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Conciliação e Mediação: Acesso à justiça e celeridade processual

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Academic year: 2021

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ADEMIR DONIZETE DA SILVA

MEDIAÇÃO E CONCILIAÇÃO:

ACESSO À JUSTIÇA E CELERIDADE PROCESSUAL

Palhoça 2018

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ADEMIR DONIZETE DA SILVA

MEDIAÇÃO E CONCILIAÇÃO:

ACESSO À JUSTIÇA E CELERIDADE PROCESSUAL

Monografia apresentada ao Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina, como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Professora MSc. Patrícia Fontanella

Palhoça 2018

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ADEMIR DONIZETE DA SILVA

MEDIAÇÃO E CONCILIAÇÃO:

ACESSO À JUSTIÇA E CELERIDADE PROCESSUAL

Este Trabalho de Conclusão de Curso foi julgado adequado à obtenção do título de bacharel em Direito e aprovado em sua forma final pelo Curso de Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina.

Palhoça,07 de Dezembro de 2018

_________________________________________ Prof. e orientador: Professora MSc. Patrícia Fontanella

Universidade do Sul de Santa Catarina

_________________________________________ Prof. Hernani Luiz Sobierajski

Universidade do Sul de Santa Catarina

_________________________________________ Prof. Joel Irineu Lohn

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

MEDIAÇÃO E CONCILIAÇÃO:

ACESSO À JUSTIÇA E CELERIDADE PROCESSUAL

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico e referencial conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Sul de Santa Catarina, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de todo e qualquer reflexo acerca desta monografia.

Estou ciente de que poderei responder administrativa, civil e criminalmente em caso de plágio comprovado do trabalho monográfico.

Palhoça, 07 de dezembro de 2018.

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“Bem aventurados os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus” (Mateus, 5,9)

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus que concede a sabedoria a todos aqueles que lhe pedem, e nada lhes impropera (Tiago 1, 5). A mim concedeu a força necessária e a sabedoria para terminar este trabalho, e apesar das minhas fraquezas, me abençoa muito.

À Professora Patricia Fontanella, orientadora dedicada e atenciosa que além de me orientar me motivou com seu profissionalismo e seriedade.

Aos professores da Unisul que me acompanharam nesta jornada. Aos colegas de trabalho pela compreensão nas minhas ausências.

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RESUMO

Grande parte das demandas judiciais pode ser resolvida através do instituto de conciliação e mediação que pode ser um ótimo fator de celeridade processual e acesso à justiça e como consequência mais justiça social. O estudo tem como objetivo discutir as propostas que já vêm sendo apresentadas e oferecer novas idéias. Dessa forma, neste trabalho são abordadas questões que levam o homem a debater-se em contendas durante a sua história sob o ponto de vista sociológico e a intervenção do Estado nos conflitos de uma maneira geral, como responsável pela tutela jurisdicional. Discute-se aqui a questão da precariedade do acesso à justiça por uma parte da população em decorrência de um sistema judiciário lento e deficiente por conta do excesso de ações judiciais em tramitação. O incentivo à adoção dos métodos extrajudiciais de resolução de conflitos torna-se muito importante como medida necessária ao desafogamento dos Tribunais. Muitas medidas têm sido tomadas neste sentido, as leis têm sido atualizadas, objetivando normatizar os procedimentos, orientações e eventos em geral programados pelos órgãos competentes, além de cursos específicos que buscam a formação de profissionais especializados. O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) mantém uma página voltada especificamente para tratar do assunto, onde publica estatísticas, notícias, e traz um cadastro nacional de mediadores judiciais credenciados. O papel deste profissional, o mediador e conciliador, é de extrema importância neste contexto de implantação, eis que muito pode influenciar na confiança no sistema.

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LISTA DE SIGLAS

Anatel – Agência Nacional de Telecomunicações ANTT – Agência Nacional de Transportes Terrestres CEF – Caixa Econômica Federal

CRFB/88 – Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 CNJ – Conselho Nacional de Justiça

CPC – Código de Processo Civil

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO... 09

2 A NATUREZA DOS CONFLITOS SOCIAIS... 11

2.1 O SURGIMENTO DA TUTELA ESTATAL... 14

3 DEMANDAS JUDICIAIS... 16

3.1 CARACTERÍSTICAS NAS DIFERENTE ÁREAS JURÍDICAS... 17

3.2 TIPOS DE CONFLITOS... 19

3.2.1 Direito de Família... 20

3.2.2 Direito das Coisas e Direito de Danos... 22

3.2.3 Contratos em geral... 23

3.2.4 Demandas consumeristas... 24

3.2.5 Reclamações trabalhistas... 25

3.2.6 Órgãos governamentais... 26

3.3 A SOBRECARGA DO SISTEMA JUDICIÁRIO... 27

3.3.1 A morosidade nas tramitações processuais... 28

4 ACESSO À JUSTIÇA... 30

4.1 GARANTIA CONSTITUCIONAL DOS DIREITOS SOCIAIS... 31

4.1.1 Justiça social e o abismo socioeconômico... 32

5 CONCEITOS DE CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO... 34

5.1 DIFERENÇA ENTRE CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO... 35

5.2 O CONSENSO EM SUBSTITUIÇÃO À CULTURA DO LITÍGIO... 36

5.2.1 O papel do conciliador e mediador... 38

5.2.2 Os advogados e operadores do direito... 40

6 CONCLUSÃO... 43

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1 INTRODUÇÃO

Quando falamos em conflito interpessoal, consideramos que o mesmo está presente no cotidiano de cada um em quase todas as circunstâncias. A disputa pelos interesses pessoais começa na infância e nos acompanha por toda a vida. Assim sempre foi a humanidade, desde os primeiros passos, motivo pelo qual o assunto desperta o interesse dos pensadores desde o tempo de Aristóteles, passando por Hobbes, Rousseau e muitos outros teóricos, incluindo os contemporâneos, cujo objetivo é discutir mecanismos práticos e eficientes como meio de resolução de conflitos.

Entre estes dispositivos encontramos o instituto da Mediação e Conciliação, que nos últimos anos vem ganhando cada vez mais espaço nos meios acadêmicos e jurídicos, tendo em vista a necessidade de se apresentar propostas consistentes neste sentido, devido à tão propalada crise no sistema judiciário, que se mostra cada vez mais aparente, gerando morosidade processual e abarrotando as prateleiras dos cartórios com processos judiciais (inclusive virtuais atualmente), sem previsão de solução em curto prazo, gerando a inquietude e angústia por parte do jurisdicionado.

O propósito do presente trabalho é discutir as perspectivas relacionadas a este instituto como instrumento de agilidade no sistema judicial brasileiro a partir de dois pontos, que entre tantos outros apresentam fragilidade: o acesso à justiça e a celeridade processual. Neste sentido, pergunta-se: quais as perspectivas relacionadas à conciliação e mediação como instrumentos de agilidade no sistema judicial brasileiro?

O primeiro ponto frágil refere-se a um direito constitucionalmente garantido pelo Estado, que é o guardião da lei e responsável pela sua aplicação, mas que, tendo em vista a falta de estrutura, não cumpre diversas garantias constitucionais. Dentro de um contexto social onde o as diferenças socioeconômicas são brutais, a falta de informação, a baixa instrução, a baixa renda, a vulnerabilidade social entre outros fatores prejudicam o acesso à justiça por parte da população.

Isto está atrelado ao segundo ponto frágil muito discutido nos meios jurídicos e acadêmicos que é a celeridade processual extremamente precária. Isso se dá, entre outros fatores, pela demanda excessiva de processos em tramitação. Conforme dados em relatório do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) (Justiça em

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Números – 2017), o Poder Judiciário finalizou o ano de 2016 com 79,7 milhões de processos em tramitação, aguardando alguma solução definitiva. Assim, a morosidade de um processo muitas vezes acarreta prejuízo à parte, quando a sentença acaba chegando atrasada, não surtindo o efeito desejado.

