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ILHA DE SANTA CATARINA 2015

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BRUNA MARIA MARESCH

TERRA RARA

Dissertação apresentada ao Programa

de Pós-Graduação em Artes Visuais, da

Universidade do Estado de Santa

Catari-na como requisito parcial para obtenção

do título de Mestre em Artes Visuais.

Orientadora: Prof. Dra. Nara Milioli Tutida

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BRUNA MARIA MARESCH

TERRA RARA

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais, da

Universidade do Estado de Santa Catarina como requisito parcial para obtenção

do título de Mestre em Artes Visuais.

Banca Examinadora

Orientadora: _____________________________

Prof. Dra. Nara Beatriz Milioli Tutida

CEART/PPGAV

Membros:

_______________________________

Prof. Dra. Marta Lúcia Pereira Martins

CEART/PPGAV

_______________________________

Prof. Dra. Regina Melim

CEART/PPGAV

_______________________________

Prof. Dr. Cassio Eduardo Viana Hissa

IGC/UFMG

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos que contribuíram para a realização deste trabalho.

Minha mãe Sônia, meu pai Bruno, vó Nahir, vó Lili e vô Antônio, Caroline, minha

irmã.

Aos mestres, com carinho!

À Nara, de maneira especial, pelo carinho e dedicação como orientadora, pela

amizade e apoio nos momentos de alegria e também de dificuldade.

Ao Zé, professor desta universidade,

in memoriam

.

Ao Daniel, Jorge, Cassio, Marta e Regina, pelas valiosas contribuições!

Aos amigos do Grupo Fora, do Observatório-móvel e do Coletivo Geodésica

Cultural Itinerante.

Aos amigos da Cepagro, que trabalham na gestão do Camping do Parque

Es-tadual do Rio Vermelho, pela inspiração.

À Capes, pelo apoio sem o qual este trabalho não teria sido realizado.

À universidade Do Estado de Santa Catarina, todos seus funcionários e aos

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Resumo

Terra rara é um resgate da terra como elemento de pertencimento por meio de práticas de intervenção no espaço público realizadas durante o período do Mestrado na Universidade do Estado de Santa Catarina. Como rotas de fuga traçadas contra o asfalto, ou o racionalismo dominante nos padrões hegemônicos de construção das cidades, os textos apontam para o uso comum dos espaços por cada um de nós. Terra rara é uma “cartilhagem” em defesa do livre acesso aos bens de uso comum do povo, e da refun-cionalização para transformação de toda condição opressora do cotidiano. Terra rara é derrubar muros, pular cercas, quebrar no beco e descobrir que a cidade possui lugares entesourados para a conveniência de uns em detrimento de toda a comunidade. O valor da terra não pode ser reduzido ao preço de especulação no mercado, simplesmente porque a terra não nos pertence, nós é que pertencemos à terra. O direito a um ambiente equilibra-do envolve a percepção da terra como elemento indispensável para nossa sobrevivência. Este é o ponto de partida para a reconstrução da nossa

ci-dadania como florestania. Terra rara é uma iniciação ao cultivo de espaços

públicos, o que tanto quer dizer uma cultura de uso comum dos espaços como o cultivo em si, ou seja, a necessidade de assumir a responsabilidade pelo cultivo de cidades com mais terra, com mais verde, mais passarinhos, mais insetos e, consequentemente, melhor qualidade de vida para todos os seus habitantes.

palavras-chave: uso comum, espaço público, florestania

Rara; sobre a diferença entre o português e o espanhol, além do sen-tido originário do

vocábulo rarus, do

la-tim, que significa: “es -paçado, esparso, pouco denso, incomum”, no es-panhol utiliza-se a pa-lavra também como

sinônimo de “excelente,

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Resumen

Tierra rara es un rescate de la tierra como elemento de pertenencia mediante practicas de intervención en el espacio publico realizadas durante el período de Maestría en la Universidade do Estado de Santa Catarina. Como rutas de escape dibujadas contra el asfalto, o el racionalismo dominante en las normas hegemónicas de construcción de las ciudades, los textos apuntan para el uso común de los espacios por cada uno de nosotros. Tierra rara es una “cartillage” en defensa al libre acceso a los bienes de uso común del pueblo, y de la refuncionalización para transformación de toda condición opresiva en el día a día. Tierra rara es colocar paredes abajo, saltar vallas, romper en el beco e descubrir que la ciudad tiene lugares atesorados para la conveniencia de unos en detrimento de toda la comunidad. El valor de la tierra no puede reducirse al precio de especulación en el mercado, simple-mente porque la tierra no pertenece a nosostros, nosotros pertenecemos a la tierra. El derecho a un ambiente equilibrado implica la percepción de la tierra como elemento indispensable para nuestra supervivencia. Este es

el punto de partida para la reconstrucción de nuestra ciudadanía como flo -restanía. Tierra rara es una iniciación al cultivo de espacios publicos, o que tanto quiere decir una cultura de uso común de los espacios como el culti-vo en sí, es decir, la necesidad de asumir la responsabilidad por el culticulti-vo de ciudades con más tierra, con más verde, más pajaritos, más insectos y, consecuentemente, mejor calidad de vida para todos sus habitantes.

palabras-clave: uso común, espacio publico, florestanía

Rara; acerca de la diferencia entre el portu-gués y el español, además del sentido original de la palabra rarus, del latín,

que quiere decir: “esca -so, de baja densidad, in-sólito”, en el español se utiliza la palabra tambien

como sinónimo de “grande,

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 Passeio na Cachoeira da Vargem - Residência Artística no Camping do Rio Ver-melho, dezembro de 2014, p. 17;

Figura 2 Desenho: travessia / caminho / jornada=dia, p. 21;

Figura 3 Diário de Leitura: CASTAÑEDA, Carlos. Viagem à Ixtlan. Rio de Janeiro: Nova Era, 1997, p. 12, p. 22;

Figura 4 Avenida Beira Mar Norte em obras de ampliação das pistas, registro da Aula Ab-erta na Ponta do Coral em 26 de março de 2015, p. 26-27;

Figura 5 Rodovia SC 403, em obras, registro de 27 de março de 2015, p. 28;

Figura 6 Giovanbattista Piranesi: Vista de Sepulcro em Porte Maggiore, Roma. Imagem di-sponível em: http://towermax.deviantart.com/art/Piranesi-roman-ruins-COPY-188544873, p. 30;

Figuras 7-12 Robert Smithson: Guide to the monuments of Passaic. Imagens disponíveis em: http://monoskop.org/images/8/85/Smithson_Robert_1967_1979_The_Monuments_of_Passaic. pdf, p. 32-33.

