente que deveriam ser considerados, e mesmo tendo sido aprovada pelo conselho na Reunião nº 13/2011, ocorrida em 10/01/2012, não foi editada nenhuma resolução sobre o tema discutido.

Cabe lembrar, que a referida Nota Técnica não responde às indagações formuladas em nosso estudo, com relação aos efeitos da execução da medida administrativa do recolhimento da CNH ou PPD.

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3. A INCOMPATIBILIDADE DO PROCEDIMENTO DA SUSPENSÃO DO DIREITO DE DIRIGIR COM OS EFEITOS SUMÁRIOS DO RECOLHIMENTO DA CNH

Com o intuito de garantir o cumprimento dos preceitos estabelecidos em seu texto, o CTB definiu as penalidades para as infrações, as quais consistem em sanções administrativas. Leandro Macedo (2011, p. 169) destaca que “As penalidades administrativas, também chamadas de sanções de polícia, estão previstas no art. 256 do CTB, e são aplicáveis apenas pela autoridade de trânsito.”

Neste sentido, as penalidades são previstas em rol taxativo, como se observa no próprio texto do CTB:

Art. 256. A autoridade de trânsito, na esfera das competências estabelecidas neste Código e dentro de sua circunscrição, deverá aplicar, às infrações nele previstas, as seguintes penalidades:

I - advertência por escrito; II - multa;

III - suspensão do direito de dirigir; IV – (REVOGADO)

V - cassação da Carteira Nacional de Habilitação; VI - cassação da Permissão para Dirigir;

VII - freqüência obrigatória em curso de reciclagem.

Inicialmente, percebe-se que a penalidade de suspensão do direito de dirigir tem semelhança com as demais penalidades, pois sua aplicação está adstrita à instauração de um processo administrativo, onde será garantido o direito de ampla defesa ao condutor infrator.

Outra característica relevante sobre a penalidade supracitada é o monopólio para sua imposição, que será da autoridade de trânsito do órgão de registro da habilitação, ou seja, o órgão executivo de trânsito do Estado ou Distrito Federal, a qual será imposta após a conclusão do processo administrativo, destacando-se que se trata de prerrogativa exclusiva que não deve ser confundida com uma medida administrativa, pois esta possui natureza de constrangimento de polícia.

O CTB definiu que o infrator poderá ter seu direito de dirigir suspenso no seu Art. 261, que enumera da seguinte forma:

Art. 261. A penalidade de suspensão do direito de dirigir será imposta nos seguintes casos:

I - sempre que o infrator atingir a contagem de 20 (vinte) pontos, no período de 12 (doze) meses, conforme a pontuação prevista no art. 259;

II - por transgressão às normas estabelecidas neste Código, cujas infrações prevêem, de forma específica, a penalidade de suspensão do direito de dirigir.

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Aqui, verifica-se que existem duas hipóteses para instauração do processo administrativo que determine a suspensão do direito de dirigir. A primeira seria a ocasião em que o condutor infrator, ao alcançar o somatório de 20 (vinte) pontos em seu prontuário, no período de 12 (doze) meses ou, na segunda hipótese, quando a transgressão da norma previr especificamente a penalidade de suspensão do direito de dirigir, onde deverão ser esgotados todos os meios de defesa da imposição da penalidade de multa na esfera administrativa. O cuidado em se esgotar tais possibilidades de recursos administrativos para imposição da medida, está prescrito no art. 8º da Resolução nº 182/2005 do CONTRAN4, demonstrando-se a preocupação do legislador em não impor ao condutor uma segunda penalidade, ainda mais gravosa, trazendo assim uma perspectiva de complementaridade à suspensão do direito de dirigir, pois sempre iniciará seu processo após a imposição da multa.

