• Nenhum resultado encontrado

A matemática e o seu ensino na formação de professores. Uma abordagem histórica - Volume II, 2018

N/A
N/A
Protected

Academic year: 2021

Share "A matemática e o seu ensino na formação de professores. Uma abordagem histórica - Volume II, 2018"

Copied!
292
0
0

Texto

(1)

A M A T E M Á T I C A

E O SEU ENSINO NA FORMAÇÃO

D E P R O F E S S O R E S

U M A A B O R D A G E M H I S T Ó R I C A

Coordenador:

José Manuel Matos

Volume II

Este livro pretende acompanhar os modos como, em Portugal,

a matemática e os saberes referentes ao seu ensino se

integraram na formação docente, sejam eles os professores do

ensino secundário que, a partir do início do século XX, foram

formados em escolas específicas, sejam os professores do

ensino primário em que a disciplina é apenas um dos temas da

sua formação.

O trabalho foi desenvolvido pelo grupo de investigação em

Educação Matemática da Unidade de Investigação Educação e

Desenvolvimento da Faculdade de Ciências e Tecnologia da

Universidade Nova de Lisboa e resulta de um projeto de

investigação iniciado em 2015.

(2)
(3)

A matemática e o seu ensino na

formação de professores.

Uma abordagem histórica

José Manuel Matos

(Coordenador)

Volume II

(4)

Coleção História e Memória do Ensino da

Matemática

A Coleção História e Memória do Ensino da Matemática, apoiada pelo Grupo de Trabalho sobre História e Memória do Ensino da

Matemática da Associação de Professores de

Matemática, pretende divulgar trabalhos científicos sobre história do ensino da Matemática, difundindo perspectivas, metodologias e temas entre investigadores da área e divulgando junto de professores e do público em geral produções nesta área.

Coordenadora da Coleção

Mária Cristina Almeida

Conselho Editorial

Alexandra Rodrigues, Ana Santiago, António Domingos, Áurea Adão, Cecília Monteiro, Célia Leme, Cristina Oliveira, Dolores Carrillo, Elisabete Burigo, Henrique Guimarães, Iran Mendes, Joaquim Pintassilgo, José Manuel Matos, Juan Carlos Arboleda, Luís Saraiva, Mária Almeida, Miguel Picado, Neuza Pinto, Teresa Monterio, Wagner Valente.

(5)

A matemática e o seu ensino

na formação de professores.

Uma abordagem histórica

José Manuel Matos

(Coordenador)

Volume II

2018

(6)

A matemática e o seu ensino na formação de

professores — uma abordagem histórica

Coordenador: José Manuel Matos

2.ª edição: agosto 2019

2.º volume de dois volumes

Tiragem: 100 exemplares

ISBN: 978-972-8768-70-6; Depósito legal: 450363/18

Coleção História e Memória do Ensino da

Matemática |APM

Associação de Professores de Matemática

Rua Dr. João Couto 27-A, 1500-236 Lisboa, Portugal Telef.: + 351 217163690

endereço eletrónico: geral@apm.pt

Unidade de Investigação Educação e Desenvolvimento

Faculdade de Ciência e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa, Campus da Caparica, 2829-516 Caparica, Portugal Telef.: +351 212948383

endereço eletrónico: uied@fct.unl.pt

Este livro foi apoiado por fundos portugueses através da Fundação para a Ciência e a Tecnologia, Projeto UID/CED/02861/2016. Capa e arte gráfica: Luís Barreira

Impressão e acabamento:

Várzea da Rainha Impressores SA.

Estrada Nacional n.º6, 2510-Óbidos, Portugal Telef.: +351 262098008

(7)

Índice — Volume I

Prefácio

A matemática como um saber profissional da docência

Wagner Rodrigues Valente 1

1. Apresentação

José Manuel Matos 5

Formação de professores em matemática no ensino primário

2.1. A matemática na formação dos professores do ensino primário em Portugal da reforma pombalina de 1772 até 1910

Rui Candeias 11

2.2. A matemática na formação dos professores do ensino primário em Portugal de 1910 até 1926

Ana Santiago, José Manuel Matos, Rui Candeias 57

2.3. A matemática na formação dos professores do ensino primário em Portugal de 1926 até 1974

Rui Candeias 85

2.4. Escolas primárias portuguesas oitocentistas e o ensino do sistema métrico decimal: ponderações a partir da inspeção extraordinária de 1863-1866

Elenice de Souza Lodron Zuin 111

Formação de professores de Matemática para o Ciclo Preparatório do Ensino Secundário

3.1. A formação contínua de professores de Matemática no Ciclo Preparatório do Ensino Secundário

Cristolinda Costa 147

3.2. Os estágios de Matemática do Ciclo Preparatório do Ensino Secundário: representações e práticas

(8)

Formação de professores de Matemática para os liceus até 1930

4.1. Os professores de matemática dos liceus: acesso à profissão e formação (1836-1930)

Ana Santiago, José Manuel Matos 209

4.2. A matemática e o seu ensino nas Escolas Normais Superiores

Ana Santiago, José Manuel Matos 227

Índice — Volume II

Formação de professores de Matemática para os liceus depois de 1930

5.1. Formação de professores de matemática para o ensino liceal (1930-1968)

Mária Cristina Almeida 253

5.2. Elaborando o conhecimento pedagógico do conteúdo matemático na década de 1960 no Liceu Pedro Nunes

José Manuel Matos, Teresa Maria Monteiro 273

5.3. Os estágios no Liceu Pedro Nunes nos anos 1960. Da crítica dos fundamentos ao maior rigor lógico

Teresa Maria Monteiro 309

5.4. Práticas de estágio no Liceu Normal de Pedro Nunes

Teresa Maria Monteiro 333

5.5. Formação de professores de Matemática — Liceu D. João III, Coimbra (1930-1970)

Ana Santiago 357

5.6. Estágios no Liceu Normal de D. Manuel II, Porto (1957-1963)

Mária Cristina Almeida 379

Formação de professores de Matemática para o ensino técnico profissional

6.1. Formação de professores nas escolas técnicas

(9)

A profissionalização de professores do ensino pós-primário entre 1979 e 1985

7.1. A Profissionalização em Exercício (1979-1985)

Cecília Monteiro 427

Notas biográficas

1. António Augusto Lopes (1917-2015)

Mária Cristina Almeida 439

2. Domitila Hormizinda Miranda de Carvalho (1871-1966)

Maria José Remédios 447

3. Jaime Furtado Leote (1902-1988)

Teresa Maria Monteiro 465

4. João António Nabais (1915-1990)

Rui Candeias 475

5. José Augusto Cardoso (1891-1979)

Ana Santiago 493

Anexos

Anexo 1 — Professores que terminaram o curso do magistério liceal em Matemática nas Escolas Normais Superiores (1911-1930)

Compiladores: Ana Santiago, José Manuel Matos 497

Anexo 2 — Professores que terminaram o curso do magistério liceal em Matemática nos liceus normais (1930-1969)

Compiladores: Ana Santiago, António José Almeida, José Manuel

Matos, Mária Almeida, Teresa Monteiro 501

Anexo 3 — Professores de Metodologia das Ciências Matemáticas e metodólogos de Matemática

Compiladores: António José Almeida, José Manuel Matos, Mária

Almeida 509

Índice onomástico 515

(10)
(11)

5. Formação de professores de Matemática

para os liceus depois de 1930

(12)
(13)

Capítulo 5.1

Formação de professores de matemática para o

ensino liceal (1930-1968)

Mária Cristina Almeida, UIED-FCT-UNL/Agrupamento de Escolas de

Casquilhos, ajs.mcr.almeida@gmail.com

Em 1911, nos primórdios do regime republicano, foram criadas Escolas Normais Superiores, anexas às Faculdades de Ciências das Universidades de Coimbra e Lisboa com vista à formação de professores para o magistério liceal1. Em 1930, a Ditadura Militar

extingue estas Escolas e institui um novo modelo de formação que, segundo os seus proponentes, tinha como objectivo maior melhorar a preparação técnica do professorado dos liceus2.

O princípio fundamental [do novo modelo] é o da divisão entre cultura pedagógica e a prática pedagógica, confinando-se cada uma a quem de direito deve pertencer – aquela às Universidades, estas a escolas do grau a que o futuro professor se destina. (Preâmbulo do Decreto n.º 18.973, de 28 de Outubro de 1930).