Figuras 13-16 Buraco, proposição da Tati Rosa durante o curso de escultura social no Rio

Ver-melho com Hermann Pollmann em dezembro de 2013 a convite do Zé Kinceler. Fotografias de

Péricles Gandi, p. 35;

Figura 17 “Eles nos enterraram mas não sabiam que éramos sementes”, pixo na Escola de Ensino Básio do Muquem, realizada durante a semana se residência artística no Rio Vermelho, em dezembro de 2014, p. 35;

Figura 18 Praia do Moçambique, registro em polaroid feito pela Nara em julho de 2014. p. 36;

Figuras 19-22 Registro fotográfico de caderno de processo, p. 36-39;

Figura 23 Registro da capa do jornal Diário Catarinense de 1 de outubro de 2014, p. 42;

Figura 24 Em terra onde o asfalto é lei, galinha cisca na brita - registro fotográfico de visita a

pedreira em Joaçaba, p. 44;

Figuras 25-28 AQUI AGORA ISSO Experiência/ laboratório / oficina de performance com Silmar

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Figura 29 Registro da Aula Aberta na Ponta do Coral em 26 de março de 2015, p. 51;

Figura 30 Fazendo botânica no asfalto, registro fotográfico de 2013, p. 52-53; Figura 31 Grupo Fora no Bicho-pau, janeiro 2014, p. 54;

Figuras 32-34 Adote um jardim: intervenção no parque do Vassourão, 2012, p. 55;

Figuras 35-37 Coleta de canteiros flutuantes, p. 56;

Figura 38 Proteção de daninhas na Praça João di Bernardi, abril de 2014, p. 56;

Figuras 39-41 Registros da Exposição Mar que falta... no Museu Vitor Meirelles, dezembro de 2012, p. 57;

Figuras 42-46 Registros da Exposição Bicho Banco, na Funarte em Brasília, fevereiro de 2014, p. 58;

Figura 47 Percevejo na Praça João di Bernardi, p. 59;

Figura 48-51 Deslocamento da Mariposa até a Udesc em abril de 2015, p. 59;

Figura 52 Registro Publicação Recibo n. 10 Observatório-móvel de paisagem, p. 60;

Figura 53-56 Registros de worklab no Ribeirão da Ilha em maio de 2014, p. 61;

Figuras 57-66 Registros Geodésica Cultural Itinerante no Rio Vermelho e Curso de Escultura So-cial com Hermann Pollmann, fotos de Péricles Gandi, dezembro 2013, p. 62-63;

Figuras 67-69 Registros da leitura de Guia aos monumentos de Passaic, de Smithson, durante a Residência Artística no Camping do Rio Vermelho, dezembro de 2014, p. 64;

Figuras 70-74 Aula e coleta de palha no Camping do Rio Vermelho para iniciar trabalho de cuida-do de área residual no campus da Udesc, junho de 2015, p. 65;

Figura 75 Registro de manchete do Jornal Hora de Santa Catarina de 1 de abril de 2015, p. 66;

Figuras 76-84 Registros da Escola de Ensino Básico do Muquem entre dezembro de 2014 e junho de 2015, p. 68-72;

Figura 85 7000 Carvalhos, de Joseph Beuys, p. 81;

Figuras 86-107 Revolução da palha em Iraquara, p. 82-85;

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Manual de Leitura

1. Do mato no texto

Na leitura desta dissertação, não se guie pelos sinais gráficos usuais de

uma pesquisa acadêmica.

Às vezes tive que interromper o texto por conta de um pensamento mui-to forte. A necessidade de interrupções bruscas é resultado de um desejo, que é estabelecer outros ritmos de leitura em que alternam-se vida e texto, relato e teoria.

Busquei uma diagramação que pudesse indicar estas transições. Você en-contrará espaços nas margens que foram ocupados de anotações, ima-gens e pensamentos. Aproprie-se deste espaço também!

2. Da leitura como caminhada

Às vezes reencontramos, no meio do caminho, alguma espécie de inço que já vimos antes. Não se engane. É isso mesmo.

3. Cada tropeço, uma solução.

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SUMÁRIO

1 TERRA RARA É... 19

2 A CIDADE É OU NÃO É A ILUSÃO DE QUE A TERRA NÃO EXISTE? ... 25

3 A LEI DO DESTERRO É SOBREVIVER À CIDADE! ... 40

4 FAZENDO BOTÂNICA NO ASFALTO ... 52

5 DOSSIÊ ESCOLA DE ENSINO BÁSICO DO MUQUEM ... 66

6 PLANTAR FLORESTAS NO DESERTO ... 78

7 JARDIM FECHADO (CONSIDERAÇÕES) ... 89

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TERRA

NÃO

TEM

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TERRA RARA É...

Terra rara é uma pesquisa como mato rachando o asfalto.

É experiência de pisar na terra, tocar o chão, acariciar a matéria que dá sustentação às coisas todas. É andar muito nos arredores do lugar onde se vive. Algo muito simples, na verdade, e ao alcance de todo e qualquer habitante da cidade.

É certo que cada um, no seu dia-a-dia, inventa rotas, traça percursos, e no deslocamento se detem sobre certos pontos da cidade. Além dos lugares funcionais de uma cidade, existem espaços outros que abrigam sonhos,

memórias e desejos. Recantos que se reconfiguram entre o segredo e a ex

-periência do convívio. Onde podemos ficar sozinhos, marcar um encontro

às escondidas, ou encontrar vistas situadas para horizontes inalcançáveis,

em que nos deixamos ficar, como observadores distantes de uma realidade

que sempre escapa.

A natureza da paisagem é dinâmica e multidimensional, sensorial e resul-tado da interação com os sentidos. É construção de pensamento e cruza-mento das linhas traçadas por cada praticante do espaço.

Terra rara é tanto relato como articulação de teoria com o conhecimento tático, aquele que adquirimos quando nos deslocamos pela cidade e apren-demos a nos orientar e tirar melhor proveito das situações do dia-a-dia.

Encontrar uma terra rara é experiência à disposição de todo aquele que começa à procurá-las. É indo de um lugar ao outro que chegamos a reconhecê-las, elas surgem no meio do caminho como frutos de travessias.

Uma pausa para um descanso ou um lanche é o melhor pretexto, para

encontrar um lugar que nos favoreça, onde podemos interromper o fluxo

normal dos pensamentos para se deixar absorver por um outro estado de percepção, mais atento às sutilezas do ambiente ao redor e às mensagens que podemos receber.

Uma terra rara é como um portal entre a realidade comum que compar-tilhamos e um instante no qual é possível parar o mundo. Refiro-me não

apenas à algazarra da cidade, como também à urgência de todas as coisas que nos impedem de estar inteiramente de corpo e alma presentes no local.

Parar o mundo é o primeiro passo para “chegar a ver”.

travessia / caminho / jornada=dia

PORTAL terra rara; realidade territorial desconhecida;

zona indefinida; lugar

perdido, marginal,

não-fixo. Processos em expansão

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É possível passar pelas terras raras sem deixar qualquer marca ou vestígio, o que é sinal de muito respeito pelo lugar, ou então demarcá-las, para reen-contrá-las, tempo depois, na hora da dor ou quando tudo parecer perdido.

