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PERIFERIA E CÂNONE EM ADONIAS FILHO

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Academic year: 2020

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ADONIAS FILHO

SUBURBS AND CANON IN

ADONIAS FILHO

João Luiz Peçanha Couto

(USP)1

RESUMO: Este artigo pretende investigar o romance adonisiano Memórias de Lázaro, propondo, em paralelo, a inscrição do autor itajuipense no que se denomina periferia – esta entendida como se estar e se postar como em lugar de não-centro. Entenda-se aqui a escrita canônica como central e opositiva à que denominamos periférica. Além: propomos caminho de análise da obra com base num conjunto de premissas que perfazem o trajeto do protagonista-narrador para sua assunção como signo de linguagem.

PALAVRAS-CHAVES: Narrativa. Periferia. Signo literário. Morte.

ABSTRACT: This article investigates the novel Memoirs of adonisiano Lazarus, proposing, in parallel, the inscription of

1 Mestre em Estudos Comparados de Literaturas em Língua Portuguesa – FFLCH – USP, CEP

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the author itajuipense in what is called the periphery - is stood to be and how to stand in place of non-center. It is under-stood here as a canonical writing center and oppositional to what we call peripheral. In addition, we propose path analysis of the work based on a set of assumptions that make up the path of the protagonist-narrator to his assumption as sign language. KEYWORDS: Narrative. Periphery. Sign literary. Death.

Embora pareça um caminho bastante sedutor, Memórias de Lázaro não conta a história da formação ou resgate das lembranças de um protagonista que renasce graças ao percurso da narrativa. Essa afirmação pareceria óbvia, se seguíssemos a trajetória da análise clássica, esquema que sugere que o início da análise de cada obra deve se operar pelo seu título: Memórias de Lázaro. A intervenção que se pretende aponta, sim, para o fio que trama a unidade da obra, que consiste na busca (recherche) do protagonista pela aceitação de sua própria morte, instaurada por via da linguagem. A morte, não (apenas) em seu sentido literal de extinção da vida, mas, sobretudo, como trampolim para a compreensão do processo de construção da linguagem ficcional e de seu espaço literário, segundo um ponto de vista blanchotiano.

Tal procedimento se apoia no vazio em que a linguagem encontra seu espaço, nesse “exterior onde desaparece o sujeito que fala” (FOUCAULT, 2009, p. 221), uma vez que “o ser da linguagem só aparece para si mesmo com o desaparecimento do sujeito” (FOUCAULT, 2009, p. 222). É um pensamento que se mantém no limiar de qualquer positividade, que apreende seus fundamentos e, ao final, descobre as latitudes nas quais se desdobra: a margem, o vazio, o próprio movimento em que aquele que fala desaparece.

Assim, a palavra literária opera o distanciamento de um subjetivismo aprisionador da matéria literária, tramado no esforço pouco útil de um autor fazer exortar sua voz como a voz da literatura (estranho engano, pois a voz do autor é necessariamente anonimato,

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frente ao desaparecimento que a operação literária impõe àquele que escreve – aí residindo sua força). Igualmente a palavra literária assinala o seu próprio distanciamento da linguagem limitadora e impossibilitadora encontrada na expressão estética aprisionada a um autor.

Em seu texto “O pensamento do exterior” , Foucault assevera que ela é o “puro exterior da origem”, não constituindo “nem a verdade nem o tempo, nem a eternidade nem o homem, mas a forma sempre desfeita do exterior” (FOUCAULT, 2009 p. 242). É dessa capacidade de a linguagem da literatura se afastar de um subjetivismo que a impossibilitaria, e rumar para sua própria ausência, para um espaço exterior e limítrofe, inegavelmente irmanado com a morte e desvinculado da positivação da referencialidade representativa, pois afirma a nulidade daquele que a gerou, que se valerá esta análise.

A literatura não é a linguagem se aproximando de si até o ponto de sua ardente manifestação, é a linguagem se colocando o mais longe possível dela mesma; e se, nessa colocação “fora de si”, ela desvela seu ser próprio, essa súbita clareza revela mais um afastamento que uma retração, mais uma dispersão do que um retorno dos signos sobre eles mesmos. O “sujeito” da literatura (o que nela fala e aquele sobre o qual ela fala) não seria tanto a linguagem em sua positividade quanto o vazio em que ela encontra seu espaço quando se enuncia na nudez do “eu falo”. ( FOUCAULT, 2009, p. 221)

A longa citação confirma nosso pensamento a respeito do espaço a partir do qual a literatura se enuncia perante o mundo e afirma seus objetos estéticos. A história de Alexandre reforça essa proposta, pois aponta para a negação final do protagonista, que o identifica como ser de linguagem, ser de morte e de transformação.

Meus pés resvalam, o corpo tomba, a boca sem um grito. É pútrido o último ar. O lodo que me absorve, e asfixia, no canal, é viscoso. Ocultam-se, num corte fulminante, o vale e o vento. Tudo vai se

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fechando, aos poucos, com serenidade e imensa quietude. (ADONIAS FILHO, 1978, p. 162)

A porção final da obra avança narrando a morte do personagem-narrador. Isso ratifica seu trânsito, como signo e não mais apenas como personagem, pela linguagem. Ou seja, Alexandre aqui se trata de signo vagando pelo universo peculiar da linguagem. Mas qual seria a diferença entre esta proposição e aquela que abriu o subcapítulo?

Alexandre termina a obra encontrando a própria morte, tramada graças ao embate entre duas palavras, duas premissas fundantes em sua construção como sujeito ou, em outras palavras, fundantes para sua constituição como signo: as palavras de Jerônimo e Natanael. Sua morte é engendrada desde o início da obra, graças ao trânsito do protagonista por dois universos que o potencializam como signo em busca de uma verdade, mesmo que efêmera – de um significado.

Seria um caminho fácil afirmar, no entanto, que desde o início de sua jornada Alexandre busca conscientemente aquele descortinar como signo de linguagem. Como personagem, o protagonista adonisiano procura ocupar seu espaço de compreensão (do mundo) a partir de duas premissas (ou palavras) que, antes de o fazerem chegar a uma conclusão assertiva a respeito de si e do mundo, capacitam-no para a contemplação do conflito imanente que se mantém quando colocado entre elas.

No seu momento final, Alexandre é puro signo se colocando à margem de qualquer mundo conhecido por ele e de sua missão clássica de narrador, e por isso alcançando uma compreensão infinita. É naquele momento que a infinitude se encontra com a finitude: vendo o vazio, o oco e a inutilidade de seu fim como ser finito, o protagonista se vislumbra como portador da infinitude jazente em todo processo estético-poético, ser de linguagem que é. Ali, a verdade única é tão ilusória quanto se acreditar que a morte de Alexandre no lodo resume-se à pura extinção da vida.