No mesmo decreto, criou-se a nova 3.ª Secção das Faculdades de Letras das Universidades de Coimbra e de Lisboa, designada por Secção de Ciências Pedagógicas, onde seria ministrada a cultura

pedagógica, enquanto que a prática pedagógica, seria desenvolvida em

qualquer dos dois Liceus Normais então criados, um em Lisboa (Pedro Nunes) e outro em Coimbra (Dr. Júlio Henriques, que em 1936 se fundiu com o Liceu José Falcão, passando a designar-se de D. João III). Sublinhamos que a constituição dos Liceus Normais – destinados a serem escolas de preparação prática dos professores do ensino secundário – se justificou com a necessidade de proporcionar aos futuros professores um ambiente de trabalho apropriado para facultar um saber fazer profissional e que este modelo de formação, relativamente ao anterior, trouxe ao professorado dos liceus uma experiência mais prolongada da prática pedagógica na profissionalização. Assim, a formação dos

(14)

professores do ensino liceal, segundo o decreto de 1930, definiu-se por duas componentes: a cultura pedagógica e a prática pedagógica. Durante a prática pedagógica o futuro professor era acompanhado por um professor metodólogo que era responsável pela sua orientação no estágio.

Para Nóvoa (1992), a legislação de 1930 procura salvaguardar as três dimensões que devem estar presentes na formação de um professor do ensino secundário, a saber, preparação académica, preparação profissional teórica e prática profissional, através da articulação de uma licenciatura de base com a frequência do Curso de Ciências Pedagógicas e o estágio num Liceu Normal. Alterar o modelo de formação de professores logo no início do ano lectivo de 1930/31 constituiu uma decisão política que teve os custos decorrentes de tal decisão em nome da mudança. Assim, com o ano lectivo a decorrer implantou-se o novo modelo através de vários diplomas (Oliveira, 1992). Por exemplo, o primeiro Regulamento dos Liceus Normais3 foi publicado quase no final do

primeiro ano letivo de funcionamento. Em 1934, foi publicado novo Regulamento dos Liceus Normais4 que se vai manter, com

pequenas alterações, durante cerca de 40 anos, ou seja, ao longo de grande parte do Estado Novo.

Embora o Estatuto do Ensino Liceal, promulgado em 19475 quando Pires de Lima era Ministro, confirmasse essencialmente o modelo formativo definido na década de 1930 e a grande alteração é a centralização da formação de professores num único liceu, o D. João III, em Coimbra. A concentração dos estágios em Coimbra é justificada pela divergência de critérios entre os professores metodólogos de um e outro liceu – D. João III e Pedro Nunes – e porque o padrão de classificações finais dos estagiários não seria uniforme. Hoje podemos antever outras explicações relacionadas com a decisão de aumentar o controle sobre o país para cercear as expectativas numa mudança possibilitadas pelo fim do conflito mundial. No ensino assiste-se assim a um conjunto de medidas centralizadoras e repressivas de controle da profissão docente (Nóvoa, 1992) de que faz parte também a instituição do livro único nos liceus e nas escolas técnicas bem como a expulsão de diversos professores.

3 Decreto n.º 19.610. Diário do Governo, 80(17/4/1931), 636-44. 4 Decreto n.º 24.676. Diário do Governo, 275(22/11/1934), 2015-26. 5 Decreto n.º 36.508. Diário do Governo, 216(17/9/1947), 888-927.

(15)

Em 1956, Leite Pinto é escolhido para Ministro da Educação Nacional. Trata-se de um dos proponentes de uma opção desenvolvimentista para o país, acompanhando o que se verificava a nível europeu e americano. A concentração da formação num único liceu normal não permite formar pessoal docente em número suficiente que suporte o crescimento do ensino liceal que já se verificava e determina a abertura de estágios em Lisboa e mais tarde no Porto6.

Mesmo assim, no final dos anos 1960, o sistema de formação de professores não formava o número necessário de professores que a rápida expansão do ensino liceal7 requeria (Matos, 2014). Em 1969 foi publicado novo enquadramento legislativo8 da formação dos professores do ensino liceal, podendo os Liceus Normais deixar de ser os únicos responsáveis pela formação prática. O novo regime já sai fora do âmbito deste capítulo.

Neste texto pretendemos pois contribuir para a compreensão da legislação sobre os processos de formação dos professores de Matemática do ensino liceal, em particular a iniciada pelo modelo de formação instaurado em 1930 e que termina em 1969. Como fontes utilizámos legislação relativa à formação de professores em Portugal na época em estudo, a imprensa periódica e revistas educativas. Foram ainda usados estudos atuais como fontes secundárias.

O acesso ao estágio

No regime de habilitação para o magistério estabelecido em 19309,

os candidatos ao estágio para o 8.º grupo de docência do ensino liceal10, tinham que possuir uma licenciatura na Secção de Ciências

6 Decreto-lei n.º 40.800. Diário do Governo, 222(15/10/1956), 1625-6 e Decreto-lei

n.º 41.273. Diário do Governo, 210(17/9/1957), 888-9, respetivamente.

7 Em 1960, o número de alunos no ensino liceal é cerca do triplo do de 1930.

Entre 1960 e 1975, o aumento do número de alunos no ensino liceal quase sextuplica (Nóvoa, 1996).

8 As modificações ao regime dos estágios pedagógicos iniciam-se com o

Decreto-lei n.º 48.868. Diário do Governo, 40(17/2/1969), 160-2 que vai ser regulado por sucessiva legislação. Podemos considerar que este modelo termina quando, em 1971, as Universidades abrem cursos de formação pedagógica.

9 Decreto n.º 18.973. Diário do Governo, 273(22/11/1930), 2333-7.

(16)

Matemáticas das Faculdades de Ciências. Nesse momento, a distribuição das disciplinas pelos quatro anos da licenciatura, era a seguinte:

1.º ano – Álgebra Superior, Geometria Analítica e Trigonometria

Esférica; Geometria Descritiva e Estereotomia; Curso Geral de Química; Desenho Rigoroso.

2.º ano – Cálculo Infinitesimal; Geometria Superior; Curso Geral

de física; Desenho Topográfico.

3.º ano – Análise Superior; Mecânica Racional; Astronomia e

Geodesia; Cálculo das Probabilidades.

4.º ano – Mecânica Celeste e Complementos de Geodesia; Física

Matemática; Desenho de Máquinas11.

Este foi, com algumas alterações12, o plano curricular da

Licenciatura em Ciências Matemáticas, que vigorou até 1964, ano em que a escolaridade das licenciaturas aumenta para cinco anos13.

Nessa altura a licenciatura em Ciências Matemáticas passou a estar dividida em dois grupos, o primeiro designado por Matemática Pura e o segundo por Matemática Aplicada. A licenciatura era composta por uma parte geral, relativa aos três primeiros anos, e uma parte complementar, relativa aos dois últimos anos. As disciplinas dos três primeiros anos da Licenciatura de Matemática Pura e da Licenciatura da Matemática Aplicada são iguais, sendo as seguintes:

1.º ano – Matemáticas Gerais, Álgebra Linear, Geometria

Descritiva e Elementos de Geometria Projetiva, Elementos de Química-Física, Curso Geral de Desenho;

2.º ano – Álgebra, Análise Infinitesimal, Elementos de Análise

Numérica, Física Geral;

3.º ano – Análise Infinitesimal II, Mecânica Racional, Astronomia

Fundamental, Elementos de Probabilidades e Estatística.

As disciplinas que pertencem ao 4.º e 5.º anos da Licenciatura de Matemática Pura eram:

4.º ano – Álgebra Superior I, Análise Superior I, Geometria

Superior, História do Pensamento Matemático;

também podiam lecionar as disciplinas de Físico-Química e Desenho e Trabalhos Manuais.

11 Decreto n.º 12.678. Diário do Governo, 257(17/11/1926), 1908-13. 12 Decreto n.º 39.021. Diário do Governo, 271(3/12/1952), 1231-5. 13 Decreto n.º 45.840. Diário do Governo, 271(31/7/1964), 953-9.