A terra rara se situa entre paradoxos: ser artista e ser universitária; ser do

interior e vir morar na capital (a ilha de Santa Catarina), habitar uma ci-dade-ilha e querer viver algo além disso: ser ilha.

Quando sou a ilha, sinto que encontro um lugar para espacializar os pensamentos, converso com o vento e espero a resposta dos pássaros

para confirmar as conclusões. Sou a ilha para transcendê-la: ao me re -descobrir como ser-ilha, volta e meia viro os olhos para o continente, como se lá fosse diferente viver. Carrego a ilha comigo aonde quer que eu ande, escrevo, torno a ler e acho estranho, pois se carrego a ilha, como carrego o corpo, sei que a minha condição é passageira e ao mesmo tempo sempre presente, em qualquer lugar.

As terras raras encontram-se em algum ponto entre o lugar comum e o lu-gar perdido, lá onde sempre se passa mas nunca se presta atenção até que de repente o terreno é cercado e posto à venda, aí é que se dá conta

do sentido oculto da palavra rara, que é qualidade específica de ser algo

extraordinário e incomum; a expressão beleza rara aponta para esta ideia.

Quando se diz terra rara o que logo se pensa é que está faltando terra pra tanta gente, e que já não tem pedaço de terra sem dono. Terra rara pra mim

quer dizer outra coisa, significa ressaltar uma qualidade, daquilo que é es -pecial. A terra não nos pertence, nós é que pertencemos a ela.

Às vezes sou ilha, às vezes sou colona. Tem um pouco de colono em cada um que foi morar longe da terra em que nasceu, mas no interior de Santa

Artista; trabalhador

autônomo, flexível, móvel,

não especializado capaz de se adaptar a múltiplas situações.

ilha; berçário para uto-pias, bem entendido que toda utopia é sinal de inconformação.

colono; é aquele que tá sempre falando das coisas lá da sua terra

Diário de leitura:

CASTAÑEDA, Carlos. Viagem

à Ixtlan. Rio de Janeiro:

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Catarina falar em ser colono, às vezes pode soar até pejorativo. Por outro lado, grande é a riqueza em aprender, como o colono, a amar a terra que lhe recebe.

Quem vem de fora é bom aprender a chegar de mansinho, atento aos sinais e receptivo aos conhecimentos profundos do lugar, que aos poucos se revelam para aquele que procura estar em íntima relação com a terra em que vive.

No lugar novo, é necessário se reorientar, o passado não serve, de acor-do com o geógrafo Milton Santos em A Natureza acor-do Espaço. Segunacor-do ele, os migrantes precisam criar uma terceira via de entendimento das cidades (2006, p. 223), no qual o entorno vivido se transforma em matriz de um pro-cesso intelectual em que o migrante se refaz continuamente para se adap-tar à nova realidade que o cerca. Territorialidade e cultura mudam, mudan-do o homem.

O colono é definido pelo dicionário Michaelis como o indivíduo que se esta -belece em um terreno inculto para desbravá-lo e cultivá-lo.

Tem um pouco de desbravar e cultivar no encontro com as terras raras.

Des-bravar para escapar das geografias pré-estabelecidas, que definem como

deve ser o uso e ocupação das cidades, e cultivar, para fundar espaciali-dades emancipadoras.

E o que se está a iniciar é uma cultura de uso temporário do territórios

para fins comuns.

Trata-se de viver o entorno como lugar de troca e ao mesmo tempo, gera-dor de processos intelectuais, subjetivos, a todo momento atualizados pelas

sensações apreendidas: minha ação modifica e é modificada pelo mundo.

O entorno nos responde a todo momento através das mais diversas formas de manifestações de espontaneidade e criatividade, algumas vezes estas

ações tendem para a cooperação, em outras, para o conflito. No embate entre essas duas polaridades a todo momento nos redefinimos como ser

humano. Percebe-se que a cultura é herança, mas também um reapren-dizado constante das relações entre o indivíduo e o ambiente.

De acordo com o professor e geógrafo Cássio Eduardo Viana Hissa, no tex-to Ambiente e vida nas cidades, há mais vida complexa no ambiente do que nossa capacidade de estruturar conceitos pelos caminhos disciplinares da ciência moderna.

O conceito de ambiente, no seu ponto de vista, opera sobre duas condições,

como algo exterior e fora do eu, e como reflexo de homens e mulheres que

se transformam em suas (re)criações. O ambiente é como um caleidoscópio de espelhos, que a todos toca formando uma rede de relações caóticas onde se alternam o encontro e o estranhamento.

Toda cidade é feita de várias cidades, onde às vezes nos reconhecemos, às vezes, não.

Cultura; forma de comu-nicação do indivíduo e do grupo com o universo; a palavra cultivo é regis-trada como raiz semânti-ca da palavra cultura. O termo cultura deriva do latim colere, que quer dizer cultivo. Inicial-mente, portanto, quer diz-er o cultivo e o cuida-do com a terra, de onde decorre a palavra agritura. Como cultivo, a cul-tura designa a ação que conduz à plena realização das potencialidades de

algo ou alguém: fazer bro

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24

Encontrar uma terra rara é como encontrar um lugar onde nos reconhece-mos, algo como um mocó.

O mocó tem vocação de esconderijo: um espaço fora da vista e opaco, que escapa à racionalidade luminosa dos espaços planejados e regulares da cidade.

Um mocó é um lugar de encontro para iniciados, que costuma se localizar em pedaços da cidade não-reconhecida, aquela cidade feita de sertões, subterrâneos e ruínas, que podem ou não coincidir com a realidade da ex-clusão e da marginalidade.

Terra rara é uma cartilhagem para irrigar a cabeça de ideias subterrâneas.

É na batalha diária para que o sonho vença o curso dos acontecimentos que aprende-se os truques, macetes, malandragens, artes e artimanhas para livrar-se das situações opressoras no cotidiano das cidades.

Aprender a quebrar no beco sem cair, quando a cisma insiste que é necessário saber se defender quando alguém mete pau em você. E saber continuar o caminho, por satisfação, vontade e alegria, que é a melhor mandinga con-tra mágoa passada.

Caminhar por terras desconhecidas nos surpreende e nos transforma. É sempre bom lembrar que não é necessário ir muito longe para se experi-mentar uma viagem iniciática, elas estão a nossa espera, nas esquinas e encruzilhadas da cidade onde moramos.

Vamosimbora!

uma cartilhagem na margem da página!

Olha a mandinga aí: Para livrar-se do mal, use a

malícia _ Já dizia o

Mestre Canjiquinha!

mocó; mocozar-se; ato ou

hábito de inflitrar-se em

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a cidade é

ou não é

a ilusão

de que a

terra

não

existe?