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A liturgia da aspereza

A primeira premissa se aproxima do lugar comum entendido como o mundo pelos habitantes do Vale do Ouro. Nesse momento, o “eu falo” de Alexandre se confunde com o “eu falo” do mundo que ele aprendeu como aquele que porta a verdade; surge como signo cosmogônico, pois afirma-se como uma verdade monolítica, fálica e unívoca, criadora de uma realidade, e eivada pela violência e pelos conceitos argamassados por séculos de verdades repetidas à exaustão. Nesse sentido, desponta como formadora daqueles conceitos a palavra de Jerônimo, como dita por Alexandre:

Jerônimo, naquela época, era mais que o pai. (…) sua voz criou a minha. Imprestáveis seriam as minhas mãos, não fossem guiadas e dirigidas pelas suas. Abertos os olhos, eu o vi antes que a mim mesmo enxergasse. ( ADONIAS FILHO, 1978, p. 30)

É ela que justifica e entroniza aquela liturgia da aspereza, tão comum ao Vale e a seus habitantes. Essa voz também aproxima Memórias de Lázaro do universo do regionalismo brasileiro que, segundo Rónai, para alguns escritores é “uma espécie de tábua de salvação” (RÓNAI, 2006, p. 405). Isso porque a, por vezes, cansativa listagem de costumes, localismos e folclorismos simplificadores elide as falhas da capacidade criadora.

Quando Jerônimo fala, sacramenta verdades. Dono de um falar parco e direto, cheio de frases travestidas de verdades pétreas, os dizeres de Jerônimo revelam e escondem, mas principalmente determinam, nos momentos-limite da vida de Alexandre, a única certeza a ser aceita, a “grande” verdade: a lógica do Vale é a única válida para a compreensão do mundo. Ou: quem sai do Vale do Ouro a ele retorna. É uma perspectiva fatalista e inescapável, tanto que o personagem-protagonista ratifica a sina: “Eu não voltei, Jerônimo. Trouxeram-me” (ADONIAS FILHO, 1978, p. 10).

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No entanto, falha a análise que crê ser a palavra de Jerônimo apenas isso. Ela também é o instrumento de que Adonias Filho lança mão para assinalar sua inscrição num regionalismo, mesmo que não seja aquele “folclórico”, referido por Rónai. A herança regionalista, tanto no autor baiano quanto em Rosa, por exemplo, é fato, sendo que ambos tecem relações (seja na experimentação rosiana com a linguagem seja nas propostas de dispersão do foco narrativo de matriz faulkneriana, como percebido em Adonias Filho) que os postam além daquele regionalismo de origem, relacionando-os com as tendências narrativas inovadoras do início do século XX.

Retorne-se à palavra de Jerônimo. A força que provoca o retorno de Alexandre ao Vale vem amparada por sua (de Jerônimo) palavra, que dá à voz daquele espaço poder inequívoco de verdade próxima do sagrado – e, portanto, incontestável. É identificada com a palavra-raiz da previsibilidade, se traçarmos paralelo com Glissant. Com a palavra que fundamenta um mundo de cristalizações e não admite a crioulização, o conflito, o embate com outra(s) realidade(s). Cosmogônica, nega movimentos rizomáticos e imprevisíveis do caos-mundo (do “mundo de Abílio”), opondo-se “à noção hoje ‘real’, nas culturas compósitas, da identidade como resultado e como fator de uma crioulização” (GLISSANT, 2005, p. 27).

Por conta dessa inequivocidade, o quase monstro Jerônimo por vezes se aproxima da figura de um eclesiasta que fundamenta a aspereza da pedra, o que aproxima sua palavra dos discursos que igualmente dão voz ao sagrado. Aquela palavra não admite subterfúgios, dúvidas ou hesitações, tão fundamentada, em seus versículos de vento, pelo tempo e pela repetição enunciatória.

Importante assinalar que, no entanto, não há registro escrito (escritura ou livro sagrado) que a confirme, caracterizando aquele sagrado como marcado pela oralidade. As palavras são pura enunciação, sem confirmação escrita, como as asserções inequívocas dos mais idosos – verdades cristalizadas por uma suposta experiência. Podemos arguí-las, no entanto; duvidar de que elas sejam

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de fato as verdades que falam dentro de Alexandre, tão irmanado que está com elas desde seu nascimento. Mas ele não as desestabiliza, pois desmenti-las seria negar o próprio mundo e a si próprio. Ele as repete, indubitáveis. Assim, nesse sentido existe um movimento de conformação de Alexandre àquela lógica de selvageria.

Dessa forma, Memórias de Lázaro é, a seu modo, um romance de formação. Não circunscrito ao Bildungsroman canônico e teleológico. Entenda-se “formação” como esforço de aproximação de uma forma (“conformação”?), de algo com que o personagem possa se identificar, enformar-se, tornar-se sujeito, signo irmanado com a morte inerente ao ato da narrativa. Vejamos como.

No início de sua odisseia, Alexandre tenta se encontrar de forma errática. No entanto, seria simplório afirmar que aquela busca ocorre como uma descoberta pessoal, como um processo de crescimento de um personagem em conflito com o mundo e que, vendo-se incomodado com dado estado de coisas, tenta transformar o que está à sua volta. O herói adonisiano não resiste e dobra-se às normas conhecidas por ele. Sagradas como as palavras do bruto Jerônimo, ele se vê incapaz de contrapô-las. Em vez disso, o herói se molda, mimetiza-se com os hábitos de quem vive no Vale, pois a maneira mais primitiva de se ver identificado com algo é mimetizá-lo.

Assim, os primeiros movimentos de Alexandre são no sentido de representar (aqui no sentido de repetir ou replicar) o mundo conhecido por ele. O problema do personagem é que ele, quem sabe por herança de Abílio, homem de travessias, aos poucos percebe que não consegue se identificar com o modus vivendi do Vale, o que frauda aquela mimesis (estranha coincidência: ele, futuro ser de papel, nega o princípio básico da representação). Ele buscava se enformar àquela leitura de mundo, mas, esforço malogrado, Alexandre vê-se incapaz de sobreviver às possibilidades que lhe são apresentadas, tanto ao mundo do Vale quanto ao seu avesso. Passa a não pertencer a nenhum deles. Sua busca é só destemor, sem chance de sucesso.

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No entanto, esse insucesso, a impossibilidade de homeostase dele resultante, aquilo que aparentemente era sua perdição, será seu mote, sua salvação. Será a chave de sua afirmação como ser de linguagem, vislumbrador de interstícios, habitante do fora de suas dúvidas, quando lhe será permitido vê-las, aceitá-las e compreender-se como compreender-ser em des / reconstrução, tal como a linguagem, da qual provém seu próprio barro.

E ouvi que dizia, em minha voz natural, mas dizia muito baixo: “Já não sou o mesmo.” Entre os dois, o que se despedira de Jerônimo na fronteira do vale e o que agora despertava, havia mais que um intervalo no tempo. Havia a morte, eu sabia. Estivera sepulto e não escapara totalmente à cerração. (ADONIAS FILHO, 1978, p. 127-128)

A porção final da citação (“Havia a morte, eu sabia”) ratifica a proposição da morte como alegórica, estatuindo em Alexandre o poder de signo de linguagem em trânsito.

