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seleção de textos elaborada por Prof. Donizete Soares

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Academic year: 2021

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Primeira

Infância

seleção de textos elaborada

por Prof. Donizete Soares

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Olá!

Meu nome é Donizete Soares. Sou professor de

filosofia e, há décadas, trabalho com formação de

profissionais da área de educação.

Meu compromisso é contribuir para a constituição

de sujeitos autônomos! Entendo a filosofia como

um modo racional e crítico de olhar e lidar com o

mundo, e a educação, sempre coletiva, como

expressão da necessidade e da capacidade dos

seres humanos se fazerem, de fato, humanos.

É um prazer me dirigir a você que, por opção

profissional e/ou por interesse pela humanidade,

se dedica à compreensão e à atuação junto aos

que acabaram de nascer: os que trazem em si

mesmos a real possibilidade de transformação do

mundo.

Compartilho com você estudos interessantes

sobre a fase mais importante da vida de cada um

de nós: a que vai de 0 a anos – chamada de

Primeira Infância.

Selecionei dez textos de pesquisadores do tema,

certo de que eles muito contribuem para que

ampliemos nossa visão sobre este período tão

marcante e, não raro, definidor do jeito de ser,

tanto da criança quanto do adulto.

Bons estudos!

Donizete Soares

www.donizetesoares.com

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Quem fala em nome da criança? Quem são (e/ou foram) os portadores das falas das crianças? Por que não temos registros sobre seus pensamentos e sentimentos? Quem foram (ou são) as crianças?

DESENVOLVIMENTO NA PRIMEIRA INFÂNCIA: CARACTERÍSTICAS VALORIZADAS PELOS FUTUROS EDUCADORES DE INFÂNCIA

Isabel Simões Dias e Sónia Correia

Este trabalho de investigação procura identificar os saberes que cinquenta estudantes do curso de formação inicial em Educação de Infância (Escola Superior de Educação e Ciências Sociais - Instituto Politécnico de Leiria, Portugal) revelaram possuir sobre o desenvolvimento das crianças na primeira infância (dos zero aos três anos).

A IMPORTÂNCIA DA FIGURA PATERNA PARA O DESENVOLVIMENTO INFANTIL Edyleine Bellini Peroni Benczik

Em função das transformações sociais, culturais e familiares ocorridas, desde o século passado, o papel da figura paterna passou e está passando por mudanças

significativas na nossa sociedade.

A INFLUÊNCIA DOS FATORES FAMILIARES E ESCOLARES NO PROCESSO SAÚDE-DOENÇA DA CRIANÇA NA PRIMEIRA INFÂNCIA

Lorena Barbosa Ximenes, Ana Karina Bezerra Pinheiro, Katiane Moisés de Lima e Helloise Barbosa Nery

Este estudo teve como objetivo identificar as situações de agravos à saúde das crianças, na primeira infância, no contexto familiar e escolar. Para a coleta de dados na escola, realizamos uma avaliação da criança quanto ao crescimento e aos agravos à saúde, e no contexto domiciliar, avaliamos 16 famílias quanto à estrutura familiar e ecomapa.

A PRIMEIRA INFÂNCIA NA FORMAÇÃO INICIAL DE EDUCADORES Isabel Simões Dias, Sônia Correia & Patrícia Marcelino

Este estudo pretende dar a conhecer os aspectos do desenvolvimento e aprendizagem na primeira infância valorizados por 50 estudantes do 3.o ano do Curso de Formação Inicial em Educação de Infância do Instituto Politécnico de Leiria - Escola Superior de Educação e Ciências Sociais. Neste sentido, procura-se reflectir sobre a primeira infância enquanto etapa do desenvolvimento humano, identificando aspectos do desenvolvimento e aprendizagem na primeira infância em contexto de creche. OS EIXOS DO CUIDADO NA PRIMEIRA INFÂNCIA

Tami Reis Gabeira e Silvia Abu-Jamra Zornig

O objetivo do artigo é analisar a importância de uma ética do cuidado relativa à primeira infância, principalmente no ambiente institucional. [...] A relação entre o profissional e o bebê ocupa o centro da investigação e é considerada fundamental no que concerne a um desenvolvimento saudável na primeira infância.

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Valéria Ferranti Baptista

Os termos postos no título deste artigo – amar, cuidar, subjetivar – supostamente apresentam vinculação direta entre si, pois tornou-se corrente associar os cuidados essenciais dispensados à sobrevivência do bebê com manifestação de amor –

vinculados ao desejo –, tendo como conseqüência a subjetivação do infans, ou seja, sua passagem de organismo a corpo imerso e inscrito na linguagem.

Curiosamente, é como se a função do cuidador tivesse sido “naturalizada” em ressonância com a construção histórico-social que traça uma equivalência entre maternagem e amor.

HABILIDADES SOCIOCOMUNICATIVAS E DE ATENÇÃO COMPARTILHADA EM BEBÊS TÍPICOS DA PRIMEIRA INFÂNCIA

Andréa Carla Machado e Suzelei Faria Bello

A compreensão da habilidade de comunicação intencional em bebês tem sido alvo de indagações e debates de pesquisadores que estudam a cognição social infantil nos primeiros anos de vida. Assim, é importante investigar habilidades sociocomunicativas e de atenção compartilhada, bem como verificar as intenções comunicativas dos bebês nas primeiras interações mãe-bebê, se os bebês interpretam o comportamento do adulto como intencional e a potencial relação entre contextos de atenção

compartilhada, comunicação intencional e aquisição da linguagem. A SAÚDE MENTAL NA PRIMEIRA INFÂNCIA

F. ESCARDÓ e EVA GIBERTI

Comunicação oficial (a convite) ao IV Congresso Latino-Americano de Saúde Mf1ntal, realizado em Santiago do Chile, de 4 a 10 de dezembro de 1960.

REFLEXÕES SOBRE UMA ÉTICA DO CUIDADO NA PRIMEIRA INFÂNCIA Silvia Abu-Jamra Zornig

A partir das noções de sustentação e de continência, este texto pretende analisar a função do cuidado na primeira infância, principalmente nas instituições e creches que acolhem crianças pequenas, para discutir como as práticas direcionadas a este

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Quem fala em nome da criança? Quem são (e/ou foram) os portadores das falas das crianças? Por que não temos registros sobre seus pensamentos e sentimentos? Quem foram (ou são) as crianças?

O que os registros exibem são os mesmos que temos sobre os pensamentos e os sentimentos das crianças? Suas alegrias, tristezas, dores, injustiças, violências de toda natureza, encantos e desencantos com a vida – seriam as mesmas ou teriam o mesmo peso que têm quando o sabemos pelos seus pais, professores, pesquisadores, pensadores, enfim, de todos aqueles que se põem a falar em nome delas?

Vejamos alguns aspectos da história da criança:

• em toda a antiguidade ocidental, nem mesmo o poder do tirano era tão grande quanto o poder do pai de família (pater familias), que tinha poder de vida e de morte sobre os filhos

• os adultos não se apegavam às crianças; o ponto de vista predominante era o de ter muitos filhos, na esperança de que alguns deles sobrevivessem

• mais do que um lugar, importa observar o “não-lugar” que, durante séculos, a criança ocupou

Grécia

família: entre os camponeses, era comum que os jovens se conhecessem na lavoura,

viessem a namorar e depois se casar; entre os ricos, os casamentos eram arranjados de acordo com conveniências: os pais das jovens procuravam casamentos em que famílias de uma mesma origem social e padrão econômico pudessem unir suas fortunas através do matrimônio de seus filhos; faziam oferendas aos deuses (especialmente a Artêmis, a protetora das mulheres) e ofereciam um dote (terras, bens de alto valor e, até mesmo, dinheiro) ao noivo e a seus familiares; no dia do casamento, a noiva ia para seu novo lar (casa da família do marido) e, somente no dia seguinte, aconteciam as visitas: parentes e amigos próximos levavam presentes ao lar do novo casal

educação: aos meninos de famílias ricas e poderosas eram ensinados, por tutores, a oratória, a poesia, o cálculo, além de atividades esportivas – manter o corpo e a mente sadios era dever dos pais; a rigidez nos estudos era grande: os tutores podiam aplicar castigos físicos aos que não se aplicassem nos estudos; as meninas eram educadas em casa, pelas próprias mães, para que se tornassem boas esposas e donas de casa: aprendiam a fiar, tecer, ler, escrever, contar, canções e histórias populares e, claro, os trabalhos domésticos

mulheres: ricas – deveriam se doar ao máximo a seus maridos e filhos e, dessa forma, abdicar quase que totalmente de seus interesses e vontades; cuidar do lar, monitorar o crescimento de seus filhos; confeccionar tecidos para a criação de peças de vestuário dos familiares; produzir tapetes e cobertas; cuidar da manutenção e embelezamento da casa; devotar integral fidelidade ao marido; pobres – além de todos os anteriores, cozinhar, lavar e limpar a casa