Tendo em vista a necessidade de se unificar os procedimentos para aplicação da penalidade da suspensão do direito de dirigir em todo território nacional, o CONTRAN, no gozo de sua competência normativa, editou a resolução supramencionada, que regulamentou todo o trâmite a ser adotado para imposição das penalidades de suspensão do direito de dirigir e da cassação da Carteira Nacional de Habilitação.

Os contornos do processo administrativo para imposição da suspensão do direito de dirigir atendem ao necessário para que o condutor tenha ciência da instauração do processo, sob quais fatos ensejaram a abertura do procedimento, indicando-se a conduta, o local, a data, o horário, bem como o prazo para interposição do recurso, garantindo-se amplo direito de defesa que poderá se manifestar por meio de documentos públicos ou privados, ou mesmo oitiva de testemunhas, pois o regulamento não determinou um rol que enumerasse quais meios de prova seriam admitidos.

Nesse momento percebe-se que a adoção da medida administrativa do recolhimento da CNH lavratura do AIT ganha contornos abusivos por suprimir o contraditório e a ampla defesa. Citando a necessidade desses princípios no processo administrativo, Helena de Toledo Coelho Gonçalves (2010, p. 65) esclarece que “Para ser necessário o contraditório e a ampla defesa, basta que do ato administrativo a ser praticado possa advir prejuízo à esfera jurídica do administrado ou do servidor público, incluindo-se aqui os processos disciplinares”.

Após o recebimento da defesa, inicia-se a instrução, onde poderão ser requeridos dos demais órgãos de trânsito as informações necessárias à formação do convencimento da

4A Resolução nº 182/2005 do CONTRAN dispõe sobre a uniformização do procedimento administrativo para

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autoridade de trânsito. Esse procedimento encontra-se devidamente regulamentado no art. 12 da Resolução nº 182/2005 do CONTRAN.

Decorrida a fase de instrução, com a decisão fundamentada, sendo as razões da defesa aceitas, o processo será arquivado. Não sendo acolhida a defesa ou não tendo sido interposta dentro do prazo legal, a autoridade de trânsito aplicará a penalidade.

Conforme ocorre no início do procedimento, será dada ciência ao interessado através de notificação, para que se efetue a entrega da CNH para iniciar o cumprimento da penalidade ou dentro do prazo interpor recurso na instância superior. Acredita-se que este é o momento ao qual o legislador se refere quando prescreve a medida administrativa do recolhimento da CNH, pois, o condutor entregará seu documento mediante recibo onde constará o prazo para que se efetue a restituição do documento, e assim sanada a irregularidade da suspensão, caso assim não fosse, é possível observar que durante todo o processo, que inicia-se com a lavratura do AIT até a conclusão do processo de suspensão, ocorrerão dois recolhimentos, sendo o primeiro de legalidade duvidosa.

Sobre a imposição da penalidade e o não recolhimento da CNH, Arnaldo Rizzardo (2010, p. 520) invoca jurisprudência do TRF da 4ª Região, destacando que:

Não cabe o recolhimento da habilitação enquanto corre o processo. Unicamente após o julgamento é que se aplica a suspensão, apreendendo-se a habilitação, na linha da jurisprudência, pronunciada pelo TRF da 4ª Região: ”A lei prevê, em caso de embriaguez, a apreensão da CNH, pela autoridade de trânsito, como medida administrativa. Tal medida não substitui, porém, o necessário procedimento administrativo, com vistas à imposição da penalidade de suspensão do direito de dirigir. Nesse procedimento, é necessário que se assegure, antes que tenha efeito a penalidade, o necessário direito de defesa, não sendo legítima a manutenção da CNH apreendida até o julgamento da consistência do auto de infração e enquanto perdurar o procedimento administrativo, pois tal procedimento configura imposição da própria penalidade, sem o devido processo legal”.

Diante dos parâmetros apresentados para imposição da penalidade da suspensão do direito de dirigir, percebe-se haver uma enorme incongruência com a adoção da medida administrativa do recolhimento da CNH, quando esta se dá no momento da autuação do condutor infrator, pois, a norma regulamentada para imposição da penalidade demonstra grande preocupação em não privar o cidadão de seu direito sem que o mesmo possa exaurir toda e qualquer possibilidade de garantir sua pretensão.

