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Colaboração premiada versus direito ao silêncio

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Academic year: 2021

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1 UNIJUÍ – UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO

GRANDE DO SUL

JOÃO HENRIQUE KURRLE HANNUSCH

COLABORAÇÃO PREMIADA VERSUS DIREITO AO SILÊNCIO

IJUÍ (RS) 2018

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2 JOÃO HENRIQUE KURRLE HANNUSCH

COLABORAÇÃO PREMIADA VERSUS DIREITO AO SILÊNCIO

Monografia final do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Monografia. UNIJUÍ – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul.

DCJS – Departamento de Ciências Jurídicas e Sociais.

Orientadora: Me. Eloísa Nair de Andrade Argerich

Ijuí(RS) 2018

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4 AGRADECIMENTOS

À minha orientadora Professora Mestre Eloísa Argerich pela dedicação e disponibilidade.

À minha família, em especial a minha mãe Diolinda, minha namorada, que me auxiliaram nesta etapa da minha formação.

A todos que colaboraram de uma maneira ou outra durante a elaboração deste trabalho, minha gratidão.

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“Em determinados períodos da história, as mudanças sociais nos deixam sem marcos de referência – portanto, inseguros e, por consequência, expostos a perigos e submetidos a riscos.”

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RESUMO

Esta monografia tem por objeto o estudo da colaboração premiada, a partir da regulação trazida pela Lei n.º 12.850/2013, e suas consequências no sistema jurídico constitucional dos direitos e garantias fundamentais de liberdade, utilizando-se da metodologia da pesquisa bibliográfica, e do método dedutivo. Para tanto aborda os principais direitos e garantias fundamentais de liberdade assegurados no artigo 5º da Constituição Federal, especialmente o direito ao silêncio do investigado/acusado e as consequências da sua renúncia em troca do prêmio legal oferecido ao colaborador que confessa o crime e delata seus comparsas, indicando os elementos de prova da veracidade das suas declarações. Bem como analisa a eficácia do novel instituto jurídico no enfrentamento e combate ao crime organizado que assola gravemente o país.

Palavras-chave: Colaboração Premiada. Direito Fundamental ao Silêncio. Crime Organizado.

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7 ABSTRACT

This monograph aims to study the award-winning collaboration, based on the regulation introduced by Law no. 12.850 / 2013, and its consequences in the constitutional legal system of fundamental rights and guarantees of freedom, using bibliographical research methodology, and deductive method. To do so, it addresses the main rights and fundamental guarantees of freedom guaranteed in article 5 of the Federal Constitution, especially the right to silence the investigated / accused and the consequences of his resignation in exchange for the legal award offered to the collaborator who confesses the crime and betrays his cronies, indicating the evidence of the veracity of their statements. As well as analyzing the effectiveness of the novel legal institute in confronting and combating organized crime that seriously ravages the country.

Keywords: Award Winning Collaboration. Fundamental Right to Silence. Organized crime.

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8 SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ... 9

1. GARANTIA FUNDAMENTAL DO DIREITO AO SILÊNCIO DO ACUSADO 11 1.1 Conceito e Relevância das garantias fundamentais de liberdade do Estado democrático de direito ... 11

1.2 O direito ao silencio no contexto jurídico brasileiro ... 17

2. A FUNÇÃO DA COLABORAÇÃO PREMIDADA NO COMBATE A CRIMINALIDADE ... 21

2.1 Da colaboração Premiada: Definição e Requisitos para concessão ... 21

2.1.1. Definição da Colaboração Premiada ... 22

2.1.2 Requisitos da Colaboração Premiada ... 25

2.2. Função da Colaboração Premiada no sistema Repressivo ... 26

3 A (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA COLABORAÇÃO PREMIADA VERSUS EFICÁCIA NO COMBATE À CRIMINALIDADE ... 29

3.1 A (In) Constitucionalidade da renúncia do corréu ao direito ao silencio como requisito básico da obtenção do benefício legal ... 29

3.2 A (In)eficácia da Colaboração Premiada na comprovação do crimes e sua respectiva autoria, a partir da análise de decisões proferidas pelos Tribunais ... 33

CONCLUSÃO ... 36

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9 INTRODUÇÃO

A presente monografia tem por objeto o estudo do instituto da colaboração premiada em face das garantias constitucionais do direito penal e direito processual penal, que tem como estratégica a redução de custos e o aumento da eficácia investigativa e elucidativa de infrações penais de grande repercussão social, política e econômica.

No entanto, a garantia constitucional do direito do acusado ao silêncio, que abrange o reconhecimento de não produzir prova contra si mesmo (Nemo tenetur se

detegere), pode ser violada pelo instituto da colaboração premiada , a qual tem como

requisito obrigatório a renúncia do réu ao exercício de um direito fundamental de liberdade.

Contudo, a colaboração ou delação premiada é importante para o processo penal porque possibilita a formação de provas, aumentando a eficiência investigativa e elucidativa de casos que envolvem infrações penais e crimes de responsabilidade.

Seguindo esta linha, ao estudar o instituto jurídico brasileiro da colaboração premiada, com enfoque na sua definição, requisitos, função, adequação constitucional e eficácia, terá como objetivo geral, a pesquisa do tipo exploratória. Sendo que, utilizará o delineamento de coleta de dados em fontes bibliográficas disponíveis em meios físicos e na rede de computadores.

