SOCIEDADE BRASILEIRA DE GEOLOGIA
NÚCLEO NORTE
BELÉM - PARÁ
28/05 a 03/06/1994
GEOCRONOLOGIA DA PROVÍNCIA MINERAL DE CARAJÁS; SÍNTESE DOS DADOS E NOVOS DESAFIOS
MOACIR JOSÉ BUENANO MACAMBIRA E JEAN-MICIIEL LAFON Laboratório de Geologia Isotópica - Centro de Geocüncias/UFPa
INTRODUÇÃO - Passados crrca de vinte anos
do inicio dos trabalhos geocronológicos na Província Mineral de Carajás, cabe uma avaliação dos dados e a definição de novas metas a serem alcançadas com base no contexto geológico atualmente estabelecido. Na primeira década (1974-1984), os dados geocronológicos foram obtidos principalmente pelas metodologias Rb-Sr em rocha total e K-Ar em minerais e rocha total. Com base nesses dados, foram propostos modelos evolutivos onde a estruturação principal com a formação, preenchimento e deformação de bacias, especialmente da região de Carajás propriamente dita, teria se dado no Proterozóico Inferior. Na década seguinte (1984-1994), metodologias de maior potencial (U-Pb em rocha total e em minerais, especialmente zircões; Rb-Sr e <0Ar/39Ar
em minerais, Pb-Pb por evaporação em zircões) foram empregadas e um novo quadro se definiu. Comprovou-se que a crosta da Província de Carajás é dominantemente arqueana. O Proterozó-ico é marcado principalmente por granitos anorogênicos, diques e vulcânicas assocudõs. Neste trabalho apresentaremos uma síntese do conhecimento atual da Província de Carajás com base nos dados geocronológicos mais significati-vos e os nosignificati-vos desafios que se definem a partir desse quadro.
OS DADOS GEOCRONOLÓGICOS E O CONTEXTO GEOLÓGICO • As rochas mais
antigas definidas até então na Província de Carajás são o Metatonalito Arco Verde da região de Rio Maria (2957 +16/-19 Ma, U-Pb em zírcÕes;_Macambira & Lancelot, 1991a; Macam-bira, 1992) e os granulitos do Complexo Pium na área de Cateté (3050 ± 114 Ma. Pb-Pb em rocha total; Rodrigues et ai., 1992). Contudo, zircões de cerca de 3,2 Ga foram identificado! pelo método U-Pb na região de Rio Maria em sedimentos de cobertura plataformal do Grupo Rio Fresco (Macambira & Lancelot, 1991b) e como núcleo herdado de um zírcão do Granito proterozóico Musa (Machado et ai., 1991), atestando a
existência de rochas mais antigas na Província de Carajás.
O metariodacito do Grupo Lagoa Seca (Supergrupo Andorinhas), que compõe os greenstone belts da região de Rio Maria, foi datado a 2904 +29A22 Ma (Ü-Pb em zircões. Macambira & Lancelot, 1992). Associada a essa metavulcânica, foram identificadas metagrauvacas • cujos zircões tiveram como fonte o Metatonalito Arco Verde (Macambira & Lancelot, 1991b). Ainda na região de Rio Maria, o Supergrupo Andorinhas e o Metatonalito Arco Verde foram cortados por granitóides, como o Granodiorito Rio Maria e o Granito Xinguara há 2876 +13/-11 Ma (U-Pb em zircões; Macambira & Lancelot, 1991a; Macambira, 1992), e o Granito Mata . Surrão há 2872 ± 10 Ma (Rodrigues et ai., 1992). Idades ligeiramente inferior**, (2859 ± 4 Ma), foram determinadas pelo método U-Pb em zircões de gnaisses do Complexo Xingu da região de Carajás e interpretadas por seus autores (Machado et ai. 1991) como datando a última migmatização sofrida por essas rochas.
A evolução arqueana da região de Carajás seria marcada por eventos tectono-metamórficos significativos (Araújo et ai. 1988; Olszewski et ai. 1989; Machado et ai., 1991). A formação da bacia de deposição do Grupo Grão Pará (de 2757 ± 2 Ma) estaria associada ao primeiro deles (2,77-2,73 Ga). Essa bacia teria uma natureza cisalhante em ambiente de ri ft continental. O complexo máfíco-ultramáfico de Luanga (2763 ± 6 Ma) seria contemporâneo a esse primeiro , evento. O segundo evento tectono-metamórfíco (2,58-2,50 Ga) provocaria a movimentação de blocos litosféricos. promovendo a deposição dos sedimentos do Grupo Rio Fresco. Esses eventos parecem ter atingido toda a Província de Carajás, como mostram as diversas datações de rochas arqueanas obtidas pelos métodos Rb-Sr em rocha total, K-Ar e 40Ar/í9Ar em minerais.
Numerosos corpos graníticos, interpretados ' como anorogênicos, espalham-se na Província de Carajás e nos seus arredores. A análise de zircões
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concordantes a sub-concordantes definiu uma estreita faixa de tempo em tomo de 1,88 Ga para essagranitogênese (Machado et ai., 1991). Idades obtidas pelo método Pb-Pb em rocha total dos granitos Velho Guilherme (Rodrigues et ai., 1992) e Redenção (Barbosa et ai., este Simpósio) suportam e ampliam a distribuição desses granitos.
QUESTÕES GEOCRONOLÓGICAS RELE-VANTES - O acervo de dados geocronológicos da Província Mineral de Carajás ajudou significa-tivamente no entendimento de sua evolução geológica. Entretanto, alguns pontos fundamenta-is, ainda precisam ser esclarecidos para chegar-se a um quadro evolutivo sintético da Província. Gostaríamos de enfatizar em seguida aqueles pontos onde a geocronologia tem uma contribui-ção importante a dar.