Outrossim, parece não ser justificável a adoção do recolhimento da CNH sob o argumento de se restabelecer a ordem ou garantir a incolumidade das pessoas ou ainda proteger a vida, pois o próprio CTB enumera mecanismos administrativos, que podem sanar aquela irregularidade sem que haja prejuízo à quem seja submetida.

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Quando em abordagem ao condutor que foi alvo de fiscalização para averiguação de ingestão de bebida alcoólica, constatando-se o cometimento da infração, sem que ocorra o crime de trânsito previsto no Art. 306 do CTB, pela concentração de álcool, restará ao agente da autoridade de trânsito lavrar auto de infração de trânsito e, conforme a Resolução nº 432/13 do CONTRAN, e como medida administrativa proceder com o recolhimento da CNH. Com relação ao veículo do condutor infrator, o mesmo poderá ser removido ao depósito caso não seja apresentado outro condutor devidamente habilitado que goze de plenas condições para condução do veículo. Caso seja apresentada pessoa habilitada, o veículo que por hora encontra-se legalmente retido será liberado para este condutor, o qual devidamente identificado, em campo próprio dentro do AIT, assumirá responsabilidade objetiva caso venha entregar a condução do veículo àquele que, por suas condições físicas e psíquicas não tem condição de dirigir, configurando-se a infração prevista no Art. 166 do CTB.

A partir da apresentação de outro condutor, tendo sido o veículo liberado e a irregularidade sanada, torna-se questionável a necessidade do recolhimento da CNH uma vez que o documento deverá ser restituído no dia seguinte. Ainda assim, o condutor infrator poderá facilmente voltar a conduzir o veículo alguns metros mais à frente, mesmo sem estar portando seu documento, voltando a gerar risco a sua vida e a terceiros.

Aparentemente parece que a remoção do veículo seria a medida administrativa que poderia garantir não só o fim do perigo gerado por aquele condutor, mas também sanaria a irregularidade, pois seria praticamente inconcebível acreditar que o infrator conseguisse outro veículo e retomasse a condução em via pública.

4. EXPERIÊNCIAS, DOUTRINA E O PROBLEMA DOS EFEITOS DO RECOLHIMENTO

Assim como em outros diplomas legais, o CTB herdou grande influência de seu antecessor, o Código Nacional de trânsito (CNT) - Lei nº 5.108/66, o que em virtude de suas terminologias possivelmente trouxe confusões entre as medidas administrativas e as penalidades.

Explicando tal circunstância, Julyver Modesto de Araújo (2010) destaca que o termo “suspensão do direito de dirigir” é equivocado e consta no CTB por herança do Art. 96 do CNT, quando se referia à antiga penalidade de apreensão do documento de habilitação, o qual prescrevia que nos casos de apreensão do documento de habilitação, a suspensão do direito de dirigir teria o prazo de um a doze meses.

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Como propõe o autor, a suspensão do direito de dirigir era efeito da penalidade administrativa da apreensão da CNH, a qual só seria imposta após decisão fundamentada em processo administrativo. Na legislação atual, a apreensão do documento de habilitação deixou de ser penalidade administrativa para se tornar medida administrativa de recolhimento da CNH.

Assim sendo, Modesto (2010) esclarece:

Comparando-se, assim, a legislação anterior e a atual, podemos dizer, resumidamente, que, antes, o órgão de trânsito aplicava a penalidade de apreensão do documento de habilitação, cujo EFEITO era o de suspender o direito de dirigir, enquanto que, hoje, o órgão de trânsito suspende tal “direito” e, para tornar a suspensão efetiva, RECOLHE o documento de habilitação.