(17)

5.º ano – Álgebra Superior II, Análise Superior II e opções agregadas em três grupos:

A: Física Matemática; Mecânica Celeste;

B: Teoria das Probabilidades; Estatística Matemática;

C: Análise Numérica e Máquinas Matemáticas; Teoria da

Informação; Programação Matemática.

Quanto às disciplinas que pertencem ao 4.º e 5.º anos da licenciatura de Matemática Aplicada, estas eram:

4.º ano – Análise Numérica e Máquinas Matemáticas, Teoria das

Probabilidades, Geodesia I, Geometria Diferencial, História do Pensamento Matemático;

5.º ano – Física Matemática, Mecânica Celeste. Como opção:

Seminário e outros trabalhos, Estatística Matemática, Teoria da Informação, Programação Matemática, Cálculo Atuarial.

A introdução de um semestre de Química Teórica na licenciatura em Ciências Matemáticas, justificou-se com as funções relativas ao professorado do 8.º grupo, dado que o ensino da disciplina de Ciências Físico-Químicas até ao 5.º ano do liceu podia ser atribuído a um professor de Matemática.

O exame de admissão

Para aceder ao 1.º ano do estágio o candidato tinha que se submeter a um Exame de Admissão. A Direção Geral do Ensino Liceal determinava a constituição dos júris deste Exame, um por cada grupo liceal. O Exame de Admissão tinha em vista averiguar a capacidade do candidato de bem usar a língua pátria; a sua cultura geral no âmbito do ensino secundário; dos seus conhecimentos acerca das matérias dos programas liceais das disciplinas da secção a que pertencia o grupo a que concorria — os do curso geral e do curso complementar quanto às disciplinas do grupo, apenas os do curso geral quanto às restantes disciplinas da secção —, assim como, dos seus conhecimentos acerca das matérias do ensino superior que tinham aplicação nas disciplinas do grupo. A formulação dos objetivos dos exames de admissão mantém-se durante o período em análise.

Os primeiros exames de admissão realizaram-se em 1931 e constavam de uma parte geral eliminatória que incluía uma redação sobre um tema de história de Portugal e outra redação sobre um

(18)

científico14. As provas continham ainda uma parte especial que, no

caso dos candidatos ao 8.º grupo eram compostas da resolução de um problema de geometria ou trigonometria e de um problema ou exposição sobre um assunto de aritmética ou álgebra.

Em 193415, seguindo o parecer de uma comissão nomeada para apreciar o Regulamento de 1931, são retiradas as provas específicas de cultura geral, que passa a ser avaliada em todas as outras provas, e são acrescentadas provas orais. As provas escritas constavam agora de duas exposições: uma, sobre a história da matemática e, outra, sobre um tópico de física ou química ao nível do curso geral dos liceus. As provas práticas constavam da resolução de quatro problemas de álgebra, geometria analítica, geometria e trigonometria, diretamente relacionados com o programa do ensino liceal. O candidato tinha ainda de prestar três provas orais: uma sobre matemática ao nível do ensino superior, outra de matemática ao nível dos programas liceais e uma terceira sobre de física e química ao nível do curso geral dos liceus. Os conhecimentos das matérias do ensino superior constavam numa lista programática que no caso do 8.° grupo era:

a) História da matemática:

1) História e importância da descoberta da lei da atração universal. 2) História e importância da invenção dos logaritmos.

3) História e importância da noção de derivada. Newton e Leibniz. 4) História e importância da aplicação da álgebra à geometria. Viète e

Descartes.

5) História e importância do problema da resolução algébrica das equações. Evariste Galois.

6) História e importância dos postulados em geometria. Euclides, Lobatchevsky, Bolyai, Riemann.

7) História e importância dos problemas da trissecção do ângulo, quadratura do círculo e duplicação do cubo.

8) Conhecimento muito geral da vida e obras de Newton, Leibniz, Descartes, D'Alembert, Euler, Laplace, Lagrange, Monge, Gauss, Cauchy, Riemann, Poincaré e Klein.

9) Conhecimento da vida e obras dos principais matemáticos portugueses, especificadamente de Pedro Nunes, Monteiro da Rocha, Anastácio da Cunha, Daniel da Silva e Gomes Teixeira. Nota. — Exigem-se apenas conhecimentos gerais e apreciações de conjunto, sem minúcias, quer técnicas quer históricas.

b) Matemática:

Teoria dos números inteiros, fraccionários, irracionais e complexos. Elementos da teoria dos conjuntos de números. Generalização das

14 Decreto n.º 19.610. Diário do Governo, 80(17/4/1931), 636-44. 15 Decreto n.º 24.676. Diário do Governo, 275(22/11/1934), 2015-26.

(19)

operações a algoritmos infinitos: propriedades elementares das séries numéricas, produtos infinitos e fracções contínuas.

Noção de função, função de uma ou mais variáveis, classificação e propriedades mais gerais. Modos de definição (séries, produtos infinitos, integrais, etc.).

Estudo especial das propriedades dos polinómios inteiros e das funções exponencial, logarítmica, funções circulares diretas, inversas e hiperbólicas, tanto no campo real como no complexo.

Resolução numérica das equações algébricas. Resolução e discussão dos sistemas de equações lineares. Teoria da eliminação. Resolução gráfica de equações e sistemas. Interpolação.

Elementos da teoria dos grupos de substituição.

Derivadas e diferenciais. Teoremas fundamentais e a aplicação à teoria dos máximos e mínimos; indeterminações.

Noção de integral; aplicação ao cálculo de áreas e volumes. Princípios de geometria descritiva; resolução de problemas métricos. Estudo, por via sintética ou analítica, das propriedades fundamentais das

cónicas e quádricas.

Questões elementares de geometria infinitesimal.

Importância da teoria dos grupos na classificação das geometrias. (Decreto n.º 24.676, de 22/11/1934, p. 2026)

Constatamos que as alterações propostas em 1934 se caracterizam pelo reforço dos requisitos matemáticos a exigir aos candidatos, o que é acompanhado pelo aumento do peso dos professores do ensino superior nos júris dos exames de admissão, que, em 1934, passam de apenas um em 1931 para três, com a consequente diminuição dos professores do ensino liceal que passam de quatro em 1931 para dois16.

Desde 1931, havia ainda uma apreciação (não regulamentada) das qualidades morais e cívicas do candidato, e se este fosse considerado politicamente suspeito não lhe era permitido o acesso ao estágio (Almeida, 2013). A Polícia Internacional de Defesa do Estado era chamada, aliás, a dar um parecer sobre a sua idoneidade. Os candidatos tinham também que passar num exame realizado por uma junta médica. Os aprovados no exame de admissão, não tinham entrada garantida pois existia um número limitado de vagas (normalmente quatro) determinado anualmente.

O Estatuto do Ensino Liceal de 194717 altera de novo a estrutura

dos exames de admissão. As provas escritas passam agora a ser compostas de uma exposição sobre um assunto de aritmética ou álgebra e outra sobre geometria ou trigonometria, ambas com a duração de uma hora e meia aparentemente deixando de fora os

(20)

temas de matemática superior. As provas práticas incluíam a resolução de problemas de aritmética, álgebra (duas horas) e de geometria e trigonometria (também duas horas). As provas orais incidiam sobre os mesmos temas e incluíam ainda tópicos dos programas liceais de física e a química.

Perante a feminização da profissão docente, uma das prioridades do Ministro Leite Pinto vai ser a de atrair o sexo masculino para o magistério liceal. A partir de 195718, por um lado, abrem quatro

vagas para candidatos masculinos e duas para femininos para o 1.º ano de estágio de cada grupo disciplinar, e, por outro, os homens teriam condições especiais de admissão ao estágio. Assim, os candidatos do sexo masculino, que possuíssem as habilitações académica e pedagógica necessárias19, tinham dispensa do exame de

admissão ou da frequência do 1.º ano, sendo admitidos diretamente ao 2.º ano do estágio, desde que durante dois anos lectivos ou quatro anos lectivos, respetivamente, tivessem exercido com boa classificação as funções docentes de professor de serviço eventual dos liceus. No fim do segundo ano, os candidatos admitidos nestas condições prestavam duas provas escritas adicionais de carácter científico – 1) exposição sobre um assunto da Álgebra ou Análise; 2) resolução de um problema de Geometria e outro de Trigonometria – designadas por Exame de Cultura.

