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IMAGENS DISTORCIDAS: O ÍNDIO E SUA REPRESENTAÇÃO SOCIAL NA ESCOLA

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IMAGENS DISTORCIDAS:

O ÍNDIO E SUA REPRESENTAÇÃO SOCIAL NA ESCOLA

Felipe Barbosa dos Santos (1); Cristiano de França Lima (1)

(1) Faculdade Escritor Osman da Costa Lins /Núcleo de Pesquisas Outras Economias felipe_jem@hotmail.com

(1)Núcleo de Pesquisa Outras Economias/Universidade Federal Fluminense cristiano.fralima@gmail.com

Resumo: O presente trabalho traz à tona a discussão sobre as representações sociais dos povos indígenas elaboradas na prática pedagógica. Partimos do pressuposto de que o cotidiano escolar, permeado pela colonialidade do saber, constitui-se enquanto espaço da (re)produção de uma percepção/visão subalternizada do índio. A escola é o lugar da construção simbólica do outro, do diferente, mediada por fatores pedagógicos. Com base nessa ideia, objetivamos compreender esses fatores que elaboram uma representação social do índio na atualidade,caracterizar a didática docente em seu contexto real e os mecanismos utilizados para a contextualização da imagem dos povos indígenas no âmbito escolar. A pesquisa tem um caráter exploratório e descritivo, enquadrando-se numa abordagem qualitativa. Trata-se de um estudo de caso, que implica, em uma primeira fase, a observação in loco e, na segunda fase, entrevistas. Como campo de pesquisa dispomos de duas escolas da rede municipal de ensino, situadas na cidade de Vitória de Santo Antão, na Zona da Mata pernambucana. Como pistas conclusivas, entre outras, apontamos que o sistema educacional deve criar mecanismos pedagógicos que avaliem as representações sociais desenvolvidas no âmbito educacional para que estas possam baseasse na realidade.

Palavras-chave: Representação Social, Índio, Fatores Pedagógicos, Escola.

(83) 3322.3222

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Introdução

O âmbito escolar é rodeado pela construção simbólica de diferentes realidades em contextos diversos, tais como: culturas, crenças e identidades distintas, formando a partir deste pressuposto representações sociais de determinados grupos ou indivíduos. As representações sociais buscam possibilitar a compreensão do conhecimento que é elaborado acerca dos valores, das condutas e da realidade de determinado objeto, povo ou pessoa, tornando familiar o desconhecido e disseminando-o socialmente através da interação que ocorre no universo consensual.

Este ensaio tem sua relevância por contribuir nos estudos e nas análises sobre as representações constituídas no ambiente educacional em relação ao índio. Entendemos que o contexto escolar desenvolve processos que viabilizam a prática de valores ligados a interesses de classes dominantes, que subalternizam grupos sociais, ignorando seus modos de vida, assim como suas maneiras de produzir conhecimento.

Diante do exposto, constatamos um desconhecimento e silenciamento da contribuição dos povos indígenas nas mais diversas esferas da formação brasileira (ALMEIDA, 1987). Por vezes, a presença indígena é referenciada numa perspectiva eurocêntrica.

Com a Lei 11.645/08 torna-se obrigatório o ensino da história e cultura indígena nas escolas brasileiras em nível fundamental e médio, almejando inteirar o povo brasileiro no tocante à historicidade que nos foi negada ao longo do tempo, causando lacunas em nossos pensamentos a respeito da diversidade que nos cerca.1

Estudos voltados às representações sociais dos povos indígenas possibilitam constatar a visão social estereotipada sobre os mesmos, revelando-os como sujeitos preguiçosos, incivilizados, carregados de condutas primitivas e representando-os como entraves ao desenvolvimento econômico, social e territorial. Diante dessa percepção, é pertinente observar que a escola, como formadora de opiniões, traz em sua prática pedagógica este olhar destorcido e errôneo frente às diversas culturas das classes populares, levando em seu processo pedagógico um imaginário excludente que subalterniza e discrimina a cultura do outro.