* por conta da orientação política adotada em Esparta, as mulheres tinham maior autonomia: recebiam treinamento militar e liberdade para participar das atividades do cotidiano, inclusive esportes; como havia mais escravos e

estrangeiros do que cidadãos, eram muitas as revoltas internas; sendo assim, crianças e mulheres eram constantemente preparados para os conflitos

• a vida das mulheres gregas só se alterava quanto ao homem que comandava suas ações: o pai, na infância; o marido, na idade adulta

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estrutura familiar baseada no paternalismo: esposa, filhos e escravos sob o comando do pai;

era comum irmãos viverem sob o mesmo teto ou propriedade até a morte do seu pai e, por isso, suas respectivas famílias se considerarem como parte de uma única e grandiosa unidade familiar

• eram comum também o patronos (mais ricos e influentes) manterem famílias humildes sob a sua proteção, garantindo a eles (patronos) vantagens como votos em eleições, trabalhadores disponíveis, amantes e filhos fora de seus casamentos

• embora a existência de famílias numerosas fosse estimulada, eram precárias as condições de vida, o que acarretava muita morte prematura de mães e crianças; muito comum também era o sacrifício ou o abandono de crianças recém-nascidas portadora de deficiências, já que a perfeita saúde física e mental eram atributos indispensáveis para que a criança pudesse futuramente seguir os passos do pai (meninos) ou conseguir um bom casamento (meninas) • para as moças, o casamento representava a passagem de suas vidas do controle paterno

para o do marido; o centro de atuação era o âmbito doméstico, onde tinham que rezar conjuntamente com os maridos e filhos, orientar a limpeza da casa, coordenar a preparação das refeições e, depois de tudo isso, com o auxílio das criadas, se preparar para recepcionar o marido cansado de mais um árduo dia de trabalho e afazeres na rua; para tanto, passavam por um pequeno tratamento de beleza diário que incluía penteados, maquiagem e a escolha de belos trajes para o final do dia em companhia do marido

• tanto os homens das famílias nobres (compromissos e atribuições políticas ou militares) como os plebeus (agricultores, comerciantes prestadores pequenos serviços em áreas urbanas) tinham longa jornada e trabalho pesado

• apenas os meninos de famílias abastadas tinham a educação como privilégio: aprendiam latim, grego, cálculos, literatura e retórica; as meninas tinham que aprender os deveres domésticos com suas mães; os de famílias humildes raramente eram alfabetizadas

a vida da criança dependia totalmente do desejo do pai; o pater familias era absoluto: um cidadão não tinha um filho, tomava; se recusasse a criança - o que era bastante comum - ela era enjeitada... e morta; a criança aceita ficava aos cuidados dos parentes paternos

(agnatos) e o destino dos bastardos, órfãos e abandonados era entregue aos parentes maternos, especialmente a tios e avós maternos

• na tradição germânica, diferentemente da romana, não havia prática do infanticídio: as próprias mães amamentavam seus filhos; as crianças eram educadas sem distinção de posição social

• entre os celtas (alguns grupos, certamente), que se opunham às práticas pedagógicas das populações bárbaras que defendiam o endurecimento do coração já na infância, havia outra forma de educação: não brutalizar o coração das crianças para a guerra e a violência

• até o final da Antiguidade as crianças pobres eram abandonadas ou vendidas; as ricas enjeitadas - por causa de disputas de herança - eram entregues à própria sorte

Idade Média católica

• não havia diferença de idades numa época em que sobreviver a pestes e invasões bárbaras era o mais importante

• os monges criaram verdadeiros “jardins de infância” nos mosteiros, recebendo

indistintamente todas as crianças entregues, vestindo-as, alimentando-as e educando-as, num sistema integral de formação educacional (e cristã)

• as crianças eram educadas por todos do mosteiro até os 15 anos

• a Regra de São Bento prescreve diligência na disciplina: que as crianças não apanhem sem motivo

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• por muito tempo, a criança não foi vista como um ser em desenvolvimento, com características e necessidades próprias, mas como um adulto em miniatura

do século XII ao XVII, a infância teve diferentes significados no imaginário do homem em todos os aspectos sociais, culturais, políticos e econômicos:

* ser produtivo com função utilitária para a sociedade – a partir dos 7 anos, era inserida na vida adulta e tornava-se útil na economia familiar, realizando tarefas, imitando seus pais e suas mães, acompanhado-os em seus ofícios: cumpria seu papel na coletividade

* a idade da criança era definida como “... a primeira idade é a infância que planta os dentes, e essa idade começa quando nasce e dura até os sete anos, e nessa idade aquilo que nasce é chamado de enfant (criança), que quer dizer não falante, pois nessa idade a pessoa não pode falar bem nem formar perfeitamente suas palavras...”

> infância é o contrário de adulto: não é provida de razão, isto é, não pensa, não raciocina e nem age como adulto

> infância é comparada à velhice: a ambos falta a razão

* as crianças eram tratadas como adultos em miniatura: modo de vestir e participar das reuniões, festas e danças

* os adultos se relacionavam com elas sem discriminações: falavam vulgaridades; brincavam de modo grosseiro; tratavam de todos assuntos na sua frente, inclusive jogos sexuais

> não acreditavam na possibilidade da existência de uma inocência pueril, ou na diferença de características entre adultos e crianças: “... no mundo das fórmulas românticas, e até o fim do século XIII, não existem crianças caracterizadas por uma expressão particular, e sim homens de tamanho reduzido...”

* durante séculos, foram altos os índices de mortalidade e de práticas de infanticídio: crianças eram jogadas fora e substituídas por outras com a intenção de conseguir um espécime melhor, mais saudável, mais forte que correspondesse às expectativas dos pais e de uma sociedade que estava organizada em torno dessa perspectiva utilitária da infância: "...uma vizinha, mulher de um relator, tranquilizar assim uma mulher inquieta, mãe de cinco 'pestes', e que acabara de dar à luz: 'Antes que eles te possam causar muitos problemas, tu terás perdido a metade, e quem sabe todos'...”

> não existia o sentimento de amor materno

* as crianças sadias eram mantidas por necessidade, e a mortalidade era algo aceito com bastante naturalidade

* era comum entregar a criança para que outra família a educasse; aos 7 anos, se

sobrevivesse, voltava pra casa e, então, era considerada apta para ser inserida na vida da família e no trabalho

* bem mais tarde, no século XVII, ocorrerão mudanças, graças à interferência do poder público e com a preocupação da Igreja em não aceitar o infanticídio, antes secretamente tolerado

> preservar e cuidar das crianças passa a ser um trabalho exclusivo das mulheres (amas e parteiras), que agiriam como protetoras dos bebês, criando uma nova concepção sobre a manutenção da vida infantil, “... como se a consciência comum só então descobrisse que a alma da criança também era imortal. É certo que essa importância dada à personalidade da criança se ligava a uma cristianização mais profunda dos costumes...”

* ainda no século XIV, dado o papel da igreja, surgiu a criança mística ou criança anjo

* aos poucos, essa representação vai se transformando, assim como as relações familiares: a criança passa a ser educada pela própria família, fazendo despertar um novo sentimento por ela – é “sentimento de infância”, que será constituído por 2 momentos: paparicação e apego

> paparicação: sentimento despertado pela beleza, ingenuidade e graciosidade da criança, fazendo com que os adultos se aproximassem cada vez mais dos filhos; os

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pequenas coisinhas: faz carinhos, bate, faz o sinal da cruz, pede desculpas, faz reverência, beija a mão, sacode os ombros, dança, agrada, segura o queixo: enfim, ela é bonita em tudo o que faz. Distraio-me com ela horas a fio...”

* por conta disso, surgiram medidas para salvar as crianças: preocupados com a saúde delas, os pais passaram a não aceitar perdê-las com naturalidade; as que perdiam era por “vontade de Deus”, segundo orientação religiosa da época

* nem todos aceitaram tais mudanças; ao contrário, irritavam-se: “...não posso conceber essa paixão que faz com as pessoas beijem as crianças recém-nascidas, que não têm ainda movimento na alma, nem forma reconhecível no corpo pela qual se possam tornar amáveis, e nunca permiti de boa vontade que elas fossem alimentadas na minha frente...”

