PARECER/CONSULTA TC-005/2006
PROCESSO - TC-4217/2005
INTERESSADO - COMPANHIA ESPÍRITO SANTENSE DE SANEAMENTO - CESAN
ASSUNTO - CONSULTA
SERVIDOR PÚBLICO DAS SOCIEDADES DE ECONOMIA MISTA NO EXERCÍCIO DE MANDATO ELETIVO - NÃO APLICABILIDADE DO ARTIGO 38 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL - IMPOSSIBILIDADE DE OPÇÃO PELA REMUNERAÇÃO - RECEBIMENTO DOS SUBSÍDIOS CORRESPONDENTES AO CARGO DE VICE -PREFEITO, PAGOS PELOS COFRES MUNICIPAIS.
Vistos, relatados e discutidos os presentes autos do Processo TC-4217/2005, em que o Diretor Presidente da Companhia Espírito Santense de Saneamento - CESAN, Sr. Paulo Ruy Valim Carnelli, formula consulta a este Tribunal, nos seguintes termos:
Considerando que é da competência deste Tribunal decidir sobre consulta que lhe seja formulada na forma estabelecida pelo Regimento Interno, conforme artigo 1º, inciso XVII, da Lei Complementar nº 32/93.
RESOLVEM os Srs. Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado do Espírito Santo, em sessão realizada no dia quatorze de fevereiro de dois mil e seis, por unanimidade, acolhendo o voto do Relator, Conselheiro Dailson Laranja, preliminarmente, conhecer da consulta, para, no mérito, respondê-la nos termos da Instrução Técnica nº 506/2005 da 8ª Controladoria Técnica, firmada pela Controladora de Recursos Públicos, Srª Vanessa Costa Righi de Oliveira, e do Parecer nº 0449/06, da Procuradoria de Justiça de Contas, da lavra do Procurador-Chefe da Procuradoria de Justiça de Contas, Dr. Ananias Ribeiro de Oliveira, abaixo transcritos:
INSTRUÇÃO TÉCNICA 506/2005 DA 8ª CONTROLADORIA TÉCNICA:
Transpostas as fases preestabelecidas no art. 97, caput e § 2º, do Regimento Interno desta Corte (Resolução TC-182/2002), tendo se manifestado a autoridade competente pela admissibilidade da presente consulta, remetem-se os presentes autos a esta 8ª Controladoria para análise e emissão de INSTRUÇÃO TÉCNICA. Trata o presente feito de consulta formulada pelo Sr. Paulo Ruy Valim Carnelli, na qualidade de Diretor Presidente da Companhia Espírito Santense de Saneamento. Indaga o consulente, nos seguintes termos: “(...) o Supremo Tribunal Federal entende
que ao vice-prefeito, mesmo quando empregado de sociedade de economia mista, aplicam-se as mesmas regras que alcançam o prefeito municipal. Nesse sentido, o vice-prefeito ‘será afastado do cargo, emprego ou função, sendo-lhe facultado optar pela sua remuneração’. Sendo assim, perguntamos: uma vez facultada a opção remuneratória, e considerando que o vice-prefeito seja empregado público de uma sociedade de economia mista e opte pela remuneração desta, quem deve arcar com o ônus financeiro?” É o relatório. DO MÉRITO O questionamento apresentado
dos servidores públicos (em sentido lato) no exercício de mandato eletivo, especialmente no que concerne ao mandato de Vice -Prefeito. De fato, assiste razão ao consulente quando afirma ser a regra do art. 38, II da Constituição Federal (servidor público investido no mandato de Prefeito) aplicável ao servidor investido no mandato de Vice -Prefeito. Este é o entendimento do Supremo Tribunal Federal, abarcado por esta Corte no Parecer 13/2005. De fato, o Vice -Prefeito encontra -se permanentemente à disposição para o exercício do mandato, sendo substituto imediato do Prefeito (nos casos de afastamentos eventuais) e seu sucessor legal (nos casos de vacância do cargo). Desta forma, fica garantida a faculdade de opção pela remuneração do cargo, emprego ou função, em detrimento do
subsidio do cargo eletivo. Prosseguind o, o
consulente aponta especificamente a situação dos servidores públicos (em sentido lato) das sociedades de economia mista, hipótese que merece análise mais detida. A regra do art. 38, caput, da Constituição Federal sofreu alteração com o advento da Emenda Constitucional nº 19/98 (Publicada no DOU de 05/05/1998). Vejamos: Redação Anterior
“Art. 38 - Ao servidor público em exercício de mandato eletivo aplicam -se as seguintes disposições:” Redação Atual (EC nº 19/98) “Art. 38 - Ao servidor público da administração direta, autárquica e fundacional , no exercício de mandato eletivo, aplicam -se as seguintes disposições:” (grifos
nossos) Verifica -se ter o diploma legal direcionado a regra para os servidores da administração direta, autarquias e fundações (servido res públicos em sentido estrito). Assim, servidores públicos (em sentido lato) das sociedades de economia mista estão afastados de tal disciplinamento. No texto de seu questionamento, o consulente refere -se a
posicionamento do Supremo Tribunal Federal
anterior ao advento da Emenda Constitucional nº 19/98. Entendeu a Corte Suprema que os servidores
das sociedades de economia mista estariam
38 da Constituição Federal, não havendo possibilidade de opção pela remuneração, resta prejudicada a análise do questionado. Passamos às considerações pertinentes. É preciso, d e início, fazer distinção entre as sociedades de economia mista que exercem atividade econômica (art. 173, § 1º, CF) daquelas prestadoras de serviço público (art. 175, CF). A diferença apontada é relevante, já que os servidores públicos (em sentido lato) v inculados a uma ou outra entidade podem subordinar -se a regime jurídico diverso (pelo menos teoricamente), com consequências distintas na investidura em mandato eletivo. Em relação às sociedades de economia mista que exercem atividade econômica, a Constituição Federal estabeleceu regra clara quanto
sua sujeição ao regime jurídico próprio das
empresas privadas. Vejamos: “Art. 173. Ressalvados
os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quand o necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. § 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade ec onômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: (...) II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas , inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários;” (grifos nossos) A mesma regra não foi estabelecida pela
Constituição para as sociedades de economia mista que prestam serviços públicos. Assim, ao menos teoricamente, tais entidades podem adotar o regime trabalhista ou o estatutário. Celso Antônio Bandeira de Mello1 entende que os servidores públicos (em sentido lato) de tais entidades sujeitam -se ao regime celetista, por serem empregados públicos. Segundo
ele, “são empregados submetidos às normas da
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), seja por força de tratar-se de entidade de Direito Privado, seja por disposição expressa constante do art. 182 do Decreto -Lei 200 (...)”. Segundo Maria Sylvia
Zanella di Pietro2, “os servidores das (...)