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10 Na sua realização será utilizado o método de abordagem dedutivo, sendo que para melhor compreensão do instituto da colaboração premiada, desenvolve-se este trabalho em três capítulos.

No primeiro capítulo, a abordagem está voltada ao estudo das garantias constitucionais, apontando alguns princípios que pautam o processo penal, especialmente os que asseguram aos presos e acusados o direito ao silêncio.

Já no capítulo subsequente, pretende-se fazer uma análise sobre a função da colaboração premiada no combate à criminalidade para refletir sobre a legitimidade deste instituto. Busca-se, ainda, conhecer o instituto da colaboração premiada, identificando os requisitos para sua concessão, bem como a função da colaboração premiada no sistema repressivo, com intenção de verificar a sua eficácia no combate ao crime organizado.

E, no terceiro capítulo, destaca-se que a colaboração premiada e sua regulamentação a partir da vigência na Lei nº12.850/2013, especialmente os artigos. 4º ao 7º, os quais dispõem sobre o acordo e os benefícios que o investigado obterá em caso de colaborar com a investigação. E, por fim, a discussão sobre a sua aplicabilidade, se pode ser considerada constitucional ou não, bem como se os acordos realizados têm auxiliado no combate à criminalidade.

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1. GARANTIA FUNDAMENTAL DO DIREITO AO SILÊNCIO DO

ACUSADO

A pesquisa tem por objeto o estudo o instituto da colaboração premiada enquanto estratégia de redução de custos e de aumento da eficácia investigativa e elucidativa de infrações penais de grande repercussão social, política e econômica.

Tem-se como propósito inicial verificar se o instituto jurídico da colaboração premiada pode ser aplicado sem que ocorra violação dos direitos e garantias fundamentais de liberdade previstos no artigo 5º da Constituição Federal, especialmente o direito do preso e dos acusados em geral ao silêncio e ao devido processo legal.

É de se destacar que é dever do Estado Democrático de Direito assegurar aos acusados e/ou presos o respeito aos direitos fundamentais e à segurança jurídica.

1.1 Conceito e Relevância das garantias fundamentais de liberdade do Estado democrático de direito

A Lei n. 12.850/13 introduziu de forma mais abrangente no direito penal e processual penal brasileiro o instituto jurídico da colaboração premiada, também denominado na doutrina de delação premiada. Por isso é pertinente a realização de um estudo acerca do impacto do novel instituto sobre o sistema jurídico brasileiro e, especialmente, sobre os direitos e garantias fundamentais de liberdade.

A finalidade mediata do direito do processo penal confunde-se com a do Direito Penal que é a proteção da sociedade, a paz social, a defesa dos interesses jurídicos e a conveniência harmônica das pessoas no território nacional (MIRABETE, 2006, p. 26).

Registra-se que serão objeto de estudo os princípios gerais informadores do processo penal, destacando-se o princípio do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa, do estado de inocência, do nemo tenetur se detegere, que garante o exercício pleno do direito ao silêncio.

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12 No sistema jurídico brasileiro o direito de punir é exclusivo do Estado, ao qual também incumbe o poder-dever de realizar as atividades de persecução penal, ou seja, o poder-dever de agir diante da pratica de um crime na busca da elucidação do caso penal e da responsabilização criminal do autor do fato delituoso.

Nesse sentido, o entendimento de Fernando Capez (2014, p. 41, grifos do autor) é fundamental para compreensão acerca do tema:

O Estado, única entidade dotada de poder soberano, é o titular exclusivo do direito de punir (para alguns, poder-dever de punir). Mesmo no caso da ação penal exclusivamente privada, o Estado somente delega ao ofendido a legitimidade para dar início ao processo, isto é, confere-lhe o jus persequendi in judicio, conservando consigo a exclusividade do jus puniendi.

Na verdade, se está dizendo que o Estado tem o direito de punir o infrator uma vez que tem o dever de proteger a coletividade, sendo sua tarefa pôr fim aos conflitos de interesses, solucionando as lides, “[...] substituindo as partes em litígio, através de seus órgãos jurisdicionais, [...] declarando a vontade do ordenamento jurídico ao caso concreto”, conforma Capez (2014, p. 42).

Por outro lado, o supracitado autor (2014, p. 42), refere que o direito de punir, que o Estado detém, consiste no poder abstrato de aplicar a lei, quando da pratica de um delito. Nesse sentido,

Esse direito de punir (ou poder-dever de punir), titularizado pelo Estado,é genérico e impessoal porque não se dirige especificamente contra esta ou aquela pessoa, mas destina-se à coletividade como um todo. Seria, aliás, de todo inconstitucional a criação de uma regra, unicamente, para autorizar a punição de determinada pessoa. Trata-se, portanto, de um poder abstrato de punir qualquer um que venha a praticar fato definido como infração penal.

Esse poder-dever de agir, no âmbito do direito penal e processual penal, acarreta aos órgãos encarregados da persecução penal, ou seja, polícia judiciária e Ministério Público, a obrigação de buscar na via jurisdicional a aplicação da Lei Penal, com a observância do devido processo legal que assegura aos acusados a proteção dos seus direitos fundamentais.