Dessa forma os meios consensuais de resolução de conflitos vão ao encontro dessa dificuldade, oferecendo propostas de conciliação e mediação, muitas vezes até mesmo na fase pré-processual, evitando sobrecarregar ainda mais o sistema. Este é o motivo pelo qual este trabalho está sendo desenvolvido, no intuito de acrescentar ideias à discussão, enriquecendo-a.

Assim, o primeiro capítulo levanta questões sociológicas a respeito da convivência em comunidade nas sociedades primitivas e a evolução do homem para a criação de um sistema de resolução de conflitos no decorrer dos tempos. O segundo capítulo discorre sobre as espécies de conflitos em geral, suas características e a crise no sistema judiciário. O terceiro aborda a garantia constitucional do direito de acesso à justiça, e o quarto capítulo apresenta por derradeiro os conceitos do instituto de conciliação e mediação.

Para a elaboração deste trabalho foram feitas pesquisas bibliográficas em livros de sociologia, filosofia e direito, coleta de informações em audiências de conciliação, além de pesquisas junto ao site do Conselho Nacional de Justiça e outros análogos.

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2 A NATUREZA DOS CONFLITOS SOCIAIS

Existem dois aspectos importantes que caracterizam o ser humano e que se entrecruzam: primeiramente, de acordo com Aristóteles (384-322), o homem é um animal político o que consequentemente o transforma em um ser social e interdependente. Desde o princípio dos tempos ele estabelece relações e vive em comunidades, e conforme identificam os mestres da sociologia e filosofia políticas, esta interdependência revela cooperação, proteção e objetivos comuns. Marisa da Silva Lopes e José Carlos Estêvão comentam esta convivência em sociedade, que caracteriza o homem como animal político:

Ora, a comunidade política (cidade) é para o ser humano o seu lugar natural porque, sendo dotado de racionalidade, ele é consequentemente dotado de linguagem discursiva, o que o torna capaz de manifestar mais do que sensação de prazer ou sofrimento, para o que bastaria a voz. Em função desse seu atributo natural, ele é capaz de perceber e manifestar o bem e o mal, o útil e o prejudicial, o justo e o injusto, motivo pelo qual o tipo de organização humana será superior àqueles agrupamentos cujas tarefas se restringem à reprodução, proteção e manutenção da vida, como são os formigueiros ou as colmeias. Segundo uma das mais famosas formulações da história da Filosofia, esta é a causa pela qual o ser humano é naturalmente um animal político (ARISTÓTELES, 1998, I, 2, 1253a 7-20)(Lopes, Estêvão, 2014, p.39).

Paralelamente, o ser humano é dotado do sentimento de ambição, e o desejo de crescer e evoluir faz parte da natureza humana; é a motivação para o trabalho e progresso. Rousseau (1712-1778) não vê esta característica como uma maldade inata do ser humano, asseverando que, na verdade, a bondade sim é que lhe é inerente, e que as contendas se dão a partir da convivência em sociedade em razão da necessidade do homem adquirir status e bens, o que o torna competitivo, e consequentemente mau:

Assim que os homens começaram a apreciar-se mutuamente, e a idéia de consideração se formou em seu espírito, cada um pretendeu ter direito a ela, e não foi mais possível a ninguém deixar de tê-la impunemente. Daí os primeiros deveres da civilidade, mesmo entre os selvagens; e, por isso, toda afronta voluntária tornou-se um ultraje pois, no mal que resultava do insulto, o ofendido via o desprezo da sua pessoa, muitas vezes mais insuportável que o próprio mal. Na medida em que cada um punia o desprezo que lhe dispensavam, proporcionalmente à importância que se atribuía, as vinganças tornaram-se terríveis, e os homens sanguinários e cruéis. Eis precisamente o grau a que chegara a maioria dos povos selvagens que conhecemos. É por não terem distinguido suficientemente as idéias, e observado o quanto esses povos já estavam longe do primeiro estado de natureza, que muitos se apressam a concluir que o homem é naturalmente cruel e que necessita de polícia para amansá-lo. Ora, nada é tão meigo

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quanto ele no seu estado primitivo, quando, colocado pela natureza à igual distância da estupidez dos brutos e das verdades funestas do homem civil e, compelido da mesma forma pelo instinto e pela razão a defender-se do mal que o ameaça, é impedido pela piedade natural de fazer mal a alguém, sem a isso ser levado por alguma coisa, mesmo depois de atingido por algum mal. Pois, segundo o axioma do sábio Locke, não pode haver afronta onde não há propriedade (Rosseau - Discurso sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade entre os Homens- 1.754. Amazon Kindle, p.1178).

Assim, o entrecruzamento destes aspectos, a convivência em sociedade e o desejo de propriedade nem sempre se deu de forma harmoniosa, gerando conflitos quando a necessidade de se viver em sociedade vai de encontro ao anseio de se progredir material e moralmente.

Thomas Hobbes (1588-1651) considera que esta desarmonia se dá em virtude de uma espécie de instinto de defesa do homem, que vê o seu semelhante sempre como um adversário pronto para destruí-lo e do qual precisa se proteger, e isto se dá em virtude de uma malígna desconfiança, congênita do ser humano, e afirma que “se dois homens desejam a mesma coisa ao mesmo tempo, que é impossível ela ser gozada por ambos, eles se tornam inimigos. E no caminho para seu fim (que é principalmente sua própria conservação, e às rezes apenas seu deleite) esforçam-se por se destruir ou subjugar um ao outro” (O Leviatã, cap.XIII, p.74). Renato Janine Ribeiro faz uma síntese do capítulo XIII de O Leviatã, “Da condição natural da humanidade relativamente à sua felicidade e miséria”, onde Hobbes disserta a respeito desta agressividade própria do ser humano:

Nesse texto célebre — e o que causou maior irritação contra Hobbes — ele não afirma que os homens são absolutamente iguais, mas que são "tão iguais que...": iguais o bastante para que nenhum possa triunfar de maneira total sobre outro. Todo homem é opaco aos olhos de seu semelhante — eu não sei o que o outro deseja, e por isso tenho que fazer uma suposição de qual será a sua atitude mais prudente, mais razoável. Como ele também não sabe o que quero, também é forçado a supor o que farei. Dessas suposições recíprocas, decorre que geralmente o mais razoável para cada um é atacar o outro, ou para vencê-lo, ou simplesmente para evitar um ataque possível: assim a guerra se generaliza entre os homens. Por isso, se não há um Estado controlando e reprimindo, fazer a guerra contra os outros é a atitude mais racional que eu posso adotar (é preciso enfatizar esse ponto, para ninguém pensar que o "homem lobo do homem", em guerra contra todos, é um anormal; suas ações e cálculos são os únicos racionais, no estado de natureza) (Ribeiro, 2011,p.45).

O convívio em sociedade pressupõe a harmonia consubstanciada em um pensamento comum; cada um cuida de seu bem estar e da sua família e contribui para o bom andamento, o progresso e o bem estar do grupo. Nesse contexto cada

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um deve cumprir com seus deveres, respeitando os direitos de outrem, conforme ilustra Petrônio Calmon:

A vida social normalmente é harmônica, disposta de modo ordenado, com seus sujeitos procedendo pacificamente, limitando sua própria liberdade para respeitar a liberdade dos demais. Trata-se de convivência humana, que embora não tenha surgido naturalmente, tendo o homem vivido antes em estado de anarquia, teria sido conquistada, segundo Thomas Hobbes, mediante a elaboração de um contrato social (Calmon, 2015, p.13).

Contudo, este pressuposto harmônico e profícuo dificilmente é observado, uma vez que as pessoas têm interesses diferentes e valores e pensamentos divergentes em relação à moral e bons costumes e ao modo de vida de uma maneira geral. Cada qual com seu ponto de vista, o que é certo pra um não é para outro. Ademais existe aquele que busca levar vantagem nas circunstâncias que envolvem as relações pessoais.