Esta sequência lógica, que coloca o recolhimento do documento como decorrente da imposição da pena administrativa e, portanto, em momento posterior (e não o contrário) é de crucial importância, pois tem sido comum que agentes de trânsito, quando da constatação de infrações de trânsito nas quais estejam previstas a penalidade de “suspensão do direito de dirigir” e a medida administrativa de “recolhimento do documento de habilitação” (como, por exemplo, “prática de racha”, “embriaguez ao volante” ou conduzir motocicleta sem capacete), procedam, de imediato, ao recolhimento do documento de habilitação, o que é, no meu entender, completamente equivocado.

O problema do recolhimento da CNH já foi abordado por alguns doutrinadores por identificarem que o procedimento carece de uma melhor regulamentação devido às repercussões dos efeitos da adoção da medida, em face do referido documento que é equiparado a documento de identificação ou mesmo da supressão temporária da concessão para dirigir para quem necessite da mesma para exercer sua atividade laboral. Outros doutrinadores questionam ainda a constitucionalidade do procedimento, tendo em vista mais uma vez que, os efeitos da medida administrativa, na prática são os mesmos da penalidade, ou seja, o impedimento de conduzir veículo em via pública, sem que haja devido processo legal.

Sobre o procedimento a ser adotado no cometimento da infração de trânsito prevista no art. 244, inciso I do CTB, o qual descreve como infração conduzir motocicleta, motoneta, ciclomotor, sem usar capacete de segurança com viseira ou óculos de proteção e vestuário de acordo com as normas e especificações aprovadas pelo CONTRAN, que prevê as penalidades de multa e suspensão do direito de dirigir, e como medida administrativa o recolhimento da CNH, Adilson Antônio Paulus (2009, p. 333) trata a questão da seguinte forma:

A penalidade de suspensão do direito de dirigir somente será aplicada por decisão fundamentada da autoridade de trânsito competente (art.22, VI, CTB), em processo administrativo, assegurando ao infrator amplo direito de

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defesa, observando os procedimentos administrativos estabelecidos pela Resolução nº 182/05 do CONTRAN.

O recolhimento do documento de habilitação dar-se-á mediante recibo, após a efetiva aplicação da citada penalidade, para cumprimento desta.

Nesse mesmo sentido, Leandro Macedo (2011, p. 183) pondera sobre o recolhimento da CNH com base na Instrução Normativa nº002/2008 do Departamento de Polícia Rodoviária Federal (DPRF), versando da seguinte forma:

Art. 19. O recolhimento da CNH/PPD será efetuado quando:

I- Tiver sido aplicada a penalidade de suspensão do direito de dirigir ou cassação da CNH/PPD, devidamente registrada no RENACH, conforme regulamentação do CONTRAN, devendo ser observados os procedimentos do Órgão Executivo de Trânsito do Estado ou do Distrito Federal

(DETRAN) que aplicou a penalidade;

II- Estiver vencida há mais de 30 (trinta) dias;

III- Houver suspeita fundada de sua inautenticidade ou adulteração. §1º Nos casos dos incisos I e II deste artigo, o documento deverá ser encaminhado ao órgão Executivo De Trânsito responsável pelo prontuário do condutor.

§2º Aplica-se à Autorização Para Conduzir Ciclomotor – ACC a situação prevista no inciso III deste artigo.

Relevante citar ainda a lição de Arnaldo Rizzardo (2010, p. 539), no que tange ao recolhimento CNH no momento da autuação, pois existe grande problema em se efetuar tal medida uma vez que o CTB o equiparou a documento de identidade e, por isso, seu porte é protegido pela Lei nº 5.553/1968 que, em seu art. 1º, proíbe a retenção de documento de identificação. Ao abordar sobre o tema, o autor aduz que:

Se a lei dá à CNH a qualidade de documento de identidade, e sendo obrigatório seu porte, não há como admitir a retenção pela autoridade de trânsito, exceto em evidente inautenticidade e adulteração.