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26

arquivo dos pés

A vida nas cidades atravessa momentos de crise. Talvez porque a humanidade tenha passado tempo demais entre o

espaço fechado de quatro paredes, admirando-se consigo mesmo e com o funcionamento mecânico do relógio na parede. Hoje o relógio parou de funcionar, o espelho embaçou e um amigo

distante me convida a nos banharmos nas águas do mar.

Nadando com as medudas, as águas trazem ao nosso encontro sacos plásticos e resíduos de poliestireno (as grandes maravilhas do século passado).

Sinto tristeza pelo

descontrole dos oceanos, e tantas ilhas de sonhos desperdiçados vagando entre pilhas de pneus e outros restos de embarcações.

O tempo está quente, logo se está seco de novo e sentimos calor. Não há banho que refresque! [...]

Passamos os dias seguintes

andando nas dunas.

Não havia nada perto o

suficiente para atrapalhar a expansão dos sonhos no

vazio da paisagem. Desde a Lagoa da Conceição

até a praia da Joaquina

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27

Tudo estava presente,

reunido no infinito de

areia que pode compor um deserto. Sob o céu de

estrelas, também não havia de quem se esconder. Todo o universo acompanhava nossos passos e nos sentíamos felizes como crianças.

No sétimo dia meu amigo se levantou ao amanhecer do dia e avisou que

estava na hora de partir. Abandonamos o deserto e eu o acompanhei até o

terminal de ônibus. Depois desse dia, por muito tempo

fiquei andando pela ilha.

[...]

Desde então, meu corpo tem fome de paisagem, sente saudades dos caminhos

diversos que percorri, de ruas de areia a rodovias de asfalto, das avenidas do centro da cidade aos caminhos que levam até o interior, de sertão em

sertão minha alma ficou

vazia, leve de tanto andar.

_É preciso ter o coração mais leve que a pena._

finalmente compreendi. Não existe carga mais

pesada que um coração

confuso assim como não há nada que pese sobre os ombros quando se possui entendimento.

Talvez a estadia na ilha não passe de uma tentativa

de fuga: o lento e

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28

O asfalto é uma mistura quente com propriedades isolantes e adesivas utilizado há muito tempo, desde a antiga Babilônia e também o Império Romano, com a diferença de que o asfalto, então, era produzido a partir de piche retirado de lagos pastosos. A partir de 1909, com a expansão da indústria petrolífera, o petróleo foi incorporado na produção do asfalto, tornando-se o principal meio de pavimentação de estradas.

A cultura do asfalto em que vivemos nasce da inserção de um novo hábito: andar de carro, e um novo modo de experimentar a paisagem: pegar a estrada em busca de outros lugares, muitas vezes espaços idealizados de natureza intocada ou protegida.

Quando os primeiros automóveis chegaram em Santa Catarina, iniciou-se também por aqui o hábito de procurar no litoral redutos balneários que pudessem oferecer momentos de tranquilidade e prazer. Eu também fui criada

nesta cultura, no fim de semana era comum passear de carro com meu pai à

procura de novos lugares para experimentar. Estes redutos, no início eram pouco frequentados, em pouco tempo foram crescendo e assumindo sua vocação balneária. Atualmente muitas praias ultrapassaram o limite do sustentável, e este fato decorre não apenas da especulação imobiliária como também de uma cultura do asfalto que privilegia a circulação por meio de automóveis privados.

A cultura do asfalto é uma cultura impermeabilizante e isolante.

Toda vez que uma daninha fura o asfalto encontra-se aí o germe de uma revolução, que consiste em abrir buracos para que a terra possa voltar a respirar.

O mundo-máquina e o homem do mundo

Quando se procura a origem etimológica da palavra máquina, encontramos a raiz grega mekhos que significa “meio, expediente, remédio”. Mundo-máquina é um modo de ver o mundo como meio e a natureza como instrumento. Esta visão de mundo é a que predomina na construção da cidade hoje, a cidade-asfalto.

O homem do mundo é a descrição de um personagem anônimo, um desenhista que o poeta Baudelaire conhece na rua. O homem não gosta de ser chamado de artista, que é o especialista subordinado a sua palheta de cores, e que pouco sabe do mundo moral e político. Prefere ser chamado homem do mundo, ou seja, alguém que conhece o mundo e seus segredos e que contemplando com prazer a multidão, mistura-se mentalmente a todos os pensamentos que se agitam a sua volta.

o apaixonado pela vida universal entra na multidão como se isso lhe parecesse um reservatório de eletricidade. Pode-se igualmente compará-lo a um espelho tão imenso quanto esta multidão; a um caleidoscópio dotado de consciência, que, a cada

a cultura do asfalto in-vade o litoral catarinense

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um de seus movimentos, representa a vida múltipla e o encontro cambiante de todos os elementos da vida. É um eu insaciável do não-eu, que a cada instante o revela e o exprime em imagens mais vivas do que a própria vida, sempre instável e fugidia. (BAUDELAIRE, Charles, 2002, p. 21)

O homem do mundo é o amador, o apaixonado, o insaciável do não-eu. O mundo não é apenas meio, mas algo complementar e visceral, múltiplo e cambiante. O prazer do homem do mundo é estar fora de casa e, no entanto, sentir-se em casa em qualquer lugar. Esse pequeno prazer é experimentado por inúmeras pessoas todos os dias, ao atravessar as cidades em que vivem

como personagens anônimos. Através dos relatos ficamos conhecendo alguns

destes personagens. Os relatos organizam o espaço percorrido para indicar possibilidades de derivas.

Certos percursos de espaço tornam-se míticos e nos iniciam na arte de ver as coisas de outro modo, por isso são lembrados e novamente compartilhados. Para mim, um destes relatos é o Guia para os monumentos de Passaic realizado por Robert Smithson. O texto narra um passeio de ônibus até uma auto-estrada em construção em Nova Jersey, lugar onde o artista passou a

infância, a fim de encontrar os novos monumentos. Smithson nasceu no centro

da cultura do asfalto (e de fato, o asfalto, enquanto material simbólico, reaparece frequentemente nos trabalhos de Smithson).

O fato de ser comum no Brasil a importação de modelos estadunidenses de comportamento, me levou a procurar no texto temas que apontam para uma outra forma de olhar para o asfalto. É comum, no desenvolvimento brasileiro, momentos em que projetos de abertura de estradas dominam a cena política, procurando nos convencer das conveniências das obras faraônicas de infra-estrutura. A transamazônica, até hoje nos assombra, enquanto símbolo desta forma de gestão. É sabido que o projeto de implantação de linhas ferroviárias no Brasil foi sabotado pela empresa automobilística. Trata-se de uma deliberada opção política pela construção de paisagens com alto grau de entropia, isto é, que demandam grande consumo de energia e que estão sempre se deteriorando.

