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MOVIMENTO SEM SENTIDO MAS COM SIGNIFICADO; é desper-

No documento ILHA DE SANTA CATARINA 2015 (páginas 34-44)

TERRA RARA É

MOVIMENTO SEM SENTIDO MAS COM SIGNIFICADO; é desper-

tar dentro de si a energia circular, a força da man- dala viva, quando se está em um grupo e cada um dos presentes dá a sua con- tribuição.

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Buraco, proposição da Tati

Rosa durante o curso de escultura social no Rio Vermelho com Hermann Poll- mann em dezembro de 2013 a convite do Zé Kinceler. Fotografias de Péricles Gandi.

Pixo na Escola de Ensino

Básico do Muquem, encon- trada em estado de abando- no - Residência Artística no camping do Rio Vermelho - dezembro de 2014.

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Praia do Moçambique,

registro em polaroid feito pela Nara em julho de

A LEI

DO

DESTERRO

É

SOBREVIVER

À CIDADE!

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Fico me perguntando porque certos homens escolhem habitar as ilhas enquanto outros decidem pelo continente, em tempos em que a superlotação de umas e outras faça com que os limites entre ambas não passem de coordenadas meramente geográficas.

Relatos sobre a busca pela cidade ideal costumam utilizar o artifício de associá-la à cidade insular. Em um texto intitulado Notas sobre a Utopia, Marilena Chauí conta que a maioria das utopias costumam ser narradas como viagens imaginárias a ilhas desconhecidas. Em uma ilha estamos cercados de águas por todos os lados, pelo menos no que diz respeito à configuração geográfica, mantém-se uma condição de isolamento, protegendo e limitando o acesso. Por isso a cidade ideal é insular, ilocalizada (daí a palavra u-topia) e, principalmente, arquitetonicamente planejada (CHAUÍ, Marilena. Notas sobre a Utopia, texto disponível em rede virtual).

Que tal configuração favoreça a forma urbana, nos passa despercebido tantos anos depois que Francisco Dias Velho aportou nessas terras que também já se chamaram Meiembipe, que na língua do índio carijó significa montanha ao longo do mar.

Inicialmente, Francisco Dias Velho batizou o lugar como Ilha de Santa Catarina, pois era dia de Santa Catarina quando aqui chegou. Logo após, o nome da cidade mudou para Terra de Nossa Senhora do Desterro, e depois já elevada ao status de cidade, Desterro. Foi o governador Hercílio Luz quem mudou o nome da cidade para Florianópolis, em homenagem ao presidente Floriano Peixoto após a derrota dos catarinenses na Revolução Federalista.

A configuração atual da capital de Santa Catarina, como uma ilha-cidade, possibilita o cruzamento de ecossistemas naturais e artificiais entre espaços não muito distantes, podendo-se transitar entre o mangue e o shopping, a restinga e a avenida, a praia e a cidade. A grande distância entre a praia e a montanha em algumas partes da ilha, resultou em um modelo de expansão urbana denominado espinha de peixe, isto é, uma via principal seccionada por inúmeras espinhas, ou cortes transversais. Ao seguir reto toda vida por essas vias principais, logo se está em uma praia diferente, de modo que há caminhos para contornar quase toda a ilha.

Contudo, esta composição encontra-se seriamente ameaçada pelo modo de viver ilhéu, cada vez mais colonizado pelas influências continentais, dentre elas a proliferação de mega-empreendimentos imobiliários e a destruição das bases naturais sob a direção de um urbanismo desorganizado e excludente.

O Episódio decisivo para a derrota dos catarinenses foi o combate naval tra-

vado entre o navio rebel- de aquidaban e onze embar- cações legalistas.

A caça às bruxas é esporte corriqueiro na ilha des- de aquele 16 de abril de 1894.

Passava das 11 horas da noite quando a frota le- galista bombardeou a For- taleza de Santa Cruz de Anhatomirim, ao norte da cidade de Desterro. O uso de torpedos em com- bate havia ocorrido so- mente em 1854, na Guer- ra da Criméia, e em 1891, na Revolta Chilena. Pela terceira vez na história do mundo eram utilizados com êxito exatamente aqui na ilha de Santa Catari- na. O número exato de mor- tos nunca pôde ser levan- tado. Em abril de 2014, o episódio completou cento e vinte anos, os personagens são outros, mas a ilha

continua assombrada por dias de terror.