(MONTAIGNE, apud ARIÈS, 1981, p. 159)

> apego: surge a partir do século XVII contra a paparicação da criança; propõe separá-la do adulto para educá-la nos costumes e na disciplina, dentro de uma visão mais racional

* foi nesse contexto moral que a educação das crianças foi inspirada e, principalmente, com o surgimento da família nuclear gerada dentro dos padrões da cúria: família conservadora, símbolo da continuidade parental e patriarcal que marca a relação pai, mãe e criança

> os pais começaram a encarregar-se de seus filhos

> necessidade da imposição de regras e normas na nova educação

> formação de uma criança doutrinada para atender ao tipo de sociedade que surgia > dada a nova concepção de indivíduo, a criança passa a ser alvo do controle familiar ou do grupo social em que ela está inserida

* com o surgimento do “novo homem”, “moderno”, aparecem as primeiras instituições educacionais, permitindo a concepção de que os adultos “compreenderam a particularidade da infância e a importância tanto moral como social e metódica das crianças em instituições especiais, adaptadas a essas finalidades...”

> a criança passa a ter um papel central nas preocupações da família e da sociedade > os laços entre adultos e crianças, pais e filhos, foram fortalecidos

> a criança começa a ser vista como indivíduo social

> a família tem grande preocupação com sua saúde e sua educação

Aspectos da História da Infância no Brasil

• paradoxo entre a infância dos filhos das elites e a infância da criança pobre

• a criança negra sofreu as mais duras penas: não era sujeito de direitos e nem mesmo de piedade; eram vítimas da mortalidade infantil, dadas as precárias condições a que eram submetidas pelos seus donos; não tinham o "direito" de amamentar, já que, em muitos casos, suas mães eram alugadas ou cedidas para servirem de ama-de-leite para crianças brancas; assim que se tornassem "úteis", eram obrigadas ao trabalho compulsório; negrinhos e negrinhas eram brinquedinhos para as crianças brancas e para o adulto

a Lei do Ventre Livre estabelecia que seriam livres os filhos dos trabalhadores escravizados nascidos no Brasil a partir da data de sua promulgação

> Art. 1o: Os filhos da mulher escrava que nascerem no Império desde a data desta lei serão considerados de condição livre.

> §1o: Os ditos filhos menores ficarão em poder e sob a autoridade dos senhores de suas mães, os quais terão obrigação de criá-los e tratá-los até a idade de oito anos completos. (... )

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os filhos "beneficiários" desta lei podiam acompanhá-las

• causas do abandono da criança: pobreza, filhos ilegítimos, morte dos pais; crença em uma educação melhor para a criança

como na Europa, também havia aqui as Rodas dos Expostos (artefato de madeira fixado ao

muro ou janela do hospital, no qual era depositada a criança, sem que a identidade de quem ali colocasse o bebê fosse revelada; surgiu Itália durante a Idade Média com a Irmandade de Caridade, que organizou em um hospital em Roma um sistema de proteção à criança exposta ou abandonada); no Brasil, foram instaladas nas Santas Casas de Misericórdia: Salvador (1726), Rio de Janeiro (1738), Recife (1789), São Paulo (1825); outras rodas menores foram surgindo em outras cidades...

• as crianças que sobreviviam nessas instituições passaram a ser preparadas para o trabalho; as meninas, no entanto, eram preparadas para o casamento

• o Estado somente se faz presente no início do processo de urbanização e de forma assistencial e repressiva: é quando o termo menor passa a ser utilizado – fase conhecida como Doutrina da Situação Irregular (instituições religiosas e atuação do estado)

• em 1979 surge um novo Código com base nessa mesma doutrina: o Juiz de Menores era a autoridade máxima, com poderes definidos em lei para proteção do menor; o Estado age de forma repressiva (não tem obrigações, assim como a própria sociedade): sequer fala em sistema social de proteção à infância e adolescência, que seria uma tarefa exclusiva da família

• após a ditadura militar, e aprovada a Constituição de 1988, com a inclusão do artigo 227, dispondo sobre direitos da criança e do adolescente, passou-se a buscar a sua

regulamentação e a substituição do antigo Código de Menores, de 1979, que se consubstancia na Lei 8069, de 13 de julho de 1990 – ECA

• a Constituição de 1988 e o ECA tem como base a concepção da norma internacional a respeito dos direitos da infância e juventude; conforme a Doutrina da Proteção Integral, a criança é um ser dotado de direitos que precisam ser concretizados

* todas as crianças e adolescentes devem ter especial atenção para que obtenham proteção integral contra a violação de seus direitos, passando a serem vistos como sujeitos de direitos, isto é, cidadãos integralmente, e não apenas como objetos da atenção do Estado

* por “especial atenção”, entende-se:

> primazia de receber proteção e socorro em qualquer circunstância

> precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública > preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas

> destinação privilegiada de recursos públicos para proteger a infância e a juventude • princípios contidos no ECA:

* atendimento integral: direito à vida, à dignidade, à integridade física, psíquica e moral, à não discriminação, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer etc. (arts. 3º, 4º e 7º) * garantia prioritária: primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias * prevalência dos interesses de crianças e adolescentes: o interesse de crianças e

adolescentes deve prevalecer sobre qualquer outro, quando seu destino estiver em discussão * respeitabilidade: é dever de todos zelar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, aterrorizante, vexatório ou

constrangedor (arts. 18, 124, V e 178)

* sigilo - é vedado a divulgação de fatos relacionados a crianças e adolescentes quando se atribua autoria de ato infracional (art. 143)

* escolarização, profissionalização, reeducação e reintegração: promover socialmente a sua família, fornecendo-lhes orientação e inserindo-os em programa oficial ou comunitário de auxílio e assistência, bem como supervisionado a frequência e o aproveitamento escolar

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18 anos de idade

* em caso de infração, a criança deve receber tratamento através de sua própria família ou da comunidade, sem privação de liberdade; o adolescente infrator pode ser submetido a um tratamento mais rigoroso, inclusive privação de liberdade; o Estatuto é aplicável aos que têm entre 18 e 21 anos nos casos expressos em lei (como, por exemplo, prolongamento da medida de internação até os 21 anos e assistência judicial)

* prevê instrumentos efetivos para sua concretização; de acordo com a doutrina da Proteção Integral, para a efetivação de tais instrumentos, o Município é a melhor instância para o atendimento desses direitos

* instrumentos :

Conselhos de Direitos - o art. 88, do Estatuto da Criança e do Adolescente disciplina, em seu inciso II, a criação de Conselhos Municipais, estaduais e nacional1

> devem ser formados em cada município, em cada estado e ao nível nacional, garantindo a participação paritária para os representantes da sociedade

* Conselhos Tutelares – órgãos que retiram dos juizados da infância e da juventude (antigos juizados de menores) as funções de assistência social

> casos que envolvam violação dos direitos de crianças e adolescentes são

encaminhados ao Conselho Tutelar que busca soluções, encaminhando ao Ministério Público/Judiciário, desenvolvendo trabalho junto à família e comunidade ou mesmo requisitando serviços públicos

> sua grande finalidade é zelar para que as crianças e adolescentes tenham acesso efetivo aos seus direitos; são 5 conselheiros eleitos pela população local, e contam com credenciamento legal e autoridade moral para atuar de acordo com as atribuições previstas no ECA

* Fundos da Criança e do Adolescente - vinculado a cada conselho, conforme previsão do ECA, como instrumento de captação de recursos; se constituirá a partir de verbas públicas, de doações subsidiadas, de multas e dos impostos de renda de pessoas físicas e jurídicas

> é um mecanismo fraco, já que nem todo município tem conselho, e nem todos os conselhos funcionam com um fundo estruturado

> não raro, são ''dor de cabeça'' pelos prefeitos

> há desconfiança das empresas quanto ao destino das doações; muitas não colaboram porque ignoram incentivos

* Cedecas - Centros de Defesa da Criança e do Adolescente, ong's de defesa dos direitos infanto-juvenis, têm como objetivo fundamental defender os direitos das crianças e dos adolescentes, especialmente os violados pela ação ou omissão do Poder Público, visando o exercício integral e universal dos direitos humanos

> podem, de fato, se constituir num dos principais instrumentos para romper o

distanciamento entre o marco legal e o direito das crianças e dos adolescentes no Brasil * ANCED – associação que congrega, nacionalmente, dezenas desses centros de defesa, cuja maioria foi formada antes da instituição do ECA e encontram-se espalhados praticamente por todo o país; tem sede em Fortaleza, capital do Ceará

> objetivo central: lutar pela implantação dos direitos das crianças e dos adolescentes e cobrar sistematicamente do poder público a execução de suas obrigações

* ação civil pública: responsabilização de autoridades que, por ação ou omissão, não cumprirem o Estatuto da Criança e do Adolescente