A cultura pedagógica

Segundo o projeto de 193020, a cultura pedagógica estava afastada

da prática escolar e era ministrada na Secção de Ciências Pedagógicas das Faculdades de Letras. O seu plano de estudos era composto por cinco disciplinas: Pedagogia e Didática (anual); História

da Educação, Organização e Administração Escolares (anual); Psicologia Geral (anual); Psicologia Escolar e Medidas Mentais (anual) e Higiene Escolar (semestral). O estudante obtinha a cultura pedagógica

através da aprovação em todas as disciplinas anteriores.

A cultura pedagógica tratava de uma formação pedagógica geral, sem abordagem especializada no que se refere à área correspondente à formação dos discípulos. Para a regência das

18 Decreto-lei n.º 41.273. Diário do Governo, 210(17/9/1957), 888-9.

19 Habilitação académica e a cultura pedagógica referidas nos n.os 2, 3 e 4 do artigo

188.º do Estatuto do Ensino Liceal de 1947 (Decreto n.º 36.508. Diário do Governo,

216(17/9/1947), 888-927).

(21)

disciplinas de Pedagogia e Didática e História da Educação, Organização e

Administração Escolares havia em cada Faculdade um professor

catedrático ou auxiliar. A disciplina de Psicologia Escolar e Medidas

Mentais era regida, em acumulação, pelo professor de Psicologia Experimental da respectiva Faculdade. A regência da disciplina de Higiene Escolar estava entregue ao professor catedrático ou auxiliar

da cadeira de Higiene das Faculdades de Medicina. No quadro 5.1.1. podemos observar o corpo docente das cinco disciplinas que compunham a componente da cultura pedagógica, em diversos períodos, bem como os temas registados nos sumários das aulas.

Quadro 5.1.1 – Docentes e temas leccionados nas disciplinas de Ciências Pedagógicas.

Disciplinas

Docentes Temas registados nos sumários

Univ.

Coimbra Lisboa Univ. 1ª. Pedagogia e

Didática - Émile Planchard (1937 a 1964) - Manuel Amâncio Viegas de Abreu (1966/67) - Delfim Santos - José de Oliveira Guimarães (entre 1944 e 1947) Utilização de métodos estatísticos e inquéritos. Análise de conceitos de Pedagogia, Didática. Instrumentos de investigação pedagógica. Delfim Santos especificou também didáticas de várias disciplinas. 2ª. História da Educação, Organização e Administração Escolares - Joaquim de Carvalho (1930 a 1958) - Sílvio Lima (1958 a 1962) - Joaquim Ferreira Gomes (1963 a 1974) - Delfim

Santos A educação — da Grécia clássica ao século XVIII. Delfim Santos referiu Rousseau, Kant e Condorcet e ainda Spencer, Fröbel, Montessori, Dewey, Dalton e Decroly. Os sumários de Gomes são muito semelhantes aos de Santos. Em 1966/67 Gomes registou também Claparède, Ferrière, Dévaud, Piaget, Rogers e ainda o século XVIII em Portugal, destacando Martinho de Mendonça.

(22)

Quadro 5.1.1 (continuação) – Docentes e temas leccionados nas disciplinas de Ciências Pedagógicas.

Disciplinas Univ. Docentes Temas registados nos sumários Coimbra Univ. Lisboa

3ª. Psicologia

Geral - Máximo Correia (1940 a 1945) - Sílvio Lima (1945 a ?) - Délio Nobre dos Santos - João António de Mattos Romão Introspeção, Psicanálise, sistema nervoso, reflexos condicionados, hereditariedade várias patologias. Em 1956/57 Lima referiu o comportamento escolar, a entrada na escola, os “atrasos” pedagógicos. 4ª. Psicologia Escolar e Medidas Mentais - Émile Planchard (1937 a 1964) - Manuel Amâncio Viegas de Abreu (1966/67) - Délio Nobre dos Santos - João António de Mattos Romão Contributos da Psicologia da Psicanálise. Testes de caráter e de personalidade, métodos de diagnóstico para crianças e adolescentes, etapas e fatores do desenvolvimento. 5ª. Higiene Escolar (semestral) - António Meliço Silvestre - Vítor Hugo Moreira Fontes (décadas de 1930 a 1950) - Vasco Valente Bruno da Costa (anos de 1960) A higiene do edifício escolar: ventilação, aquecimento, iluminação, mobiliário mais adequado. A alimentação dos estudantes, a educação física e os horários escolares. Foram registadas ainda as fases do desenvolvimento físico e psíquico. Vítor Fontes especificou temas do desenvolvimento mental.

(23)

O Regulamento dos Liceus Normais aprovado em 1934 21

preconizava que podiam ser admitidos à matrícula nas cadeiras da cultura pedagógica os indivíduos que estivessem habilitados com o curso complementar de letras ou de ciências dos liceus, o que possibilitava que estas fossem frequentadas antes, durante ou depois da obtenção da licenciatura, ainda assim a legislação acautelava que a frequência das lições da cultura pedagógica se pudesse processar em simultâneo com a do 1.º ano de estágio cumprindo aos reitores dos liceus normais comunicar com antecedência ao diretor da Faculdade de Letras o horário dos exercícios obrigatórios do 1.º ano de estágio, a fim de com ele ser tornado compatível o das disciplinas pedagógicas.

Embora o lugar do primeiro contacto com os assuntos pedagógicos estivesse atribuído à Universidade, como a matrícula no 1.º ano de estágio não dependia da aprovação nas cadeiras de cultura pedagógica — só a transição para o segundo ano estava condicionada à prévia aprovação nessas cadeiras — a frequência das disciplinas da cultura pedagógica teórica por alunos que estivessem a frequentar o estágio no Liceu Normal levava a que muitos daqueles só aparecessem nas universidades nos exames finais daquelas cadeiras (Pintassilgo, Mogarro e Henriques, 2010), o que na prática veio certamente retirar importância à formação pedagógica de natureza teórica, universitária.

Apesar da valorização das Ciências Pedagógica — onde eram divulgados métodos, pedagogos, e concepções sobre a profissão na formação inicial de professores — como uma etapa importante da formação inicial para a docência ser um objectivo da legislação de 1930, a 3.ª Secção permaneceu à margem no contexto da Universidade, nunca conseguindo um estatuto de pós-graduação. Deve ainda referir-se que, embora as determinações oficiais para a formação inicial o recomendassem, era impossível a realização de qualquer trabalho prático, simulação ou discussão, com os alunos nas Ciências Pedagógicas, nomeadamente devido ao elevado número de alunos inscritos nas disciplinas (Pintassilgo, Mogarro e Henriques, 2010).

(24)

As conferências pedagógicas

As conferências pedagógicas constituíam outra vertente do estágio. A legislação de 1931 e 193422 dedica-lhes um capítulo próprio e

preconiza conferências duas espécies: a) reuniões destinadas a fomentar o convívio entre os professores do liceu e os estagiários, bem como a promover o aumento do conhecimento dos mesmos em relação a todo o ensino realizado no liceu e a familiarizar os estagiários com os métodos usados em todas as disciplinas liceais; b) dissertações sobre assuntos de carácter científico ou pedagógico. As conferências com as características indicadas na alínea a) eram presididas pelo Reitor e anunciadas no Liceu com bastante antecedência, sendo obrigatória a assistência para todos os estagiários e professores do liceu e de todas se redigia uma ata. Deviam realizar-se durante o ano, pelo menos, uma em cada grupo. Para cada uma destas conferências havia um estagiário escolhido pelo metodólogo, de entre os do 1.º ou do 2.º ano cujo trabalho era apresentado e discutido pelos assistentes à conferência. Os relatores também podiam ser designados por sorteio ou pelo Reitor. Os títulos das conferências e os respectivos sumários e bibliografias eram entregues, pelos metodólogos ao Reitor, que marcava os dias em que cada uma se realizava. Os sumários e bibliografias eram organizados pelos estagiários. A recusa em apresentar uma conferência ou a tomar parte na discussão subsequente tinha influência na classificação do estágio.

As conferências indicadas na alínea b) eram realizadas, sem subsequente discussão, por professores metodólogos ou outros do Liceu, por pessoas de reconhecida competência, para tal convidadas pelo Reitor e, ainda, por estagiários do 1.º ou do 2.º ano.