A ambição, característica inerente ao ser humano desde os primórdios da humanidade, é benéfica quando racional e equilibrada, foi ela que produziu até os dias de hoje o progresso que experimentamos. A ambição por uma vida melhor, um bem estar social adequado, um maior conforto, etc., desde que conseguida de forma honesta, sem prejudicar os outros, é absolutamente aceitável; quando exagerada, fora dos parâmetros toleráveis, transforma-se em ganância desmedida, o que significa querer mais do que se tem direito, muitas vezes provocando o prejuízo de outrem.

A supremacia de uns em detrimento da fragilidade alheia revela o lado ganancioso do homem na busca pelos bens materiais e poder, e dessa forma, numerosos são os motivos que levam as pessoas a se digladiarem em conflitos, alguns banais, outros de muita relevância, que nem sempre acabam bem. Se partirmos do pressuposto de Thomas Hobbes, de que “o homem é o lobo do

homem” (Ribeiro, 2011,p.45), então teremos aí seres humanos predadores e presas

indefesas ao mesmo tempo. Neste contexto podemos inferir que se não estivermos fugindo de um lobo, estaremos atrás de um cordeiro que nos foge. É a lei da selva, a necessidade de sobrevivência.

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2.1 O SURGIMENTO DA TUTELA ESTATAL

Conforme se verifica nas idéias dos grandes pensadores contratualistas, Hobbes, Locke e Rosseau, ao sair do seu estado natural o homem evoluiu para a convivência em sociedade gerando a partir de então a necessidade de um poder estatal que lhe garantisse proteção e isonomia entre a sociedade. Até então, sem a tutela estatal, a resolução de conflitos na história com muita freqüência se deu pela força, subjugando os mais fracos, tendo em vista, em muitas ocasiões, a ausência de um mecanismo protetivo e julgador que pudesse mediar e analisar o mérito, oferecendo a solução adequada e justa. Dessa forma, prevalecia a lei do mais forte, e nem sempre se fazia justiça. Roberto Portugal Bacelar afirma que “a idéia de monopólio do Estado surgiu exatamente para limitar o poder do mais forte, evitando abusos e a aplicação generalizada daquilo que se denominava autotutela pelo exercício de uma forma de aplicação de justiça privada” (Bacelar, 2016,p.17). O autor complementa destacando a importância do monopólio jurisdicional como fato incontestável, assegurando aos cidadãos a tranqüilidade de não precisar se armar para a luta ou fazer valer seus direitos por meio do exercício da força.

A convivência em sociedade estabelece uma organização diante da necessidade de sua manutenção, formando assim uma cadeia produtiva e organizada em classes e grupos de pessoas com características diferentes. Carlos Eduardo Vasconcelos contextualiza esta evolução:

À plebe, subintegrada socialmente, apenas cabiam os deveres e obrigações, inclusive os de guerrear em defesa de interesses alheios. Aos nobres e protegidos, sobreintegrados socialmente, eram destinados os direitos e privilégios. A coercitividade difusa das sociedades primitivas foi sendo substituída por um direito tradicional, convencional, em que a norma, elaborada por um poder central, vai constituindo uma “ética da lei”, enquanto outorga de expectativa generalizada de comportamento. Há milênios o patrimonialismo, com suas variantes circunstanciais de natureza política, econômica, jurídica, religiosa e ecológica, promove modelos fortemente hierarquizados e uma acumulação excludente de capital, sob rígida divisão do trabalho. Sua natureza patrimonialista propagou a cultura de dominação e suas atenuações circunstanciais, inclusive após o advento da agricultura irrigada e da escrita(Vasconcelos, 2017,p. 27).

Diante deste quadro, surge o direito como mediador dos conflitos, como forma de implementar o princípio da igualdade entre as pessoas. Dessa forma, o Estado assume o papel de julgador e detentor das leis. Entretanto, a difusão de valores e conceitos jurídicos, as desigualdades socioeconômicas e questões de cunho

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sociológico de uma maneira geral impedem uma distribuição igualitária desse direito. A justiça, almejada por todos, nem sempre é atingida por boa parte dos jurisdicionados, mormente aqueles que subjetivamente mais carecem dela: a população pobre.

O Estado como elemento de proteção e um sistema de tutela à vulnerabilidade dentro de um contexto de desigualdade social no Brasil tem obtido progressos, mas conforme salienta Valeria Ferioli Lagrasta Luchiari, ainda há muito que se fazer:

E, apesar de ter havido algum progresso no afastamento dos obstáculos econômicos e políticos, com a criação da Defensoria Pública e do sistema de assistência judiciária gratuita, bem como a edição de leis especiais (Juizados Especiais, Ação Popular, Ação Civil Pública, Código de Defesa do Consumidor), ainda há muito a ser feito em relação à chamada “terceira onda” do acesso à Justiça (no dizer de Mauro Cappelletti), que visa à pacificação social. Nesse contexto, se considerarmos a jurisdição como poder, função e atividade, voltada à consecução dos escopos, jurídico, político e social, inserindo-se a pacificação social, neste último, como escopo magno, o processo deve ter como objetivo também a promoção da autocomposição; e, para tanto, no mesmo devem ser inseridos, como complementares, métodos alternativos de solução de conflitos. (Luchiari, 2012, p.122)

O artigo 5º da Constituição Federal estabelece uma série de direitos, definindo que todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. O mesmo artigo, inc. LXXIV, bem como o artigo 98 do CPC determina a assistência judiciária gratuita aos que não tiverem condição de pagar. Porém conforme se verifica, a dificuldade do acesso à justiça não se restringe exclusivamente à falta de recursos financeiros.

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3. DEMANDAS JUDICIAIS

Trabalhar na área jurídica significa lidar com acontecimentos extremamente importantes nas vidas das pessoas. Circunstâncias cruciais, que podem representar muitas vezes uma vida inteira de planos, sonhos e lutas, que, dependendo do resultado de uma contenda podem ser justamente recompensados, provocando a alegria e felicidade, ou serem irreversivelmente perdidos de forma injusta, causando uma dor profunda, imensurável. Advogados, Magistrados, Servidores da Justiça, peritos em diversas áreas e demais operadores do direito devem estar conscientes da grande responsabilidade que é aplicar a justiça nas demandas judiciais.

Assim, um processo judicial é necessariamente cercado de cuidados, justamente visando a garantia da aplicação do direito. Petrônio Calmon bem o define da seguinte forma:

O processo é o método pelo qual a jurisdição atinge sua finalidade de pacificação social e ao mesmo tempo a garantia do indivíduo de que sua esfera de bens e direitos não será atingida arbitrariamente. Por esta razão há de atender as garantias estabelecidas na Constituição Federal e para atendê-las é estruturado em uma série de atos complexos, com ampla participação de todos os juridicamente interessados (Calmon, 2015, p.37).

A demanda judicial nasce fundamentalmente de um litígio, um conflito de interesses em que um dos litigantes parte para a abertura de uma ação requerendo seus direitos. O outro tem que se defender e eis que entra em cena a figura do advogado para, baseando-se na legislação, doutrina, jurisprudência e outras fontes, tentar provar que a ação não deve prosperar, ou ainda reconvir, propondo uma inversão do autor e réu. Cabe então ao Magistrado fazer esta mediação judicial através de uma profunda e cuidadosa análise do caso, e dar o veredicto.

A tramitação de um processo na justiça é desgastante geralmente para ambas as partes. Dependendo da urgência em ver seu direito reconhecido, o cidadão se desespera num mar de ansiedade e aflição. Tantos trâmites, o andamento, a morosidade, a falta de movimentação, um eventual despacho desfavorável e o pesadelo de um futuro incerto. Some-se ainda as custas processuais, honorários advocatícios, audiências angustiantes e as despesas com idas e vindas. Este é, inclusive, um dos aspectos do acesso à justiça do qual falaremos no decorrer desta pesquisa: O custo de um processo nem sempre pode ser arcado por pessoas de baixa renda, cabendo também ao Estado socorrê-las.