Uma proposição fácil também poderia impor à crítica a ideia de que Alexandre desejasse conhecer um “outro mundo” que não aquele sabido por ele; que, a partir daquele conhecimento adquirido pela experiência naquele “mundo novo”, suposto por histórias (que por vezes se confundem com lendas) contadas por Jerônimo, o protagonista voltasse de sua jornada, armado com um saber proibido àqueles viventes do Vale, e transformasse aquela realidade, transgredisse aquela forma de vida e a tornasse mais justa, ou reinstaurasse aquele universo com a delicadeza aprendida. Mas Alexandre não vem da mesma origem de Ulisses, muito menos se supõe que fosse essa sua pretensão. O herói de Memórias de Lázaro nega-se como herói clássico. Não sai do Vale do Ouro com a proposta de aprender, voltar e transformar: ele apenas sai movido por uma força que desconhece, que não domina. Sua motivação é a mesma da lava que transborda do vulcão, movido por forças abaixo dele e à sua volta que não domina. Não tem em mente voltar, não há

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Penélope ou Ítaca aguardando seu retorno. Alexandre parte sem a possibilidade do retorno, parte apenas porque precisa.

Resgatem-se mais exemplos da tradição literária e veremos que seus personagens sempre almejam o retorno àquele mundo conhecido por eles antes de sua epopeia. A Alice de Lewis Carroll, mesmo quando naquele mundo do negativo (no sentido técnico da fotografia) do mundo, sempre desejou o mundo de fora do espelho. O Chapeleiro Louco ou o Coelho Falante são personagens que a menina precisa encontrar para tornar-se forte, para alcançar a compreensão do rito de passagem da infância para a puberdade e retornar ao mundo conhecido, mezzo mulher reinstaurada que é ao fim da narrativa. Igualmente Dante Alighieri adentrou o Inferno em busca de sua Beatriz, mas seu desejo sempre foi retornar. Alexandre, ao contrário, encarna a própria travessia para o negativo daquilo que vive, só busca o “outro lado” do seu mundo para conhecer seu inverso, alma em eterno desouvrement.

O que seria a ruína de Alexandre (a desconstrução que se opera no personagem) se torna sua salvação – não a salvação medianamente compreendida, aquela que se opera graças à paz proporcionada a quem a alcança, mas uma salvação imposta pelas perguntas que se instauram no personagem e que transformam seu ser num reino de conflitos. Alexandre sai do Vale eivado de afirmações e verdades, confirmadas pela palavra de Jerônimo, e retorna apenas carregando perguntas. É certo que seu desejo é encontrar respostas no oposto do mundo do Vale, mas ele não as alcança – apenas as aguça.

Assim, Alexandre, no falar glissantiano, criouliza-se. Ou: amalgama suas experiências, tornando-as fragmentos, porções que assumem acima de tudo sua incapacidade de apreensão dos universais a que até então estivera acostumado. Ao ver frustrado seu projeto, vê-se desabilitado para ambos os mundos conhecidos e encarna a figura do homem sem alternativas – afastado daquela de conformação com um mundo dado – e se vê frente a frente com a imprevisibilidade. A transmutação operada em Alexandre em ser de linguagem o aproxima daquele amálgama identitário concebido por Glissant.

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Ele consegue, à revelia do poder daquela palavra cristalizadora de Jerônimo, aceitar a possibilidade de existência de um mundo diverso e de uma outra lógica, mesmo que esse vislumbre o leve à incerteza. É a imprevisibilidade rizomática, percebida no aceite do amálgama de espaços que habitou, que vemos sobrepujar a experiência radicular ancestralmente vivida pelo personagem.

O embate raiz-rizoma surge patente, especialmente no momento final da obra. Nele, entrevemos a inconstância do mundo das palavras adentrando o protagonista, que se transmuta em signo – elemento mais identificado com a assunção de sua origem multifacetária, significante e significado, palavra e mundo, do que com suas formações de origem, apegadas a um tempo e um espaço claramente definidos e excludentes, pois afirmadores de uma identidade. O canal de lodo figura, portanto, como a afirmação de uma negação. Negação, pois se afasta de asserções que excluem, apartam e obstroem a apreensão dos mundos de Alexandre como regiões de dúvida e de impossibilidade da obtenção de resposta única.

O apego às asserções, presente na palavra de Jerônimo, agora é suplantado pela chance de mudança de paradigmas do mundo de Abílio, que aos poucos se trama, de lenda para realidade possível. A conciliação pela liberdade, esta posta ombro a ombro com a finitude estabelecida no suicídio de Alexandre no canal de lodo, se frustra nesse momento, só se consumando nas últimas linhas da narrativa.

A morte, para Alexandre, é sua utopia; é nela que ele se funda e funda seu universo (identificado com aquele instaurado pela operação literária, proposto por Blanchot); é nela que ele se torna áspero, personagem com textura, reagente a toques, distinto daquela conformação atávica da qual era vítima. Essa escolha por um ideal de liberdade é uma caixa de Pandora ao avesso para Alexandre: seu destravamento potencializa fantasmas que ele acreditava inertes, e essas aparições per mitem que ele se desvencilhe daquele movimento de conformação atávica.

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Adonias Filho mostra-se irmanado com as bordas, pois é periférico tanto como brasileiro (periférico em relação às nações ditas desenvolvidas) quanto como nordestino (um periférico em uma nação periférica). As marcas de formação do autor baiano ficam salientadas primeiramente na construção enunciativa de seus personagens, que prescinde da utilização da variante linguística esperada e entroniza a norma instituída da língua – estabelecida, como se sabe, pelos estratos linguísticos hegemônicos. Além disso, o fato de pertencer à classe dos que estabeleciam as leis “de ferro” para aquela sociedade (nordestina, rural, ancorada em regras suprainstitucionais de relacionamento social e submissão) igualmente transparece em seus romances, estruturalmente construídos como que por poderosa argamassa. Não são obras abertas, as adonisianas, mas construtos bem organizados e, neste particular, mais identificados com os romances produzidos até o século XIX. Suas obras divergem das que podemos verificar em outros escritores do período, ou anteriores, que permitiam que a experimentação atingisse a estrutura de seus romances – Joyce (Ulisses) e Faulkner (O som e a fúria) são exemplos dessa “descorporificação” nas fundações (se formos compará-los a casas) de seus livros.

Denotaria descuido uma abordagem de Alexandre, personagem irrompido do solo realista moderno regionalista, sem reterritorializarmos sua travessia no espaço (rural, nordestino) em que se move. Esse lugar é caracterizado pelas relações de poder existentes no interior cacaueiro brasileiro, reestruturadas, como já se disse, pelas transformações políticas sofridas pelo país. Alexandre carrega um novo crivo do binômio personagem-linguagem, pois ajuda a traçar a distância entre o regionalismo de origem e o “novo regionalismo”, do qual Adonias Filho é representante, sobretudo pela via do foco narrativo de matriz faulkneriana.