Na legislação de 194723 as conferências merecem apenas uma breve

menção. No entanto, no único Liceu Normal em Coimbra, os estagiários continuam a produzir trabalhos de reflexão sobre temas educativos. Mais tarde, quando em 1956 e 1957 se alarga a formação a outros Liceus Normais, a prática das Conferências Pedagógicas desempenha de novo um papel importante nos três liceus24.

22 Decreto n.º 19.610. Diário do Governo, 80(17/4/1931), 636-44; Decreto n.º

24.676. Diário do Governo, 275(22/11/1934), 2015-26.

23 Decreto n.º 36.508. Diário do Governo, 216(17/9/1947), 888-927 24 Os capítulos seguintes analisam estes documentos.

(25)

A prática pedagógica

O modelo estabelecido em 1930 determinou que a prática pedagógica era proporcionada pelo trabalho realizado durante um estágio de dois anos, num dos dois liceus normais, o Liceu Pedro Nunes em Lisboa e o Liceu Júlio Henriques de Coimbra, mais tarde fundido com o Liceu José Falcão e adotando o nome Liceu D. João III. Nesta experiência profissional o futuro professor era acompanhado por um professor metodólogo que era responsável pela sua orientação no estágio.

Os objetivos e a estrutura da prática pedagógica mantiveram-se estáveis entre 1930 e 196825. No decorrer do 1.º ano, o estagiário devia efetuar um conjunto de tarefas, que compreendia a assistência a lições-modelo leccionadas pelo professor metodólogo; o ensino em pequenas séries de lições dadas pelo estagiário; a assistência a conferências pedagógicas e a reuniões do conselho escolar e dos conselhos de classe ou a quaisquer outras de carácter pedagógico ou administrativo, e a assistência e participação em exames. Todos os estagiários do 1.º ano deviam ainda frequentar um curso de trabalhos manuais para professores. O curso, a realizar no Liceu, não devia ocupar o estagiário mais do que dois tempos semanais. O 1.º ano deveria começar no primeiro dia útil de dezembro e terminava com o ano escolar dos liceus. Para além das tarefas do 1.º ano, no 2.º ano de estágio incluía o ensino em duas turmas ou em duas disciplinas da mesma turma, pelo menos, e a participação em excursões escolares e outros meios de ensino experimental. O 2.º ano iniciava-se com o começo do ano escolar e terminava em 30 de abril. Em cada ano, o estagiário devia assistir ou ensinar, simultaneamente, em duas turmas ou em duas disciplinas da mesma turma, conforme fosse designado pelo Reitor, ouvido o metodólogo, não podendo em caso algum, ter menos de nove tempos semanais. No decorrer do ano lectivo o estagiário mudaria de classes, de forma a percorrer, quanto possível, os dois ciclos do curso geral e o curso complementar, podendo, para tal fim, assistir e ensinar em aulas regidas por quaisquer professores, sempre com a assistência destes e sob a direção e fiscalização do professor metodólogo. Os professores metodólogos deveriam expor aos

25 Decreto n.º 18.973. Diário do Governo, 273(22/11/1930), 2333-7; Decreto n.º

(26)

estagiários os planos das lições-modelo e dar-lhes as indicações necessárias para que eles compreendessem os objectivos dessas lições e os processos nelas adoptados. Se o estagiário fosse responsável pelas lições, tinha que apresentar, previamente, os respectivos planos de lição ao metodólogo, que os modificava, se fosse caso disso. As lições dos estagiários seriam frequentemente discutidas em conferência, pelos estagiários do mesmo ano e do mesmo grupo ou secção que a elas tivessem assistido, e pelo metodólogo, independentemente das observações que este tivesse a fazer, a seguir a cada lição.

O treino de outras atividades pedagógicas e administrativas fazia parte das tarefas comuns aos estagiários de todos os grupos. No âmbito destas atividades, cabia ao Reitor indicar os conselhos de âmbito pedagógico (Conselho Escolar e Conselhos de Classe) e outras reuniões nas quais os estagiários deviam estar presentes. Aos estagiários do 1.º ano que fossem convocados para os conselhos pedagógicos, cumpria apenas a assistência. Os do 2.º ano, se o Reitor o entendesse, podiam participar nos trabalhos. Era igualmente, da responsabilidade do Reitor a indicação de períodos de prática dos estagiários junto dele próprio, do Vice-Reitor, dos Diretores de classe, ou Diretores de instalações e demais serviços e dos secretários das diversas reuniões. Aos estagiários cabia apresentar ao Reitor pequenos relatórios destas atividades corroborados pelos professores junto dos quais foram cumpridas. Esta parte do estágio tinha o objectivo de iniciar o formando em toda a direção e realização de serviços que podia ser chamado a desempenhar nos Liceus e instruí-lo na resolução de problemas de ordem pedagógica e administrativa referente à vida escolar normal. Esses relatórios seriam um dos elementos a considerar para a classificação final do estágio.

As informações para apreciação do estagiário competiam: ao professor metodólogo; a outros professores metodólogos, nomeadamente dos grupos afins, que podiam assistir a lições dadas pelos estagiários; ao Reitor, que faria o seu juízo visitando aulas, assistindo a outros trabalhos do estagiário e colhendo informações sobre o seu cumprimento dos trabalhos. Na apreciação e na classificação do estágio, atendia-se a: a) assiduidade; b) pontualidade; c) competência, revelada na prática do ensino; d) as suas qualidades docentes; e) zelo e dedicação pelo ensino e educação dos alunos, quer nas atividades escolares quer nas circum-escolares; f) subsidiariamente o curriculum vitae. A apreciação e classificação de cada um dos anos do estágio era da

(27)

responsabilidade do Conselho Escolar que, para este efeito, era constituído apenas pelos professores metodólogos. A apreciação do estágio adoptada pelo Conselho traduzia-se, em relação a cada uma das alíneas a) a e), na atribuição das classificações de mau, medíocre, suficiente, bom ou muito bom. A classificação era feita por votação nominal em relação a cada uma das alíneas. Em seguida, tendo em conta o conjunto de resultados desta votação, fixava-se a nota do estágio. A escala de valores a utilizar era a seguinte: 0 a 4, mau; 5 a 9, medíocre; 10 a 13, suficiente; 14 a 17, bom; 18 a 20, muito bom. Finalmente, por meio de votação dentro da escala da nota previamente fixada, obtinha-se a nota expressa em valores. O resultado das votações era publicado, no liceu, até 31 de Julho e até 5 de Maio, respectivamente, para os estagiários do 1.º e do 2.º ano.

O Exame de Estado

Para finalizar a formação os estagiários tinham de se submeter a Exame de Estado e a aprovação neste exame conferia-lhes a capacidade legal para serem nomeados professores do ensino secundário, quer do oficial quer do particular. A estrutura deste Exame pouco se alterou no período em estudo. Inicialmente, em 193026, pensados para o mês de Julho no Liceu de Lisboa e depois,

em 1931, também em Coimbra27, envolvem provas de cultura

escritas, orais e práticas sobre os programas liceais e do ensino superior e provas pedagógicas centradas no conhecimento do candidato sobre questões pedagógicas e suas aplicações à educação e ensino liceal.

O programa das provas de cultura para os futuros docentes de Matemática era o seguinte:

Prova oral:

Propriedades gerais dos polinómios inteiros e das funções algébricas. Resolução numérica das equações algébricas. Noções gerais da teoria dos grupos, Teoria geral da eliminação. Sistemas de equações lineares. Conjuntos, sua classificação. Noção mais geral de função. Vários aspetos sobre os quais se pode fazer a respetiva classificação, Estudo analítico da reta e do plano e propriedades mais gerais das cónicas e das quádricas. Princípios fundamentais de geometria superior. Teoria dos limites. Princípios fundamentais do cálculo diferencial e integral. Propriedades elementares das séries. Produtos infinitos e frações contínuas. Principais factos astronómicos.