Fonte: a tragédia de des- terro, texto disponível em http://www2.uol.com.br/ historiaviva/reporta-

gens/a_tragedia_de_dester- ro_imprimir.html

Aquidaban;entre rios, terras fertéis e aguadas [tupi-guarani]

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De acordo com Boaventura da Souza Santos em a Gramática do tempo (2010, p. 335 e seguintes), o fascismo não só tem demonstrado ser plenamente capaz de conviver com a democracia como aposta justamente na expansão das liberdades para se manter. O fascismo nas relações sociais presente em nossa sociedade difere do fascismo político do século XX, porém perpetua velhas técnicas.

O fascismo da insegurança está presente na produção do espaço, na disseminação da informação e nas relações de trabalho. Beneficia-se principalmente da produção da diferença e da manipulação discriminatória da insegurança das pessoas através da criação de acidentes ou acontecimentos desestabilizadores que produzem altos níveis de ansiedade e insegurança com relação ao presente, baixando o nível geral das expectativas e criando- se a disponibilidade para que grande parte das pessoas aceitem a imposição de condições cada vez mais abusivas. A condição de vulnerabilidade pode ser percebida no cotidiano das cidades, no desemprego, no trânsito, na distribuição das pessoas em bairros.

O acesso diferenciado aos espaços da cidade é uma das características determinantes do modo de produção vigente e está diretamente associado à venda de terras, e à adoção de um modo de vida urbano, em que perde- se o vínculo com a terra em troca do conforto da proximidade com as áreas centrais da cidade e os respectivos serviços urbanos: comércio, gastronomia, lazer, centros empresariais.

O padrão capitalista de produção do espaço é caracterizado pela separação de pessoas em unidades habitacionais, construções cúbicas isolantes unifamiliares, distribuídas em um espaço reticular, projetadas a partir de um plano cartesiano. Estas unidades são agrupadas em zonas, conforme a utilidade (residencial, comercial, industrial, por exemplo). Esta forma de organização possibilita manter as pessoas em ordem e coesas.

Sobre a evolução do processo de concentração das terras na ilha encontrou- se o seguinte relato no livro São João do Rio Vermelho: Memórias dos Açores organizado pelo professor João Lupi a partir de entrevistas realizadas com os moradores do bairro:

Mas, dentro da identidade do trato, existiam diferenças de riqueza, que vêm desde os tempos da colonização, quando os nobres açorianos receberam grandes terras, e os pobres ficaram quase sem poder se sustentar; essas diferenças foram permanecendo, mesmo quando as fortunas mudaram A forma autoritária com

que o espaço tem se reconfigurado desde o ato público assinado em 17 de maio de 1894 que alterou o nome desta ilha de Desterro para Florianópolis, já seria motivo para desespero alarmante, não obstante, os ilhéus parecem

possuídos por um delírio coletivo.

O fato de as eleições estarem tão próximas

(serão na semana seguinte à data do periódico)

confunde-se promiscuamente com a notícia da onda de atentados na manchete do jornal: Os bastidores do debate para o Governo de Santa Catarina, seguido de Nova série de atentados a ônibus e policiais em SC é considerada a mais violenta pela segurança pública, que apura os motivos por trás da nova onda de crimes] (http:// www.manchetesdosjornais. com.br/manchetes/brasil/ sc/floripa/diario_

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de mão, e no final do século passado havia pelo menos três classes sociais bem distintas: os senhores de escravos; os lavradores que só tinham a família para trabalhar com eles; e os próprios escravos, formando este conjunto uma sociedade estratificada; contudo estas camadas tinham certa mobilidade, posto que os mestiços, filhos às vezes dos senhores e de suas escravas, desempenhavam papel intermediário. Hoje esta diferenciação admite mais gradações, mas reflete-se a antiga no fato de as famílias de mais posses serem todas de origem branca. As diferenças estão sobretudo na quantidade de terras possuídas, uma vez que alguns tem o equivalente a vários lotes, outros não possuem quase nada; e no comércio, havendo alguns que pelo seu esforço e habilidade para os negócios conseguem reunir um patrimônio importante, construir residência grande em estilo urbano, comprar carros, e mais terras. (LUPI, João, sem data, p. 33).