sociedades de economia mista (...) regem -se pela legislação trabalhis ta. Para as empresas que exercem atividade econômica, esse regime é imposto pelo art. 173, § 1º, da Constituição. Para os demais, não é obrigatório, mas é o que se adota por meio das leis ordinárias, por ser o mais compatível com o regime de direito privado a que se submetem.”
Assim, na hipótese de as sociedades de economia mista prestadoras de serviços públicos adotarem regime estatutário para seus servidores (ainda que a hipótese seja remota e anômala), o disciplinamento relativo ao afastamento para exerc ício de mandato
eletivo deve ser determinado por instrumento
próprio. Quanto ao regime trabalhista, comumente adotado (seja em razão do art. 173, § 1º seja em razão da submissão ao regime de direito privado), remetemo-nos às regras impostas pela Consolida ção das Leis do Trabalho (CLT). Em razão de a matéria não se incluir no âmbito da competência desta Corte de Contas, nos limitaremos a indicar os dispositivos da CLT que julgamos pertinentes, no bojo de breve transcrição doutrinária: “(...) enquadram-se como
suspensão do contrato de trabalho as situações de atendimento a encargo público de larga duração no tempo. São exemplos que confirmam esse segundo critério geral o afastamento para cumprir mandato político eletivo (arts. 472, caput, e 483, § 1º, CLT).”
(Curso de Direito do Trabalho. Mauricio Godinho Delgado. 2ª ed. 2003. p. 1067). É ainda necessário considerar a possibilidade de tais artigos da CLT não terem sido recepcionados pela Constituição Federal (art. 38 com redação introduzida pela Emenda Constit ucional nº 19/98) no que concerne às sociedades de economia mista. Ocorre que tal interpretação não se coaduna com o ordenamento jurídico pátrio. O exercício dos direitos políticos é assegurado pela Constituição Federal (art. 14) a
todos os que preencham a s condições de
elegibilidade pré -estabelecidas. Assim, é assegurada ao empregado de empresa privada a possibilidade de afastar-se de seu emprego para fins de exercer
mandato eletivo, de acordo com as regras
estabelecidas na Consolidação das Leis do
Trabalho. Não se justifica, pelo Princípio da Igualdade, serem os servidores públicos (em sentido lato) das sociedades de economia mista, também regidos pela CLT, impossibilitados de afastarem -se de seu emprego para o exercício de mandato eleitoral. Por fim, veri fica-se que, afastada a regra estabelecida no art. 38, II da Constituição Federal, estando o servidor público (em sentido lato)
impossibilitado de optar pela remuneração,
perceberá os subsídios correspondentes ao cargo de
Vice-Prefeito, pagos pelos cofres municipais.
CONCLUSÃO Deste modo, considerando o ordenamento pátrio aplicável ao presente caso e a fundamentação exposta, opinamos para, no mérito, responder ao questionado nos termos elencados neste feito. Esse é o nosso entendimento.
PARECER Nº 0449/06 DA PROCURADORIA DE JUSTIÇA DE CONTAS:
posicionamento, não se coaduna com o texto constitucional vigente. Por isso, afastada a regra do art. 38, II, da Constituição Federal, fica o servidor público impossibilitado de
optar pela remuneração, perceberá os subsídios
correspondentes ao cargo de Vice-Prefeito, pagos pelos cofres municipais. Diante de tais fatos, comungando com o entendimento desta Egrégia Corte de Contas, somos pelo CONHECIMENTO da presente consulta, adotando as respostas e fundamentos discriminados neste Parecer e na Instrução Técnica de fls. 14/18.
Presentes à sessão plenária da apreciação os Srs. Conselheiros Elcy de Souza, Vice-Presidente no exercício da Presidência, Dailson Laranja, Relator, Mário Alves Moreira, Umberto Messias de Souza, Enivaldo Euzébio dos Anjos e Marcos Miranda Madureira. Presente, ainda, o Dr. Ananias Ribeiro de Oliveira, Procurador-Chefe do Ministério Público junto a este Tribunal.
Sala das Sessões, 14 de fevereiro de 2006.
CONSELHEIRO ELCY DE SOUZA
Vice-Presidente no exercício da Presidência
CONSELHEIRO DAILSON LARANJA Relator
CONSELHEIRO UMBERTO MESSIAS DE SOUZA
CONSELHEIRO ENIVALDO EUZÉBIO DOS ANJOS
CONSELHEIRO MARCOS MIRANDA MADUREIRA
DR. ANANIAS RIBEIRO DE OLIVEIRA Procurador-Chefe
Lido na sessão do dia:
FÁTIMA FERRARI CORTELETTI Secretária Geral das Sessões