(28)

Provas práticas:

1) Resolução gráfica de equações, leitura e construção de gráficos e ábacos ou uso corrente das tábuas numéricas … logaritmos de Gauss, funções naturais e tábuas astronómicas;

2) Uso da régua de cálculo ou uso do teodolito ou do sextante nos problemas de trigonometria. (Decreto n.º 19.610, p. 645)

O candidato ao magistério podia optar por não se inscrever no Exame de Estado logo que terminasse o estágio, mas, se decorressem três épocas de exames depois de concluído o estágio sem que tivesse obtido aprovação no Exame de Estado, o candidato teria que repetir o 2.º ano. Três eliminações ou desistências no Exame de Estado implicavam exclusão definitiva do candidato, não sendo permitida mais de uma repetição do 1.º ano ou do 2.º ano de estágio.

O Regulamento dos Liceus Normais de 193428 introduz alguma

alterações. O Exame de Estado realizava-se nos meses de maio e junho e passa a ser composto por três provas pedagógicas – uma prova escrita, um ensaio crítico e uma lição a alunos, deixando cair as provas de cultura, com o argumento que estes conhecimentos deveriam ser avaliados antes do ingresso no estágio, isto é, nos exames de admissão. A legislação de 194729 elimina o ensaio crítico,

mas mantém o essencial da restante estrutura A prova escrita, com duração de duas horas, compunha-se de um enunciado dividido em duas partes, uma de didática geral e outra de didática especial ou administração do ensino secundário. O júri organizava para esta prova dez enunciados, que eram afixados no liceu dois dias antes da sua realização. A prova era discutida durante meia hora por um vogal do júri. Outra prova, um ensaio crítico, era um trabalho escrito versando o ensino de um ponto concreto do programa de uma das disciplinas do grupo que devia ser documentado com os planos de algumas lições. Eram entregues cinco exemplares impressos ou dactilografados, do ensaio, com o requerimento de exame. Este trabalho era discutido durante meia hora por um dos vogais do júri. O candidato tinha ainda outra prova, uma lição a uma classe do Liceu. Aquela era sobre a disciplina do grupo e durava cinquenta minutos. Os assuntos da lição eram, por norma, os que deviam ser leccionados em continuação da aula anterior, ou seja, não havia quebra de sequência no ensino dos alunos da classe. Esta lição era discutida durante meia hora por um dos vogais, a discussão podia realizar-se numa outra sala.

28 Decreto n.º 24.676. Diário do Governo, 275(22/11/1934), 2015-26 29 Decreto n.º 36.508. Diário do Governo, 216(17/9/1947), 888-927.

(29)

Depois de realizadas as provas de todos os candidatos, o júri procedia à sua apreciação. Um candidato era excluído se não obtivesse, pelo menos, dez valores em cada prova. A classificação das provas pedagógicas era, para os candidatos não excluídos, a média dos valores obtidos nas três provas. Feita a classificação das provas pedagógicas, o júri determina a classificação final, que seria afixada no liceu, e era obtida pela média das seguintes classificações:

a) Classificação obtida na licenciatura, ou média dos valores obtidos nas cadeiras que a substituam – coeficiente 1;

b) Classificação obtida no exame de admissão ao estágio – coeficiente 3;

c) Média das notas obtidas nas cadeiras da Secção de Ciências Pedagógicas – coeficiente 1;

d) Classificação do estágio do 2.º ano, dada pelo Liceu Normal – coeficiente 3;

e) Classificação do Exame de Estado – coeficiente 2. Em conclusão, a nova estrutura da formação de professores do ensino secundário decidida a partir de 1930 revela uma valorização do exame de admissão, que testava os conhecimentos sobre os conteúdos a ensinar, e do 2.º ano de estágio, aquele em que os estagiários mais intervinham, assegurando parte substancial da docência, e uma valorização relativa, apesar do seu peso simbólico, do Exame de Estado. Este processo desvalorizava tanto a licenciatura como as disciplinas de “ciências pedagógicas”, o que manifesta uma maior confiança na avaliação dos conhecimentos científicos por via do exame e da preparação pedagógica por via da observação da prática (Pintassilgo e Teixeira, 2011).

Os novos sistemas de formação de professores após 1968

Em 1969 foi publicada uma nova regulamentação30 da formação dos professores do ensino liceal que vai alterar consideravelmente o modelo. Das diferenças encontradas entre o regime de estágio pedagógico instaurado em 1969 e o anterior de 1930 salientamos: a redução do estágio para um só ano, a atribuição de turmas próprias ao estagiário e o funcionamento do estágio noutros liceus, para além dos Liceus Normais. O propósito do estágio seria

(30)

essencialmente formativo e teria uma orientação predominantemente prática, compreendendo: estudo e aplicação de métodos, processos e técnicas de ensino e aprendizagem das disciplinas do respetivo grupo; conhecimento genérico da respetiva legislação e noções práticas de administração escolar; atividades culturais complementares e de ar livre. Em 1971 foi criado o ramo de Formação Educacional da Licenciatura em Matemática31, pelo que a licenciatura passou a contemplar a formação pedagógica para quem quisesse seguir a carreira de professor do ensino secundário. O curso compreendia duas partes: o Bacharelato (três anos) e a Especialização (dois anos). O Bacharelato era constituído por cadeiras científicas, a Especialização era formada por cadeiras da área educacional (4.º ano), sendo o 5.º ano composto pelo estágio pedagógico e uma Monografia científica. Este modelo de formação de professores constituiu uma melhoria relativamente ao anterior, mas continuou a separar completamente as componentes científica, pedagógica e prática da formação dos futuros professores.

Fontes primárias

Legislação principal

Decreto n.º 18.973. Diário do Governo, 273(22/11/1930), 2333-7. Decreto n.º 19.610. Diário do Governo, 80(17/4/1931), 636-44. Decreto n.º 24.676. Diário do Governo, 275(22/11/1934), 2015-26. Decreto n.º 36.508. Diário do Governo, 216(17/9/1947), 888-927. Decreto-lei n.º 40.800. Diário do Governo, 222(15/10/1956), 1625-6. Decreto-lei n.º 41.273. Diário do Governo, 210(17/9/1957), 888-9.

Fontes secundárias

Almeida, M. (2013). Um olhar sobre o ensino da matemática, guiado por António

Augusto Lopes. Dissertação de doutoramento. Faculdade de Ciências e

Tecnologias da Universidade Nova de Lisboa. Lisboa.

Almeida, M. e Almeida A. (2016). Ecos de um passado: Uma listagem cronológica

de documentação educativa (1288 – 1974). Caparica: UIED.

Matos, J. M. (2014). A Matemática no ensino não-superior em Portugal. Em A. Almeida e J. M. Matos (Eds.), A matemática nos programas do

ensino não-superior (1835-1974) (pp. 71-91). Caparica: UIED e APM.

Nóvoa, A. (1992). A ‘Educação Nacional’. Em Serrão, J. e Oliveira Marques, A.H. (1992). Nova História de Portugal. Portugal e o Estado Novo.

Volume XII (1930 – 1936). Lisboa: Editora Presença

(31)

Nóvoa, A. (1996). Ensino Liceal. Em Rosas, F. e Brito, J. M. (1996).

Dicionário de história do Estado Novo. Volume 1. Venda Nova: Bertrand

Editora.

Oliveira, M. S. (1992). A formação de professores no Liceu Normal de Pedro

Nunes. Tese de Mestrado. Universidade de Lisboa.

Pintassilgo, J. e Teixeira, A. (2011). A formação de professores em Portugal nos anos 30 do século XX (algumas reflexões a partir do exemplo dos professores de Matemática). Revista HISTEDBR. 43, 4-20.

Pintassilgo, J., Mogarro, M. e Henriques, R. (2010). A formação de professores

em Portugal. Lisboa: Edições Colibri.

Rosas, F. (1994). História de Portugal – Vol. 7 – Estado Novo (1926 - 1974). Lisboa: Círculo de Leitores.