Em Passaic, o artista apresenta os detritos industriais da estrada em construção como ruínas capazes de alcançar a imortalidade do monumento. _ O que se pode encontrar em Passaic que não se pode encontrar em Paris, Londres ou Roma? _ O artista brinca com a ideia de passeio turístico, referindo-se à cultura de consumo de paisagens, proporcionada pela indústria do turismo e do entretenimento, que direciona o turista sempre às mesmas paisagens.

Passaic é lugar que não costuma ser visitado muito menos lembrado como opção de roteiros turísticos. É um lugar em obras, que abriga monumentos efêmeros e que desaparecerão assim que a estrada estiver pronta. A paisagem industrial visitada por Smithson é um conjunto de lugares demarcados pela onda erosiva da indústria. Ir à Passaic, e cada leitura do texto é uma visita, é como dar uma espiada por trás das cortinas, para ver de que matéria são feitas

LER UM TEXTO: UMA VIAGEM

INICIÁTICA

Através das viagens

iniciáticas somos apresen-tados a novas formas de se posicionar no mundo

Paisagem; de acordo com

Javier Maderuelo toda

paisagem é artifício mediador de uma relação estética que se consuma no ato do homem em contato com a natureza;É uma elaboração intelectual que realizamos através de certos fenômenos da

cultura. (MADERUELO,

(30)

30

freqüentadores de

ruínas; habitantes da

de-composição de sentido náufrago solitário póstumo

as engrenagens que movem as cidades.

Quando Smithson afirma, que os edifícios erguem-se como ruínas antes mesmo de serem construídos, o artista retoma a tradição filosófica que encontra nas

ruínas uma crítica ao progresso.

As ruínas reaparecem frequentemente na modernidade como alegorias para o desperdício, a decadência ou a catástrofe associadas ao projeto urbanizador. Alberto Ruiz de Samaniego [De Ruínas: Piranesi, Benjamin e Smithson] conta que foi Piranesi que iniciou entre os modernos o hábito de freqüentar ruínas, o artista não apenas visitava, como costumava pernoitar nas ruínas de Roma. De Piranesi até hoje, diversas gerações de freqüentadores de ruínas se sucedem: Baudelaire, Walter Benjamin, Robert Smithson, entre outros, buscavam nas ruínas alegorias para mundos em transformação. Charles Baudelaire, por exemplo, foi contemporâneo das reformas de Paris durante o governo do Barão de Haussmann. Assistiu a destruição de bairros inteiros para a realização do

alargamento das vias e concepção de um novo modelo de cidade que influenciou

a modernização de muitas outras metrópoles.

Na obra filosófica de Walter Benjamin a ruína é apresentada como emblema

da transitoriedade da cultura capitalista e recusa à ideologia do progresso. As imagens das ruínas são evocadas na descrição do anjo na nona tese sobre o conceito da história:

Onde nós vemos uma cadeia de acontecimentos, ele (o anjo da história) vê uma catástrofe única, que acumula incansavelmente ruína sobre ruína e as arremessa a seus pés. Ele gostaria de deter-se para acordar os mortos e juntar os fragmentos. Mas uma tempestade sopra do paraíso e prende-se em suas asas com tanta força que o anjo não pode mais fechá-las. Essa tempestade o impele irresistivelmente para o futuro, ao qual ele volta as costas, enquanto o amontoado de ruínas diante dele cresce até o céu. É a essa tempestade que chamamos progresso. (BENJAMIN, Walter, 2012, p. 246)

Para o materialista histórico, não há cadeia de acontecimentos, em que o

progresso é eleito como norma histórica e o fim inevitável de um processo

inevitável de desenvolvimento técnico, mas uma única catástrofe, que acumula ruína sobre ruína. Os bens que consideramos como culturais, são os despojos arrancados pelos vencedores. Benjamin critica uma visão linear da história,

como se o presente fosse o fim inevitável de uma linha de trem que vem lá da

antiguidade. Para Benjamin o trem da história é uma máquina desgovernada

que avança em uma corrida acelerada. O pensador radical desconfia de todo discurso que afirma a inexorabilidade das coisas, e procura, em cada instante,

ruínas; restos, destroços, vestígios, decadência,

degradação, mortos que falam, memórias, onde as coisas entram em estado de deterioração.

Giovanbattista Piranesi: Vista de Sepulcro em Porte Maggiore, Roma. Imagem di

-sponível em: http://tow

-ermax.deviantart.com/art/ Piranesi-roman-ruins-CO

-PY-188544873

“nunca houve um documento

de cultura que não fosse simultaneamente documento de barbárie.” (Walter

Benjamin: Sobre o conceito da história. In: Obras

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31

liberar a chama revolucionária capaz de redimir o passado.

A leitura de Benjamin pode ser associada ao significado das ruínas em A Condição Humana, de Hannah Arendt. De acordo com a filósofa, a atitude do

consumo, característica da sociedade capitalista, condena à ruína tudo em que toca. Em última instância, a emergência de uma sociedade de consumidores comporta o grave risco de que nenhum objeto do mundo esteja à salvo de ser destruído e aniquilado por meio do consumo. Esta sensação corresponde àquilo que Smithson encontra no conceito de entropia, que permeia todo seu trabalho.

O outro lugar

Durante a década de 60 diversos artistas irão em busca de um outro lugar, fora dos limites da cidade onde realizar suas práticas artísticas. É comum artistas que buscam os desertos, bem como paisagens industriais arruinadas. De acordo com

Miwon Kwon é uma busca condizente com um momento histórico identificado

com a era industrial e a expansão dos subúrbios. A desmaterialização da arte em práticas conceituais e a procura de outros espaços para a experiência artística indicam o desencantamento com o projeto modernizador.

Alguns artistas, como o próprio Smithson, irão em busca dos desertos. Ir ao deserto é fazer emergir um estado consciencial onde o lodo da cidade necessariamente deve evaporar, conforme ele se refere no texto que motiva o título deste capítulo “Uma sedimentação da mente: projetos da terra”.

Passaic pode ser definida como uma paisagem entrópica, uma espécie de

paisagem que se tornou muito comum e onde encontram-se reunidos elementos que tornam visíveis os impactos do crescimento das cidades. Ao visitar e registrar estes lugares, os artistas realizam uma crítica à cultura, transformando realidades físicas em vetores discursivos em que se questiona a representação na natureza e a crise ambiental.

Ao se relacionar com estas paisagens, Smithson desenvolve uma dialética de trabalho que corresponde à oposição entre site e nonsite. O site é onde confronta-se com a duração real das coisas e as confronta-sensações imediatas transmitidas pelo entorno, é o lugar que está sempre se evadindo, na periferia de um sistema (SMITHSON, Robert, 2009, p. 284).

O nonsite é um recurso que nasce do mapeamento dos primeiros sites que

Smithson costumava frequentar. Durante o processo, conta que foi ficando cada

vez mais interessado nos aspectos abstratos do mapeamento, tal procedimento foi adotado não para simplesmente transferir dados a respeito de um site para um outro site, mas para acumular exterior e interior, as fronteiras entre o que é e o que não é.