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Desenvolvimento na primeira infância: características

valorizadas pelos futuros educadores de infância

Early childhood development: characteristics valued by future childhood educators

Isabel Simões Dias1

Instituto Politécnico de Leiria, IPLeiria, Portugal

Sónia Correia2

Instituto Politécnico de Leiria, IPLeiria, Portugal

Patrícia Marcelino3

Grupo Projeto Creche (Núcleo de Investigação e Desenvolvimento em Educação), NIDE-IPL, Portugal

Resumo

Este trabalho de investigação procura identificar os saberes que cinquenta estudantes do curso de formação inicial em Educação de Infância (Escola Superior de Educação e Ciências Sociais - Instituto Politécnico de Leiria, Portugal) revelaram possuir sobre o desenvolvimento das crianças na primeira infância (dos zero aos três anos). Recorrendo-se a uma metodologia qualitativa, analisaram-se vinte e cinco trabalhos de revisão de literatura sobre o desenvol-vimento infantil elaborados no âmbito da unidade de Prática Pedagógica II (3.º ano), no ano letivo de 2008-2009. A análise de conteúdo efetuada por um painel de três juízes revelou o olhar dos estudantes sobre o conceito e as características do desenvolvimento que ocorrem durante estes primeiros anos de vida. Os dados obtidos permitem-nos inferir que a carac-terística holística do desenvolvimento foi pouco enfatizada pelos estudantes e que, ao nível dos diferentes domínios do desenvolvimento humano, os futuros educadores valorizaram o domínio físico-motor e linguístico em comparação com os domínios cognitivo e psicossocial. Estes resultados assumem-se como importantes para o processo de reflexão relativo à cons-trução da profissionalidade docente, principalmente no que se refere ao trabalho desenvolvido na formação inicial, com futuros educadores de infância. Na verdade, o conhecimento das características do desenvolvimento da criança até aos três anos é um dos principais suportes para a intencionalidade educativa e intervenção adequada com as crianças nestas idades.

Palavras-chave: Desenvolvimento; Primeira Infância; Formação Inicial.

Abstract

This research identifies the knowledge that fifty students of the Initial Training in Child-hood Education (School of Education and Social Sciences - Polytechnic Institute of Leiria, Portugal) have revealed about the development of children in early childhood (from zero to three years old). By employing a qualitative methodology we analyzed twenty-five works of

1 Doutorada em Psicologia pela Universidade de Aveiro (Portugal), é docente no Instituto Politécnico de Leiria - Escola Superior de Educação e Ciências Sociais (IPL-ESECS). Atualmente, coordena o Projeto Creche (Núcleo de Investigação e Desenvolvimento em Educação - NIDE-IPL). E-mail: isabel.dias@ipleiria.pt

2 Licenciada em Educação de Infância e docente no Instituto Politécnico de Leiria - Escola Superior de Educação e Ciências Sociais (IPL-ESECS). Doutoranda em Didática e Formação (Universidade de Aveiro, Portugal). Integra a equipe de coordenação do Projeto Creche (NIDE-IPL). E-mail: sonia.correia@ipleiria.pt

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literature review about child development elaborated by the students within the unit Peda-gogical Practice II (3th grade) in the 2008-2009 school year. The content analysis carried out by a panel of three judges showed that students knew about the concept and character-istics of development that occur during these early years of life. The data obtained allow us to infer that the characteristic of the holistic development was not emphasized by students and that as regards the different areas of human development, the future educators valued the physical and language domains compared to the cognitive and psychosocial ones. These results are assumed to be important for the process of reflection on the construction of the teaching profession, particularly with regard to work done in training, with future early childhood educators. In fact, knowledge of the characteristics of child development up to three years old is a mainstay for the educational intention and appropriate intervention with children at these ages.

Keywords: Development, Early Childhood, Initial Training.

Hoje em dia já não se discute a importância do desenvolvimento na primeira infância, especialmente entre os zero e os três anos de idade, pois sabe-se que é na infância que se lançam “as bases do desenvolvimento nos seus diversos aspectos físicos, motores, sociais, emocionais, cognitivos, linguísticos, comunicacionais, etc.” (PORTUGAL, 2009, p.7). Por esta razão, o trabalho dos educadores de infância4

torna-se essencial na promoção de um desenvolvimento equilibrado da criança, permitindo-lhe o desencadear de todo o seu potencial enquanto ser humano. Assim sendo, faz sentido que os educadores de infância conheçam e estejam informados sobre as características do desenvolvimento da criança durante esta sua fase de vida. Com este estudo identificamos o que futuros educadores (estudantes do 3.º ano do curso de Educação de Infância) revelaram possuir sobre o desenvolvimento das crianças até aos 3 anos, procurando fazer uma reflexão mais profunda sobre o desen-volvimento da criança na primeira infância e sobre o papel do educador de infância na promoção do seu desenvolvimento em contexto de creche. Partindo destes dados, refletimos, ainda, sobre as oportunidades de aprendizagem que a formação inicial5

oferece para o conhecimento da criança nesta idade.

O processo de desenvolvimento humano nos três primeiros anos de vida

Desde a concepção no útero materno até ao momento em que morre, o ser humano vive num processo caracterizado por constantes mudanças. Este processo de mudança, que resulta da interação entre as características biológicas de cada indivíduo e os fatores contextuais onde o indivíduo se encontra inserido (sociedade e cultura), é denominado por desenvolvimento humano (MATTA, 2001; NÚÑEZ, 2005; PAPALIA et al., 2001; PORTUGAL, 2009; TAVARES et al., 2007). Sendo um processo holís-tico e contextualizado que ocorre ao longo de toda vida, o desenvolvimento humano acarreta mudanças progressivas, contínuas e cumulativas provocando, no indivíduo, 4 Educadores de Infância, em Portugal, são profissionais de educação habilitados a trabalhar com as crianças dos 4 meses

até à sua idade de ingresso no 1.º Ciclo do Ensino Básico (por volta dos 6 anos de idade).

5 De acordo com a Lei de Bases do Sistema Educativo Português (Lei n.º 46/86, alterada pela Lei n.º 115/97 e Lei n.º 49/2005), formação inicial de nível superior é aquela formação que proporciona “aos educadores e professores de todos os níveis de educação e ensino a informação, os métodos e as técnicas científicos e pedagógicos de base, bem como a

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reorganizações constantes ao nível das suas estruturas físicas, psicológicas e sociais que evoluem num contínuo faseado e integrativo (NÚÑEZ, 2005; TAVARES et al., 2007). Portugal (2009) defende que o período da infância e as primeiras experiências de vida do ser humano enquanto criança determinam aquilo que o ser humano será enquanto adulto, pois é nesse período que o sujeito aprende sobre si, sobre os outros e sobre o mundo.Neste sentido, o conhecimento da criança nesta etapa da sua vida torna-se essencial para os profissionais de educação que com ela desenvolvem uma ação educativa.

Todas as transformações do ser humano provocam outras mudanças que o influen-ciam no seu todo (MATTA, 2001; PAPALIA et al., 2001). Poderemos pensar, como exemplo, o momento em que a criança começa a ser capaz de usar a linguagem oral para se expressar. Esta nova competência cognitiva permitir-lhe-á novas possibili-dades de interação com o mundo, novas possibilipossibili-dades de interação com os outros, influenciando, também, o seu desenvolvimento social. Esta e outras situações fazem com que tenhamos de assumir que o desenvolvimento do ser humano é um processo holístico e que todos os processos ocorridos se influenciam e se provocam mutua-mente. Na perspetiva de Núñez (2005), só será possível aceitar uma fragmentação do desenvolvimento humano se houver uma finalidade metodológica que permita observar cientificamente algumas dimensões da condição humana. Desta forma, e sem perder esta característica integrada do desenvolvimento humano, faremos uma breve apresentação dos diferentes domínios do desenvolvimento categorizados por Papalia et al. (2001) como sendo os domínios do desenvolvimento físico-motor, cognitivo e psicossocial.

Desenvolvimento físico-motor

Segundo Tavares et al. (2007) o crescimento do bebê nos dois primeiros anos de vida é extremamente acentuado em comparação com outros períodos da vida de um ser humano. Para Matta (2001) e Papalia et al. (2001), o processo de desenvol-vimento é gradual. Quando a criança nasce, tem pouco controle sob o seu corpo e os seus movimentos são descoordenados. Progressivamente vai-se desenvolvendo, controlando inicialmente o corpo nos membros superiores (lei céfalo-caudal) e no sentido do centro do corpo para fora (lei próximo-distal). Sendo competente é capaz de aprender a partir das estruturas a que chega ao mundo.