Em seu conto “O túnel”, o escritor suíço Friedrich Dürrenmatt (2006) alegoriza o século XX e profetiza um terceiro milênio de muros derrubados e de ideologias fraturadas. O conto trata de uma viagem de trem. O comboio parte e, após minutos de viagem, entra

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num túnel. Em vez de seguir rumo à saída do túnel, como era de se esperar, o trem mergulha num abismo sem fim. A ambiência da narrativa avança como um duplo dos vagões em sua viagem zunente túnel adentro: acelera, pressuriza, arrebata, assusta, embriaga. O túnel então passa a descer mais verticalmente e o desespero do protagonista se exponencia em sequência. A viagem túnel adentro passa a ser uma queda em direção às entranhas da Terra, e o trem entra veloz num mundo de pedra que não se sabe onde e se um dia vai acabar. Em dado ponto da narrativa, o personagem pensa com seus botões: “Aparentemente nada havia se alterado, mas na verdade o poço já nos havia engolido para suas profundezas” (DÜRRENMATT, 2006 p. 87). Aqui a leitura nos levaria à alegoria do percurso humano que, inconsciente de sua trajetória rumo à destruição apenas avança, cego? Ou pode-se descortinar, a partir do texto de Dürrenmatt, a imagem do século XX, tradutor da transformação do homem em peça de um jogo composto por dois grandes jogadores, cada um julgando-se dono de uma verdade? Ou, enfim, uma alegoria da experiência da literatura, que nos põe frente a frente com o desconhecido da natureza humana e nos impõe a morte como forma de compreensão do mundo? Círculos infernais, travessias ou mergulhos rumo a um ponto de chegada que não existe, as travessias de Dante e do personagem de Dürrenmatt são a mesma do heroi adonisiano, aqui identificada com o abismo necessário à própria manutenção da literatura enquanto atividade humana. A morte aqui figura como o elo entre o homem perdido do princípio da obra de Adonias Filho e o personagem autenticado por suas hesitações das últimas páginas. “Não se trata de uma exposição da memória involuntária, mas do relato de um aprendizado”, sugere Deleuze (DELEUZE, 2006, p. 3).

Assim, a memória do Alexandre-Lázaro não o permite apenas voltar-se para o passado, mas igualmente galgar o futuro, ainda que a força pretérita se faça presente, como no anjo de Klee. O enigma de Alexandre não está no Vale do Ouro, nos seus cavalos selvagens, em Jerônimo, Natanael, Gemar Quinto ou Rosália. Não é a síntese

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de uma existência, mas sua negação, a assunção do nada inerente ao seu trânsito na palavra da literatura. Alexandre declara-se morto para os mundos e as palavras com os quais teve contato quando mergulha no mistério da própria morte e autoreinstitui-se como elemento de uma poética, indagador, habitando um espaço estético atrelado ao mundo narrativo do autor baiano.

O saber, no protagonista de Memórias de Lázaro, não é seguro e jamais admite conclusão, irmanando-se com a recherche proustiana. O que diferencia o Bildungsroman, canônico, da “formação” sígnica de Alexandre é que esta última aponta para um fim sem alcançá-lo, jamais completa o círculo, espirala-se infinitamente como o túnel fantástico de Dürrenmatt. Ela manifesta-se como quebranto, na inanidade de suas tentativas. Pode-manifesta-se entrever apenas algo como um personagem ciente de suas impossibilidades (como Rosália, Natanael ressuscitado ou Jerônimo, que se apresentam como reinstaurações impossíveis), sobretudo quando diante do valão. Nesse momento, a morte assoma como sua Beatriz, seu “ainda não”, sua busca incessante, nunca um descanso, movimento vão. A morte figura como intento último de formação do sujeito Alexandre que, desabilitado para o mundo real, torna-se ser de linguagem (FOUCAULT, 2009, p. 222).

Alexandre torna-se “mais real que própria realidade”, como Blanchot afirmara. Aqui se trata de uma dimensão essencial ao vínculo com o território e seu momento histórico dar conta das linguagens, possíveis, que o dizem e o refazem.

A dor da pedra

A segunda premissa de Alexandre figura como um negativo da primeira. Em seu “primeiro mundo”, o vale e a estrada surgem como a espinha dorsal em volta da qual transitam, como zumbis, buscando um significado para suas existências, seus personagens “minerais”:

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cristalizados pela dor sem se aperceberem dela, monólitos de pedra que, num primeiro momento, parecem impenetráveis, mas que, pouco a pouco, por força de uma tessitura paciente de ourives, deixa entrever-lhes, e sob eles, como que lençóis freáticos nas quais são escaldadas suas tragédias.

O vale e a estrada não perfazem apenas um espaço, geografia física na qual a trama se desenrola. São a motivação para a constituição de um ambiente mental atormentado que persegue o protagonista desde as primeiras linhas. Ao vale e à estrada, completando uma trindade que acorrenta os homens àquele espaço, temos o vento constante e enlouquecedor. Tal tríade consubstancia o locus por onde transitam aqueles personagens-zumbis. Espaço que é mágico, poderoso e, como já dissemos, sacralizado pelas asserções de Jerônimo, e nega a tradição naturalista clássica, pois vemos aqui personagens que, sob o manto de uma pedra insubmissível, revelam as dores de quem não se constitui como cidadão do mundo.

A zona cacaueira baiana, espaço dominante, sobretudo nos livros da chamada “trilogia do cacau” de Adonias Filho, serve como suporte para uma exploração da alma primitiva. Glissant refere-se a esses espaços como amálgamas telúricos, lugares plenos de violência e pobreza historicamente institucionalizadas e de interpolações culturais diversas.

O marco divisório de estilos espaciais (dentro e fora do Vale do Ouro) permite, por deslocamento, aproximação com o conceito de espaço literário blanchotiano. O primeiro espaço se opera graças à representação clássica, um exercício realista de cânone, em oposição ao segundo espaço, fomentador de dúvidas. Há momentos da narrativa que permitem que se questione se esse segundo espaço não seria pura imaginação, tão desatrelado do mundo conhecido pelo protagonista.

O Vale do Ouro, porém, era uma miragem. A dolorosa miragem gerada pela mata. Podia-se acreditar em muitas coisas, naturalmente. Havia o

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mar, por certo. Existia uma cidade como Ilhéus, era verdade. Mas, quem podia crer em um vale seco, eternamente fustigado pelo vento, habitado por homens brutos e cavalos selvagens? (ADONIAS FILHO, 1978, p. 139)

Assim, o Vale e o extra-Vale por vezes se confundem por ser inapreensível a definição do que é o imaginário e do que não é; de que espaço pode ser considerado como literário, da linguagem ressignificada, e do outro, espaço do “real”. Lembre-se da observação de Terto, quando afirma ser o Vale ideia de loucos: aqui, caracteriza-se o vale como ficção, “estória”, lenda, universo fantástico.

O momento do retorno de Alexandre ao Vale ratifica a suposição de que aquele espaço seja puramente naturalista não tem fundamento. A distância que separa o Alexandre do início da narrativa desse personagem que retorna ao Vale é imensa, e espelha a diferença entre a influência que o personagem sofria daquele espaço com a que sofre quando de seu retorno a ele. Nesse terceiro momento da narrativa, o duplo de Alexandre vislumbra o abismo, as realidades anteriores e posteriores à experiência de sua travessia, o que faz com que o anjo de Klee novamente emerja como imagem à perfeição.