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13 Deve-se mencionar que a finalidade do processo penal é

[...] propiciar a adequada solução jurisdicional do conflito de interesses entre o Estado-Administração e o infrator, através de uma sequência de atos que compreendam a formulação da acusação, a produção das provas, o exercício da defesa e o julgamento da lide” (CAPEZ, 2014, p. 43).

Portanto, não se pode deixar de ressaltar que sem o processo não há como solucionar o litigio ou caso penal, visto que é nula a pena sem a intervenção da jurisdição. Por isso impende sejam observados os princípios informadores do direto processual constitucional, que asseguram que o acusado tenha à sua disposição algumas garantias consideradas fundamentais para sua defesa.

Desta forma abordar-se-á a seguir a garantia constitucional do devido processo legal, imprescindível para a validade do instituto jurídico da colaboração premiada. Contudo, é necessário entender o significado e relevância dos direitos- garantias1 fundamentais de liberdade do Estado democrático de direito para depois adentrar naquelas que informam o processo.

Segundo José Afonso da Silva (2011, p.185) as garantias constitucionais “consistem nas instituições, determinações e procedimentos mediante os quais a própria Constituição tutela a observância ou, em caso de inobservância, a reintegração dos direitos fundamentais[...]”, assegurando ao cidadão não violação dos seus direitos.

Direitos e garantias se interligam. Esse é o de entendimento de Alexandre de Moraes (2014, p. 30) quando refere que

Os direitos e garantias fundamentais consagrados pela Constituição Federal, portanto, não são ilimitados, uma vez que encontram seus limites nos demais direitos igualmente consagrados pela Carta Magna (Princípio da relatividade ou convivência das liberdades públicas).

Não é demais mencionar que os direitos cumprem as seguintes finalidades: defesa e instrumentalização. A primeira, nas palavras de Uadi Lammêgo Bulos (2011,

1 Expressão utilizada por Jose Joaquim Gomes Canotilho em sua obra “Direito Constitucional”, 1992, p. 509.

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14 220, grifos do autor) refere-se aos direitos de defesa que “[...] permitem o ingresso em juízo para proteger bens lesados, proibindo os Poderes Públicos de invadirem esfera privada dos indivíduos”, ou seja, o indivíduo está protegido das investidas arbitrárias do poder estatal. Quanto a segunda, explica que

[...]enquanto direitos instrumentais, consagram princípios informadores de toda ordem jurídica (legalidade, isonomia, devido processo legal, etc.), fornecendo-lhes mecanismos de tutela (mandado de segurança, habeas corpus, ação popular, etc.) (BULOS, 2009, p. 230).

Observa-se que os direitos e garantias não são a mesma coisa, Paulo Bonavides (2017, p.538), explica que “[...] confundir direitos e garantias, de fazer um sinônimo da outra, tem sido reprovado pela boa doutrina, que separa com nitidez os dois institutos, não incidindo em lapso dessa ordem [...]”

Na verdade, direitos significam as disposições declaratórias, ou seja, para Bonavides (2017, 538) “[...]são disposições contidas em normas que atribuem a alguém a titularidade de uma prerrogativa sobre um bem, um valor ou ainda sobre faculdades reconhecidas pela ordem jurídica”.

Enquanto que garantias fundamentais, no entender de André Alencar dos Santos (2017, p. 5, recurso eletrônico) são

[...] normas instrumentais para garantir os direitos declarados. São instrumentos formais (procedimentos, processos ou meios) que a ordem jurídica disponibiliza para os sujeitos do ordenamento jurídico com a finalidade de evitar lesão a o direito declarado ou, havendo lesão, reparar ou minimizar seus efeitos, ou ainda, fazer com que o sujeito de um direito declarado possua a capacidade de exigir dos outros sujeitos e do próprio Estado o respeito a esse direito.

No mesmo sentido são as lições de Dimitri Dimoulis e Leonardo Martins (2014, p. 43, grifos do autor) ao afirmarem que:

As garantias fundamentais correspondem às disposições constitucionais que não enunciam direitos, mas objetivam prevenir e/ou corrigir uma violação de direitos: Tais garantias “são meios

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15 destinados a fazer valer esses direitos” ou “instrumentos a serviço da concretização fática da promessa normativa”.

Em decorrência dessas garantias, pode-se inferir que os princípios constitucionais são considerados como fontes jurídicas e sua violação é mais grave do que violar uma lei infraconstitucional.

Merece destaque, o princípio do devido processo legal previsto na Constituição da República Federativa do Brasil (CF/88), em seu artigo 5º, inciso LIV, o qual estabelece que “ninguém será privado de sua liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal” (BRASIL, 1988) e em decorrência tem-se a ampla defesa e o contraditório.

Cumpre observar que não é apenas no Texto Constitucional que o devido processo legal encontra-se positivado, pois o Pacto de São José da Costa Rica, art. 8, inciso I, assim dispõe:

Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável, por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido anteriormente por lei, na apuração de qualquer acusação penal formulada contra ela, ou para que se determinem seus direitos ou obrigações de natureza civil, trabalhista, fiscal ou de qualquer outra natureza.