Torna-se central o estudo de como o índio, sua história e cultura são abordados em salas de aula. Neste sentido, buscamos identificar quais são as representações dos indígenas pedagogicamente elaboradas no cotidiano escolar e os fatores relacionados a esse processo.

1 Esta Lei altera a Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela Lei no 10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”.

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Metodologia

O processo metodológico adotado nesta pesquisa alinhou-se aos métodos descritivo e exploratório, enquadrando-se numa abordagem qualitativa, onde buscamos compreender os sujeitos de análise com base em sua realidade sobre a qual nos debruçamos. O método descritivo caracteriza-se por descrever e caracterizar o sujeito de estudo em seus processos situacionais. Como afirma Triviños (1987), esse tipo de estudo pretende descrever os fatos e fenômenos de determinada realidade.

O método exploratório distingue-se pela busca da familiarização com o contexto de pesquisa. Segundo Gil (2002), este tipo de pesquisa tem como finalidade, possibilitar maior familiaridade acerca do problema, com o objetivo de torná-lo mais visível ou a formular hipóteses. Compreendemos, dessa maneira, que a pesquisa exploratória pretende indicar métodos e técnicas com a intenção de produzir informações a respeito do campo de estudo.

A pesquisa empírica ocorreu em duas escolas da rede pública, da cidade de Vitória de Santo Antão, na Zona da mata pernambucana, realizou-se em três etapas. A primeira, desenvolvida em abril de 2016, ocupou-se das averiguações das representações do índio para os alunos do 4°Ano do Ensino Fundamental, em ambas escolas. Foi coletado, via desenhos, a imagens que estes alunos têm dos índios.2

A segunda etapa, empreendida naquele mês, consistiu em entrevistas semiestruturadas a duas docentes do 4º ano do ensino fundamental das escolas pesquisadas.

A observação do campo consistiu a terceira etapa. Esta aconteceu, especificamente, no dia 19 de abril de 2016 (dia do Índio), circunstância que forneceu oportunidades para observar e registrar o fenômeno educacional pesquisado nas duas escolas.

Algumas considerações sobre o conceito de representações sociais

A Teoria das Representações Sociais surge com base nos estudos do sociólogo Émilie Durkheim enquanto representações coletivas, fenômeno que não pode ser interpretado em termo singular, pois é produzido através da coletividade. Segundo Alexandre,

O sociólogo [Émilie Durkheim] argumentou que esses fenômenos coletivos não podem ser explicados em termos de indivíduo, pois ele não pode inventar uma língua ou uma religião. Esses fenômenos são produto de uma 2 A cada aluno foi entregue uma folha em branco, na qual, sem nenhuma descrição ou diálogo prévio, ele desenhou o que sabia ou imaginava ser um índio.

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comunidade, ou de um povo [...] Durkheim, ao propor tal divisão procurava dar conta de um todo, mas se fundamentava em uma concepção de que as regras que comandam a vida individual (representações individuais) não são as mesmas que regem a vida coletiva (representações coletivas). (2004, p.123)

A concepção das representações sociais é revisitada por Serge Moscovici, em 1961, com o objetivo de indicar fatos ou fenômenos múltiplos, analisados de forma complexa, sendo estas individuais e/ou coletivas. Este autor relaciona tais representações ao estudo das simbologias sociais que influenciam a construção do conhecimento partilhado e da própria cultura. Conforme o que aponta Mesquita (2009), para Moscovici, a representação é a interpretação de algo, de algum conceito ou até mesmo de uma pessoa. Partindo dessa mesma percepção, Jodelet (1985) denota que as representações sociais são modelos de conhecimento prático norteadas à comunicação e apreensão da realidade em todas as suas esferas (social, material, cultural etc.).

