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VAGÃO ROSA: UM CONVITE AO OUTRO

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Academic year: 2020

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Universidade Estadual da Paraíba

Profº Antonio Guedes Rangel Junior Reitor

Prof. Ethan Pereira Lucena Vice-Reitor

Editora da Universidade Estadual da Paraíba

Diretor

Cidoval Morais de Sousa Diagramação

Carlos Alberto de Araujo Nacre

Revista do Programa de Pós-Graduação em Literatura e Interculturalidade do Departamento de Letras

Direção Geral e Editorial Luciano Barbosa Justino Editor deste número Luciano Barbosa Justino Conselho Editorial

Alain Vuillemin, UNIVERSITÉ D´ARTOIS Alfredo Adolfo Cordiviola, UFPE

Antonio Carlos de Melo Magalhães, UEPB Arnaldo Saraiva, UNIVERSÍDADE DE PORTO Ermelinda Ferreira Araujo, UFPE

Goiandira F. Ortiz Camargo, UFG

Jean Fisette, UNIVERSITÉ DU QUÉBEC À MONTRÉAL ( UQAM) Max Dorsinville, MC GILL UNIVERSITY, MONTRÉAL

Maximilien Laroche, UNIVERSITÉ LAVAL, QUÉBEC Regina Zilberman, PUC-RS

Rita Olivieri Godet, UNIVERSITÉ DE RENNES II Roland Walter, UFPE

Sandra Nitrini, USP

Saulo Neiva, UNIVERSITÉ BLAISE PASCAL Sudha Swarnakar, UEPB

Coordenadores do Mestrado em Literatura e Interculturalidade Antonio Carlos de Melo Magalhães e Luciano Barbosa Justino Revisores

Eli Brandão da Silva, Luciano B. Justino, Sébastien Joachim, Antonio Magalhães

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VAGÃO ROSA: UM

CONVITE AO OUTRO

Sociopoética

Volume 1 | Número 16 | janeiro a junho de 2016

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VAGÃO ROSA: UM CONVITE AO OUTRO

Roland Walter1

Tiago Silva2

Namrata Poddar é Ph.D em Estudos Franceses pela Universidade da Pensilvânia, onde desenvolveu sua tese sobre a ficção das Ilhas Maurício, em que observou, particularmente, aquilo que chama de poética insular, e publicou artigos e resenhas sobre esse tema em uma perspectiva pós-colonial. Talvez, por isso mesmo, seu conto “Vagão rosa” aborde, a partir do cotidiano de mulheres indianas, aspectos tão caros a essa discussão e as relações do sujeito com o outro em um mundo cada vez mais rizomático - um mundo sem raiz única, como propõe Édouard Glissant (2011); um mundo que convida a abrir-se ao outro. Obviamente, essa abertura ao outro não acontece sem conflitos, principalmente, quando o espaço físico é reduzido e sujeitos tão díspares são colocados em um mesmo compartimento. Em ‘Vagão rosa’, a rixa entre a pescadora e as outras mulheres representa essa dificuldade de convivência, que emerge quando não se tem espaço, quando não existe a possibilidade de transcender a condição do presente, como coloca Yi-Fu Tuan (2014), para quem a sensação de liberdade está profundamente associada à possibilidade de agir, de mover-se no espaço; do contrário, o sujeito é colocado em um contexto claustrofóbico, que oprime e dificulta o exercício da solitude, da reflexão e da própria individualidade. Ainda segundo Tuan, são as pessoas, e não os objetos, que oprimem, restringem o espaço e cerceiam a liberdade; que excluem e marginalizam os outros.

No conto, o vagão do trem é transformado em

1 Doutor em Literatura Comparada pela Johannes Gutenberg Universität. Atualmente é professor no Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal de Pernambuco.

2 Aluno de doutorado do Programa de Pós-Graduação em Letras da Universidade Federal de Pernambuco e professor de inglês do Instituto Federal de Sergipe.