Com relação ao devido processo legal, Capez (2014, p. 78), consigna que esse “consiste em assegurar à pessoa o direito de não ser privado de sua liberdade e de seus bens, sem a garantia de um processo desenvolvida na forma que estabelece a lei”. Isso significa que o acusado deve ter acesso à defesa técnica, bem como o direito de ser ouvido na presença do advogado, de ser julgado por um juiz competente, e de permanecer calado, sem colaborar com as investigações, entre outras garantias.

Acerca do princípio do contraditório e da ampla defesa, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem decidido que:

[...] os princípios do contraditório e da ampla defesa, ampliados pela Constituição de 1988, incidem sobre todos os processos, judiciais ou administrativos, não se resumindo a simples direito, da parte, de manifestação e informação no processo, mas também à garantia de

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16 que seus argumentos serão analisados pelo órgão julgador, bem assim o de ser ouvido também em matéria jurídica. Precedentes” (STF, 2 ª T., RE-AgR 492783/RN, rel. Min. Eros Grau, j. 3-6- 2008).

No mesmo sentido, Gilmar Ferreira Mendes (2009, p. 592) afirma que “o contraditório e a ampla defesa não se constituem em meras manifestações das partes em processos judiciais e administrativos, mas, e principalmente uma pretensão à tutela jurídica”.

Ainda sobre o princípio da ampla defesa e contraditório é importante esclarecer que um está ligado ao outro, e nessa ótica relata Nelson Nery Costa (2013, p. 15) aduz que:

O direito de ampla defesa exige a bilateralidade, determinando a existência do contraditório. Entende-se, com propriedade, que o contraditório está inserido dentro da ampla defesa, quase que com ela confundido integralmente, na medida em que uma defesa não pode ser senão contraditória, sendo esta a exteriorização daquela.

Nesse rumo, ensina Rui Portanova (2008, p. 160-161) que “o princípio do contraditório elemento essencial ao processo. Mais do que isto, pode-se dizer que é inerente ao próprio entendimento do que seja processo democrático, pois está implícita a participação do indivíduo na preparação do ato de poder”. Esse entendimento, segundo o referido autor:

[...] assenta-se fundamentos lógico e político. A bilateralidade de ação (e da pretensão) que gera a bilateralidade do processo (e a contradição recíproca) é o fundamento lógico. O sentido de que ninguém pode ser julgado sem ser ouvido é o fundamento político. Sustentado sobre esses dois pilares, o principio dinamiza a dialética processual e vai tocar, como momento argumentativo, todos os atos que preparam o espirito do juiz.

No entendimento de Távora e Alencar (2015, p.56, grifos dos autores) a defesa pode ser subdivida em:

(1) Defesa técnica (defesa processual ou especifica), efetuado por

profissional habilitado; e (2) autodefesa (defesa material ou genérica), realizada pelo próprio imputado. A primeira é sempre obrigatório. A segunda está no âmbito de conveniência do réu, que pode optar por permanecer inerte, invocando inclusive o silêncio. [...]

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17 Dessa forma, verifica-se que ao acusado é assegurada a ampla possibilidade de defesa, seja a técnica ou a autodefesa.

Diante do exposto, à luz do princípio da autodefesa, aos acusados é assegurado o direito ao silencio que tem sido debatido nos Tribunais Superiores, que nada mais é do que o direito de não produzir provas contra si mesmo, de autoincriminar-se.

1.2 O direito ao silencio no contexto jurídico brasileiro

O direito fundamental do acusado ao silencio abrange o reconhecimento da garantia de não ser obrigado a produzir prova contra si mesmo (Nemo tenetur se detegere), ao passo que o instituto da colaboração premiada pressupõe a renúncia do réu ao exercício de um direito fundamental de liberdade.

O direito ao silêncio está consagrado na Constituição Federal de 1988, no art. 5.º, LXIII, in verbis: “o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado” (BRASIL, 1988). Ou seja, o acusado ou indiciado tem o direito de permanecer calado, em qualquer fase procedimental (extrajudicial ou judicial).

Importa, ainda realçar que o direito ao silêncio é uma decorrência da garantia contra a não autoincriminação, isto é, do princípio nemo tenetur se deteger, o qual tem um significado fundamental na persecução penal, pois autoriza o réu a “não produzir provas contra si mesmo”, assegurando-lhe seja aplicado o princípio da presunção de inocência, também denominado de princípio do estado de inocência (MARQUES, 2017).

Depreende-se, portanto, que se o acusado for forçado a falar, o seu depoimento estará eivado de nulidade. Nesse contexto, convém salientar que o texto constitucional e o parágrafo único do artigo 186 do Código de Processo Penal, invalidaram a última parte do artigo 198 do Código de Processo Penal, o qual prevê que: “O silêncio do acusado não importará confissão, mas poderá constituir elemento para a formação do convencimento do juiz” (grifo nosso).

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18 Da mesma forma, o art, 8º, alínea “g”, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José da Costa Rica), assegura ao acusado o direito de ficar calado.