O non-site direciona para o centro do sistema, de certa forma cria uma

cristalização, uma ficção em que o trabalho deixa de acontecer no site para se encontrar em uma sala onde fisicamente somos confrontados com nossas

entropia; consciência de um estado crítico, isto é, de que nos encontramos presos ao mecanismo de nossa auto-destruição [e de que precisamos, a todo custo, agir]. A sociedade capitalista é um sistema altamente entrópico. A produção de desertos é

o estágio final deste

processo civilizatório.

Monumentos entrópicos de robert smithson

tipo A: memoriais de sig

-nificados exaustos ou aqui -lo que o homem da rua per-cebe como monumento

tipo b: certos prédios an

-teriores à queda de wall

street, o antigo subúrbio

tipo c: pós-segunda guerra

mundial, ou o novo subúr-bio

tipo d: lugares em desu -so, como piscinas vazias, estacionamentos ou terras degradadas

tipo e: ruínas ao revés, a

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próprias limitações. E no movimento entre o dentro e o fora da galeria o artista denuncia a moldura institucional na qual está inserido.

Para mim, o mundo é um museu. A fotografia

torna a natureza obsoleta. O meu pensamento em termos de site e non-site me faz sentir que não há mais necessidade de se referir à natureza. Estou completamente absorvido em fazer arte e isto é principalmente um ato de observação , uma atividade mental que aponta diretamente para sites distintos. Não estou interessado em apresentar o meio pelo meio [medium for its own sake]. Acho que essa é uma fraqueza de vários trabalhos contemporâneos. (SMITHSON, Robert, 2009, p. 280]

Em Guide to the monuments of Passaic, as analogias entre a paisagem, a

fotografia e o filme são freqüentes, Smithson faz diversas referências ao ato fotográfico e brinca com as palavras: ele encontra-se em uma imagem

em movimento (moving-picture) que não pode capturar (that I couldn’t quite picture), o texto procura dar conta de algo que sempre escapa à capacidade

de registro da sua máquina fotográfica.

a paisagem não era uma paisagem, mas “um tipo particular de heliotipia” (Nabokov), um tipo de cartão-postal auto-destrutivo de um mundo de imortalidade fracassada e opressiva grandeza. Eu estive andando em uma imagem em movimento que eu não podia exatamente capturar, mas enquanto

eu ficava perplexo, eu vi um sinal verde que

explicava tudo: “Seus impostos para estradas em trabalho (...)” Aquele panorama zero parecia conter ruínas ao revés, isto é, todas as construções que seriam eventualmente construídas. Isto é o oposto da “ruína romântica” porque as coisas não decaem como ruínas depois que são construídas, mas erguem-se como ruínas antes de serem construídas. Este mise-en-scene anti-romântico sugere a ideia desacreditada de tempo e muitas outras coisas “fora de data”. Mas os subúrbios existem sem um passado racional e sem “grandes eventos”da história. Talvez existam algumas estátuas, uma lenda, alguns curiosos, mas nenhum passado - apenas o que passa para o futuro. Uma utopia menos um fundo, um lugar onde as máquinas estão inativas, e o sol se transformou em vidro, e o lugar onde a Planta de

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Guide to the monuments of Passaic, New Jersey foi um texto publicado por Smithson na Revista Artfo

-rum em Dezembro de 1967. O texto está disponível em: http://monoskop.org/ images/8/85/Smithson_Rob

-ert_1967_1979_The_Monu

-ments_of_Passaic.pdf Concreto de Passaic (Via Fluvial 253) faz um bom

negócio em PEDRA, BETUME, AREIA e CIMENTO. Passaic parece cheia de “buracos” comparada com a cidade de Nova York, que parece hermeticamente empacotada e sólida, e estes buracos em um sentido

são os vazios monumentais que definem, sem

tentar, os traços mnemônicos de um conjunto de futuros abandonados. (SMITHSON, Robert. A tour to the monuments of Passaic. Texto disponibilizado em rede virtual. Livre Tradução)

A referência a Nabokov é também encontrada em um texto anterior de Smithson, Entropia e os novos monumentos de 1966, no qual encontra-se a seguinte observação: “O futuro não é senão o obsoleto ao reverso”. Se Smithson contemplasse o anjo da história, diríamos que teria a face escancarada não para o passado, mas para o futuro, procurando recolher no presente as lembranças de possibilidades: os subúrbios não tem passado, apenas passam para o futuro.

Os monumentos de Passaic são tributos aos subúrbios. Ao olhar para estas paisagens como ruínas ao revés, Smithson elabora uma nova monumentalidade, uma nova percepção sobre as deformidades introduzidas pelas máquinas modernas, uma atitude que não é melancólica, mas que procura expressar a beleza própria destes espaços em estado de deterioração.

De acordo com Iñaki Abalos (2008, p. 217), ao encontrar beleza nestes espaços o artista recupera o conceito de pitoresco, associando-o também à paisagem arruinada pela indústria, fazendo da sua arte um paisagismo da ausência da paisagem. Esta operação remete ao fato de que todo paisagismo, articulado como sistema estético, surge precisamente quando se perdem os vínculos naturais de uma sociedade, trazendo para a esfera do cidadão o contato perdido reorganizado como experiência estética.

Passaic parece cheia de buracos, ao contrário do chão de Nova York, hermeticamente empacotada e sólida. Em um lugar onde não existem buracos é possível criar a ilusão de que a terra não existe. O observador das ruínas ao revés percebe nos buracos do caminho reminiscências de futuros abandonados pela construção da cidade.

Os buracos são freqüentes nos textos de Smithson (em Entropia e os novos

monumentos, Smithson também afirma que ir ao cinema é fazer um buraco

na vida). Nos textos de Smithson frequentemente saltamos entre as ciências

físicas, a arquitetura, o cinema ou a fotografia. Estes saltos são construídos

enquanto metáforas para processos mentais em que o tempo é continuamente atualizado na consciência do sujeito, de certa forma somos a todo momento remetidos à espiral negativa do tempo que consome tudo, que também pode ser

identificada pelo mito de Saturno devorando seus filhos. Smithson contempla

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34

Cavar buracos

Nos despediremos de Robert Smithson (pelo menos por enquanto). Seguimos outras trilhas neste momento, tendo o buraco como guia e artistas que cavam buracos. Cavar buracos precede quase toda construção assim como todo sepultamento. Os buracos preparam o terreno para receber as novas fundações

e guardam coisas para ficarem enterradas.

Pensando entropicamente certos buracos representam uma grande demanda

de energia em troco de um esforço sem aparente significado. A sensação

de modernidade falida tem mais ou menos a ver com esse movimento e a constatação de que nossas cidades funcionam como máquinas térmicas a

beira de um colapso também. Enquanto as contradições ficam mais evidentes,

o colapso que não se realiza se acumula em relações mais tensas e nervosas.