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A tutela jurisdicional pelo Estado nasceu em consequência da necessidade de um fator apaziguador nas contendas, com o surgimento do direito como um sistema normatizador. As demandas começam extrajudicialmente e não raro evoluem para a esfera judicial diante da falta de consenso. Assim, nas diversas áreas do direito existem conflitos, cada qual com suas características e cujos meios de resolução muitas vezes divergem em alguns aspectos.

Conforme já ressaltado neste trabalho, o relatório do CNJ (Justiça em Números - 2017) apresenta os 79,7 milhões de processos que tramitam no sistema judiciário brasileiro, divididos por área, sendo a trabalhista a que apresenta maior número de demandas judiciais, seguida por ações relativas ao direito civil e direito eleitoral.

3.1 CARACTERÍSTICAS NAS DIFERENTES ÁREAS JURÍDICAS

Diante da complexidade no trato com o direito das pessoas, eis que o ser humano é multifacetado, o sistema jurisdicional é dividido em áreas específicas, cada qual com suas características. Embora essencialmente os movimentos iniciais e finais e o propósito de toda ação sejam os mesmos, quais sejam, protocolo inicial, trânsito em julgado e o devido reconhecimento do direito, durante o seu decorrer algumas ações podem ser distintas em cada área. Dessa forma temos diferentes movimentações nas principais áreas, civil, criminal, trabalhista, tributária, previdenciária, ambiental, entre outras.

De acordo com a pesquisa justiça em números (2017) do CNJ, o ano de 2016 registrou um acúmulo de quase oitenta milhões de ações, sendo a maior parte de demandas tramitando na área trabalhista com mais de oito milhões de ações, cujas reivindicações se referem principalmente a verbas rescisórias. Ações relativas ao direito civil vêm logo a seguir com seis milhões e setecentos mil. Há por sua vez um grande índice ações tramitando na justiça criminal e eleitoral, conforme se verifica no gráfico (fig.1):

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Fig.1: ações por assuntos mais demandados

Fonte: CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA (CNJ) – Relatório Justiça em

números 2017 – p.167 – disponível em

http://www.cnj.jus.br/files/conteudo/arquivo/2017/12/b60a659e5d5cb79337945c1dd1 37496c.pdf - acesso em 29/10/2018

Observa-se que enquanto na justiça trabalhista as ações se concentram nas reclamações de verbas rescisórias, no direito civil elas são mais diluídas em vários assuntos, tendo maior incidência em obrigações/contratos, direito do consumidor.

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Depois vem responsabilidade civil e direito de família. No direito eleitoral também encontramos enorme quantidade de processos.

Como já afirmamos, cada uma dessas classes de ação tem suas características e as estudaremos a seguir. O objetivo deste trabalho é discutir as perspectivas relacionadas ao instituto de mediação e conciliação como instrumento de agilidade no sistema judicial brasileiro, visando o acesso à justiça e celeridade processual. Isto pode ser possível através do desafogamento do sistema, e, considerando as peculiaridades de cada classe, poderemos definir ações específicas, aprofundando o conhecimento do mediador, eis que este deve estar preparado em diversas áreas jurídicas e até procurar se especializar em outras disciplinas conforme sugere Érica Barbosa e Silva:

Com a institucionalização dos meios consensuais voltados à resolução de conflitos, os operadores do direito devem ter uma formação interdisciplinar, abandonando a redução da realidade a um só nível regido pela lógica jurídica, para entender melhor o conflito e adequar de forma mais efetiva as possíveis resoluções. Somente o conhecimento interdisciplinar, que abandone a análise exclusivamente tecnicista do ordenamento jurídico vigente, pode permitir a compreensão do conflito como fenômeno jurídico, mas contextualizado em suas múltiplas particularidades (Silva, 2013, pg 89) A mesma autora se refere a interdisciplinaridade como integração entre várias disciplinas e campos de conhecimento, tais como a psicologia, sociologia, antropologia, biologia, medicina, e outras mais (Silva, 2013, pg.88). Esse pensamento é justamente para abarcar as diversas peculiaridades em cada classe processual.

3.2 TIPOS DE CONFLITOS

Observamos que há uma diversidade muito grande de conflitos, motivo pelo qual não poderemos analisar todas as classes e tipos. Dessa forma abordaremos algumas características gerais e daremos mais atenção àqueles interpessoais, tratados mais especificamente pelo direito civil.

O conflito interpessoal se refere àqueles envolvendo relações entre as pessoas: são discussões que abrangem a família, vizinhos, colegas de relacionamento e da comunidade, contratos em geral envolvendo pessoas, assuntos

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relativos à responsabilidade civil, etc. Este tipo de contenda pondera fatores subjetivos, já que em muitas ocasiões a questão nem sempre é puramente material, lidando muitas vezes com sentimentos, anseios e emoções dos litigantes. Um exemplo citado por Malhadas, (2017, p.51) é a “guarda de filhos, em que predomina o grande envolvimento emocional”, na qual o autor considera mais adequado a mediação.

Outros litígios de natureza não pessoal são aqueles envolvendo um ser humano e uma pessoa jurídica no outro pólo, que geralmente tratam de questões financeiras ou bens materiais. São demandas consumeristas, reclamações trabalhistas, ações contra órgãos governamentais, etc..

Existem ainda conflitos corporativos envolvendo empresas e órgãos públicos nos dois lados do combate. Em relação a estes, não cabe discussão no contexto do presente trabalho, pois envolvem um estudo mais aprofundado e específico a respeito das técnicas utilizadas e deverá ser estudado em outra pesquisa.

De qualquer forma, a autocomposição através dos meios extrajudiciais é perfeitamente cabível em qualquer uma das circunstâncias citadas, conforme pode se verificar no portal criado especialmente para tratar do assunto pelo CNJ (

http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/conciliacao-e-mediacao-portal-da-conciliacao – acesso em 12/11/2018). Neste espaço são tratados diversos assuntos

relativos a cursos, eventos, notícias, conciliadores, centros de conciliação, etc.

Isto demonstra que a não judicialização de um confronto e a resolução através de meios consensuais tem se mostrado cada vez mais discutido nos últimos anos, razão pela qual o debate de suas perspectivas revela-se muito importante.

3.2.1 Direito de Família

A convivência em sociedade começa pela família, que é a sua base e deve ter a proteção do Estado, conforme define em seu artigo 226, a Constituição Federal de 1988 (CF/88).

Esta afirmação é bastante objetiva ao relevar a importância da família na sociedade, estabelecendo assim parâmetros do Direito de Família. Considerando esta valorização, existe no Direito de Família as varas específicas, cujas competências abarcam os litígios familiares. Tradicionalmente o Direito de Família

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trata de ações de alimentos, separações conjugais, sucessão, etc. que englobam a disputa pela guarda dos filhos, bens materiais e demais assuntos correlatos.

É certo que o conceito de família vem mudando há alguns anos, e a CF/88 abarcou essas mudanças estabelecendo uma diversidade maior de modelos familiares; hoje, além daquele formato patriarcal do matrimônio formal monogâmico, de pai, mãe e filhos, temos a união estável plenamente reconhecida como entidade familiar e a família monoparental (CF/88, art.226, §§ 4º e 6º) que não incluem necessariamente o matrimônio. Foi ainda reconhecida a união entre pessoas do mesmo sexo pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2011 no julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4277 e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132.

Com relação aos filhos, é garantido o mesmo tratamento entre os legítimos e aqueles fora do casamento, inclusive os filhos reconhecidos por adoção (CF/88, art. 227, § 6º) privilegiando as relações socioafetivas. O Código Civil de 2002 se alinha a esta determinação no art. 1.593: “Os filhos, havidos ou não da relação de casamento, ou por adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação”.