Acerca do direito ao silêncio, pertinente a afirmação de Sérgio Marques (2017, p. 13) que:

[...] O direito ao silêncio é formulado, constitucionalmente, sem qualquer condição ou exceção, de modo que não pode o legislador limitá-lo de qualquer maneira. Assim, como consequência, deve-se reputar não recepcionada a parte final deste artigo, mencionando poder o silêncio do réu “constituir elemento para a formação do convencimento do juiz”. Ora, se a pessoa pode se calar, torna-se de manifesta inconstitucionalidade extrair desse ato alguma consequência negativa.

Todavia, esse direito não é absoluto, visto que o réu tem a liberdade de dispor dele, isto é, o réu pode quebrar este silêncio e manifestar-se, mas isto deve ser por sua livre vontade, sem pressão, condições ou exceções.

Outra questão que merece ser discutida, refere-se à interpretação do “direito ao silêncio”, uma vez que estando previsto no texto constitucional, possibilita sua invocação em casos concretos que envolvem situações tais como no caso da utilização do bafômetro e da realização do exame de DNA.

Interessante colacionar a posição do Supremo Tribunal Federal sobre o direito ao silêncio, exposta em sede de julgamento de Habeas Corpus (HC 99.289, rel. min. Celso de Mello, j. 23-6-2009, 2ª T, DJE de 4-8-2011) decidiu que:

O Estado – que não tem o direito de tratar suspeitos, indiciados ou réus, como se culpados fossem, antes do trânsito em julgado de eventual sentença penal condenatória (RTJ 176/805-806) – também não pode constrangê-los a produzir provas contra si próprios (RTJ 141/512), em face da cláusula que lhes garante, constitucionalmente, a prerrogativa contra a autoincriminação. Aquele que sofre persecução penal instaurada pelo Estado tem, entre outras prerrogativas básicas, (a) o direito de permanecer em silêncio, (b) o direito de não ser compelido a produzir elementos de incriminação contra si próprio nem de ser constrangido a apresentar provas que lhe comprometam a defesa e (c) o direito de se recusar a participar, ativa ou passivamente, de procedimentos probatórios que lhe possam afetar a esfera jurídica, tais como a reprodução simulada (reconstituição) do evento delituoso e o fornecimento de padrões gráficos ou de padrões vocais para efeito de perícia criminal (HC 96.219 MC/SP, rel. min.

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19 Celso de Mello, v.g.). (...) A invocação da prerrogativa contra a autoincriminação, além de inteiramente oponível a qualquer autoridade ou agente do Estado, não legitima, por efeito de sua natureza eminentemente constitucional, a adoção de medidas que afetem ou que restrinjam a esfera jurídica daquele contra quem se instaurou a persecutio criminis nem justifica, por igual motivo, a decretação de sua prisão cautelar. O exercício do direito ao silêncio, que se revela insuscetível de qualquer censura policial e/ou judicial, não pode ser desrespeitado nem desconsiderado pelos órgãos e agentes da persecução penal, porque a prática concreta dessa prerrogativa constitucional – além de não importar em confissão – jamais poderá ser interpretada em prejuízo da defesa (STF, 2011).

Constata-se, assim, que o direito ao silêncio se sobrepõe ao direito de punir do Estado, limitando este, visto que a sua aplicação está assegurada pela força normativa obrigatória da Constituição.

Na mesma direção, são as lições de Mendes (2014, p.595) quando refere a significativa repercussão do direito ao silêncio na ordem jurídica constitucional e penal, como pode ser constatado em julgados do STF, a saber:

[...] No HC 68.929, de 22-10-1991, da relatoria de Celso de Mello, asseverou-se que do direito ao silêncio, constitucionalmente reconhecido, decorre a prerrogativa processual de o acusado negar, ainda que falsamente, a prática da infração. Desse, assim chamado, “direito de mentir” extraiu-se também a conclusão quanto à impossibilidade de se caracterizar a criminalidade da falsa negativa de reconhecimento pelo acusado de suas próprias assinaturas. Na mesma linha, afirmou-se no HC 69.818, de 3-11-1992 (RTJ, 148/213), da relatoria de Sepúlveda Pertence, que, não obstante correto que à validade da “gravação de conversa pessoal entre indiciados presos e autoridades policiais, que os primeiros desconheceriam, não se poderia opor o princípio do sigilo das 791/2051 comunicações telefônicas”, seria invocável, na hipótese, o direito ao silêncio (art. 5º, LXIII), corolário do princípio nemo tenetur se detegere, “o qual, entretanto, não aproveita a terceiros, objeto da delação de corréus...”. O Supremo Tribunal Federal afirmou também o direito ao silêncio no HC 75.616, da relatoria do Ministro Ilmar Galvão, de 6-10-1997, que acabou por não ter relevância in casu, tendo em vista que a condenação não se assentara na confissão do acusado. Entendeu-se, posteriormente, que o direito de permanecer em silêncio configurava fundamento para excluir a condenação, por desobediência, em razão de recusa de fornecer autógrafo para servir de padrão para perícias.