Rosas, F. e Brito, J. M. (1996). Dicionário de história do Estado Novo. Volume

1. Venda Nova: Bertrand Editora.

Revisores

Ana Santiago, António Domingos, José Manuel Matos

(32)
(33)

Capítulo 5.2

Elaborando o conhecimento pedagógico do

conteúdo matemático na década de 1960 no

Liceu Pedro Nunes

32

José Manuel Matos, Universidade Nova de Lisboa, jmm@fct.unl.pt Teresa Maria Monteiro, Instituto Politécnico de Beja,

teresamaria.monteiro@gmail.com

Em momentos de grandes alterações educativas motivadas por mudanças na percepção da função social da escola podem ocorrer recomposições relacionadas com o conhecimento do professor, que se manifestam nos conteúdos ou nas metodologias de ensino. Este texto pretende contribuir para a compreensão de como se processam estas recomposições, seguindo as diferenciações no conhecimento profissional dos professores sublinhadas por Lee Shulman (1986, 1987). Este autor valoriza em particular o

conhecimento pedagógico do conteúdo — que compreende a formulação

de conceitos, técnicas pedagógicas, a noção do que torna conceitos ou procedimentos difíceis ou fáceis de aprender, uma noção do saber prévio dos alunos e incorpora ainda o conhecimento de estratégias de ensino associadas a representações conceptuais apropriadas — e distingue-o do conhecimento do conteúdo detido por um perito numa área científica e do conhecimento pedagógico geral33,

comum aos professores de todas as áreas curriculares. Não negando a importância destes outros dois tipos de conhecimento34

32 Este texto é simultaneamente uma adaptação e um desenvolvimento do artigo

Matos, J. M. e Monteiro, T. M. (2011). Recompondo o conhecimento didático do conteúdo durante o início da matemática moderna em Portugal (1956-69).

REMATEC, Revista de Matemática, ensino e Cultura, 6(9), 7-25. Aqui optámos por

utilizar o termo “conhecimento pedagógico do conteúdo” que nos parece mais próximo do original inglês.

33 Shulman utiliza os termos pedagogical content knowledge, content knowledge e pedagogical

(34)

para o conhecimento profissional docente, Shulman sustenta no entanto que o conhecimento pedagógico do conteúdo não é uma mera justaposição de conteúdos e didática, trata-se antes da

fusão de conteúdos e pedagogia numa compreensão de como tópicos, problemas e assuntos específicos são organizados, representados e adaptados aos distintos interesses e capacidades dos aprendizes e apresentados para ensino. O conhecimento pedagógico do conteúdo é a categoria que mais facilmente permite distinguir a compreensão do especialista do conteúdo da do pedagogo. (Shulman, 1987, p. 8)

Outros autores, por exemplo André Chervel (1988), valorizaram as disciplinas escolares (incluindo o seu currículo) como criações específicas e autónomas da cultura escolar. Desviar o foco da investigação educativa, quer de escolas enquanto entidades sociológicas globais, quer das disciplinas enquanto vulgarizações de conhecimento científico, revelou-se frutuoso na resolução de novos problemas de investigação.

A maior parte dos estudos que se têm debruçado sobre o conhecimento do professor têm procurado, numa dimensão pessoal, dissecar as suas componentes, procurar exemplos de como o professor o vai gerando ao longo da sua vida profissional, quer ainda procurar refletir sobre o seu estatuto epistemológico. Mais raramente tem-se, numa dimensão coletiva, procurado estudar forma de colaboração entre professores ou entre professores e formadores. Não é, no entanto, comum estudar a própria geração do conhecimento pedagógico do conteúdo. Este texto procura contribuir para a compreensão dos modos como o conhecimento pedagógico do conteúdo pode ser criado, não ao nível individual, mas no seio de uma comunidade particular de professores ao longo de um período de tempo alargado em contexto de grandes alterações educativas. Seguindo a distinção de Hargreaves (1992), preocupa-nos o conteúdo35 substantivo da cultura de professor: “as

atitudes, os valores, crenças, hábitos, suposições e formas de fazer coisas” (p. 219) gerados numa comunidade de formação de professores em contexto de mudanças educacionais, em particular curriculares, profundas.

Estudámos especificamente o desenvolvimento do conhecimento pedagógico do conteúdo entre o final dos anos 50 e 60 do século passado na época da implementação da reforma curricular que

Williams e Murray-Harvey (2009) e, quando este conhecimento envolve tecnologia em Mishra e Koehler (2006).

(35)

ficou conhecida como Matemática Moderna. Durante este período assistem-se a grandes alterações curriculares em todo o mundo. A nova matemática modificava profundamente o conhecimento do conteúdo matemático e consequentemente gerava uma desadequação do conhecimento pedagógico do conteúdo. Durante os anos em estudo, vai-se produzir uma lenta recomposição deste conhecimento e este texto pretende estudar esse processo. O período escolhido é balizado pelo recomeço dos estágios no Liceu Pedro Nunes em 1956 e pela alteração a partir de 1969 do regime de formação que mudou fundamentalmente o papel dos Liceus Normais na formação de professores em Portugal36. Este trabalho

insere-se num estudo histórico comparativo da cultura de matemática escolar em Portugal e no Brasil durante a implementação da Matemática Moderna37.

Para compreender os modos como o conhecimento pedagógico do conteúdo pode ser gerado no seio de uma comunidade de professores em contexto de grandes alterações educativas, recorremos a uma análise longitudinal de produções de futuros professores de Matemática em estágio no Liceu Normal de Pedro Nunes entre 1956 e 1969. A comunidade é assim constituída pelos professores estagiários e pelos seus metodólogos de Matemática daquele Liceu que estabelecem relações de maior ou menor proximidade com outros docentes, alunos, funcionários, etc. Para cumprir o objetivo analisámos o conteúdo das produções dos futuros docentes publicadas em revistas de educação e em arquivos.

Embora o foco deste trabalho esteja no conteúdo dos textos estudados, o recurso a textos produzidos num contexto algo distante do atual — e portanto já histórico — tornou necessário constituí-los como documentos (Le Goff, 1992), questionando-os e confrontando-os com o seu contexto de produção. Recorreu-se assim a outras fontes, nomeadamente artigos, artigos de jornal, documentação cinzenta do arquivo do Liceu Pedro Nunes, entrevistas, entre outras38.

36 E de que se deu conta no capítulo 5.1.

37 Referimo-nos ao Projeto de Cooperação Internacional CAPES/GRICES,

intitulado “A Matemática Moderna no Brasil e em Portugal: estudos históricos comparativos”, desenvolvido entre 2006 e 2009 na Unidade de Investigação Educação e

Desenvolvimento da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa.

(36)

O contexto de produção da reforma da Matemática Moderna em Portugal

Para compreender as mudanças no âmbito educativo, incluindo no domínio curricular, é fundamental conhecer o contexto socioeconómico e por aí começaremos. Portugal foi dos países que, no espaço europeu, mais alterações económicas, sociais e culturais experimentou desde o período posterior à Segunda Guerra Mundial, consequência de um peso crescente da indústria, com o consequente crescimento das cidades. Acompanhando este movimento, um sector do regime — os desenvolvimentistas — traça um programa que incluía uma abertura económica externa. Assim, em 1960, Portugal é membro fundador da EFTA, uma instituição visando a integração económica europeia, e, também em 1960, torna-se membro de diversas instituições internacionais, como por exemplo a Organização Europeia de Cooperação Económica. Internamente, tomam-se medidas económicas viradas para o incremento da produção industrial (entre outras, os Planos de Fomento que se iniciam em 1953) (Rosas, 1994).

No sistema educativo, estas mudanças no tecido produtivo são acompanhadas por um aumento consistente da população escolar desde o início dos anos 50. A política educativa vai procurar acomodar-se às transformações sociais do pós-guerra e assiste-se a uma valorização da educação enquanto objectivo para conseguir o crescimento económico do país (Nóvoa, 1992; Teodoro, 1999). É lançada pelo Governo uma Campanha de Alfabetização de Adultos, aumenta-se gradualmente a escolarização básica e efetua-se uma alteração curricular — a Reforma Pires de Lima de 1947 — que, em particular, expande o Ensino Técnico destinado à formação de trabalhadores qualificados, sustentando-o como alternativa ao Ensino Liceal, reservado ao segmento da população que se destina ao ensino superior.

Estas medidas são, no entanto, insuficientes para acompanhar as mudanças sociais. Por um lado, a procura da escola pós-primária por sectores cada vez maiores da população não vai ser acompanhada nem pela construção de escolas em número suficiente, nem, em especial, por alterações na formação inicial de professores que permitisse qualificar profissionais em número suficiente (Lima, 1963). Por outro, especialmente a partir da mudança democrática em 1974, a percepção de que o Ensino Técnico era socialmente desvalorizado vai rapidamente conduzir à criação do Ensino Unificado que significou na prática a quase

(37)

extinção do ensino profissional e o alargamento do ensino liceal a todos os alunos (Teodoro, 1999).