O conceito de representação social advém de um conjunto de explicações baseadas em crenças, diferentes ideias ou pensamentos sobre determinados grupos de pessoas. Esta noção é resultante das interações sociais, ligadas ao senso comum, que busca familiarizar algo que até então é desconhecido e classificá-lo a partir do ambiente que vive sem necessariamente ser um especialista no devido assunto. Segundo Morais et al,

A Teoria das Representações Sociais está intimamente relacionada com o estudo dos registros simbólicos sociais, tanto em nível macro quanto em micro de análise. Em outras palavras, diz respeito ao estudo das trocas simbólicas desenvolvidas nos ambientes sociais, nas relações interpessoais, influenciando na construção do conhecimento que é partilhado. (2014, p. 19)

Uma das finalidades das representações sociais é fazer conhecer algo inexplorado proporcionando a categorização, rotulação e/ou nomeações de ideias ou fatos específicos, que não foram vivenciados ou percebidos.

Tendo como ponto de partida o que tecemos, até o momento, e percebendo a escola em seu contexto histórico, a mesma está preponderantemente ligada às representações sociais. Como destaca Dotta (2006), a escola é um dos campos mais interessantes para o estudo das representações sociais, haja vista as influências de grupos sociais de diferentes posições, em maior ou menor grau, dentro da instituição escolar. A escola, enquanto espaço de socialização e sociabilização, cria em seu cotidiano representações da realidade através da interação entre os sujeitos que a constituem, formando noções sobre determinado grupo ou imagens que os

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fazem compreender o que é relatado.

Seguindo a perspectiva de Arroyo (2014), sobre o pensamento social e pedagógico, entendendo aquela como o espaço em que coletivamente se elaboram visão, compreensão, ideias e sentidos – que circulam na sociedade – nas interações sujeito e sujeito-instituição, a escola apresenta fatores geradores de representações sociais.

A escola, a colonialidade do Saber e a Representação Social: relações possíveis

Ao refletir sobre o processo histórico da colonização, observou-se que a Europa balizou, sobre seu domínio, formas que viabilizam a produção da subjetividade, de características culturais e de produções de conhecimentos peculiares. Nessa perspectiva, objetivava-se a conversão do outro, do diferente, para aceitação de uma nova identidade, como destaca Brandão:

O outro é um diferente e por isso atrai e aterroriza. É preciso domá-lo e, depois domar no espírito do dominador o seu fantasma: traduzi-lo, explicá-lo, ou seja, reduzi-lo, enquanto realidade viva, ou poder da realidade eficaz dos símbolos e valores de quem pode dizer quem são as pessoas e o que valem, umas diante das outras, umas através das outras (1986, p. 07).

Santos (2005) aborda o período colonial como uma época de violência física e epistemológica. Esse período resultou num apagamento da história dos povos colonizados e numa tentativa de “branqueamento” das suas culturas e organizações de vida e de pensamento. Com este mesmo raciocínio, Quijano (2005) aponta a repressão das formas de produção de conhecimento dos colonizados, assim como de seus padrões de produção de sentido, incluindo seu universo simbólico, suas formas de expressão e de objetivação da subjetividade como ratificação da maneira violenta em que se deu esse processo.

De acordo com Quijano (2010) tornou-se essencial a criação do outro como um ser inferior, contrário aos povos europeus. Isso porque a conquista ibérica da América produziu esse “outro” mediante a imposição de identidades raciais não europeias. “[…] a construção do imaginário da 'civilização' exigia necessariamente a produção de sua contraparte: o imaginário da 'barbárie'”. (CASTRO-GOMEZ, 2005, p. 175).

Partindo desse contexto histórico, França Lima e Almeida (2014) reiteram que “[a] escolaridade, enquanto a institucionalização do processo de aprendizagem, foi estruturada numa lógica de hierarquização do saber, ou seja, do privilégio de uma determinada forma de conhecimento e de tradução do mundo” (2014, p.2). A escola, conclui-se do que acima se

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afirma, é responsável pela construção das identidades formuladas durante o período colonial e disseminadas até os dias atuais, como bem descrevem Bourdieu e Passeron (1975), a violência da educação existe. E é inerente e inaceitável, visto que toda ação pedagógica, segundo esses autores, é uma forma de violência simbólica porquanto reproduz a cultura dominante, incluindo suas significações e convenções, impondo um modelo de socialização que favorece a reprodução da estrutura de relações de poder.