De qualquer forma, para a apreensão, é indispensável o prévio procedimento administrativo, reservando-se o direito de defesa.

O doutrinador supramencionado ampara seu posicionamento em jurisprudência pronunciada pelo TRF da 4ª Região (apud RIZZARDO, 2010, p. 539), conforme destacado:

Nesse sentido deve ser entendida a seguinte ementa de uma decisão: ”A apreensão da Carteira Nacional de Habilitação fica condicionada a prévio procedimento administrativo, sob pena de violação aos dispositivos constitucionais que asseguram ao suposto infrator o contraditório, a ampla defesa e o devido processo legal”.

Igual entendimento é ressaltado por Benevides Fernandes Neto (2007), que defende o não recolhimento do documento, pois no Estado de São Paulo o órgão normativo estadual regulamentou o recolhimento da CNH, através da Deliberação nº 199/2000 do CETRAN/SP, a qual tratou o assunto da seguinte forma:

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O Código de Trânsito Brasileiro estabelece como uma das medidas administrativas, a retenção do documento de habilitação, em infração da qual possa resultar a suspensão do direito de dirigir. Cabe à autoridade de trânsito, após processo regular, suspender o direito de dirigir (art. 272) de quem foi personagem de ato infracional (art. 280). O recolhimento do documento pressupõe que será dado um recibo ao seu proprietário. O CTB é omisso, e cabe ao CONTRAN regulamentá-lo, para que o condutor não seja impedido de dirigir. Até que o CONTRAN regulamente o recolhimento do documento (que se afigura de duvidosa constitucionalidade, face ao art. 5º, II, LV e LVII da Constituição Federal), os agentes referidos no art. 280 devem se abster de recolher documento de habilitação, mesmo porque, em tese, incorreriam em abuso de autoridade.

Eliseu Gomes de Oliveira (2004) possui o mesmo entendimento vigente no Estado de São Paulo, pelo teor da Deliberação nº 141/2003 CETRAN/SP, na qual afirma que a Polícia Militar apenas adota o recolhimento do documento de habilitação quando a CNH encontra-se vencida há mais de trinta dias, ou quando houver suspeita de inautenticidade ou adulteração. O autor aponta, ainda, que esse procedimento tem se mostrado mais adequado de acordo com o posicionamento dos tribunais.

Não é menos certo, porém, que o artigo 265º desse mesmo ‘codex’ prevê que as penalidades de suspensão do direito de dirigir e de cassação do documento de habilitação serão aplicadas por decisão fundamentada da autoridade de trânsito competente, em processo administrativo, assegurado ao infrator amplo direito de defesa. (TJSP, Ap Civil nº 94.193-5/0 – Rel Coimbra Schmidt, 18/10/1999).

Apesar de aparentemente não estar devidamente regulamentado, e considerando que a Resolução nº 432/13 do CONTRAN, só regulamentou os procedimentos para o cometimento das infrações do Art. 165 do CTB, a qual tem sua constitucionalidade questionável, a medida administrativa do recolhimento da CNH ou PPD também não foram contempladas pelas alterações trazidas ao CTB com o advento da Lei nº13.281/2016, exceto, pelo Art.162, inciso III, do CTB, que prevê a infração para o condutor que dirigir veículo com CNH ou Permissão para Dirigir de categoria diferente da do veículo que esteja conduzindo. Tal dispositivo sofreu alteração em seu texto onde a medida administrativa do recolhimento da CNH foi substituído por outra medida, qual seja, a retenção do veículo até apresentação de condutor devidamente habilitado.

Percebe-se que o legislador constatou que o recolhimento da habilitação não era a medida administrativa adequada para esta circunstância, pois na redação do texto anterior desse dispositivo não havia previsão da penalidade de suspensão do direito de dirigir, mas sim, além da multa a penalidade de apreensão do veículo, a qual foi revogada do rol de

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penalidades previstas no CTB em seu artigo inciso IV do Art. 256, por força da Lei nº 13.281/2016, por falta de regulamentação da referida penalidade.