“Neste período, o bebé sofre importantes e aceleradas modificações, tais como gati-nhar, sentar, andar e falar” (TAVARES et al., 2007, p.44). Durante os dois primeiros meses de vida aprende a segurar o pescoço e, aos quatro meses, senta-se necessitando da ajuda de um suporte (MATTA, 2001). O rastejar e o gatinhar surgem como as primeiras tentativas de movimentação intencional por volta dos quatro/seis meses (PAPALIA et al., 2001). Com cerca de sete meses, senta-se sozinha sem qualquer suporte. As primeiras tentativas de se colocar na posição bípede surgem por volta dos oito/nove meses, apoiando-se, porém, em alguma coisa. Apenas por volta dos onze meses é que a criança consegue andar com alguma ajuda (MATTA, 2001). O andar “não se adquire de repente” (BRAZELTON, 2006, p. 166), sendo necessários alguns meses até que se torne mais autônoma (BÉBE, 1981). Ao aprender a andar, a criança

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No decorrer do segundo ano de vida a criança já anda e explora o espaço circun-dante, começa a subir degraus (inicialmente sem alternar os pés), corre, salta, pisa por cima de um risco, lança, anda em bicos dos pés e de triciclo (PAPALIA et al., 2001; ROJO et al., 2006). No que diz respeito à manipulação de objetos, a criança por volta dos cinco meses já tem consciência de que pode alcançar e agarrar tudo o que tem à sua volta, no entanto, só aos dez meses é que estes dois movimentos se coordenam num só (PAPALIA et al., 2001). Ao completar o segundo ano, pode-se verificar o início de uma certa preferência por um dos lados, o que “não quer dizer que a criança já desenvolva o domínio de um lado sobre o outro” (GISPERT, 1996, p. 79).

Em relação ao início do controle dos esfíncteres não há um consenso entre os diversos autores. Segundo Bébe (1981), o mesmo acontece por volta dos 16-18 meses. A criança manifesta maior predisposição para adquirir com eficácia o controle dos esfíncteres por volta dos 18-24 meses, apesar de Griffey (2002), Brazelton (2006) e Mucchielli (1992) referirem os 18-36 meses. O controle esfincteriano depende da maturidade do sistema nervoso mas, regra geral, a criança do sexo feminino antecipa--se (BÉBE, 1981).

Desenvolvimento cognitivo

Nos primeiros três anos de vida a criança desenvolve capacidades cognitivas devido ao interesse que manifesta pelo mundo que a rodeia e à sua necessidade de comunicação (TAVARES et al., 2007). Por volta dos quatro meses a criança já é capaz de se concentrar no que vê, toca e ouve, sem perder o controle. Conforme Brazelton (2006, p. 157), “alguns bebés sorriem e balbuciam naturalmente, absorvendo os sons e imagens, dormindo regularmente e comendo sem problemas”. A criança aprende rapidamente a usar e compreender os sinais que são expressos através do compor-tamento, da expressão corporal e da postura corporal. Desde o nascimento há uma reação aos ruídos, uma vez que para além do bebê detectar, ele orienta o olhar e a cabeça em direção à fonte que produziu o mesmo. Para além disso, “é capaz de discri-minar características rítmicas e melódicas em diferentes tipos de sequências sonoras, revelando alterações nas suas respostas” (MATTA, 2001, p. 125).

Aos dois anos a criança é capaz de ordenar e de guardar objetos pessoais, de cons-truir torres de sete cubos (ROJO et al., 2006), de identificar três a cinco desenhos (GISPERT, 1996), de examinar e de agarrar pequenos objetos.

O egocentrismo Piagetiano (apud PAPALIA et al., 2001) é uma das características presentes na criança da primeira infância - a criança desta idade não tem capaci-dade para se colocar no ponto de vista do outro e não entende a sua visão, pois a sua compreensão está centrada em si mesma. No entanto, para estes autores, citando estudos de Yarrow (1978), a criança não é tão egocêntrica como Piaget descreveu e até mostra alguma capacidade de empatia.

A par destas transformações começam a surgir as primeiras palavras e, poste-riormente, as primeiras frases. Esta crescente capacidade linguística traz inúmeras implicações ao nível da comunicação com os outros. A criança começa a conversar, a questionar, a querer saber sempre mais, numa tentativa de compreender o mundo que a rodeia. Na verdade, com um ano de idade a criança já pronuncia algumas

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palavras perceptíveis, iniciando a articulação das primeiras palavras com significado (PAPALIA et al., 2001) embora fale muitas outras que não se conseguem compreender (BRAZELTON, 2006). A primeira palavra surge, normalmente, entre os 10 e os 14 meses iniciando a chamada fala linguística. No período a partir dos 18 meses (apro-ximadamente) a criança utiliza a “pré-frase, constituída por dois ou vários termos dispostos segundo a importância afetiva que a criança lhe atribui” (DELMINE; VERMELEN, 2001, p.54). Ao longo do período da pré-frase a criança encontra-se na idade «perguntadora» - coloca questões do gênero “o que é isto?”, “como?”, ”onde?”, “quando?”, “por que?”, exprimindo a sua curiosidade e desejo de conhecer.

Por volta dos dois anos a criança entusiasma-se com a sua própria linguagem. Gosta de aprender palavras novas (por vezes pronunciadas incorretamente) e de inventar novas palavras (MUCCHIELLI, 1992). Nomeia objetos familiares e é capaz de conversar sozinha com um brinquedo. É também por volta dos dois anos que surgem as primeiras frases, ainda que rudimentares (ROJO et al., 2006). Segundo Delmine e Vermelen (2001), nesta idade, a criança apresenta um forte incremento da linguagem e, de fato, este é o período em que se verifica o maior enriquecimento do vocabulário. Desenvolvimento psicossocial

Sabemos que a criança se desenvolve em vários contextos com características específicas, isto é, com regras, atitudes, valores e modos de estar e ser concretos. Desde o primeiro dia em que vem ao mundo, o ser humano começa a ter consciência de que existe um mundo externo a si. É nesse mundo que aprende sobre si, a estar e a comunicar-se com os outros. Neste sentido, a primeira infância é um período de mudanças significativas no que diz respeitoao desenvolvimento social.

Como afirma Brazelton (2006), uma criança entre as seis e as oito semanas utiliza o sorriso como um meio para captar a atenção dos seus pais (linguagem não-verbal). Para além do sorriso, o choro é uma das principais formas da criança contatar com o que a rodeia (MATTA, 2001).

Nos primeiros meses de vida a criança tem grandes oscilações de humor (BOUFFARD, 1982; BRAZELTON, 2006). Ao aproximar-se dos 3 anos vai tornando--se (mais) obediente, arrumada e amável (BOUFFARD, 1982) indo (re)conhecendo, em fotografias, as pessoas mais chegadas e demonstrando sentimentos de afeto, compaixão e culpabilidade (ROJO et al., 2006).

A capacidade de ser terna, confiante e estabelecer intimidade, quer com adultos, quer com pares, aumenta entre os quatro e os seis meses (BRAZELTON, 2006). Com um ano de idade a criança ainda manifesta um apego excessivo com a mãe ou de quem cuida dela e ainda a perturba a separação ou ausência materna (BÉBE, 1981; PAPALIA et al., 2001). Contudo, começa a tomar consciência que é alguém distinto da mãe e com vontade própria.

Os dois anos são uma idade de conflito, pois a criança vive entre a necessidade de afeto e a necessidade de independência. Como afirmam Papalia et al. (2001, p. 169): “os terríveis dois anos são uma manifestação normal da necessidade de autonomia” o que ocasiona um período de oposição em duas áreas fundamentais: nas brincadeiras (demolir e construir) e na alimentação (repugnância e preferências por alimentos)

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Aos dois anos a criança demonstra, também, dificuldade em partilhar - normal-mente brinca sozinha (GESELL, 1979). Aos dois anos e meio já brinca com outras crianças embora em paralelo. Por vezes acontece entusiasmar-se e morder o melhor amigo (BRAZELTON, 2006), revelando estes comportamentos o início da socialização (UNESCO, 1978) - gosta da companhia de outras crianças mas tem dificuldade em se relacionar com elas (ROJO et al., 2006; UNESCO, 1978).

Ainda que haja especificidades próprias de cada dimensão do desenvolvimento da criança, uma mudança numa dimensão provoca muitas outras nos restantes domínios. Observar um bebê que ainda gatinha e observá-lo um mês depois permite

espantarmo-nos, pois são notórias as inúmeras conquistas já alcançadas! Talvez já

ande sozinho ou se aventure a dar passos agarrado ao mobiliário ou à mão de alguém. Esta capacidade de se deslocar mais autonomamente permite ver o mundo de uma outra perspectiva e ter acesso a realidades até então desconhecidas. Tudo isto desperta o desejo da criança por novas formas de interação com os objetos e com as pessoas que fazem parte da sua vida. Uma conquista situada no domínio do desenvolvimento físico-motor, como foi o caso apresentado, permite à criança outras possibilidades de aprendizagem e de, consequentemente, outros processos de desenvolvimento nos restantes domínios.