Como se percebe, o nosso ordenamento jurídico vem cada vez mais valorizando os vínculos afetivos e emocionais que unem as pessoas em um núcleo familiar, e não muda a sua função característica de ser a base da sociedade, mas flexibiliza a lei para normatizar suas diferentes estruturas. Desta forma, junto com as novas famílias podem vir novas ocorrências, novas espécies de conflitos e a conseqüente necessidade de aprimoramento na gestão de conflitos no direito de família.

O contexto familiar pressupõe uma relação profunda de sentimento, e por esta razão, quando existe uma demanda, ela pode vir acompanhada de muita angústia e fortes emoções que abalam duramente o estado psicológico dos envolvidos, incluindo aí as crianças oriundas de uma relação tempestuosa que acabam sendo atingidas. Conforme afirma Hélio Cardoso de Miranda Junior em artigo na revista Psicologia: Ciência e Profissão:

Questões, por exemplo, das famílias que entram em litígio. Elas compõem, quase sempre, a cena do trabalho do psicólogo também. As disputas pela guarda dos filhos, as acusações mútuas, as intimidades expostas num processo judicial, assim correm muitos processos nas Varas de Família. Como ficam as crianças nestas situações ? Em geral, não muito bem. E o

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que se percebe na prática é que estes litígios relacionam-se muitas vezes a problemas particulares que os ex-cônjuges não conseguiram elaborar após a separação. Então chegam ao judiciário com uma construção litigiosa imaginária muito bem estabelecida na qual, em geral, os filhos estão como objetos de disputa, sendo que a preocupação com seu bem estar fica em segundo plano. Se os filhos estão mal, a culpa é sempre do outro. As crianças e adolescentes envolvidos transformam-se em objetos de ataques e defesas que não são senão uma forma sintomática de lidar com a perda narcísica implícita na desilusão amorosa (Miranda Junior, 1998 – Disponível em: https://site.cfp.org.br/psicologia-ciencia-e-profissao/ - acesso em 22/10/2018).

Assim, a aplicação de métodos não judiciais de resolução de conflitos, pode, conforme afirma Marcos Julio Olive Malhadas Jr., amenizar esta dor ao manter a relação:

A mediação aplica-se por excelência, às questões familiares porque estas, mais do que todas, encontram-se permeadas por fortes emoções e também porque os relacionamentos em geral, não se encerram com o episódio e, em grande parte das situações, a preservação do relacionamento futuro é de fundamental interesse das partes (por exemplo, quando existem filhos menores de idade (Malhadas Jr, 2004,p.79).

Por sugestão do novo CPC, art.165, § 2º, o ideal nos conflitos familiares é a aplicação da mediação, uma vez que entre as partes envolvidas já existe um vínculo anterior, e o objetivo é o restabelecimento da comunicação. Considerando estes aspectos, seria interessante que o mediador conhecesse além dos conceitos jurídicos que envolvem a relação familiar, procurando entender os elementos psicológicos subjetivos que levam ao desentendimento. Eis aí a interdisciplinaridade.

3.2.2 Direito das Coisas e Direito de Danos

A parte do Código Civil que trata do direito das coisas estabelece regras relativas à posse e direito da propriedade, justamente os bens materiais que provocam a maior parte dos conflitos entre a vizinhança e a comunidade em geral.

Com efeito, são muitas as previsões de ocorrências que podem causar confusões entre vizinhos e comunidade elencadas no código civil. A partir do artigo 1.277 são relacionadas as possibilidades de conflitos oriundos de problemas relacionados à vizinhos e logo a frente o mesmo diploma trata do artigo 1.314 em diante de assuntos relativos à condomínio. Observa-se que são tratadas questões relacionadas à perturbação de sossego e incômodos em geral, e outras relativas à

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propriedade. No caso de condomínio a lei tenta normatizar procedimentos relativos às controvérsias oriundas da convivência e compartilhamento de um ambiente comum.

Muitas destas desavenças acabam por gerar ações de danos morais e responsabilidade civil, cujas demandas sempre poderão se socorrer da conciliação e a mediação como forma de resolução de controvérsias.

3.2.3 Contratos em geral

Em qualquer negócio, o contrato é um dispositivo indispensável para seu bom andamento porque estabelece regras a serem cumpridas de maneira geralmente bilateral. Ou seja, já é um acordo pré-estabelecido para que nenhuma das partes deixe de cumprir com suas obrigações, em detrimento do prejuízo da outra. São documentos que regulamentam a compra, venda, aluguel, doação, empréstimo, comodato de coisa, prestação de serviços, e uma diversidade muito grande de situações, previstas no Código Civil.

Conforme afirma Carlos Roberto Gonçalves:

O contrato é uma espécie de negócio jurídico que depende, para a sua formação, da participação de pelo menos duas partes. É, portanto, negócio jurídico bilateral ou plurilateral. Com efeito, distinguem-se, na teoria dos negócios jurídicos, os unilaterais, que se aperfeiçoam pela manifestação de vontade de apenas uma das partes, e os bilaterais, que resultam de uma composição de interesses. Os últimos, ou seja, os negócios bilaterais, que decorrem de mútuo consenso, constituem os contratos. Contrato é, portanto, como dito, uma espécie do gênero negócio jurídico (Gonçalves, 2017, p.19)

O artigo 422 do código civil estabelece que devem ser guardados os princípios da probidade e boa fé, motivo pelo qual um contrato deve procurar prever as circunstâncias que podem ocorrer durante sua execução para que nenhuma das partes seja lesada.

Porém dificilmente um contrato consegue prever todas as situações que podem eventualmente surgir no decorrer de seu cumprimento e que ali não foram acordadas. Varias circunstâncias não previstas e não regulamentadas podem interferir, por exemplo, o prazo não foi cumprido mas o motivo pode justificar; houve

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a inadimplência, mas há justificativa aceitável, acontecimentos podem atrapalhar o cumprimento do contrato por uma das partes.

A maioria dos contratos são documentos já prontos com as cláusulas comuns prevendo as situações básicas, mas as possibilidades de novos acontecimentos são muitas. Assim, é comum um contrato terminar com a última cláusula determinando algo do tipo: “os casos omissos serão dirimidos pelo foro da comarca tal,

desprezando-se qualquer outro, por mais privilegiado que seja”. Como se vê, os

contratos já são feitos, prevendo-se uma possível judicialização em caso de descumprimento por um motivo não calculado.

O ideal nestes casos é a aplicação da conciliação para propor um novo acordo naquela cláusula não cumprida. E uma boa sugestão para não haja a judicialização é que a última cláusula seja substituída por ”os casos não previstos

serão analisados primeiramente em uma audiência de conciliação e mediação ”.

3.2.5 Demandas consumeristas

As relações de consumo têm como dispositivo para a sua regulação o Código de Defesa do Consumidor (CDC), criado em 1990, com o objetivo de normatizar a proteção do consumidor o que caracteriza o pressuposto de que este é a parte vulnerável em uma relação comercial. O propósito é evitar que as empresas se aproveitem desta vulnerabilidade para lesar o cidadão no papel de consumidor, e obter lucro indevido em detrimento do prejuízo de outrem. Conforme afirma Sergio Cavalieri Filho (2014, p.7) “A massificação da produção, do consumo e da contratação deixou o consumidor em desvantagem, pois, à medida que o fornecedor se fortaleceu técnica e economicamente, o consumidor teve o seu poder de escolha enfraquecido, praticamente eliminado”. Completa depois:

Instalou-se então um acentuado desequilíbrio ou desigualdade de forças entre produtores e distribuidores, por um lado, e consumidores, por outro. O consumidor tornou-se vulnerável em face do fornecedor, vulnerabilidade tríplice: técnica, fática e jurídica.