Entretanto, Arroyo assegura que os coletivos – indígenas, negros, mulheres entre outros marginalizados – “mostram que as concepções e práticas educativas pensadas para educá-los, civilizá-los estão condicionadas pelas formas de pensá-los, ou padrão de poder/saber de como foram pensados para serem subalternizados.” (2014, p. 11). França Lima e Almeida (2014) conjeturam que “”[n]ão basta apenas negar o outro como sujeito de saber, mas pensá-lo a partir de padrões e/ou parâmetros culturais/históricos balizados por uma visão sistêmica/dicotômica do mundo”. (2014, p. 12).

A construção simbólica do índio na sala de aula

A escola, na perspectiva desse trabalho, e partindo da análise de Beltrão (2000) é pautada pelo processo classificatório, pois, segundo a autora, “na instituição escolar, não há lugar para uma concepção de educação que trabalhe em função da produção de um outro tipo de subjetividade marcada pela singularidade, pela diferença, pela multiplicidade. ” (2000, p.15). Logo, poderemos concluir que a escola desempenha um trabalho de imposição e/ou dominação simbólica em relação aos sujeitos nela envolvidos.

Por muito tempo, a história dos povos indígenas foi retratada nas escolas de maneira errônea. A trajetória desses povos foi, por muitos séculos, abordada com base nos discursos dos “brancos” detentores do poder, de modo que os mesmos se colocavam como protagonistas do ato da colonização, sem considerar quem ali estava, como viviam sua cultura, suas crenças e seus costumes. Como atesta Almeida (2013), a historicidade do Brasil é descrita com base na chegada dos ditos colonizadores no continente americano, desconsiderando a história e a realidade dos povos autóctones que aqui habitavam.

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Para Almeida (1987), os índios ocupavam um lugar de passado e folclore nos materiais pedagógicos, desconsiderando as relações estabelecidas entre estes e os portugueses. Também é salutar a imagem dos povos indígenas abordada em segundo plano em relação aos heróis brancos.

Segundo Funari e Piñón (2014), “[a] escola, ao longo da história do Brasil, tem cristalizado determinadas imagens sobre os índios que “fazem a cabeça” dos cidadãos presentes e futuros. ” (2014, p. 08). Com isso, muitas vezes, acabam favorecendo a exclusão ou, pelo menos, o esmaecimento da presença indígena na sociedade e na cultura brasileira.

A reflexão a respeito dos povos indígenas nas salas de aula, por muitas vezes se deu apenas na data 19 de abril, data estabelecida pelo primeiro Congresso Indigenista Interamericano que ocorreu em abril de 1940. Neste foi programado aquela data para ser comemorada como o Dia do Índio e para o estudo dos problemas dos povos indígenas na atualidade pelas diferentes instituições escolares. O Brasil passou a adotar essa data em 1943, segundo Funari e Piñón (2014). Com o estabelecimento dessa data, a temática indígena, antes quase ausente, foi introduzida no calendário escolar brasileiro. Até hoje, a data é comemorada nas escolas com diversas atividades, chegando a ser estendida por uma semana, a Semana do Índio.

Com a sanção da Lei nº 11.645/08, há a necessidade de uma “(re)construção da representação social […] do índio, bem como de seus valores, crenças, costumes” (FRANÇA LIMA e ALMEIDA, 2014, p. 10). Segundo França Lima e Almeida, a referida legislação possibilita a “a desconstrução histórico-social da carga negativa” (2014, p. 10) conferida aos índios. Este processo de desconstrução está ligado a fatores pedagógicos estabelecidos pela sociedade vivenciados nas instituições de ensino.