Não hápadrões de desenvolvimento verdadeiramente iguais em todos os seres humanos uma vez que “cada criança é semelhante às outras crianças em alguns aspectos, mas é única em outros aspectos” (PAPALIA et al., 2001, p.9). O processo de desenvolvimento do ser humano toma em si as singularidades humanas, as especifi-cidades hereditárias do indivíduo e aquelas que são resultantes da sua experiência de interação com a realidade social e física. O processo de desenvolvimento da criança é um processo pessoal, único, situado num contexto histórico e cultural que, também, o influencia. A criança desenvolve-se em diferentes ambientes, mais ou menos fami-liares, que lhe oferecem as suas primeiras experiências de vida. No caso concreto deste estudo, aproximamo-nos de uma reflexão sobre os contextos educacionais dedicados às crianças até aos três anos – o contexto de creche – e por isso importa debruçarmo--nos um pouco sobre o papel deste contexto e dos seus profissionais (particularmente os educadores de infância).

O desenvolvimento da criança, o contexto de creche e o

papel do educador de

infância

O desenvolvimento humano situa-se num contexto histórico e cultural, num ambiente que o influencia fortemente (PAPALIA et al., 2001). Neste sentido, emerge uma responsabilidade acrescida de reflexão e estudo sobre os contextos educacionais que proporcionamos às crianças nesta primeira fase da sua vida.

Contextos que ofereçam à criança oportunidades para aprender ativamente são determinantes para que a criança possa se desenvolver de forma harmoniosa. Em Portugal, a creche enquanto instituição dedicada à primeira infância apresenta-se, para além da família e de outros ambientes, como um potencial contexto de desenvol-vimento/aprendizagem para a criança pelos desafios que lhe pode proporcionar. Na verdade, a forma como as crianças são cuidadas e respeitadas nas “suas necessidades,

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forma como a creche responde à criança e à sua individualidade terá efeitos signifi-cativos para o desenvolvimento” (CARVALHO, 2005, p. 43).

Como refere Didonet (2001) a creche é o contexto que se organiza para, de forma intencional, apoiar o desenvolvimento das crianças levando-as a ir mais longe possível neste processo. Para se caminhar neste sentido é necessário que os profissionais de educação possuam conhecimentos específicos e que planifiquem sustentando-se “no conhecimento do desenvolvimento nos primeiros anos de vida e das finalidades educa-tivas de todo o trabalho em creche” (PORTUGAL, 2012, p. 13). Este conhecimento da criança, daquilo que ela é, permite ao educador de infância uma maior segurança nas oportunidades de aprendizagem e desenvolvimento que é capaz de proporcionar às crianças.Neste sentido, conhecer as características e os processos de desenvolvimento nos três primeiros anos de vida é um saber essencial para o exercício da profissão.

O processo de desenvolvimento, marcado por inúmeras e rápidas conquistas, transparece a imagem de um ser altamente competente, capaz e com iniciativa própria (BARBOSA; FOCHI, 2012). Para que a criança se sinta feliz e se desenvolva de forma integral em contexto de creche, solicita-se um educador que reconheça cada criança como um ser único, rico, com potencial para construir o seu conhecimento a partir das suas ações. A qualidade da relação que o educador é capaz de estabelecer com a criança influencia a qualidade do desenvolvimento da criança. Como refere Portugal (1998, p.178), “a creche poderá fazer com que a criança seja mais assertiva e socialmente mais interativa, mas as consequências dependem da qualidade e consistência dos cuidados substitutos fornecidos à criança”. Neste sentido, as relações estabelecidas com a criança deverão ser relações autênticas e de confiança, que vão ao encontro do ser humano que ali existe. Didonet (2001, p. 24) sublinha a ideia de que “falar sobre creche é, antes de tudo, falar sobre a criança. Ela é a razão, o conteúdo e a metodologia em creche”. Assim, falar sobre a criança implica um conhecimento sobre as suas características de desenvolvimento, assim como uma observação atenta às singularidades individuais desse mesmo processo de desenvolvimento. Será este conhecimento que sustentará a planificação realizada pelo educador, tanto ao nível das experiências educativas como na organização dos tempos, espaços, mobiliário e materiais que, por sua vez, proporcionam outras experiências à criança.

Os princípios educativos apresentados por Gonzalez-Mena e Eyer (1989, citado por PORTUGAL, 2000) para o contexto de creche evidenciam, entre vários aspectos, a necessidade de se investir tempo para construir a pessoa “total”. Isto significa que um educador de infância deverá conhecer de forma aprofundada o que acontece com as crianças nos diferentes domínios de desenvolvimento para assim poder garantir que as oportunidades de aprendizagem proporcionadas facilitam o desenvolvimento holístico. Muitofacilmente se poderá cair na tentação de valorizar determinados domí-nios em detrimento de outros. Os mesmos autores, também chamam à atenção para a necessidade de se respeitar o processo natural de desenvolvimento em cada faixa etária. Não tem sentido apressar a criança a atingir outros níveis de desenvolvimento, cada criança tem o seu ritmo próprio ao qual o educador deverá ser responsivo. Esta responsividade prende-se com o encorajamento que o educador oferece à criança, dando-lhe espaço para que ela faça as coisas que lhe interessam e lhe dizem respeito. Envolver as crianças nas coisas que lhe dizem respeito é um outro princípio educativo

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que os autores assumem para o contexto de creche e que implica, obrigatoriamente, o conhecimento das características desenvolvimentais.

As necessidades físicas, de afeto, de segurança, de reconhecimento e afirmação, de competência, de significados e valores que a criança, nos três primeiros anos de vida, precisa de ver satisfeitas(PORTUGAL, 2012) assumem uma importância crucial no contexto de creche. O contexto de creche é um contexto privilegiado na promoção do desenvolvimento da criança, salientando-se aqui o papel do educador de infância como o principal responsável. Investir tempos de qualidade, estar disponível para as crianças, respeitá-las enquanto pessoas e valorizar as suas formas de comunicação únicas, são princípios educativos essenciais (GONZALEZ-MENA; EYER, 1989, citado por PORTUGAL, 2000). Neste sentido, torna-se importante uma formação de educadores de infância que aposte numa reflexão aprofundadasobre o papel destes profissionais neste contexto. Analisando a situação de Portugal e Brasil (DAGNONI, 2011; VASCONCELOS, 2011; DIDONET, 2001) reconhece-se que a formação inicial e contínua fica aquém das necessidades, não proporcionando o suporte necessário ao desenvolvimento de competências, sustentadas num conhecimento científico do que é a criança nesta idade. Parece-nos que haverá algum trabalho a desenvolver neste sentido, começando pela formação inicial dos educadores de infância.

No caso concreto deste estudo,procuram-se os saberes que estudantes da formação inicial, do 3.º ano do curso de Educação de Infância, revelaram possuir sobre o desen-volvimento na primeira infância, num trabalho de revisão de literatura (pesquisa).Este estudo é de índole exploratório e qualitativo e decorreu no ano letivo de 2008-2009 no âmbito do Projeto Creche, integrado no Núcleo de Investigação e Desenvolvimento em Educação do Instituto Politécnico de Leiria (Portugal).

Metodologia

Contexto

Este estudo decorreu no Instituto Politécnico de Leiria (IPL), instituição do Ensino Superior Politécnico de Portugal que concentra cerca de 900 docentes e 11.500 estu-dantes distribuídos por 5 Escolas Superiores: Escola Superior de Educação e Ciências Sociais, Escola Superior de Tecnologia e Gestão, Escola Superior de Artes e Design, Escola Superior de Turismo e Tecnologias do Mar e Escola Superior de Saúde.

A Escola Superior de Educação e Ciências Sociais ministra cursos nas áreas da formação de professores, das ciências sociais, da comunicação, da tradução e da animação cultural e acolhe, atualmente, cerca de 1.700 estudantes e 165 docentes. Este estudo desenrolou-se nesta escola, no âmbito da formação inicial de professores. Participantes

Participaram neste estudo 50 estudantes do sexo feminino, com idade entre os 19 anos e os 45 anos de idade (M = 24.62; DP = 6.35), a frequentar o 3.º ano do Curso de Formação Inicial em Educação de Infância, no ano 2008-2009 (IPL-ESECS)6. 6 O curso de formação inicial em Educação de Infância estava, no ano letivo 2008/2009, organizado em quatro anos,

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A maioria era solteira (78% do total da amostra) e encontrava-se no curso da sua primeira preferência (92% do total da amostra). Das 50 participantes, 10 (20% do total da amostra) eram estudantes-trabalhadoras (5 eram Auxiliares da Ação Educativa, 2 Administrativas, 1 Assistente de Administração Escolar, 1 Vendedora e 1 Empregada de Armazém).