A reforma da Matemática Moderna, resposta internacional à necessidade de reforço da formação matemática que decorre desde os anos 1950 (Guimarães, 2003; Moon, 1986), vai-se conjugar com todas estas transformações no sistema educativo português, essencialmente a partir de 1962, com a nomeação de uma comissão de revisão do programa do último ciclo liceal presidida por José Sebastião e Silva (1914-1972) (Matos, 2014). Iniciam-se então diversos cursos para professores do liceu, preparatórios da experiência pedagógica. Em 1963 aplicou-se um novo programa a três turmas experimentais, uma em cada um dos Liceus Normais (Lisboa, Porto e Coimbra). Gradualmente o número de turmas, de professores e de escolas foi aumentando. A reforma demorou mais de dez anos a ser generalizada a toda a população escolar pré-universitária e, embora com algumas vozes discordantes, as ideias da Matemática Moderna congregaram, durante a sua longa gestação, um entusiasmo generalizado dos experimentadores, dos professores com responsabilidades de formação profissional, bem como de muitos outros professores, em particular daqueles que durante aqueles anos experimentais fizeram o seu Estágio Pedagógico.

Muito está ainda por saber sobre os efeitos desta alteração curricular nas práticas escolares. Os estudos já efectuados apontam, no entanto, para que até ao final dos anos 1970, os resultados estejam muito aquém do que os reformadores pretendiam. Quanto às aprendizagens, quer as de conteúdos característicos da Matemática Moderna, quer as dos temas que transitaram dos programas anteriores, o desempenho é fraco (Matos, 2005, 2012). Quanto às condições de ensino, até aos anos 1980, verificam-se atrasos das colocações de professores que por vezes apenas chegam às escolas muito após o início do ano lectivo, o predomínio de professores sem certificação profissional e com formações académicas incompletas, e mesmo a falta de professores durante todo o ano, situações que se revelam de particular acuidade em Matemática.

O Liceu Pedro Nunes e a formação de professores

(38)

no ano lectivo de 1905/0639. O primeiro Conselho deste Liceu teve

a presidência de António Joaquim de Sá Oliveira (1872-1954), um professor com formação jurídica e que foi o seu reitor entre 1906 e 1918 e de 1930 até 194140 (Gomes, 2003; Oliveira, 1992).

Desde 1915 o Liceu esteve ligado à formação de professores. No âmbito da formação ministrada pelas Escolas Normais Superiores das Universidades de Coimbra e de Lisboa que se iniciou em 1915/1641, a componente da prática pedagógica com a duração de

dois anos funcionou no então designado Liceu Central de Pedro

Nunes42. Na segunda fase em que Sá Oliveira é reitor do Liceu

Normal de Lisboa, e talvez devido à sua formação jurídica, costuma dizer-se que tudo no Liceu estava regulamentado e Sá Oliveira assume uma posição muito relevante na própria definição da legislação dos anos 30 do século XX sobre a formação de professores e a organização dos liceus normais. Reitor do Liceu durante 23 anos “e professor durante 35 anos. O ‘Pai Sá’, como era chamado pelos alunos, vivia no liceu, acompanhava a vida escolar e pessoal dos alunos e supervisionava o trabalho dos professores” (Gomes, 2010, p. 1). “Nós nos educaremos” era a divisa do Liceu. “Afirmava o reitor que cada aluno devia ser capaz ‘de se governar e cuidar da sua própria educação’, competindo aos professores desenvolver o sentido da responsabilidade e autonomia do aluno” (Gomes, 2010, p. 1).

A partir de 1930, a formação de professores vai ser alterada, criando-se Secções Pedagógicas nas Faculdades de Letras de Coimbra e Lisboa, concentrando a formação nos liceus normais e encerrando as Escolas Normais Superiores. A formação inicial de professores do ensino liceal vai agora assentar numa licenciatura de base continuada por duas componentes: a cultura pedagógica ministrada nas referidas Secções Pedagógicas e a prática pedagógica desenvolvida durante dois anos nos Liceus Normais. O novo modelo visava produzir “um professor vocacionado em primeira instância para a transmissão de conhecimentos” (Nóvoa, 1992, p. 507).

39 Decreto reorganizando as zonas escolares de Lisboa e Porto. COLP Janeiro

1906, p. 9.

40 Mais detalhes sobre o Liceu podem ser encontrados em Gomes (2003). 41 Que estudámos nos capítulos 4.1 e 4.2.

42 Como este Liceu teve diversas denominações (ver Anexo 5.2.1), passaremos a

(39)

Mais tarde, no âmbito da Reforma do ensino liceal de Pires de Lima de 1947, visando-se um reforço dos dispositivos de controlo moral e político sobre a profissão docente (Nóvoa, 1992), são encerrados os estágios no Liceu Pedro Nunes que passam a ser da exclusiva competência do Liceu D. João III em Coimbra43.

Em 1956, já com o novo Ministro Leite Pinto, os estágios são de novo reabertos no Liceu Pedro Nunes44 admitindo estagiários logo

nesse ano. Estas medidas para o aumento de possibilidades de estágio devem-se, particularmente, ao aumento do número de alunos que ingressavam no sistema educativo, obrigando a contratar um número bastante significativo de docentes sem preparação pedagógica (Nóvoa, 1992). No período sobre que incide este trabalho — 1956-1969 —, os estágios para formação de professores no Liceu Pedro Nunes ainda se regem fundamentalmente pelo modelo de formação de 193045. Do

trabalho desenvolvido durante o estágio fazia parte a elaboração de uma monografia cujo tema era determinado pelos metodólogos no início do ano letivo e a sua apresentação formal por um dos professores em formação de uma Conferência Pedagógica perante os docentes do Liceu, professores e estagiários de todas as disciplinas.

O Liceu Pedro Nunes e a Matemática Moderna

Durante o período em estudo, o Liceu Pedro Nunes vai ser um lugar de especial relevância no desenrolar da reforma da Matemática Moderna pois boa parte dos seus professores de Matemática vão assumir um papel de relevo. Em primeiro lugar, José Jorge Calado (1903-1986), Jaime Furtado Leote (1902-1988) e Alfredo Osório dos Anjos (1919-2002), intervenientes ativos nas experiências curriculares desta época, e os dois últimos são metodólogos de Matemática no Liceu Pedro Nunes durante o período estudado46. Para além de serem autores de artigos, Calado

e Osório dos Anjos produzem livros únicos. Dois deles estão presentes em estruturas fundamentais do desenvolvimento da reforma: Leote participa na Comissão de Revisão do Programa do

43 Decreto n.º 36.508. Diário do Governo, 216(17/9/1947), 888-927. 44 Decreto-lei n.º 40.800. Diário do Governo, 222(15/10/1956), 1625-6. 45 Que foi analisado no capítulo anterior.

Referências

Documentos relacionados

de lôbo-guará (Chrysocyon brachyurus), a partir do cérebro e da glândula submaxilar em face das ino- culações em camundongos, cobaios e coelho e, também, pela presença

Após a capitulação jurídica e validação por parte do Delegado de Polícia responsável pelo atendimento virtual, o sistema pode viabilizar a inserção de informações

5 “A Teoria Pura do Direito é uma teoria do Direito positivo – do Direito positivo em geral, não de uma ordem jurídica especial” (KELSEN, Teoria pura do direito, p..

Pensar a formação continuada como uma das possibilidades de desenvolvimento profissional e pessoal é refletir também sobre a diversidade encontrada diante

Podem treinar tropas (fornecidas pelo cliente) ou levá-las para combate. Geralmente, organizam-se de forma ad-hoc, que respondem a solicitações de Estados; 2)

inclusive com a alteração da destinação das áreas remanescente que ainda serão recebidas em permuta pelo clube; Ratificar a  nomeação dos cargos da Diretoria Executiva,

utilizada, pois no trabalho de Diacenco (2010) foi utilizada a Teoria da Deformação Cisalhante de Alta Order (HSDT) e, neste trabalho utilizou-se a Teoria da

De acordo com o objetivo proposto, que foi o estudo dos aspectos e eficiência do sistema de filtração do tipo bolsa para a retenção de partículas indesejáveis em herbicidas