A proteção do consumidor passou assim a ser um desafio da nossa era e o Direito não podia ficar alheio a tal tarefa. A finalidade do Direito do Consumidor é justamente eliminar essa injusta desigualdade entre o fornecedor e o consumidor, restabelecendo o equilíbrio entre as partes nas relações de consumo. (Cavalieri Filho, 2014, p.8).

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Desta maneira, o CDC traz a definição do consumidor, do fornecedor, dos produtos e serviços e estabelece regras relativamente ao “atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo” (artigo 4º, CDC).

A relação de compra e venda se dá entre o fornecedor, normalmente uma loja, que vende ou presta serviços, e o consumidor que pode ser uma pessoa física ou jurídica. Como todo negócio, deve ser pautado pela boa fé, prevista também no art. 422 do Código Civil de 2002, ou seja, o vendedor oferecendo um produto ou serviço de boa qualidade, sem vícios, sem defeitos, a um preço razoável. O comprador ao adquirir este produto, efetua o pagamento sob estas garantias e o recebe o no prazo combinado, constatando que tudo está correto.

Mas nem sempre é assim. Os conflitos na relação consumerista geralmente são provocados pelo rompimento deste princípio basilar nos negócios jurídicos. A boa fé tem que ser respeitada de forma bilateral, mas o fornecedor é a parte forte na relação e deve cumprir com as garantias elencadas. Se não o fizer, resta ao consumidor reclamar à empresa para que cumpra o prometido, ou se desfaça o negócio com a devolução do dinheiro.

Assim, O CDC existe para proteger o consumidor e para tal elenca diversos dispositivos normatizando as características do produto (Art. 8º ao 10º), a responsabilidade do fornecedor pelo fato ou vício do produto e serviço (Art. 12º ao 27º), estabelece ainda proteção contra propaganda enganosa, práticas abusivas, cobranças de dívidas, etc. Observa-se no CDC um pressuposto de que é o consumidor quem corre o risco de ser lesado e as regras existem para que, caso isto aconteça, gerando um conflito consumerista, ele tenha garantido seus direitos.

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3.2.6 Reclamações trabalhistas

A conciliação ganhou também incentivos na área trabalhista. A reforma, através da lei 13.467/17, criou o art. 855-B na CLT, que propõe a realização de acordo extrajudicial, que após consolidado deve ser homologado pelo juiz, encerrando o curso de uma provável demanda.

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A Consolidação das Leis do Trabalho, que normatiza as relações empregatícias, foi criada em 1943, durante uma fase de forte crescimento da indústria no Brasil. Ela busca proteger os direitos dos trabalhadores, supostamente o lado mais fraco em uma relação trabalhista com uma determinada empresa, coibindo o patrão de exigir do empregado uma carga horária excessiva, expor o trabalhador a riscos de insalubridade e periculosidade sem os devidos equipamentos protetivos e garantindo remuneração adequada. Entretanto, apesar da lei, muitas empresas deixam de pagar as verbas rescisórias ao desligar seu funcionário.

Para o empregado torna-se angustiante quando ao ser demitido não recebe os valores em dinheiro que lhe caberiam, eis que se trata de verba de caráter absolutamente alimentar, ou seja, é com o fruto do seu trabalho que ele alimenta sua família. Assim, o cenário de ver um filho passando por necessidade e não ter de onde tirar configura-se assustador.

Existem alguns motivos que levam a empresa a deixar de pagar. Alguns patrões não o fazem por desonestidade, outros porque o empregado teve sua demissão por justa causa após suposta falta grave. Existem ainda as empresas que, diante de uma economia instável, alta tributação no âmbito trabalhista e fiscal, encontram-se à beira da falência, não conseguindo cumprir com seus compromissos financeiros, deixando de lado a sua função social.

Diante deste quadro, a judicialização das reclamações trabalhistas é o caminho mais propício àquele recém desempregado, entretanto, como acontece nas outras esferas judiciais, é um longo tempo de espera.

3.2.7 Órgãos governamentais

Cabe à Justiça Federal julgar as lides em que algum órgão governamental figure em um dos pólos, conforme determinado no artigo 109, I, da Constituição Federal. Nestes casos, a União, entidades autárquicas ou empresas públicas federais podem ser tanto polo ativo como passivo. O INSS, a CEF, agências reguladoras como a Anatel, ANTT, ANA, entre outros, Conselhos profissionais e órgãos de fiscalização como o IBAMA, INMETRO, etc. são órgãos públicos que se submetem ao foro da Justiça Federal.

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Independente da posição da entidade pública, autor ou réu, nestes casos a conciliação e mediação podem se fazer presentes no sentido de se encerrar o processo através de um acordo, levando à celeridade processual. Cada órgão público tem características diferentes alguns incidindo mais no polo ativo, outros no polo passivo

Em todos estes casos acima existem possibilidades de se propor a resolução não adversarial, estabelecendo acordos e agilizando os processos, conforme a Resolução nº 125/2010.

3.3 A SOBRECARGA DO SISTEMA JUDICIÁRIO

Outro fator muito citado nos meios jurídicos e acadêmicos é a sobrecarga do sistema judiciário. Conforme dados do CNJ em seu último relatório Justiça em números (2016), a quantidade de processos pendentes de alguma solução vem crescendo cada vez mais nos últimos anos. O número de processos em tramitação não parou de crescer, e, novamente, houve aumento no estoque de processos que aguardam por alguma solução definitiva.

Segundo o relatório, no final do ano de 2009 tramitavam no Poder Judiciário 60,7 milhões de processos. Em sete anos o quantitativo cresceu para quase 80 milhões de casos pendentes, variação acumulada no período de 31,2%, ou crescimento médio de 4,5% a cada ano. A demanda pelos serviços de justiça também cresceu esse ano, numa proporção de 5,6%, não se verificando a tendência de redução esperada pela retração de 4,2% observada em 2015, comparativamente a 2014. Em 2016, ingressaram na justiça 29,4 milhões de processos - o que representa uma media de 14,3 processos a cada 100 habitantes.

A taxa de congestionamento permanece em altos patamares e quase sem variação em relação ao ano de 2015, tendo atingido o percentual de 73,0% em 2016. Isso significa que apenas 27% de todos os processos que tramitaram foram solucionados

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3.3.1 A morosidade nas tramitações processuais

A instauração de um processo judicial visa apurar de maneira rigorosa as circunstâncias em que determinado acontecimento gerou um conflito, para, conforme afirma Petrônio Calmon (2015, p.37), atingir seu objetivo de pacificação social e ao mesmo tempo a garantia do indivíduo de que sua esfera de bens e direitos não será atingida arbitrariamente. Conforme o autor, para atender estas garantias, o processo é complexo, cheio de formalismos, dependendo de pesada estrutura para seu sustento, provocando assim a morosidade. Afirma ainda:

A inflação processual não deixa de ser vista como fator multiplicador desses problemas mais básicos, pois a enorme quantidade de processos agrava a crise, exigindo mais tempo para a conclusão de cada um, o que diminui a eficácia e aumenta o custo da Justiça, refazendo-se o círculo vicioso (Calmon, 2015, pg. 39).