Instrumentos

Para a recolha dos dados recorreu-se aos trabalhos de revisão de literatura sobre o desenvolvimento e aprendizagem na 1.ª infância que foram elaborados pelos estudantes no âmbito da unidade curricular de Prática Pedagógica II (documentos pessoais, não publicados).

Foi, também, elaborado um questionário sócio-demográfico que permitiu a caracte-rização da amostra. O questionário foi dividido em duas partes distintas: apresentação dos objetivos do estudo/solicitação de autorização para participação, e, questões de caráter fechado e semi-fechado.

Procedimento

No âmbito das atividades formativas da unidade curricular de Prática Pedagógica II (IPL-ESECS), foi solicitado aos estudantes a realização de um trabalho de revisão da literatura sobre o desenvolvimento/aprendizagem na primeira infância com um número máximo de seis páginas. Como os estudantes estavam a realizar o estágio em contexto de creche, pretendia-se, com a elaboração deste trabalho de revisão de literatura, que os mesmos tomassem conhecimento das características do desen-volvimento das crianças nesta idade, de forma a adequar a sua ação educativa ao contexto. Assim, este trabalho de pesquisa foi um exercício formativo sustentador da ação educativa dos estudantesem contexto de creche ao longo do seu estágio. A definição de um reduzido número de páginas exigiu aos estudantes uma seleção rigo-rosa das informações mais relevantes sobre o assunto, levando-os a evidenciarem o que consideraram, a partir das suas leituras, o essencial.

Organizados em grupos de dois elementos, os estudantes produziram 25 traba-lhos, codificados de T.1 a T.25. Recolhidos os trabatraba-lhos, as docentes-investigadoras solicitaram autorização aos estudantes para utilizar os documentos elaborados para fins investigativos. Com a anuência dos participantes, procedeu-se à recolha dos seus dados sociodemográficos. Os dados advindos foram organizados em categorias através da técnica de análise de conteúdo (com um painel de três juízes). Para a caracterização dos participantes recorreu-se à análise estatística descritiva.

Resultados

Os dados que se apresentam, organizados em quadros, referem-se ao conceito e características gerais do desenvolvimento (ver Quadro I) e aos domínios do desen-volvimento e suas características, identificados pelos estudantes nos seus trabalhos de revisão de literatura (ver Quadros II, III, IV e V).

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Quadro I - Desenvolvimento: conceito e características gerais

Conceito e características gerais Frequência %

Mudanças no ser humano ao longo da vida 42 59,2

Ritmo de desenvolvimento individual 13 18,3

Domínios do desenvolvimento 12 16,9

Desenvolvimento holístico 4 5,6

Total 71 100

Fonte: Dados da pesquisa.

Os dados apresentados (Quadro I) revelam a existência de uma maior incidência na definição do desenvolvimento como mudanças no ser humano ao longo da vida (59,2%). O desenvolvimento como processo holístico é a característica que apresenta menos evidências (5,6%).

No que se refere aos diferentes domínios do desenvolvimento os dados mostram que as evidências de desenvolvimento físico-motor são as mais referenciadas (42%), seguidas do desenvolvimento psicossocial (25%) e do desenvolvimento cognitivo (23%). As evidências de desenvolvimento linguístico (10%) foram perspectivadas pela maioria dos estudantes como um domínio do desenvolvimento e não como um subdomínio da dimensão cognitiva. De seguida analisamos cada um destes domínios de forma a verificar que aspectos surgem identificados e valorizados pelos estudantes.

Quadro II - Características do Desenvolvimento Físico-Motor

Características do Desenvolvimento Físico-Motor Frequência % Desenvolvimento dos cinco sentidos (audição, visão, tato, olfato, paladar) 36 6

Crescimento 71 11,9

Motricidade fina 118 19,8

Motricidade grossa e controle corporal 359 60,3

Controle esfincteriano 11 2

Total 595 100

Fonte: Dados da pesquisa.

Ao nível do desenvolvimento físico-motor (Quadro II) existe uma grande incidência nos aspectos do desenvolvimento da motricidade grossa e controle corporal (60,3%), sendo que o controle dos esfíncteres é o menos valorizado.

Quadro III - Características do Desenvolvimento Psicossocial

Características do Desenvolvimento Psicossocial Frequência %

Manifestação de emoções 143 41

Comunicação interpessoal (pais, outros adultos significativos, pares, vinculação) 144 41 Manifestações de independência e de segurança (autonomia, alimentação,…) 64 18

Total 351 100

Fonte: Dados da pesquisa.

Analisando o desenvolvimento psicossocial (Quadro III) verificamos que a

mani-festação de emoções (41%) e a comunicação interpessoal (41%) são os aspectos mais

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Quadro IV - Características do Desenvolvimento Cognitivo

Características do Desenvolvimento Cognitivo Frequência % Representação simbólica (jogo simbólico, associação palavras/objeto) 50 14,9

Resolução de problemas 86 25,7

Exploração de objetos/meio 45 13,5

Egocentrismo 22 6,6

Curiosidade/questionamento 24 7,2

Desenvolvimento da concentração e da memória 24 7,2

Reconhecimento (nome, vozes, palavras, objetos, figuras familiares) 37 11,1

Objeto permanente 25 7,5

Consciência do self 21 6,3

Total 334 100

Fonte: Dados da pesquisa.

Das características do desenvolvimento cognitivo (quadro IV) realça-se a resolução

de problemas (26%), e a representação simbólica (15%) como categorias com mais

evidências. A consciência do self é a categoria com menor incidência mas ainda com uma percentagem significativa de 6%.

Quadro V - Características do Desenvolvimento Linguístico

Características do Desenvolvimento Linguístico Frequência %

Emissão, combinação e diferenciação de sons 56 39,1

Verbalização das primeiras palavras 18 12,6

Construção frásica 34 23,8

Aquisição e utilização de vocabulário 35 24,5

Total 143 100

Fonte: Dados da pesquisa.

Relativamente ao desenvolvimento linguístico (Quadro V) os estudantes dão espe-cial ênfase à emissão, combinação e diferenciação de sons por parte das crianças (39%).

Fazendo uma leitura dos dados apresentados, constatamos que o domínio de desenvolvimento que maior número de categorias de análise apresentou foi o domínio cognitivo (9 categorias) seguido do domínio físico (5 categorias), do domínio linguístico (4 categorias) e, por fim, do domínio psicossocial (3 categorias). Já no que se refere à quantidade de evidências, o domínio físico destaca-se (595 evidências). Com uma quantidade semelhante de evidências surge o domínio psicossocial (351) e o domínio cognitivo (334). O domínio linguístico apresenta 143 evidências.

Análise crítica dos resultados

A análise destes dados mostraque, os estudantes, na sua revisão de literatura, definem o conceito de desenvolvimento humanocomo um processo complexo que resulta de vários fatores (biológicos, psicológicos, sociais e culturais) e que leva a mudanças no pensamento, no comportamento e na estrutura dos indivíduos (TAVARES et al., 2007). O desenvolvimento não pode ser interpretado como um conjunto de dimensões estanques, fragmentadas, e sem relação entre si. No entanto, de acordo com os dados levantados, esta característica integral do desenvolvimento não foi igualmente valorizada pelos estudantes, um dado que nos faz questionar a

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indiciar uma rudimentar compreensão por parte dos estudantes de que qualquer conquista da criança num domínio acaba por ter implicações em todos os outros. A criança desenvolve-se como pessoa “total” e a fragmentação da ação educativa não tem sentido nestas idades. Gabriela Portugal (2000, p. 96) reforça essa ideia quando afirma que

Importa não cair na armadilha de pensar que se pode estimular o desenvolvimento cognitivo sem trabalhar simultaneamente o desenvolvimento físico, emocional e social. O desenvolvimento e a aprendizagem da criança pequena efectua-se holis-ticamente e não de uma forma espartilhada em conteúdos ou áreas.