O Vale, assim, assume inicialmente para Alexandre o estatuto de um lugar / mundo / espaço atávico, único possível ou imaginável. Posteriormente, suas experiências exteriores transformam ambos os lugares habitados por ele em alternativas crioulizantes do odisseu adonisiano. Os monólitos espaciais transmutam-se em amálgamas por onde os seres se movem, possibilidades de contato com o caráter compósito de uma morte figurada, ocorrida no lodo. Nesse ponto, inclusive, é curioso perceber que a morte figurada une-se à idéia de mortificação do corpo, pois o elemento utilizado para essa dupla operação é um canal putrefato – que é identificado com a morte física, esta trespassada por líquidos, gases, miasmas e tecidos explodindo.

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O movimento de Alexandre rumo à memória reinstalada o aproximam do leitor, que passa a ser tido, neste movimento centrípeto de interiorização e compreensão de seu universo, como seu principal interlocutor, cúmplice maior. Essa operação é reforçada pelo fato de a voz de Jerônimo, fora do Vale, aos poucos tornar-se quase inaudível, fazendo com que Alexandre mergulhe cada vez mais profundamente em seu universo de interrogações e devaneios líricos, perdido que está no labirinto de uma memória problemática e, por isso, rica de elementos. Alexandre incorpora ontologicamente a imprevisibilidade: o periférico tem seu aprendizado consumado pela narrativa.

É nesse momento que a segunda premissa se agudiza. O que fundamenta a ordem do espaço fora do Vale é a palavra de Natanael. Com o mesmo sentido de palavra sagrada, ela fundamenta uma “nova lógica”. No entanto, deve-se atentar para o perigo de cair numa contraposição simplória de universos opostos. Para isso, propomos o resgate da alegoria do espelho, compreendida como fronteira líquida não-cindante. Se ela derroca o conceito de domínios autoexcludentes, declarando-os pertencentes ao mesmo meio, como as superfícies acima e abaixo de um lago, e predispondo-as a transcomunicações como ocorre com os fenômenos de evaporação e precipitação da analogia do lago, igualmente a obra, a linguagem por ela utilizada e as teorias de que se lança mão para o trabalho crítico, antes de serem considerados elementos apartados entre si, compõem movimentos cíclicos e amorosos de aproximação, provocando ampla legitimação: da obra, da linguagem, da teoria.

A segunda premissa (a palavra de Natanael) não serve apenas para ressaltar uma diferença de episteme entre dois universos diferentes. Também aqui cairíamos na solução fácil da oposição claro-escuro. Esta segunda palavra também sacraliza uma lógica de mundo, e serve a Alexandre para desfazer suas cristalizações históricas e esmaecer o poder da palavra sagrada anterior (Jerônimo). Já em casa de Natanael, Alexandre questiona o poder das duas palavras: “a comparação que interiormente surgiu não

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foi entre o vale e a nova terra, mas entre Natanael e Jerônimo” (ADONIAS FILHO, 1978, p. 150).

A palavra de Natanael desfaz a certeza do mundo do protagonista e nele cria dúvidas. É a palavra do caos, contrapondo-se à palavra da ordem. Enquanto a primeira nega o passado e o futuro, atendo-se apenas a um presente imobilizante e determinante, a segunda premissa permite ao protagonista o vislumbre da malha do tempo; permite-lhe, enfim, tecer pontos de contato entre aqueles elementos que o constituíram como ser – Jerônimo, Abílio e sua mãe, Rosália. No entanto, essa operação não ocorre afirmativamente, não se impõe como outra verdade emudecedora de outras vozes. Ela apenas predispõe Alexandre a aceitá-la como “um outro lado”, outra voz naquele mundo plurívoco recém-aprendido pelo protagonista.

Ressaltamos aqui uma característica libertadora para esta segunda premissa, pois, ao descristalizar uma sacralização (afirmada pela palavra de Jerônimo, legitimadora do mundo aparentemente inquestionável do Vale), ela se mostra, a um só tempo, sagrada e laicizante. Menos complicada a compreensão de seu caráter sagrado, pois facilmente se verifica que ela institui uma ordem – mais suave, menos assertiva – e autentica um “eu falo” daquele mundo, a seu modo tão cosmogônico quanto seu antecessor. As palavras de Natanael é que substantivam aquela sacralização, ao afirmar a lógica da delicadeza, que acaba por tomar o lugar da anterior liturgia da aspereza presente no espaço do Vale. Ela é que permitirá, ao cabo, que o protagonista consiga, mesmo que ainda identificado com sua antecessora natureza de pedra, vislumbrar a dor de sua assunção como ser de linguagem; assunção que demandará o enfrentamento da sua própria finitude.

Utópica, sua morte será sua consagração como ser de papel, ser estético e amoral. Ainda “mineral” (pétreo, duro) como os demais viventes do Vale, Alexandre passa a admitir, em um esforço poético de compreensão da sua existência, a dor que sente, as perdas que amarga, as memórias que teimam em se dissolver em sua tentativa

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vã de viver apenas apoiado em reminiscências, algumas que nem lhe são próprias, como aquelas ouvidas da boca de Jerônimo, sem amparo de uma visão de seu futuro.

Por que adjetivamos a segunda premissa de laicizante? Digamos que ela aja como um negativo, um oposto que combate aquela voz sagrada do mundo antes conhecido pelo heroi adonisiano, e o auxilie a desbotar aquela ideia sagrada que trouxe do Vale, que, no entanto, ainda ecoa nas palavras de Jerônimo que o acompanham.

Em termos estruturais, a palavra de Natanael é fundamental para a narrativa, pois a desestabiliza, torna-a inerte a cristalizações fáceis a que algumas narrativas se permitem: sem ela aquele primeiro espaço, duro, do Vale, não teria opositores e dominaria a estrutura da obra, que se mostraria uma reedição categórica de um naturalismo ultrapassado. É essa segunda premissa / palavra que confere o dinamismo e o interesse que a obra desperta, ao transformar o uno em duvidoso, a cristalização em devir. Ela se mostra tão fundamental para a obra quanto o segundo espaço habitado por Alexandre o é para o espaço do Vale, retirando-lhe aquela aura naturalizante.

Este duelo entre as duas palavras mostra-se ontológico, pois situa em Alexandre o vértice de duas formas de ver o mundo. O herói de Adonias Filho procura definir e compreender seu destino, quase sempre sem consegui-lo. E talvez nem seja essa sua pretensão. A morte e a morte do Lázaro

O essencial de Memórias de Lázaro é aquilo que aparenta ser seu pano de fundo: nessa argamassa usada para sua construção subjetiva, na montagem caótica do mosaico-Alexandre, a morte surge como única saída, uma vez que o distancia de uma interioridade superficializante e o encaminha para a liberdade do olhar da exterioridade, para o lugar de fora, onde, conforme Foucault (2009), desaparece aquele que fala.