Aqui se entende por fatores pedagógicos, os mecanismos e as ferramentas utilizadas para a formação dos conhecimentos acerca do que se pretende discutir, ultrapassando os conhecimentos escolarizados. Fatores estes que moldam a prática pedagógica em consonância ao seu posicionamento representativo, consequentemente (re)formulam os olhares de docentes e/ou discentes, e o ‘habitus’ que diz respeito às disposições incorporadas pelos sujeitos no decurso do processo de socialização (BOURDIEU,

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2002). Assim percebe-se que os fatores pedagógicos alinham-se com “o processo de constituição das identidades sociais no mundo contemporâneo” (SETTON, 2002, p.61).

Os fatores pedagógicos na construção das representações sociais: o estudo de caso

Quando falamos em fatores pedagógicos, referimo-nos aos processos relacionados com o ensinar e aprender elegidos por uma sociedade ou por um grupo social. Constatamos, com o estudo de caso, que estes fatores estão intrinsecamente relacionados à formação das representações sociais em relação aos povos indígenas na escola, em razão de que os mesmos estão presentes no cotidiano educacional e corroboram com a formação identitária de determinado objeto, povo e sujeito.

Um dos fatores pedagógicos que está associado às representações é o ‘currículo’ que contribui para a produção, transmissão e assimilação de processos construtivos de identidades, subjetividades e conhecimentos distintos. Este interligado a processos metodológicos, viabilizando a construção do conhecimento coletivo pode possibilitar a formação de concepções errôneas acerca do que deve ser trabalhado.

Há outros fatores pedagógicos interligados ao currículo, tais como as ‘formações iniciais e continuadas’, oferecidas aos professores(as) e a sujeitos em formação. Estas têm como objetivo a reflexão/ação das práticas docentes, tal como a construção dos conhecimentos dos educandos. As mesmas possibilitam produções das representações sociais do outro, uma vez que, são oferecidas/apresentadas métodos e concepções de como deverão ser aplicados e/ou vistos tais conteúdos em sala, que podem ser abordados tanto de maneira positiva quanto de maneira negativa, referenciando um contexto de negação ou subalternização. Isto acontece de acordo com as pedagogias oferecidas.

O ‘livro didático’ aqui também é identificado como fator pedagógico. Foram observadas três coleções utilizadas pelas docentes em salas de aula para o desenvolvimento das propostas pedagógicas a cerca da história e cultura indígena, as coleções Samba Lelê, Projeto Coopera e Girassol.3 Estas relatam sobre a história do índio a partir de um olhar

3 Livro Projeto Hoje é dia de aprender, coleção Lelê, autora: Rosy Helayne Sgroglia Machado, editora Rideel, ano 2015; Livro Projeto Coopera História, autore: Elian Alabi Lucci e Anselmo Lazaro Branco, editora Saraiva, ano 2014; Livro Novo Girassol Saberes e Fazeres do Campo, coleção Novo Girassol, autores: Tânia

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europeu, a começar pelas chegadas dos portugueses nas terras brasileiras, ressaltando a história dos índios de maneira exótica. Abordando os indígenas como indivíduos que são contribuintes na cultura – numa perspectiva reduzida da noção de cultura – e folclore brasileiro, e nada mais. Portanto, se entende que os livros didáticos estão ligados à representação de um imaginário social do índio voltado principalmente ao passado, silenciando por muitas vezes o contexto história social dos povos indígenas.

O ‘Projeto Político Pedagógico’ da instituição escolar também, aqui, é reconhecido como um fator pedagógico contribuinte para as representações sociais, sendo ele a identidade da escola, constata-se que tem como um dos focos a preparação dos educandos para viverem perante a sociedade. O mesmo utiliza um conjunto de métodos e projetos diversos para a formação humana no lócus escolar.