Por outro lado, um movimento sem sentido mas com significado pode preparar o terreno para a inversão do sentido vetorial da espiral entrópica que

impulsiona nossas cidades. Penso, especificamente, em um projeto de um

coletivo de artistas japoneses intitulado grupo I, realizado em agosto de 1965.

Durante a realização de um festival de arte independente, em Gifu, no Japão, o coletivo passou oito dias cavando coletivamente um buraco nas margens do rio

Nagara. No fim do festival o buraco foi novamente coberto. Além do aparente

desperdício de energia, o trabalho instiga a urgência de ações coletivas frente a tantas formas de individualismo em que nossa sociedade tem se afundado, apontando para o equilíbrio entre a unidade do grupo e o esforço individual de cada um ali presente.

Não se pode esquecer que abrir buracos também precede o semear e que

toda semente contém uma reserva de energia para fazer brotar e frutificar. A

capacidade de acumular reserva de energia corresponde ao conceito oposto de entropia, ou negentropia. Joseph Beuys costumava utilizar este conceito em suas aulas, discursos e esquemas sobre a escultura social. A escultura

social utiliza a floresta como arquétipo e pensa o campo social como uma

forma plástica moldada pela interação e cooperação entre os membros de um coletivo. A escultura social relaciona-se com o conceito de simbiose, isto é, a cooperação entre organismos vivos visando tanto a sobrevivência comum quanto a autonomia das partes.

O uso da terra na cidade precisa ser colocado em discussão. A terra está pobre e demanda a articulação de todo nosso esforço. Novas receitas urbanas estão em evidência: elas partem da cooperação entre as pessoas da vizinhança e a administração pública. As ferramentas desta micro-revolução são: a autoconstrução, o trabalho em equipe e a solidariedade.

MOVIMENTO SEM SENTIDO MAS

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35

Buraco, proposição da Tati

Rosa durante o curso de escultura social no Rio Vermelho com Hermann Poll

-mann em dezembro de 2013

a convite do Zé Kinceler.

Fotografias de Péricles Gandi.

Pixo na Escola de Ensino Básico do Muquem, encon-trada em estado de

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36

Praia do Moçambique,

registro em polaroid feito pela Nara em julho de

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A LEI

DO

DESTERRO

É

SOBREVIVER

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41

Fico me perguntando porque certos homens escolhem habitar as ilhas enquanto outros decidem pelo continente, em tempos em que a superlotação de umas e outras faça com que os limites entre ambas não passem de

coordenadas meramente geográficas.

Relatos sobre a busca pela cidade ideal costumam utilizar o artifício de associá-la à cidade insular. Em um texto intitulado Notas sobre a Utopia, Marilena Chauí conta que a maioria das utopias costumam ser narradas como viagens imaginárias a ilhas desconhecidas. Em uma ilha estamos cercados

de águas por todos os lados, pelo menos no que diz respeito à configuração geográfica, mantém-se uma condição de isolamento, protegendo e limitando

o acesso. Por isso a cidade ideal é insular, ilocalizada (daí a palavra u-topia) e, principalmente, arquitetonicamente planejada (CHAUÍ, Marilena. Notas

sobre a Utopia, texto disponível em rede virtual).

Que tal configuração favoreça a forma urbana, nos passa despercebido

tantos anos depois que Francisco Dias Velho aportou nessas terras que

também já se chamaram Meiembipe, que na língua do índio carijó significa

montanha ao longo do mar.

Inicialmente, Francisco Dias Velho batizou o lugar como Ilha de Santa Catarina, pois era dia de Santa Catarina quando aqui chegou. Logo após, o nome da cidade mudou para Terra de Nossa Senhora do Desterro, e depois já elevada ao status de cidade, Desterro. Foi o governador Hercílio Luz quem mudou o nome da cidade para Florianópolis, em homenagem ao presidente Floriano Peixoto após a derrota dos catarinenses na Revolução Federalista.

A configuração atual da capital de Santa Catarina, como uma ilha-cidade, possibilita o cruzamento de ecossistemas naturais e artificiais entre espaços

não muito distantes, podendo-se transitar entre o mangue e o shopping, a

restinga e a avenida, a praia e a cidade. A grande distância entre a praia e a montanha em algumas partes da ilha, resultou em um modelo de expansão urbana denominado espinha de peixe, isto é, uma via principal seccionada por inúmeras espinhas, ou cortes transversais. Ao seguir reto toda vida por

essas vias principais, logo se está em uma praia diferente, de modo que há caminhos para contornar quase toda a ilha.

Contudo, esta composição encontra-se seriamente ameaçada pelo modo

de viver ilhéu, cada vez mais colonizado pelas influências continentais,

dentre elas a proliferação de mega-empreendimentos imobiliários e a

destruição das bases naturais sob a direção de um urbanismo desorganizado e excludente.

O Episódio decisivo para a

derrota dos catarinenses

foi o combate naval tra-vado entre o navio rebel-de aquidaban e onze embar-cações legalistas.

A caça às bruxas é esporte

corriqueiro na ilha

des-de aquele 16 des-de abril des-de 1894.

Passava das 11 horas da

noite quando a frota

le-galista bombardeou a For -taleza de Santa Cruz de Anhatomirim, ao norte da cidade de Desterro. O uso de torpedos em com-bate havia ocorrido

so-mente em 1854, na Guer

-ra da Criméia, e em 1891, na Revolta Chilena. Pela

terceira vez na história do mundo eram utilizados

com êxito exatamente aqui

na ilha de Santa

Catari-na. O número exato de mor -tos nunca pôde ser

levan-tado. Em abril de 2014, o

episódio completou cento e vinte anos, os personagens são outros, mas a ilha

continua assombrada por dias de terror.

Fonte: a tragédia de des

-terro, texto disponível em http://www2.uol.com.br/

historiaviva/reporta- gens/a_tragedia_de_dester-ro_imprimir.html

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42

De acordo com Boaventura da Souza Santos em a Gramática do tempo (2010, p. 335 e seguintes), o fascismo não só tem demonstrado ser plenamente capaz de conviver com a democracia como aposta justamente na expansão

das liberdades para se manter. O fascismo nas relações sociais presente em nossa sociedade difere do fascismo político do século XX, porém perpetua velhas técnicas.

O fascismo da insegurança está presente na produção do espaço, na

disseminação da informação e nas relações de trabalho. Beneficia-se

principalmente da produção da diferença e da manipulação discriminatória da insegurança das pessoas através da criação de acidentes ou acontecimentos desestabilizadores que produzem altos níveis de ansiedade e insegurança com relação ao presente, baixando o nível geral das expectativas e

criando-se a disponibilidade para que grande parte das pessoas aceitem a imposição de condições cada vez mais abusivas. A condição de vulnerabilidade pode ser percebida no cotidiano das cidades, no desemprego, no trânsito, na distribuição das pessoas em bairros.