Dessa forma, muito se tem discutido a respeito do prejuízo no acesso à justiça provocado por uma suposta crise no sistema judicial. Diversos são os fatores apontados, e muitas propostas têm sido estudadas no sentido de se aperfeiçoar o sistema, buscando celeridade processual e a conseqüente redução dos números de pastas nas prateleiras sobrecarregadas dos cartórios, tanto físicas como virtuais. Aliás, o processo eletrônico já é uma realidade em quase todos os Tribunais e este é um aspecto interessante a ser discutido, uma vez que ações na Justiça por meio do Processo Judicial Eletrônico (PJe) têm tramitação mais rápida e de menor duração em comparação aos processos físicos. Essa é uma das constatações da pesquisa encomendada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) sobre a adoção dos processos eletrônicos nos tribunais, conforme artigo da Agência CNJ de Notícias (http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/86343-processo-eletronico-pje-tem-tramitacao-mais-rapida-no-judiciario - acesso em 27/09/18)

A reforma do judiciário é uma das mais propaladas discussões nos meios políticos e jurídicos. Em 2004, a Emenda Constitucional nº 45 trouxe avanços no sentido de reformular um sistema deficitário em termos de prestação jurisdicional, criando o CNJ - Conselho Nacional de Justiça – além de garantir a duração razoável do processo e celeridade na sua tramitação, de acordo com o artigo 5º, LXXVIII. Érica Barbosa e Silva (2013, p.14) afirma que “Nesse contexto reformador, papel de destaque foi dado aos meios consensuais, que passaram a ser vistos

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definitivamente como formas possíveis de distribuir justiça. Contudo, cumpre verificar se a introdução dos meios consensuais responde às causas desta crise”, corroborando ideia de que a reforma trouxe progresso em relação à aplicação de meios consensuais.

A simples introdução dos meios consensuais pode realmente não responder por si só às causas desta crise. Petrônio Calmon (2015, p.5) afirma que de nada adiantará ser criado um sistema consensual de resoluções de conflitos, sem aperfeiçoar a justiça tradicional. O autor propõe o fortalecimento dos dois sistemas para que operem juntos, criando-se ainda o que ele chama de “política de incentivo

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4 ACESSO À JUSTIÇA

Seria interessante se o conceito de acesso à justiça se resumisse em abrir as portas dos tribunais a todos que ali quisessem se manifestar. Assim, bastaria ajuizar uma ação e, ao requerer seus direitos pela via judicial, ver o seu pedido analisado em um curto lapso temporal pelas autoridades competentes, que prontamente elaborariam um parecer. É lógico que hoje isto é uma utopia, mas seria o ideal. Isto é possível? Talvez. É certo que se percebe o esforço das autoridades nas esferas jurídicas, políticas, sociais e acadêmicas em diversas áreas no sentido de aprimorar o sistema judiciário que hoje se encontra deficitário em relação a este assunto a começar pelo “curto lapso temporal” e “prontamente elaborar um parecer”. Fernanda Tartuce define o conceito de acesso a justiça como uma atenção maior à algumas premissas:

É pertinente a afirmação de que o pressuposto da ideia de justiça para o Direito é a existência de um consenso social acerca, pelo menos, das ideias fundamentais da justiça, sendo seus postulados, de evidência imediata: o respeito e a proteção da vida humana e da dignidade do homem; a proibição da degradação do homem em objeto; o direito ao livre desenvolvimento da personalidade; a exigência da igualdade de tratamento e a proibição do arbítrio. É com base em tais premissas que serão abordados a justiça e o acesso a ela (Tartuce, 2017, p.79).

Neste contexto, percebemos que o acesso à justiça vai muito além da facilidade de se ingressar com uma ação e aguardar o julgamento, porque a justiça deveria ser feita de maneira equânime, imparcial e célere. Primeiramente o direito se estenderia a todos, independente de classe socioeconômica, mas sabemos que as classes menos favorecidas, que já têm menos privilégios em diversos setores, recebem menos atenção neste sentido. A mesma autora pondera que:

Estudos sociológicos revelaram que, quanto mais baixo o estado social em que se situam os cidadãos, maior a sua distância em relação à administração da justiça em razão de fatores econômicos, sociais e culturais; faltam informações sobre seus direitos e sobre como exercê-los, bem como disposição para demandar por desconfiança quanto aos possíveis resultados e insegurança concernente a possíveis represálias posteriores.

Também as classes de nível mais elevado tendem a resolver seus conflitos de forma extrajudicial para que seus interesses econômicos sejam solucionados com certa privacidade (Tartuce, 2017, p. 152)

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A tramitação de um processo deveria ser da forma mais íntegra e honesta possível, aplicando-se dispositivos que provocassem a rapidez nas decisões, e sabemos que não é assim.

Dessa forma, não tem acesso à justiça um cidadão que encontra dificuldade em ver o seu caso analisado através de um processo judicial, devido às custas judiciais, honorários advocatícios e outros empecilhos; que vê o seu processo emperrado, tendo a urgência muitas vezes de uma decisão; e finalmente após tanta angústia e demora, acaba tendo seu pedido indeferido.

4.1 GARANTIA CONSTITUCIONAL DOS DIREITOS SOCIAIS

Sem distinção de qualquer natureza, a Constituição Federal em seu artigo 5º garante aos brasileiros o direito à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. Mais especificamente o mesmo artigo determina no inciso XXXV que a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito, o que define o princípio da inafastabilidade da jurisdição.

Corrobora ainda o codinome de “Constituição Cidadã”, eis que esta Carta magnífica teve sua redação tão direcionada aos valores humanos, o seu artigo 6º, que determina também: São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o

trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

Se falamos de justiça, os itens acima citados são o grande exemplo; Não haverá a configuração do acesso à justiça sem que os direitos fundamentais, humanos e sociais, garantidos constitucionalmente, sejam oferecidos de maneira ampla e irrestrita àqueles que deles necessitam. A carência de recursos, o analfabetismo, a falta de instrução leva a população de baixa renda à cultura de aceitar as coisas como elas são, desconhecendo um mundo de melhor qualidade de vida. Wilson Alves de Souza define que:

O problema do acesso à justiça começa no plano educacional. Esse é o ponto de partida. Pode-se dizer que o acesso à justiça começa a partir da possibilidade de conhecer os direitos e, quando violados, os mecanismos para exercê-los, na medida em que o conhecimento dos direitos, em larga medida, passa inicialmente pela informação. Esse é um problema que varia

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a depender do nível educacional do povo de cada país. A realidade é que o cidadão desprovido de educação normalmente ignora os direitos que tem, não sabe se seus direitos foram violados e nem como buscar tutelá-los em caso de violação. O Brasil, com sua massa de analfabetos, sem contar os chamados analfabetos funcionais, é um péssimo exemplo, nesse ponto, de dificuldade de acesso à justiça (Souza,2013, p.18).

4.1.1 Justiça social e o abismo socioeconômico

Observamos no contexto social brasileiro que um dos grandes males do Brasil é a pobreza e a consequente falta de acesso aos direitos fundamentais pelas camadas mais pobres. A justiça social consiste em diminuir o abismo socioeconômico gigantesco que se afigura no país cuja economia é oitava no mundo, mas que a distribuição de recursos é extremamente desigual. Carlos Eduardo Vasconcelos (2017,p.31) comenta que a desigualdade social, falta de moradia adequada, acesso à saúde e educação causa revolta em parte da população devido à expansão democrática do conhecimento através das tecnologias de informação, que ele chama de “Revolução dos conhecimentos”. Segundo o autor “Ao atenuar as hierarquias patrimonialistas, a “Revolução dos Conhecimentos” deflagra ondas emancipatórias” e afirma:

A democratização dos conhecimentos e das instituições, acionada pela expansão das tecnologias da informação, instiga e, ao mesmo tempo, constrange milhões de cidadãos limitados econômica, social e ecologicamente. Uma explosão de criatividade se dá ao lado de um vulcão de frustrações. Multidões excluídas de fato se sentem, entretanto, incluídas de direito.

No Brasil, milhões de jovens e suas famílias suburbanas, carentes da figura paterna, de educação, de saúde e de sustentabilidade econômica, são induzidos ao uso da força e à prática do ilícito, tentados a um atalho em direção aos confortos da modernidade. Talvez aí a principal razão de tanta violência em sociedades abertas, de feição liberal democrática, em que os direitos humanos ainda não foram efetivados. Em meio a todas essas mudanças, os cidadãos – ressalvados os funcionários públicos estáveis – não mais se sentem ocupando um lugar seguro. Cada um se percebe sem lugar, num lugar incerto ou, quando muito, num certo lugar. Nessas circunstâncias, a desigualdade de oportunidades assume feições dramáticas, trágicas, insustentáveis. Sob esta globalização comunicativa, a cidadania vai-se universalizando e passa a ostentar uma consciência mais clara do seu direito a uma vida digna, com aspiração de acesso a igual liberdade, inclusive para divergir, e a uma igualdade de oportunidades, inclusive, eventualmente, para a prática do ilícito (Vasconcelos, 2017,p.31).