Deve-se ainda mencionar que o direito ao silencio nas Comissões Parlamenteares de Inquérito, também, tem orientação da Corte Suprema do Brasil,

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20 sendo que acentuam que é uma escolha do depoente optar em falar ou não sobre os fatos que em tese o incriminam, em virtude da autodefesa e da impossibilidade constitucional da obrigação de autoincriminação. Nessa perspectiva a orientação jurisprudencial, conforme Mendes (2014, p. 597):

[...] o direito ao silêncio em relação a fatos que possam constituir autoincriminação tem aplicação à situação dos depoentes nas Comissões Parlamentares de Inquérito, entendendo-se que a sua invocação não pode dar ensejo a ameaça ou a decretação de prisão por parte da autoridade do Estado. Também aqui há de se aplicar o entendimento quanto à escolha de uma posição por parte do depoente. Se ele optar por uma intervenção ativa, inicialmente, não poderá invocar o direito ao silêncio para se eximir de responder a questões similares ou conexas com as que tenha respondido.

Infere-se, assim que o direito ao silêncio tem sido assegurado ao longo dos anos e que de forma alguma pode ser utilizado em desfavor do acusado, pois conforme Celso de Mello (STF, HC 99.289, 2011 “[...] O exercício do direito ao silêncio, que se revela insuscetível de qualquer censura policial e/ou judicial, não pode ser desrespeitado nem desconsiderado pelos órgãos e agentes da persecução penal,[...]”.

Registra-se que na colaboração premiada, em prol do combate à criminalidade organizada, os presos ou acusados estão se autoincrimando, produzindo provas contra si mesmo e isso se contrapõe ao direito ao silêncio.

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21 2. A FUNÇÃO DA COLABORAÇÃO PREMIDADA NO COMBATE A CRIMINALIDADE

A legitimidade do instituto da colaboração premiada no sistema jurídico brasileiro é avaliada a partir da análise da sua eficácia no combate à criminalidade. No presente capítulo, portanto, pretende-se abordar a sua definição, requisitos legais de validade, bem como a função que exerce na repressão e combate ao crime organizado.

A colaboração premiada, em que pese reconhecida como instituto de direito processual penal produz efeitos no direito material (PEREIRA, 2016). No entanto, seu regramento legal não se encontra no Código de Processo Penal, nem tampouco no Código Penal (CAPEZ, 2014).

O regramento da colaboração premiada é previsto na Lei dos Crimes Hediondos (Lei n.º 8.072/90), na Lei de Proteção a testemunhas (Lei n.º 9.807/99), na Lei de Drogas (Lei n.º 11.343/2006) e na Lei do Crime Organizado (Lei n.º 12.850/2013), sendo que está última traz os requisitos para a sua validade, bem como o procedimento a ser adotado na obtenção da prova.

2.1 Da colaboração Premiada: Definição e Requisitos para concessão

Convém enfatizar que a colaboração premiada passou a ser um mecanismo de combate à criminalidade que envolve grandes empresas, políticos e servidores públicos, mediante o desmantelamento dos grupos organizados com a finalidade de lesar o erário público. Aponta-se que a colaboração premiada não é uma novidade trazida pelo ordenamento jurídico brasileiro, visto que foi:

Amplamente utilizada nos EUA (plea bargain) durante o período que marcou o acirramento do combate ao crime organizado e adotada com grande êxito na Itália (pattegiamento) em prol do desmantelamento da máfia, a delação premiada consiste, em termos gerais, na possibilidade concedida ao participante e ou associado de ato criminoso ter sua pena reduzida ou até mesmo extinta, mediante a denúncia de seus comparsas às autoridades, doravante permitindo o desmantelamento do bando ou quadrilha, ou ainda facilitando a libertação do

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22 seqüestrado, possível no caso do crime de extorsão mediante seqüestro cometido em concurso de agentes (BOLDT, 2018, sic).

Registra-se que imprescindível entender o significado da colaboração premiada, bem como os requisitos necessários para a sua aplicação e assim complementar este estudo.

2.1.1. Definição da Colaboração Premiada

A ineficiência do aparato repressivo do Estado no combate à criminalidade, especialmente no âmbito do crime organizado, gera um sentimento coletivo de insegurança e impunidade.

O crime organizado pressupõe o envolvimento na atuação ilícita de políticos e servidores públicos, e uma corrupção no sistema público de persecução penal. Nesse contexto, o modelo tradicional de investigação criminal se mostrou ultrapassado e ineficaz, exigindo uma adequação nos mecanismos de investigação criminal.

Daí, o surgimento, principalmente a partir dos anos 90, de legislações que buscam equilibrar as forças sociais, porquanto diante do crime organizado o Estado passou a ser o hipossuficiente, seja aspecto das tecnologias utilizadas na perpetuação do crime frente às tecnologias disponíveis ao aparato repressivo do Estado, seja pela corrosão dos órgãos públicos encarregados da investigação e repressão penal.

A Lei n.º 12.850/2013 trouxe no parágrafo primeiro do seu artigo primeiro o conceito de organização criminosa, in verbis:

§ 1º Considera-se organização criminosa a associação de 4 (quatro) ou mais pessoas estruturalmente ordenada e caracterizada pela divisão de tarefas, ainda que informalmente, com objetivo de obter, direta ou indiretamente, vantagem de qualquer natureza, mediante a prática de infrações penais cujas penas máximas sejam superiores a 4 (quatro) anos, ou que sejam de caráter transnacional.