- Rochas de 3.2 Ga ou mais - Até o momento, apenas zireões com a idade ae 3,2 Ga foram identificados na Província de Carajás. Rochas dessa idade, que certamente participaram da fonte do Granito Musa e dos sedimentos do Grupo Rio Fresco na região de Rio Maria, ainda não foram identificadas, se é que ainda existem.
- Idade da crosta inferior - Dentre os granulitos da Província de Carajás, apenas aqueles da região de Cateté dispõem de dados geocronológicos interpretados como datando o protólito ígneo (3050 ±114 Ma, Pb-Pb em rocha total; Rodrigues et ai., 1992). A idade da granulítização é outra incógnita, embora Renne et ai. (1988) tenham proposto idades em tomo de 2,7 Ga para esse evento a partir de dados ^Ar^'Ar.
- Os complexos máficos e ultramâficos - Até então, o único complexo máfico-ultramáfico datado é o Complexo Luanga (2763 ± 6 Ma, U-Pb em zireões. Machado et ai., 1991). A correla-ção com aqueles aflorantes na região de Tucumã e Gradaús, e suas evoluções geológicas não estão bem estabelecidas.
- O Complexo Xingu - Com o avanço do conhecimento geológico da Província de Carajás, a medida que novas unidades são descritas e individualizadas, o domínio do Complexo Xingu tem sido reduzido. É o caso do Metatonalíto Arco Verde, dos granitóides arqueanos e dos greensto-ne belts da região de Rio Maria, anteriormente englobados no Complexo Xingu (Hirata et ai., 1982). Por outro lado, a correlação entre os
gnaisses das diferentes áreas da Província de Carajás, também tem sido prejudicada pela falta de estudos petrológicos, estruturais e geocronoló-gicos que, quando existem, são em geral pon-tuais. É o caso dos gnaisses da região de Carajás e dos granitóides da região de Rio Maria, que têm idades U-Pb similares, porém com interpre-tações distintas. Para os gnaisses, Machado et ai. (1991) propõem que a idade de 2,86 Ga represen-te a última migmattzação sofrida por essas rochas, enquanto que para os granitóides, Macambira St Lancelot (1991a) propõem a idade de 2,87 Ga para sua cristalização.
- Deformações, metamorfismos arqueanos e mineralizacões associadas - Os estudos recentes têm conseguido mostrar que vários depósitos de Cu, Zn e Au, como os das áreas Salobo, Pojuca, Igarapé Bahia (em Carajás) e Lagoa Seca (em Rio Maria) estão associados ao mrtamorfísmo e às zonas de cisalhamento (p. ex. DOCEGEO, 1988; Huhn, 1991; Lindenmayer & Fyfe, 1991). As idades do metamorfismo e da deformação são, . portanto, fundamentais para entender-se a formação e a remobilização das mineralizacões. Para a região de Carajás, Machado et ai. (1991) propuseram idades para os eventos tectono-metamórficos (2,77-2,73 Ga e 2,58-2,50 Ga) com base em datações em minerais pelo método U-Pb. Para o restante da província, não se dispõem de datações precisas para os eventos tectono-metamórficos. Contudo, os diversos dados ' geocronológicos obtidos através dos métodos Rb-Sr em rocha total, K-Ar e 40Ar/"Ar em minerais
indicam idades entre 2,5 e 2,75 Ga para esses eventos. As limitações desses sistemas cronomé-tricos e a falta de estudos estruturais sistemáticos, dificultam a individualização dos diferentes eventos arqueanos afetando a Província de Carajás como um todo.
• - O Grupo Rio Fresco - A idade das coberturas de plataforma englobadas pela DOCEGEO (1988) no Grupo Rio Fresco mostra-se como uma das grandes controvérsias da geologia da Província de Carajás. Sabe-se que esses sedimentos são cortados pelo Granito Central da Serra dos Carajás de 1,88 Ga (Machado et ai., 1991). Certos autores propõem-lhes uma idade arqueana (p. ex. Araújo et ai., 1988), enquanto que outros acreditam que o Grupo Rio Fresco depositou-se após o Ciclo Transamazônico, portanto, depois de 2,0 Ga (p. ex. DOCEGEO, 1988). Os únicos
dados geocronoiógicos disponíveis para o Grupo Rio Fresco são os apresentados por Bonhomme et ai. (1982), obtidos em frações finas de folhelhos pelo método K/Ar, que indicam idades entre 1,65 e 1,55 Ga, interpretadas por seus autores como a idade de cratonização da região.
- O Ciclo Transamazônico - Com base nos dados Rb-Sr em rocha total, K-Ar e 4 0Ar/"Ar em biotita, a região de Carajás tem sido interpretada como tendo sofrido a influência do Ciclo Transamazônico. Contudo, caso esse evento tenha realmente atingido essa região, ele deve ter sido de fraca intensidade, uma vez que o mesmo não foi detectado pelos métodos U-Pb em titanita e
monazita (Machado et ai., 1991) e "Ar/^Ar em anfibólio (Renne et ai., 1988). Na região de Rio Maria, métodos sensíveis, como o Rb-Sr em minerais e K-Ar em biotita, indicaram idades entre 1,8 e 2,0 Ga, como provável resultado do aporte calorífíco das intrusões dos granitos anorogénicos do Proterozóico. Por outro lado, os dados estruturais dessa região (Souza et ai., 1990) e a idade Rb-$r em minerais (2,58 ±0,05 Ga) do Granodioríto Cumaru na região de Gradaús (Lafon et ai., 1990), no sudoeste da Província de Carajás, não suportam a hipótese do Ciclo Transamazônico ter atingido a parte sul dessa província.
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