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metáfora dessa problemática - um número crescente de pessoas em um espaço cada vez menor, mais encurtado e disputado, no qual bens e serviços são distribuídos de forma desigual. É essa a dura realidade das periferias do mundo; comum aos países que, como as ilhas do arquipélago do conto, ocupam posições descentradas em relação ao oco que se forma no centro. Se o espaço é esse conjunto indissociável composto por objetos geográficos, naturais e sociais e, ao mesmo tempo, pela “vida que os prende, que os preenche e os anima” (SANTOS, 1986), o vagão do trem é sua representação perfeita; une elementos culturais distintos em uma miscelânea de referências que vão das bolsas de grife, aos guias e agências de viagem, aos deuses da religião hindu, aos gurus, aos meios de comunicação virtual, e a sujeitos culturalmente diferentes. No vagão superlotado, o vão entre as fileiras de cadeiras passa a ser disputado como se fosse confortável; a jornada de trabalho é ampliada por estratégias que reduzem a possibilidade de contato humano mais íntimo e afetivo, ao mesmo tempo em que ferramentas de aproximação virtual são ofertadas como substitutivos. Assim, na disputa pelo conforto mínimo, acabamos nos acostumando com o microespaço que é reservado para cada um de nós; aceitamos, como diria João Cabral de Melo Neto em “Morte e Vida Severina”, a parte que nos cabe nesse latifúndio. Abdicamos ao direito de bem viver, pela certeza temporária de que ocupamos um lugar melhor que outros viajantes.

Em “Vagão rosa”, o quinhão de cada um é problematizado; o da mulher, especialmente. A sua segregação em um trem especificamente voltado para recebê-la parece sugerir que a mulher é culpada por sua própria sexualidade. Em outros termos, as vítimas da violência, do machismo, são retiradas do convívio social e postas em um espaço separado, como acontece com alguns criminosos em nossas sociedades, indiciando que a “imputabilidade”, ou seja, a capacidade de ser legalmente responsabilizado por alguma coisa, é transferida do agressor para a vítima. A mulher, dessa forma, recebe

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uma carga extra, que fica ainda mais pesada quando se soma ao trabalho, às horas de viagem diárias e ao cuidado com o outro; é a mulher a responsável pelo cuidado com a família, principalmente em sociedades machistas. No percurso de volta para a casa, a personagem principal corta verduras e prepara, antecipadamente, o jantar da família, enquanto percebe a precariedade de sua vida; uma vida sem muitas possibilidades, em que um simples guia de viagens lhe é inacessível; uma vida que simplesmente sangra e se esvai como o seu próprio sangue, junto com as verduras, com a viagem de trem, com a falta de espaço, com a carga extra de trabalho, com o sonho distante de viver em um lar melhor e maior.

Nessa realidade, a solidariedade entre as amigas de viagem parece ser uma tábua de salvação; uma força que pacifica e promove o bem-estar e evita o enlouquecimento. A ajuda que se dão parece evitar efeitos mais drásticos dessa realidade, que seria distópica se não fosse tão comum nas grandes cidades do mundo. Assim, Namrata Poddar faz, de fato, um convite a abrir-se ao outro, um chamado para conectar-se com o humano, com o afeto e a solidariedade, apontando para um ideia central na literatura escrita por mulheres - a noção de sisterhood ou sororidade; esse pacto ético e moral de ajuda mútua entre mulheres que se reconhecem irmãs. Esse contrato entre irmãs justifica levar outra pessoa no colo no longo caminho para o trabalho. Para além dessa relação entre mulheres, o conto aponta para a urgência de mais solidariedade nas relações entre as pessoas e resgata um ponto nevrálgico no trabalho do escritor inglês E. M. Foster - a necessidade de conexão entre os indivíduos, além das fronteiras de raça, classe, e nações -, genialmente apresentada em duas palavras como epígrafe de Howards End, de 1910: “only connect”. É possível cantar, rir, viver, mesmo em situações adversas, em um mundo que empurra o humano para a margem, que restringe e enclausura. Only connect!

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REFERÊNCIAS

FORSTER, E. M. Howards End. Disponível em: http://www. gutenberg.org/ebooks/2891. Acesso em 21 de novembro de 2015. GLISSANT, E. Poética da Relação. Rio de Janeiro: Editora

Sextante, 2011.

MELO NETO, J. C. Morte e Vida Severina. Rio de Janeiro: Editora José Olympio, 1986.

SANTOS, M. Espacio y Método. Revista Geocrítica da

Universidade de Barcelona, 1986. Disponível em: http://www. ub.edu/geocrit/geo65.htm. Acesso em 16 de setembro de 2013. TUAN, YI-FU. Space and Place: the perspective of experience. Minneapolis: University of Minnesota Press, 2014.

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