Em razão das características básicas das organizações criminosas, é possível perceber a dificuldade que o sistema jurídico brasileiro na sua estrutura básica de

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23 investigação criminal encontraria se não fossem adotados institutos jurídicos aptos a enfrentarem a atuação criminal destas organizações.

Desta forma, se faz necessário compreender o significado social, político e jurídico da colaboração premiada para demonstrar a sua importância no âmbito da sociedade civil e, ao mesmo tempo, a utilização deste instituto para a solução de alguns casos em que não se conseguiriam por outro meio lícito, provas aptas para desvendar os crimes de corrupção, lavagem de dinheiro, tráfico de influência no serviço público, entre outros que se inserem no conceito de crime organizado.

Nesse contexto, o modelo tradicional de investigação criminal se mostra ultrapassado e ineficiente, exigindo uma adequação nos mecanismos de investigação. Daí o surgimento, a partir dos anos 90 (noventa) de legislações que buscam equilibrar as forças sociais, porquanto diante das organizações criminosas o Estado passou a ser o hipossuficiente, seja no aspecto das tecnologias utilizadas na perpetuação do crime, seja na corrosão dos órgãos públicos encarregados da investigação criminal. Surgem, então, leis autorizadoras de violações de direitos fundamentais de liberdade em prol da garantia do direito social de segurança pública, tais como as leis que regulamentam as interceptações telefônicas, quebra de sigilo telemático, quebra de sigilo bancário, colaboração premiada, agente infiltrado, entre outras.

Todavia, estes instrumentos da investigação criminal não tem sido bem aceitos por vários doutrinadores, entre eles Alberto Silva Franco (1992, p. 221) afirma que a delação premiada, pelo aspecto social, nada mais é “[...]do que um instrumento de desintegração social, a delação – e, por conseguinte, a traição – é, sob a perspectiva da ética, um desvalor, contrário em sua essência à concepção de vida moral fundada na dignidade da pessoa humana.”

E ao referir-se ao prêmio que é ofertado ao “alcaguete” quando ele colabora com a justiça delatando seus companheiros, afirma que aquele que delata está tratando de “salvar a sua pele”, e assevera que dele:

[...] não se exige nenhuma postura moral, mas antes, uma atitude eticamente condenável. Na equação “custo-benefício”, só se

(24)

24 valora as vantagens que possam advir para o Estado com a cessação da atividade criminosa ou com a captura de outros delinquentes, e não se atribui relevância alguma aos reflexos que o custo possa representar a todo o sistema legal enquanto construído com base na dignidade da pessoa humana (FRANCO, 1992, p. 21).

No entanto, pelo aspecto político pode-se afirmar que delação premiada visa a dar respostas à sociedade que está decepcionada com as instituições jurídicas e com o Poder Legislativo do país. Por isso vê com “bons olhos” e esperança o fato de a delação desmascarar criminosos, antes jamais investigados pela Polícia Federal e Ministério Público Federal, processados e julgados pela Justiça Federal.

Convém enfatizar que a colaboração premida passou a ser um mecanismo de combate à criminalidade que envolve grandes empresas, políticos e servidores públicos, mediante o desmantelamento dos grupos organizados com a finalidade de lesar o erário público. Convém frisar que a colaboração premiada, como referido não é uma novidade trazida pelo ordenamento jurídico brasileiro, visto que foi

Amplamente utilizada nos EUA (plea bargain) durante o período que marcou o acirramento do combate ao crime organizado e adotada com grande êxito na Itália (pattegiamento) em prol do desmantelamento da máfia, a delação premiada consiste, em termos gerais, na possibilidade concedida ao participante e ou associado de ato criminoso ter sua pena reduzida ou até mesmo extinta, mediante a denúncia de seus comparsas às autoridades, doravante permitindo o desmantelamento do bando ou quadrilha, ou ainda facilitando a libertação do seqüestrado, possível no caso do crime de extorsão mediante seqüestro cometido em concurso de agentes (BOLDT, 2018, sic).

Por último, registra-se que sob o viés da definição jurídica pode ser entendida como um direito premial, uma vez que o Estado concede ao delator a possibilidade de auxiliar na persecução penal, delatando seus “parceiros” como um modo de diminuição da pena. (MASSON, 2014).

Michelle Barbosa de Brito (2017, p.71), assevera que em relação ao sujeito delator “[...] a delação premida é um meio de prova, na medida em que se presta a levar ao processo informações que contribuíram para a formação da convicção do juiz sobre o caso e sobre a conduta delituosa do delatado.” Ou seja, a colaboração premiada

(25)

25 contribui muito para a elucidação do caso e, consequentemente, auxilia na formação da convicção do julgador.

Ainda, cabe ressaltar que a colaboração ou delação premiada tem contribuído com as investigações que envolvem todos crimes, sejam tipificados no Código Penal ou em leis especiais, tais como a Lei n.º 9.807/99 e 12.850/13.

Andrey Borges de Mendonça (2018, p.1) refere que em determinados tipos de criminalidade é muito mais difícil obter provas, pois “[...] não há testemunhas presenciais e as únicas pessoas que podem fornecer informações são os próprios envolvidos”. Assim, a colaboração premiada surge “[...]como instrumento que permite o enfrentamento eficaz destas novas formas de criminalidade, visando permitir uma persecução penal eficiente e, sobretudo, melhorar a qualidade do material probatório produzido”.