As áreas centrais e sobre as quais é exercido o poder de atração no espaço urbano são alvo de especulação predatória, de modo que não existe área aparentemente abandonada que não viva sob o risco incessante de ser incorporada às áreas de expansão urbana. Sabe-se que, muitas vezes, um terreno abandonado indica um processo na justiça e um conflito de propriedade que pode demorar muitos anos pra se resolver. A competição e a especulação dos preços tem contribuído para modificação dos costumes e a perda dos vínculos afetivos entre as pessoas, há mais individualismo e menos ajuda mútua.

Sobre a urbanização de Florianópolis, em Padrões espaciais na morfologia urbana da Ilha de Santa Catarina a autora Lisete Assen de Oliveira afirma que a urbanização balneária da ilha iniciou-se na década de 50 com o processo de loteamento de terras devolutas no bairro de Canasvieiras. A expansão deste padrão de urbanização em outros núcleos urbanos da ilha, resultou na superposição da vida da cidade sobre a ilha.

O crescimento de áreas urbanas sobre antigas áreas rurais resultaram na formação de uma paisagem peculiar , onde formas tradicionais de uso do espaço, como a criação de animais nas vias públicas e outras áreas de uso comum, persistem ao lado dos novos empreendimentos. De acordo com a autora em epígrafe, muitos destes loteamentos ocuparam áreas de campos comuns, predominantemente planas, acompanhando a orla do mar, formando novas fachadas, novos setores, vinculados por meio de estradas

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ao centro da cidade.

O crescimento passa a se basear na reunião de três elementos: o lote, a casa e o automóvel.

O problema deste padrão de crescimento, segundo a autora em epígrafe, é que ele não compreende o litoral como espaço público urbano da cidade de Florianópolis, o espaço público é decorrência, mas nunca o objetivo deste ordenamento espacial que reduz o espaço público a espaços de consumo. A sociedade brasileira bloqueia a esfera pública das mais diversas formas: não há a percepção da rua como espaço comum e a opinião pública é frequentemente monopolizada pelos meios de comunicação, formando consensos que neutralizam a expressão de grupos ou classes sociais antagônicas.

A confusão entre espaço público e privado, a publicização do privado e o esvaziamento do sentido original do espaço público são determinantes para a produção de relações sociais autoritárias no espaço urbano, formando fronteiras que segregam comunidades com diferentes padrões de consumo. De acordo com a filósofa Hannah Arendt em A Condição Humana, o termo privado, em sua acepção original, apenas tem sentido enquanto privativo, isto é enquanto ser privado de alguma coisa, de estar entre os homens. Neste aspecto, o surgimento de uma economia capitalista e o processo de acúmulo de riqueza se dá sobre a expropriação crescente de certos grupos de seres humanos, em um número cada vez maior. A propriedade privada, perde o valor de uso privado, antes determinado pela localização, para adquirir um valor social mutável, mediado pelo dinheiro.

Mais que um fim em si mesma, a propriedade privada soma-se entre os meios à disposição do capitalismo financeiro para especular e acumular uma riqueza supérflua nas mãos de poucos, enquanto milhares de pessoas são privadas do direito à moradia.

O termo público, de acordo com a Hannah Arendt, significa, em primeiro lugar, ser visto e ouvido por todos, aparecer a público e, em segundo lugar, o termo corresponde ao próprio mundo, o mundo comum que pode ser compartilhado, que permite reunir os homens uns na companhia dos outros. O significado da vida pública está em ser visto e ouvido por muitas pessoas, cada qual com seu ponto de vista, e encontrar coisas em comum para conversar, através de perspectivas múltiplas.

O que mantém o domínio público, definido como espaço potencial da

O déficit habitacional de Florianópolis era de 14mil famílias em janeiro de

2014, segundo informação apresentada pela prefeitu- ra Municipal a respeito da Ocupação Amarildo, no Bairro do Rio Vermelho. fonte: (http://portal.pmf. sc.gov.br/noticias/index. php?pagina=notpagina&no- ti=11054).

Em terra onde o asfalto é lei, galinha cisca na bri- ta. Registro realizado du- rante visita a uma pedrei- ra em Joaçaba, inverno de 2013, com neto e caroline.

No documento ILHA DE SANTA CATARINA 2015 (páginas 34-44)

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