O acesso diferenciado aos espaços da cidade é uma das características determinantes do modo de produção vigente e está diretamente associado à venda de terras, e à adoção de um modo de vida urbano, em que perde-se o vínculo com a terra em troca do conforto da proximidade com as áreas

centrais da cidade e os respectivos serviços urbanos: comércio, gastronomia, lazer, centros empresariais.

O padrão capitalista de produção do espaço é caracterizado pela separação de pessoas em unidades habitacionais, construções cúbicas isolantes unifamiliares, distribuídas em um espaço reticular, projetadas a partir de

um plano cartesiano. Estas unidades são agrupadas em zonas, conforme a utilidade (residencial, comercial, industrial, por exemplo). Esta forma de organização possibilita manter as pessoas em ordem e coesas.

Sobre a evolução do processo de concentração das terras na ilha encontrou-se o encontrou-seguinte relato no livro São João do Rio Vermelho: Memórias dos Açores

organizado pelo professor João Lupi a partir de entrevistas realizadas com os moradores do bairro:

Mas, dentro da identidade do trato, existiam diferenças de riqueza, que vêm desde os tempos da colonização, quando os nobres açorianos receberam grandes terras, e os pobres

ficaram quase sem poder se sustentar; essas diferenças

foram permanecendo, mesmo quando as fortunas mudaram

A forma autoritária com que o espaço tem se

reconfigurado desde o

ato público assinado em

17 de maio de 1894 que

alterou o nome desta ilha de Desterro para

Florianópolis, já seria

motivo para desespero alarmante, não obstante, os ilhéus parecem

possuídos por um delírio coletivo.

O fato de as eleições

estarem tão próximas

(serão na semana seguinte à data do periódico)

confunde-se promiscuamente com a notícia da onda de atentados na manchete do

jornal: Os bastidores do debate para o Governo de

Santa Catarina, seguido de Nova série de atentados a ônibus e policiais em SC é considerada a mais violenta pela segurança pública, que apura os motivos por trás da nova

onda de crimes] (http:// www.manchetesdosjornais.

com.br/manchetes/brasil/

sc/floripa/diario_

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43

de mão, e no final do século passado havia pelo menos três

classes sociais bem distintas: os senhores de escravos; os lavradores que só tinham a família para trabalhar com eles; e os próprios escravos, formando este conjunto uma

sociedade estratificada; contudo estas camadas tinham certa mobilidade, posto que os mestiços, filhos às vezes

dos senhores e de suas escravas, desempenhavam papel intermediário. Hoje esta diferenciação admite mais

gradações, mas reflete-se a antiga no fato de as famílias de

mais posses serem todas de origem branca. As diferenças estão sobretudo na quantidade de terras possuídas, uma vez que alguns tem o equivalente a vários lotes, outros não possuem quase nada; e no comércio, havendo alguns que pelo seu esforço e habilidade para os negócios conseguem reunir um patrimônio importante, construir residência grande em estilo urbano, comprar carros, e mais terras. (LUPI, João, sem data, p. 33).

As áreas centrais e sobre as quais é exercido o poder de atração no espaço urbano são alvo de especulação predatória, de modo que não existe área aparentemente abandonada que não viva sob o risco incessante de ser incorporada às áreas de expansão urbana. Sabe-se que, muitas vezes,

um terreno abandonado indica um processo na justiça e um conflito de

propriedade que pode demorar muitos anos pra se resolver. A competição e

a especulação dos preços tem contribuído para modificação dos costumes

e a perda dos vínculos afetivos entre as pessoas, há mais individualismo e

menos ajuda mútua.

Sobre a urbanização de Florianópolis, em Padrões espaciais na morfologia

urbana da Ilha de Santa Catarina a autora Lisete Assen de Oliveira afirma

que a urbanização balneária da ilha iniciou-se na década de 50 com o processo de loteamento de terras devolutas no bairro de Canasvieiras. A

expansão deste padrão de urbanização em outros núcleos urbanos da ilha, resultou na superposição da vida da cidade sobre a ilha.

O crescimento de áreas urbanas sobre antigas áreas rurais resultaram na formação de uma paisagem peculiar , onde formas tradicionais de uso do espaço, como a criação de animais nas vias públicas e outras áreas de

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ao centro da cidade.

O crescimento passa a se basear na reunião de três elementos: o lote, a casa e o automóvel.

O problema deste padrão de crescimento, segundo a autora em epígrafe, é

que ele não compreende o litoral como espaço público urbano da cidade de Florianópolis, o espaço público é decorrência, mas nunca o objetivo deste ordenamento espacial que reduz o espaço público a espaços de consumo.

A sociedade brasileira bloqueia a esfera pública das mais diversas formas: não há a percepção da rua como espaço comum e a opinião pública é

frequentemente monopolizada pelos meios de comunicação, formando consensos que neutralizam a expressão de grupos ou classes sociais antagônicas.

A confusão entre espaço público e privado, a publicização do privado e o esvaziamento do sentido original do espaço público são determinantes para

a produção de relações sociais autoritárias no espaço urbano, formando fronteiras que segregam comunidades com diferentes padrões de consumo.

De acordo com a filósofa Hannah Arendt em A Condição Humana, o termo

privado, em sua acepção original, apenas tem sentido enquanto privativo, isto é enquanto ser privado de alguma coisa, de estar entre os homens.

Neste aspecto, o surgimento de uma economia capitalista e o processo de

acúmulo de riqueza se dá sobre a expropriação crescente de certos grupos de seres humanos, em um número cada vez maior. A propriedade privada, perde o valor de uso privado, antes determinado pela localização, para adquirir um valor social mutável, mediado pelo dinheiro.

Mais que um fim em si mesma, a propriedade privada soma-se entre os meios à disposição do capitalismo financeiro para especular e acumular uma riqueza supérflua nas mãos de poucos, enquanto milhares de pessoas

são privadas do direito à moradia.

O termo público, de acordo com a Hannah Arendt, significa, em primeiro

lugar, ser visto e ouvido por todos, aparecer a público e, em segundo lugar,

o termo corresponde ao próprio mundo, o mundo comum que pode ser compartilhado, que permite reunir os homens uns na companhia dos outros.

O significado da vida pública está em ser visto e ouvido por muitas pessoas,

cada qual com seu ponto de vista, e encontrar coisas em comum para

conversar, através de perspectivas múltiplas.

O que mantém o domínio público, definido como espaço potencial da O déficit habitacional de

Florianópolis era de 14mil

famílias em janeiro de

2014, segundo informação

apresentada pela prefeitu-ra Municipal a respeito da Ocupação Amarildo, no

Bairro do Rio Vermelho. fonte: (http://portal.pmf. sc.gov.br/noticias/index.

php?pagina=notpagina&no-ti=11054).

Em terra onde o asfalto é lei, galinha cisca na

bri-ta. Registro realizado du -rante visita a uma

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