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A linguagem literária escapa do discurso cristalizador e aprisionador, debate-se contra a prisão da representação e se desenvolve a partir dela mesma, no mesmo movimento em que se afasta de si, dispersando-se e deslegitimando-se como verdade, afirmando-se como continuum e revelando sua máxima clareza. É nesse ponto que emerge a morte como caminho do encontro do signo literário com seu próprio vazio, lugar máximo da afecção literária. Nesse percurso, a morte não se apresenta como portadora de uma resolução final, um construto engessado ou um fim em si, mas como desconstrução de afirmações definitivas, desouvrement. Em sua trajetória, o protagonista, analogamente ao Dante da Divina comédia, perpetra travessias – círculos infernais de ensimesmamento, de autocompreensão. Podemos entendê-los como espirais verticais rumo a um suposto interior abissal, antes inescrutável, que o levarão ao vislumbre de seus conflitos interiores. Cabe a pergunta: quem foi o “professor” de Alexandre? Quem lhe forneceu uma pista que fosse para que se dispusesse a enfrentar seu fim, ser de carne que se transubstancia em ser de papel? Quem, se a morte estava todo o tempo presente para Alexandre, fosse nos cavalos selvagens executados sem dó ou na filha que assassina o próprio pai, poderia lhe ter enviado sinais de que a morte lhe poderia servir para vislumbrar-se como sujeito / signo? O que faltava a Alexandre aprender, ou por que ainda não o fizera?

Podemos aqui nos voltar para Gemar Quinto, o leproso do Vale. Emblemático, ele já percorrera, no início da narrativa, todos os círculos infernais que Alexandre ainda percorreria. No entanto, o heroi de Adonias Filho não suspeita dessa experiência prévia. Em vez disso, apenas o julga, excluindo-o, como todos o fazem. Gemar não merece o discurso de Alexandre, que acredita estar acima dele, ser melhor que ele, julgamento afinado com o dos demais habitantes do Vale. Nem desconfia que Gemar é mais sábio, pois já aprendeu o que ele ainda não aprendeu: Gemar é a morte em si, carrega-a no corpo, que é sua linguagem, sua forma de se afirmar como signo

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naquele mundo. Ademais, Gemar Quinto é mal visto, julgado e excluído graças ao interdito que a morte representa para o homem (Cf. ARIÈS, 1989). O leproso encarna a morte da narrativa em vida, é como a clepsidra de Sêneca que permite ser perpassada pelo fio de água anunciador do fim, íntimos amantes.

Ainda levará tempo até que Alexandre adquira a sabedoria que a morte iminente já ofereceu a Gemar. O leproso já se serviu da ceia da morte e se delicia com o sabor que por vezes lhe retorna à boca; é um personagem que funciona como um aviso silencioso, premonindo o caminho que se insinua ao andarilho. Os mesmos abutres que se trancam com o corpo já morto de Gemar em sua casa também andarão em círculos sobre Alexandre em seu retorno ao Vale. Os signos da morte, da necessidade de transfiguração do heroi de ser real em ser estético mostravam-se a todo instante a ele, que precisou de todo o percurso da narrativa para conseguir decodificá-los.

É desse aprendizado da própria nulidade, do vazio que se instala, da escuridão da qual emerge a luz ofuscante que deslinda os caminhos da operação literária, que se articula com o efeito negativo da morte sobre a vida, que falamos. A partir desse trajeto de dispersão do ser real em ser de papel, signo, possibilidade, desconstrução, é que se trama a morte na narrativa desta análise. A morte plana, cotidiana, de podridões e adeuses emocionados pouco contou para a nossa investigação. Morte como distúrbio, distensão, afastamento, expansão infinita, (re)criação de mundos, desentronização de qualquer positividade, reino da pergunta e do desaparecimento do sujeito para o surgimento do ser da dúvida e da hesitação, matérias-primas de toda arte. É disso que trata a obra. É esse o fio que a torna obra.

Por fim, assinalamos que o caminho de Alexandre é cego, pois não há oráculo que lhe antecipe os passos – ou se há, como é o caso de Gemar Quinto, Alexandre não lhe dá atenção, o que torna seu intento puro fracasso. Antes disso, vemos mais um aprendizado pelo

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erro, pela falta de caminho a ser seguido e, sobretudo, pela distração; o personagem de Adonias Filho nega o estatuto clássico do heroi e não prediz o percurso que fará, nem ao menos sabe se um dia viverá um retorno ao lugar de onde veio, vivendo mais movido por verdades repetidas ao cansaço e menos por perguntas. Estas últimas demorou a aprendê-las e, quando o fez, entregou-se ao vazio. Perdido que estava em seus faróis voltados para trás, suas reminiscências – estas sim sua perdição. Por isso desprezamo-las: são mais desvio, miragem, que projeto de vida ou rota de análise. Em vez de, amparado pelas operações pretéritas, fazê-lo voltar-se para as possibilidades do futuro, as memórias amarram-no ao já vivido numa espiral infernal de interiorização e ensimesmamento sem Beatriz alguma a alcançar. Isso o imobiliza e o impossibilita.

A verdade e a morte: da raiz ao rizoma

Não há logos, só há hieroglifos. Pensar é, portanto, interpretar, traduzir. As essências são, ao mesmo tempo, a coisa a traduzir e a própria tradução; o signo e o sentido. Elas se desenrolam no sentido para serem necessariamente pensadas (DELEUZE, 2006, p. 95) A Terra precisa da cultura do Amálgama.(Jorge Mautner)

O exílio do protagonista de Memórias de Lázaro lhe permite rever a ordem do seu mundo, constrastando-a com a lógica do mundo exterior, o “mundo de Abílio”. Isso o leva a um mergulho no caos das realidades múltiplas. A despedida de Jerônimo abre caminho para a entrada de uma nova lógica para Alexandre:

– Do outro lado, o mundo de Abílio – disse.

Não me apertou a mão, nem seu próprio rosto distingui dentro das trevas. Afastando-se, regressando ao vale como se não pudesse escapar da prisão, exclamou com a voz tão forte que pode vencer a pancada do vento:

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No fim, como na filosofia, nunca se chega a uma certeza que baste. Podemos entender aquelas “outras verdades possíveis” como peças que compuseram ou comporão outro jogo de imagens que se perdem numa narrativa baseada em memórias, num carrossel de afirmações que se contradizem e se reerguem, castelos de verdades destronadas por possibilidades que não se assentam em fundamentos – as “abstrações do pensamento” de Nietzche.

A memória se mostra fragmentária, como fragmentária é a personalidade do Lázaro protagonista. Essa característica “lazariana”, remetendo ao personagem bíblico ressuscitado, igualmente o afirma como personagem duplo de si mesmo, antes e depois da morte (ou das mortes, se entendermos tanto suas travessias de e para o vale quanto seu fim no canal de lodo como mortes

possíveis), como o personagem de Umberto Eco2, náufrago que

não naufraga, imobilizado num navio encalhado no fim do mundo. A morte que mais nos interessa, no entanto, escapa à pura teia da narrativa, localizando-se na transformação do protagonista em signo de busca.