Longe de um consenso, sobre a adoção da medida administrativa do recolhimento da CNH no momento da autuação, diversas indagações surgem sobre os seus efeitos, pois mesmo tendo menor tempo de duração, são similares aos efeitos da penalidade de suspensão do direito de dirigir, trazendo a possibilidade de um dano de difícil reparação, ou mesmo irreparável.

Se a medida administrativa for adotada de imediato ao momento da autuação, haverá um cenário curioso onde até a conclusão do processo administrativo que irá suspender o direito de dirigir, ocorrerão dois recolhimentos da CNH, um no instante da lavratura do AIT, e outro quando concluído o processo para que se inicie a contagem do prazo de imposição da penalidade. Tal circunstância, de duplo recolhimento, não foi mencionada no texto do CTB nem nos demais regulamentos, não havendo assim como negar a intenção do legislador que o procedimento devesse ser adotado uma única vez após a conclusão do processo para cumprimento da penalidade.

Outra questão importante a respeito da medida administrativa é a validade do recibo expedido no ato do recolhimento como substituto da CNH. Vislumbrando a hipótese de um condutor que foi autuado e teve seu documento de habilitação recolhido, é imaginável que o mesmo busque a restituição no próximo dia útil. Será possível a esse condutor exercer seu direito de dirigir, para reaver seu documento, portando o recibo que lhe foi entregue no momento da autuação? Acredita-se que não diante do silêncio da norma contida no Art. 272 do CTB, e de não haver nenhum regulamento indicando que o recibo tenha o cunho de suprir a falta da CNH, ou seja, este tem apenas o propósito de comprovar seu recolhimento. Nesse momento pode-se levantar outra hipótese danosa, aquela em que o condutor necessite de seu documento de habilitação para exercer sua atividade laboral. O cidadão ficará impedido de trabalhar, pois já está sofrendo os efeitos de uma suspensão sumária do seu direito de dirigir, o que pode resultar em ruptura de seu contrato de trabalho e ensejar sua demissão.

Além disso, percebe-se também que não há regulamento quanto ao prazo para a efetiva restituição da CNH, a qual corresponde a documento de identificação conforme prescreve o Art.159 do CTB. Pondera-se que se faça a devolução no dia seguinte, ou em até 5 (cinco) dias como ordena o Art. 2º da Lei nº 5.553/1968.

Na prática, a falta de regulamentação da medida pode trazer grave dano ao suposto condutor infrator, que ao ter seu documento recolhido, talvez o único documento de identificação que ele porte, venha a precisar se dirigir a um serviço médico ou hospitalar

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privado. Tendo em vista a necessidade de que se proceda sua identificação para realização do atendimento com seu convênio médico, o mesmo poderá ficar impedido de receber atendimento por não poder apresentar um documento de identificação considerado válido.

Já vimos que torna-se dispensável o recolhimento do documento de habilitação de imediato, tendo em vista a apresentação de condutor devidamente habilitado que comprove ter condição de assumir direção do veículo, estando este sujeito às sanções previstas no Art. 166 do CTB, àquele que confiar ou entregar a direção de veículo a pessoa que, mesmo habilitada, por seu estado físico ou psíquico, não estiver em condições de dirigi-lo com segurança. Pode-se considerar que a aprePode-sentação de condutor para retirar o veículo retido como uma medida eficaz para sanar a irregularidade posta naquele momento, tendo em vista a possibilidade de responsabilização daquele que comete a infração descrita no Art. 166 do CTB.