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Conforme se afirma, este é um contexto que influencia muito a geração de conflitos: Todos os dias, em todos os lares, somos bombardeados por informações. Para alguns é muito frustrante estar na parte de baixo das camadas sociais.

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5 CONCEITOS DE CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO

A autocomposição é a resolução de conflitos através do consenso entre as partes envolvidas, mediada por um profissional imparcial e independente, sem necessariamente a intervenção de um magistrado, de acordo com o artigo 334. § 1º do Código de Processo Civil. Fernanda Tartuce, (2017, p.49) afirma que “Cumpre destacar que, no regime do Novo CPC, o magistrado não é a pessoa responsável por conduzir a sessão consensual: esta deverá ser realizada necessariamente por um terceiro facilitador auxiliar do juízo”.

Assim é o instituto da conciliação e mediação, que se caracteriza por um acordo entre as partes de forma que satisfaçam as pretensões de cada um, evitando-se com isto a judicialização da demanda, ou se já existir o processo judicial, que se provoque a extinção do mesmo, através da homologação judicial do acordo, como prevê o artigo 725, VIII do Código de Processo Civil (CPC).

Conforme o artigo 166 do CPC, a conciliação e a mediação são informadas pelos princípios da independência, da imparcialidade, da autonomia da vontade, da confidencialidade, da oralidade, da informalidade e da decisão informada

Estes institutos ganharam muita importância nos últimos anos e a sua utilização vem crescendo, certamente por ser um caminho interessante na questão de acesso à justiça e celeridade processual. Uma boa comprovação deste aspecto é atenção que as instituições vêm dando ao tema. O CNJ promove todos os anos no âmbito das Justiças Federal, Estadual e Trabalhista, a Semana Nacional de Conciliação, que tem se mostrado produtiva, melhorando resultados a cada ano que passa, estando na 13ª edição. Em notícia publicada no site, o órgão informa que “O evento para promover a cultura do diálogo entre as partes de um conflito, criado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ocorre, anualmente, desde 2006”. (disponível em http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/87125-xiii-semana-nacional-da-conciliacao-confirmada-para-ocorrer-entre-os-dias-5-e-9-de-novembro - acesso em 03/11/2018). Comentário de Erica Barbosa da Silva reforça esta tendência:

Incrementando tal política, o CNJ sedimentou a política pública de tratamento adequado dos conflitos de interesses, recorrendo a meios consensuais para resolver conflitos, pela resolução nº 125, de 29 de novembro de 2010. Os grandes destaques desta resolução consistem na nivelação das práticas voltadas aos meios consensuais e na

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obrigatoriedade do Judiciário em oferecer meios consensuais para resolução de conflitos (Silva, 2013, p.165).

Outro fato que denota o interesse das autoridades é o cuidado na elaboração do novo CPC, com a inserção de mais dispositivos relativos ao assunto. Logo no artigo 3º o codex já começa a disciplinar o instituto e depois lhe dedica um capítulo inteiro. Fredie Didier Jr. Comenta este interesse dos legisladores:

O Poder Legislativo tem reiteradamente incentivado a autocomposição, com a edição de diversas leis neste sentido.O CPC ratifica e reforça essa tendência:

a) dedica um capítulo inteiro para regular a mediação e a conciliação (arts. 165-175); b) estrutura o procedimento de modo a pôr a tentativa de autocomposição como ato anterior ao oferecimento da defesa pelo réu (arts. 334 e 695); c) permite a homologação judicial de acordo extrajudicial de qualquer natureza (art. 515, III; art. 725, VIII); d) permite que, no acordo judicial, seja incluída matéria estranha ao objeto litigioso do processo (art. 515, § 2º); e) permite acordos processuais (sobre o processo, não sobre o objeto do litígio) atípicos (art. 190). A Lei n.13.140/2015 disciplina exaustivamente a mediação, em geral, e a autocomposição envolvendo o Poder Público (arts. 32-40) (Didier Jr, 2017, p.187).

Uma vez disseminada, o uso deste instituto poderá se traduzir em economia de tempo e dinheiro, tanto por parte do Estado, que reduz o fluxo de ações judiciais, quanto para o jurisdicionado que poderá ver a solução de seu caso com rapidez, evitando custas judiciárias, honorários, e despesas gerais de locomoção entre outras.

5.1 DIFERENÇA ENTRE CONCILIAÇÃO E MEDIAÇÃO

Embora sejam parecidos e voltados ao mesmo objetivo da pacificação e resolução do conflito, existem diferenças entre os termos Conciliação e Mediação, que são tratados de maneira distinta pelo CPC, no artigo 165, que define separadamente nos parágrafos 2º e 3º os papeis do conciliador e do mediador, considerando que, entre eles existem diferenças. Assim, o passo inicial para distinguir os institutos é a análise que o legislador já providenciou ao elaborar o Código. Valéria Lagrasta Ferioli Luchiari cita que:

Alguns autores, inclusive, recomendam tratar os dois termos como sinônimos. Entretanto, observados a prática universal e todos os fatores envolvidos, não há dúvida que são dois mecanismos distintos, embora suas

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técnicas, muitas vezes, sejam utilizadas na tentativa de solução de um mesmo conflito (Luchiari, 2012, p.38)

A sugestão, conforme determina os artigos citados, é que o conciliador atuará preferencialmente nos casos em que não houver vínculo anterior entre as partes, já o mediador, nos casos em que houver. Conforme o CPC, na conciliação, sem constranger ou intimidar, o conciliador pode oferecer sugestões para o litígio, já que não há vínculo anterior entre as conflitantes. Na mediação o ideal é que as partes, que já se conhecem anteriormente, estabeleçam o diálogo, e acompanhados pelo mediador, cheguem a um consenso. Vezzula (1999, p.114) afirma que “a mediação nem julga, nem procura culpados. Analisa o passado para que fiquem esclarecidas as inter-relações e sejam trazidos à tona os desejos do presente e do futuro”. O autor arremata suas ponderações dizendo que “o importante na mediação é estabelecer qual deveria ser o contrato (o relacionamento) atual entre elas que as satisfaça plenamente, e não quem quebrou o contrato passado”.

O CNJ, empenhado na disseminação dessas práticas publica em seu site algumas definições:

A outra diferenciação está pautada no tipo de conflito. Para conflitos objetivos, mais superficiais, nos quais não existe relacionamento duradouro entre os envolvidos, aconselha-se o uso da conciliação; para conflitos subjetivos, nos quais exista relação entre os envolvidos ou desejo de que tal relacionamento perdure, indica-se a mediação. Muitas vezes, somente durante o procedimento, é identificado o meio mais adequado (disponível em http://www.cnj.jus.br/programas-e-acoes/conciliacao-e-mediacao-portal-

da-conciliacao/perguntas-frequentes/85619-qual-a-diferenca-entre-conciliacao-e-mediacao - acesso em 03/11/2018) .

De qualquer forma ao falarmos de conflito, ponderamos que as circunstâncias que envolvem a autocomposição são muito diversas e antes de se definir o método a ser aplicado, deve-se analisar cada caso, considerando que ambos são métodos autocompositivos de conflitos que trarão bons resultados se aplicados adequadamente.

5.2 O CONSENSO EM SUBSTITUIÇÃO À CULTURA DO LITÍGIO

O litígio é consequência de um desentendimento que surge em decorrência de choque de interesses, divergência de opiniões, valores controversos, etc. Fernanda Tartuce, (2017, p.3) define que “Conflito é sinônimo de embate, oposição,

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