Assim, em Memórias de Lázaro, se existe a verdade, ela está na morte: seja a morte no canal de lodo, real, seja a morte do homem para o seu trânsito como signo: a morte do signo e os signos da morte. A primeira preexiste à própria narrativa e dela tira seu poder. Os seguintes, distribuídos pela trama graças a Gemar Quinto, Rosália, Roberto, Natanael e Jerônimo, dentre outros, acercam-se daquela para lhe dar substância estética. Esta é a verdade da obra, o fio tramado no poder da narrativa sobre a realidade. A filosofia e a estética aqui se juntam para dar potência ao universo selvagem do sertão rural de Adonias Filho. Universo que, num mesmo movimento, se aproxima e se distancia do regionalismo da tradição, que

2 Referimo-nos ao piemontês Roberto Pozzo, personagem protagonista de A ilha do dia

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(...) acaba trabalhando muito perto do mundo empírico, da mimese propriamente dita, dificultando a reinvenção do imaginário (...) trabalha sempre a um passo da estereotipia da paisagem, da personagem e da ação, da reprodução da linguagem, seguindo de perto o imaginário que se encontra pronto. (VICENTINI, 1998, p. 42)

O regionalismo adonisiano aproxima-se da tradição quando apresenta um espaço que, visto preliminarmente, determina as vidas dos seres. Mas seguir por essa análise trata-se de outro equívoco. O regionalismo do autor baiano, à semelhança de João Guimarães Rosa, não busca retratar um mundo; o universo rural adonisiano, com suas regras de brutalidade e seus códigos de vingança, apresenta-se tão-somente como suporte para a operação estética do autor de Memórias de Lázaro, que, no trato com seu personagem principal, toca no essencial: cansado de sua existência de animal, Alexandre consegue, naquele universo marcado e movido pelo trágico, entregar-se à sujidade do canal de lodo e determinar a impossibilidade de dar respostas definitivas à sua vida. Igualmente se aproxima da imagem do homem contemporâneo, que ultrapassou aquela postura lukacsiana de ser problemático lutando contra um mundo, para enxergar a realidade como fragmento, espaço de fissura que impede sua compreensão e desabilita totalidades.

O canal de lodo: o puro e o podre aqui se unem para que o signo da morte se aposse das angústias do protagonista, exponencie-as e exponencie-as lance àquele vazio de sua própria negação. Se reexponencie-assinalarmos os conceitos de raiz e rizoma, podemos por analogia identificar o desejo da busca de uma verdade única com a “identidade-raiz” de Glissant, dominadora e sistemática, que não admite outras vozes. Sua afirmatividade e inquestionabilidade mostram-se inábeis para explicar o mundo de Alexandre.

A outra lógica se identifica com o conceito de rizoma: não há raiz única, afirmação positivante, mas busca de outras possibilidades de raiz, verdades que não podem jamais se afirmar como verdades, pois, assim fazendo, perdem sua potência de fazer questionamentos.

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No meu entendimento, essa proposta significa sair da identidade raiz única e entrar na verdade da crioulização do mundo. Penso que será necessário nos aproximarmos do pensamento do rastro / resíduo, de um não-sistema de pensamento que não seja nem dominador, nem sistemático, nem imponente, mas talvez um não-sistema intuitivo, frágil e ambíguo de pensamento (GLISSANT, 2005, p. 29)

Assim, o canal de lodo representa a opção-rizoma do Lázaro perdido, sua possibilidade de se ver em vários espelhos, universos paralelos que, antes de se excluírem mutuamente, aceitam seus afastamentos. O tema de Memórias de Lázaro é a busca da verdade pela via da morte (pela aventura do signo que se afirma negando-se); busca de uma verdade que, à medida que a narrativa se desenvolve, vai-se mostrando mais delicada e quebradiça, reordenando aquela busca não mais para uma afirmação derradeira, mas para a aceitação do ambíguo e do rizomático imprevisível. A obra trata igualmente da busca de um homem que, imobilizado em ações pretéritas, debate-se para se libertar de suas memórias fragmentadas. O protagonista traça seu trajeto como uma linha que vai da afirmação à dúvida, do sim ao não. Mais importante que a morte física de Alexandre é seu caminho para ela, identificada que é com a incerteza e com o não.

Essa negação e esse vazio nos remetem por analogia ao conto de Dürrenmatt: como no túnel fantástico do escritor suíço, o desespero de Alexandre fica mais potente frente à indiferença dos outros. Exemplos disso: Jerônimo, indiferente à razão do retorno do protagonista ao Vale do Ouro, mais preocupado que está com a reação à notícia; os irmãos Luna, impassíveis ao sofrimento dos cavalos selvagens; Rosália, insensível à sua culpa por ter matado o próprio pai ou por tê-la imputado a Alexandre.

Naquele mundo, a apatia é a negação de uma lógica que afirma a (a)imoralidade de se matar o próprio pai. A negação (o não da morte), ao mesmo tempo em que encaminha o protagonista para o seu encontro como signo, o expõe a toda sorte de dúvidas.

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(...) alastrou-se o conflito entre um corpo destrutível e uma alma sem governo. Soube, naquele momento, que poderia humilhar o mundo – bastaria enlouquecer e matar a realidade. Antes, porém, teria que agonizar. E foi a agonia mesma que se iniciou quando, com os pés nus, comecei a travessia, dolorosa e interminável. (ADONIAS FILHO, 1978, p. 113)

Deleuze afirma que o signo é o objeto de um encontro (DELEUZE, 2006, p. 91) não passível de síntese, mas pleno de dissipações. Assim, o que seduz na compreensão de Alexandre, como signo se debatendo na tormenta da narrativa, é o fato de ele não se encerrar numa afirmação, mas se embrenhar na criação de linguagem, neste movimento envolvendo a busca e sua esperada dispersão.

Por isso, é no mínimo suspeito afirmar que, em suas últimas páginas, Memórias de Lázaro traduza Alexandre como personagem que alcançou a verdade. Em vez disso, apontamos que o heroi de Adonias Filho tenha achado um caminho para a afirmação de suas dúvidas.

Agora, unicamente o maravilhoso caminho, aquele caminho que se não pode comparar à estrada do vale, mas o caminho que se abre, aos meus olhos, pela mão de Abílio, meu pai. Vejo-o, na frente, a guiar-me. Em volta, o que resta é negro. O meu pobre coração já não enxerga, inúteis as minhas mãos – não mais doem, no meu corpo, as feridas. O cérebro não interroga, a língua não fala. Mas andam os pés, vagarosos. (ADONIAS FILHO, 1978, p. 161)

O inferno e o paraíso são imagens afirmativas e excludentes, e encaminham o pensamento para uma afirmação-raiz. Negro e branco. No entanto, as travessias de Alexandre, antes de o levarem a respostas que o coloquem numa espécie de paraíso ou o encaminharem a um inferno de existência, inserem-no em seu purgatório. Essa região cinza, rizomática porque distante de conclusão unívoca, lugar não-território como o que quer Glissant,

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no qual a diversidade do autor martinicano, se oferece como a alternativa de imprevisibilidade, como se vê na narrativa adonisiana. Entrevemos o conceito deleuziano de rizoma e os encaminhamentos teóricos de Glissant (notadamente o de comunidades compósitas) servindo de lentes para se observar Adonias Filho, mais detidamente o Vale do Ouro. Espaço dominante da narrativa, o Vale identifica-se com os traços culturais de mestiçagem dos quais aquela população surge como resultante.