Apesar de a ação educativa não ter sentido ser vivenciada de forma espartilhada, faz sentido que o educador conheça em profundidade cada um desses domínios de forma a desenvolver um trabalho mais consciente e intencional, responsivo às carac-terísticas das crianças nestas idades. A este nível, os dados revelam que a seleção de informação realizada pelos estudantes nos seus trabalhos de pesquisa é desigual entre os diferentes domínios do desenvolvimento da criança. Os valores encontrados apontam para a existência de uma maior preocupação por parte dos estudantes em descrever o desenvolvimento físico-motor comparativamente aos outros domínios. Este fato poderá resultar do desenvolvimento físico-motor ser um domínio com características fáceis de identificar (PORTUGAL, 1998; 2009). Das várias leituras realizadas pelos estudantes, a apropriação que os mesmos fazem do conhecimento e que colocam em evidência no trabalho de revisão de literatura analisado, mostra claramente essa hipervalorização do domínio físico. São dados que nos chamam à atenção para uma reflexão sobre o conhecimento que os estudantes parecem ter sobre as especificidades do desenvolvimento.Questionamos de que forma esta maior ênfase dada ao desenvolvimento físico-motor terá implicações diretas/reflexos na ação educativa que é desenvolvida por estes estudantes em contexto de creche. O mesmo acontece com a dissociação realizada pelos estudantes do desenvolvimento da linguagem do domínio cognitivo. Nos trabalhos apresentados surge a caracteri-zação do desenvolvimento da linguagem equiparada a qualquer dos outros domínios. Questionamos o entendimento dos estudantes sobre a interligação aqui existente.

Como refere Portugal (2009, p.8), “compreender o que é que pode causar ou afetar o desenvolvimento é uma questão com indubitável interesse teórico mas, sobretudo, com inegáveis implicações práticas”. Para nós é desconhecido neste momento se esta diferente valorização dos domínios tem implicações diretas na planificação e na avaliação que esses estudantes realizam em contexto de creche. Será que esta valorização do domínio físico se revela, também, nas planificações realizadas? Será que a avaliação traduz de forma idêntica os diferentes domínios do desenvolvimento? Haverá uma correspondência unívoca?

Torna-se interessante verificar que o segundo domínio mais valorizado, com mais evidências, é o domínio psicossocial. Os estudantes colocaram a tônica nas carac-terísticas de comunicação interpessoal e de manifestação de emoções o que nos dá indicação de que os estudantes reconheceram estas características como as mais importantes neste domínio e, nesse sentido, talvez estejam mais disponíveis para a

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Associado ao reconhecimento dos ritmos individuais no processo de desenvolvimento (algo também valorizado pelos estudantes), a disponibilidade para a relação por parte do adulto é essencial. Conforme Post e Hohmann (2003, p. 12), as interações autên-ticas com as crianças “proporcionam o “combustível” emocional de que os bebés e as crianças precisam para desvendar os mistérios com que se deparam no seu mundo social e físico”. Como refere Portugal (2011, p. 49), “é a natureza e a qualidade das interacções (entre bebê e o educador, entre os profissionais da creche e entre os profis-sionais e as famílias) que distingue os programas de elevada qualidade”.

Considerações finais

A análise dos trabalhos de revisão de literatura elaborados pelos estudantes da formação inicial de educadores de infância permitiu-nos “olhar de perto” para os saberes que os mesmos revelaram possuir sobre o desenvolvimento das crianças entre os zero e os 3 anos. Este “olhar” parece-nos essencial face à importância deste conhecimento na promoção de ambientes educativos facilitadores do desenvolvimento humano. Com este estudo é-nos possível sistematizar algum conhecimento sobre o desenvolvimento das crianças entre os zero e os três anos, o papel do contexto de creche e dos educadores de infância nesse processo, e ainda, deixar alguns pontos para a reflexão relativa à formação destes profissionais.

Analisando o relatório da OCDE, de 20067, Vasconcelos (2011, p. 18032) realça

a recomendação de que é necessário “colocar o bem-estar, o desenvolvimento e a aprendizagem no cerne do trabalho com os primeiros anos”. Neste sentido, e tomando em consideração os resultados deste estudo, não poderemos negar a necessidade que existe dos educadores de infância terem um conhecimento aprofundado sobre o processo de desenvolvimento das crianças nestas idades, ainda mais, quando em Portugal, ainda não existem linhas pedagógicas oficiais, verdadeiramente assumidas pelo governo, para o contexto de creche. Será este conhecimento, por parte dos profissionais, que permitirá a criação de ambientes facilitadores do desenvolvimento holístico da criança. O contexto de creche, enquanto um contexto onde a criança também cresce, assume uma responsabilidade acrescida no processo de desenvolvi-mento pessoal e único da criança. A consciência desta responsabilidade deverá estar presente, e, a reflexão e intervenção dos educadores de infância deverá ser ajustada ao que é ser criança. O que já sabemos sobre o desenvolvimento não nos poderá deixar cair numa visão fragmentária da criança e consequentemente da ação educativa, pelo contrário, o que já sabemos dá-nos a possibilidade de assumirmos uma atitude responsiva e facilitadora do desenvolvimento da pessoa “total” (GONZALEZ-MENA e EYER, 1989, citado por PORTUGAL, 2000). Assim e, acreditando que um dos elementos mais importantes na qualidade da creche são as pessoas que cuidam e educam a criança (PAPALIA et al., 2001) importa investir, também, na qualidade da formação inicial e contínua destes profissionais.

Em Portugal, particularmente, um educador de infância pode trabalhar com crianças entre os quatro meses e os seis anos de idade e, desta forma, a formação 7 OECD. Starting Strong II: Early Childhood Development and Care. Paris: Organização para a Cooperação e

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inicial destes profissionais alarga-se para além dos três primeiros anos de vida do ser humano. Contudo, tanto em Portugal como no Brasil (DAGNONI, 2001; VASCON-CELOS, 2011; DIDONET, 2001) a formação inicial (e contínua) tem carecido de um investimento ao nível da compreensão do que é ser criança entre os zero e os três anos e de uma reflexão sobre o papel dos profissionais de educação. Parece-nos que, pelos resultados e pelaproblematização que fomosfazendo dos mesmos, se torna crucial assumir a necessidade de no ensino superior se valorizar a aprendizagem e a reflexão sobre o desenvolvimento da criança nesta idade por parte dos futuros profissionais. Só a partir de um conhecimento aprofundando do desenvolvimento da criança é que as competências ligadas à planificação, reflexão e intervenção com as crianças se desenvolverão de forma ajustada, respeitando a infância e as suasparticularidades. Só desta forma teremos profissionais capazes de “garantir que as experiências e rotinas diárias da criança lhe confiram segurança emocional e encorajamento, ou seja, as fundações “heart-start” para aprender em casa, na escola e ao longo da vida” (PORTUGAL, 2011, p. 51).

Este estudo, para além de nos deixar motivos para um processo de autorreflexão sobre as nossas práticas enquanto docentes na formação inicial de educadores e educadoras, desperta-nos outras curiosidades que poderão, eventualmente, deflagrar outros projetos investigativos. Seria interessante fazer, por exemplo, um cruzamento entre este conhecimento manifestado pelos estudantes no trabalho de revisão de lite-ratura e as planificações que realizaram para trabalhar com as crianças. Será que na planificação valorizaram as mesmas dimensões do desenvolvimento? Haverá também uma desigualdade? Será que as planificações evidenciam a característica integral do desenvolvimento? De que forma? … Várias questões emergiram ao longo da reflexão em torno destes resultados. Por outro lado, será que as fontes bibliográficas que susten-taram o trabalho influenciaram os estudantes? Será que essas fontes valorizaram diferenciadamente os diferentes domínios do desenvolvimento da criança? Será que reforçam o seu desenvolvimento holístico? Terão os alunos “imitado” no seu trabalho a lógica das suas fontes de informação?... Outras questões, para nós pertinentes. Afiguram-se, assim, novos trilhos investigativos possíveis de serem palmilhados.

Referências

BARBOSA, Maria Carmen Silveira; FOCHI, Paulo Sergio. O desafio da pesquisa com bebês e crianças bem pequenas. In: IX ANPED Sul – Seminário de Pesquisa da Região Sul, 2012. Disponível em http://www.ucs.br/etc/ conferencias/index.php/anpedsul/9anpedsul/paper/viewFile/1234/318, acedido em 16/10/2012.

BÉBE, Maurice. O meu filho dos 12 meses aos três anos. Porto: Porto Editora, 1981.

BOUFFARD, Pierre. A criança até aos 3 anos – como cuidar da criança no dia-a-dia. (4ª edição). Lisboa: Publicações Dom Quixote, 1982.

BRAZELTON, T. Berry. O Grande Livro da Criança – o desenvolvimento emocional e do comportamento durante os primeiros anos. (9ª Edição). Lisboa: Editorial Presença, 2006.

CARVALHO, Maria de Lurdes Dias de. Efeitos de estimulação multi-sensorial no desempenho de

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