A representação social dos alunos sobre os povos indígenas

As imagens elaboradas pelos educandos das duas escolas pesquisadas consistem em toda bagagem de informações concebidas ao longo de sua formação educacional, os mesmos apresentam nos desenhos formulados, elementos que ainda caracterizam de forma homogênea a imagem do índio na contemporaneidade. Esses elementos consistem em afirmar que todos os povos indígenas vivem da mesma maneira, vivenciam a mesma cultura, crenças e hábitos.

Dentre tais elementos destacam-se a visão folclórica, como podemos perceber pelas figuras 1 e 2, afirmada pelo pensamento de que os povos indígenas vivem na mata em meio aos animais. A idealização de que toda população nativa reside em ocas feitas de barros e cobertas por palha. O estereotipo do índio que anda apenas de tanga para cobrir seus órgãos sexuais e cabelos cortados na altura da testa. A noção de que todo índio vive pintado e com penas na cabeça. A visão distorcida da alimentação dos povos indígenas onde se destacam apenas a caça e a pesca como forma presente no cotidiano dos nativos. A interpretação errônea de que todo índio usa arco e flecha.

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Esta constatação explicita bem o que Funari e Piñón (2014) afirmam sobre a instituição escolar que tem solidificado ao longo da história visões deturbadas que formam o conhecimento dos sujeitos, favorecendo a exclusão, a visão incorreta e a disseminação de representações erradas, voltadas ao passado.

Nesse contexto, Almeida (1987) explicita que essas representações dos povos indígenas são “colchas de retalhos”, ou seja, informações colhidas ao longo da história do Brasil contada por pessoas brancas, sem a completa certeza da realidade vivida pelos nativos, tornando o índio, um personagem presente apenas no universo folclórico do Brasil. Dessa maneira, corrobora a afirmação de Moscovici (1978) ao certificar que há uma diferença entre o que se sabe e o existente.

Durante o momento em que os educandos, de uma das escolas pesquisadas, estavam fazendo a atividade proposta na pesquisa (desenhar o que sabiam dos indígenas), surgiu um dialogo em que os mesmos questionavam-se mutualmente: como o índio falava; como as mulheres indígenas ocultavam seus seios; e o que cada índio comia. Os educandos procuravam responder os questionamentos feitos por outros colegas, afirmando que os índios

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falam batendo na boca, que as índias usam quengas de coco para cobrir os seios e comem frutas, animais, pois são como 'Tarzan'.4

Considerações...

Em relação ao processo de elaboração das representações sociais dos indígenas no cotidiano escolar, compreendemos a influência de fatores pedagógicos neste processo, constituída por meio da interação dos indivíduos nos ambientes sociais escolarizados.

Aqui, pretendemos expor alguns fatores pedagógicos encontrados, não desconsiderando a ideia de haver muitos outros. Constatamos que alguns fatores pedagógicos norteadores da prática educacional não são explorados/utilizados de forma crítica e transformadora. Consequentemente, provocam a reprodução e a manutenção das representações sociais negativas/subalternizadas sobre o outro, no nosso caso, dos povos indígenas. Um desses fatores refere-se à formação docente que na maioria das vezes centra-se em aspectos conteudistas, sem proporcionar novos saberes e visões sobre o que se ensina. As professoras não são preparadas e formadas para trabalhar tais temas em sala de aula, visto que, na grande maioria, sua formação acadêmica antecedeu à implementação da Lei 11.645/08. As formações continuadas podem suprir essa devassagem, mas não oferecem formações específicas sobre essa temática, prendendo-se apenas a conteúdos programados e à formas de transposição didática dos mesmos.

O sistema educacional deve criar mecanismos que possam avaliar as representações desenvolvidas no âmbito educacional para que estas possam baseasse na realidade; promover a qualificação das formações continuadas para o corpo docente de cada instituição; constatar se a prática dos projetos previstos pelo Projeto Político Pedagógico da escola está sendo vivenciado, e também reavaliar como as escolas estão implementando Lei 11.645/08.

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4 Tarzan é um personagem de animação produzido pela Disney em 1999. Trata-se de uma história de um menino que perdido pelos pais, passou a viver na selva, criado por macacos.

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