É certo que a população do sul cacaueiro baiano foi formada nos incontáveis trânsitos de comunidades diversas por aquele espaço. Os negros, vindos como escravos, ali se assentaram e se mantiveram, à revelia do fim do regime escravagista. Os brancos, identificados com a classe dominante da região, graças a intercursos sexuais com a população negra, fartamente abordados pela literatura, e indígena atualmente figuram como mestiços de pele mais clara, contudo. Agregando-se a essa mescla de populações e comunidades, etnias diversas em constante trama, ainda há os descendentes árabes, igualmente figurados pela literatura de um Jorge Amado, por exemplo, e até hoje presentes naquele espaço. É o caos-mundo glissantiano visto em microcosmo.

No entanto, é naquele espaço que a narrativa, mesmo que provisoriamente, se territorializa. É nele que as relações são tramadas e é dele que surgem as regras de selvageria explícitas nos gestos e na vida daqueles habitantes. O traço mestiço dos viventes daquele espaço os insere na região limítrofe de culturas que se batem, jamais buscando conforto, mas confronto – um enfrentamento com o que há de instável naqueles trânsitos intercomunitários. Esse caráter imprevisível do diverso é específico na escrita de autores

pertencentes a zonas culturais compósitas3, regiões de fronteira,

fenômeno cunhado por Glissant como “tormento da linguagem”

3 Interessante assinalar, neste pormenor, semelhança entre os tratamentos discursivos

de Adonias Filho e William Faulkner, pois ambos se ocupam de personagens habitantes de regiões e culturas limítrofes.

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(GLISSANT, 2005, p. 131), nas quais inserimos o escritor baiano e o espaço por ele utilizado.

O “novo regionalismo” adonisiano impõe-se como elo com as experiências literárias contemporâneas, pois redimensiona o conceito do realismo do século XIX e parte do XX, admitindo a multifacetação, a indefinição de verdades apropriadas e cristalizadas e a fragmentariedade, características das formas narrativas em curso na segunda metade do último século. Sendo assim, é a obra de Adonias Filho forjada graças uma escrita do amálgama, pois se identifica, tanto no que respeita às populações por ela tratadas, quanto aos lugares por elas transitados, com os espaços, identidades e culturas estudadas por Édouard Glissant.

Aquelas populações detêm, em sua visão de mundo, as aproximações e conflitos inerentes às apropriações e trocas culturais presentes nos espaços instáveis de resultantes imprevisíveis. Essa escritura do amálgama promove, a um só tempo, aproximações e afastamentos da tradição, ora relacionando ora distanciando-se de uma escrita embasada numa matriz regional, como simples enraizamento em valores culturais. Admite, ora as verdades seculares cristalizadas por aqueles espaços rurais, ora as incertezas e os embates, a conversação infinita de culturas, características de espaços concebidos por Glissant como compósitos.

Essa escrita “multilocalizada” e problemática, pois ao mesmo tempo lida com resíduos de cultura e nega-os com vistas ao mergulho na diversidade, Glissant bem caracteriza, ao perguntar: “como ser si mesmo sem fechar-se ao outro, e como abrir-se ao outro sem perder-se a si mesmo?” (GLISSANT, 2005, p. 28). A resposta não pode nada afirmar, pois ela determina o modo com que as chamadas “culturas compósitas” das Américas lidam com suas heranças culturais e históricas – abortando os projetos de identidade de raiz única que excluem aquilo com que não se assemelham, para abrirem-se à desordem do mundo, à “difícil complexão de uma identidade relação (...) que comporta uma abertura ao outro, sem perigo de

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diluição” (Idem, p. 28), ao fenômeno da crioulização – uma tentativa de sair do confinamento a que o mundo se vê reduzido.

A vocação para o trágico e para o mítico evidencia-se na escrita adonisiana, que faz uso das referências à tradição literária (como na morte de Roberto que, tendo cometido incesto com Rosália, é punido por Alexandre com a perfuração dos dois olhos, antes de ser estrangulado por Jerônimo, apontando, desse modo, para a intertextualidade com o mito de Édipo). O mito da subserviência do povo aos grandes fazendeiros é mantido, mesmo após a extinção ou o enfraquecimento daquele poder local. Aquela ritualística de subserviência ajuda a manter a lógica da violência para aqueles que propuserem a transgressão da conhecida reverência de “beija-mão”. No que há de específico em Adonias Filho, os signos presentes em sua escrita remetem, a um só tempo, ao universo do regionalismo brasileiro e às propostas de renovação narrativa do início do século XX, como as suas experimentações de foco narrativo, já mencionadas.

A abertura de sua narrativa ao projeto moderno de construção do romance e a sua atuação como crítico literário, portanto, tanto o aproximam ainda mais daquelas tendências de renovação quanto criam a exigência de um olhar diferenciado porque particular sobre sua obra. Seu viés de crítico literário dá força a hipóteses sobre a impossibilidade de uma “inocência” no trato narrativo quando o autor se utiliza de recursos narrativos presentes naqueles romances “de renovação” do início do XX. Tudo isso nos obriga a circunscrever o projeto literário adonisiano na cena contemporânea, tanto da literatura quanto da teoria.

Referências bibliográficas

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ARIÈS, Philippe. Sobre a história da morte no ocidente desde a Idade Média. Trad. Pedro Jordão. Lisboa: Teorema, 1989.

BLANCHOT, Maurice. A parte do fogo. Trad. Ana Maria Scherer. Rio de Janeiro: Rocco, 1997.

DELEUZE, Gilles. Proust e os signos. 2ª. Ed. Trad. Antonio Carlos Piquet; Roberto Machado. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2006.

DÜRRENMATT, Friedrich. A pane. Trad. Marcelo Rondinelli. São Paulo: Códex, 2003.

FOUCAULT, Michel. Estética: Literatura, pintura, música e cinema. MOTTA, Manoel Barros da. (org.) 2ª. Ed. Trad. Inês Autran Dourado Barbosa. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2009.

____. As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas. Trad. Salma Tannus Muchail. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

GLISSANT, Édouard. Trad. Enilce do Carmo Albergaria Rocha. Introdução a uma poética da diversidade. Juiz de Fora-MG: Editora UFJF, 2005. RÓNAI, Paulo. A arte de contar em Sagarana. In: ROSA, João Guimarães. Sagarana. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2006.

VICENTINI, Albertina. O sertão e a literatura. Sociedade e cultura, jan/ jun 1998.

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