Da mesma forma, a remoção do veículo ao depósito cessaria a possibilidade perpetuação do ato infracional de forma definitiva, até que o condutor infrator restabelecesse as devidas condições para exercer a direção do veículo, pois mesmo que se apelasse para a utilidade daquele veículo que outrora fora removido ao depósito, ainda assim restariam várias possibilidades de deslocamento que cumprissem o mesmo papel, e mais importante, dispensaria o recolhimento da CNH.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Todas as ponderações feitas até aqui tem como fim entender a plausibilidade de danos que podem ser causados pela aplicação de uma medida administrativa que tem previsão legal, porém carece de regulamentação que especifique em que momento deve ser aplicada e seus limites para que seja garantida lisura durante todo o procedimento administrativo.

Cabe aos órgãos normativos componentes do SNT, na esfera de suas competências, regulamentá-la tendo sempre em vista os possíveis danos que podem ser gerados em decorrência da aplicação inadequada da medida administrativa do recolhimento da CNH, sendo esta entendida como acessória de uma penalidade, destacando assim seu caráter de complementaridade.

Nesse sentido, vale ressaltar que parte da doutrina tem se posicionado indicando como sendo equivocado o recolhimento da CNH no momento da autuação. Alguns por entender que perdura uma confusão com os termos empregados da legislação anterior ao CTB, quando no CNT utiliza a expressão “apreensão” para determinar a penalidade que suspendia o direito de dirigir.

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Outros doutrinadores condenam a adoção da medida por ser conflituosa com a Lei nº5553/1968 que protege a posse dos documentos de identificação, ou ainda em obediência à Instrução Normativa nº002/2008 editada pelo DPRF.

No Estado de São Paulo o recolhimento da CNH também não é efetuado em obediência a Deliberação nº 199/2000 e Deliberação nº141/2003 do CETRAN/SP, as quais recomendam que só se aplique a medida administrativa após a conclusão do processo administrativo.

Percebe-se, também, que o recolhimento da CNH não é uma medida que não garante o fim da conduta infracional, pois mesmo sem seu documento de habilitação, o condutor infrator pode novamente tomar a condução do veículo em via pública, pois quem não teme a sanção mais gravosa, a penalidade gravíssima por estar dirigindo embriagado, não se importará com a sanção menos gravosa, seja a penalidade leve por dirigir sem os documentos de porte obrigatório.

Talvez fosse mais prudente proceder à remoção do veículo ao depósito e permitir-lhe a retirada de seu veículo no dia seguinte, entendendo não haver possibilidade de ocorrer nenhum dano que não possa ser facilmente sanado.

Visualiza-se ainda que, a apresentação de outro condutor devidamente habilitado, seria suficiente para cessar o perigo gerado pelo infrator, cabendo ao condutor responsável pela liberação do veículo, recair sobre si as sanções previstas no Art. 166 do CTB, e assim não seria necessário o recolhimento da CNH.

Para parte da doutrina, não resta dúvidas quanto à ilegalidade do recolhimento da CNH antes da conclusão do processo administrativo que submeterá o condutor infrator a penalidade da suspensão do direito de dirigir. Constata-se grave vício no ato administrativo por não garantir o amplo direito de defesa a quem sofrerá de imediato os efeitos semelhantes aos da penalidade, configurando-se claramente um cenário de abuso de autoridade.

Impossível deixar de destacar a jurisprudência dos tribunais, onde se apóia parte da doutrina, que já se posicionou contrária ao procedimento em face da produção dos efeitos da penalidade antes mesmo da instauração do processo administrativo que a impõe, revelando assim contornos abusivos à imposição da medida administrativa sem o prévio procedimento que garanta ampla defesa e o devido processo legal.

Diante do exposto, fica claro que há uma preocupação com as repercussões jurídicas oriundas da carência de uma regulamentação do recolhimento da CNH, que atenda aos princípios constitucionais e administrativos, cabendo ao CONTRAN, órgão máximo normativo e consultivo do SNT, exercer suas prerrogativas para unificação dos procedimentos

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em todo território nacional, entendendo que não se trata de conceder lastro argumentativo para o condutor infrator, mas sim, trazer a segurança jurídica nas relações entre o cidadão e administração pública.

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REFERÊNCIAS

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Referências

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