Todavia, é preciso que a utilização dos institutos jurídicos que relativizam os direitos e garantias fundamentais do cidadão seja feita com base no princípio da proporcionalidade.

2.1.2 Requisitos da Colaboração Premiada

Os requisitos legais da colaboração premiada estão previstos no artigo 4º da Lei n.º 12.850/2013 e podem ser sintetizados como a voluntariedade da delação e a relevância da informação trazida pelo delator/colaborador para a investigação e obtenção de um ou mais resultados previstos nos incisos I a V do artigo 4º da referida Lei.

No que se refere à voluntariedade da delação, cumpre registrar a observação feita por Solange Lima Lira (2017, p.5), in verbis: “... a delação premiada e o direito ao silêncio são direitos facultativos, uma vez que o agente usa conforme seu próprio arbítrio”. Ou seja, a voluntariedade pressupõe ausência de imposição e de coerção do colaborador/delator.

(26)

26 A relevância da informação trazida pelo delator/colaborador deverá ser analisada no caso concreto para que o prêmio ajustado possa ser concedido pelo Juiz, ou seja, as declarações do colaborador devem ser úteis e necessárias para que reste configurada uma ou mais das hipóteses previstas nos incisos I a V do artigo 4º da Lei n.º 12.850/2013.

2.2. Função da Colaboração Premiada no sistema Repressivo

A colaboração premiada tem como função auxiliar os agentes públicos encarregados da atividade de persecução penal do Estado na descoberta e/ou elucidação de crimes que dificilmente seriam descobertos e/ou desarticulados por outro meio. Ou seja, tem a função de diminuir a impunidade desses criminosos denominados de “criminosos de colarinho branco”, possibilitando que a Justiça condene as pessoas que cometeram esses crimes.

A elucidação do crime organizado, por meio da colaboração premiada, como por exemplo a lavagem de dinheiro, assegura ao novel instituto jurídico uma aceitação e aprovação da sociedade, pois viabiliza a condenação do criminoso. Assim, a sociedade passa a reconhecer no sistema judiciário brasileiro uma força maior do que a daqueles que agem como se estivessem acima da justiça.

Porém, se a colaboração premiada tem se mostrado como um instrumento eficaz na elucidação de crimes e isso é positivo, existe também o lado negativo, o qual advêm da violação da ética processual e da quebra de direitos e garantias fundamentais de liberdade e “[...] a situação parece ainda mais grave, na medida em que faz parte do próprio discurso oficial a suposta tutela de interesses do delator, de modo a facilmente convencê-lo de que confessar e colaborar com as investigações é o melhor “negócio”, (BRITTO, 2017, p.45).

Seguindo essa linha de raciocínio, a autora Michelle Barbosa de Brito (2017, p.45) afirma que “[...] instrumentos jurídicos eficazes no combate à criminalidade, como a delação premiada, ainda que se revelem de caráter inquisitório, são amplamente aceitos e

(27)

27 acriticamente aplicados no direito brasileiro, em total falta de comprometimento com os princípios constitucionais.”

Por outro viés a colaboração premiada é uma “ferramenta jurídica” importante para as autoridades que estão investigando determinado crime, para que os mesmos possam vir a ser solucionados. Além disso, o delator, tem a possibilidade de ter algum benefício/” prêmio”, por ter narrado/delatado o fato criminoso que ocorreu ou que está ocorrendo. Claro, que essas informações tem de ser verídicas para que sejam validadas e usadas no Inquérito policial e/ou na denúncia do Ministério Público.

Ou seja, no processo judicial quando o Ministério Público e/ou Delegado de Polícia ofertam ao pretenso delator/acusado a oportunidade de realizar a colaboração premiada a expectativa é de que o réu além de confessar a participação na prática delitiva também traga informações acerca da outros coautores e partícipes do crime, além de indicar elementos de prova das suas alegações. Segundo Capez (2014, p. 473), a colaboração premiada “Consiste na afirmativa feita por um acusado, ao ser interrogado em juízo ou ouvido na polícia. Além de confessar a autoria de um fato criminoso, igualmente atribui a um terceiro a participação como seu comparsa”.

Seguindo essa linha de pensamento, podemos dizer que “[...] a delação não se confunde com a confissão. Confessar significa admitir a autoria ou a participação em crime. É o ato pelo qual o imputado “opta” por declarar-se autor ou partícipe do delito, assumindo a responsabilidade pelo ato” (BRITO 2017, p.54).

Outrossim, para que a colaboração premiada seja válida, o réu em sua narratória, deverá confessar suas ações e revelar a identidade dos demais coautores ou participantes do delito, demonstrando vontade de colaborar com as investigações. Além, disso para obter o prêmio a informação deverá vir comprovada em elementos de prova ou seja:

“9. A colaboração premiada é aplicável somente quando as informações prestadas pelo acusado primário possuam alguma eficácia para a investigação criminal, contribuindo efetivamente para a identificação dos demais coautores ou partícipes e/ou para recuperação total ou parcial do produto do crime (art. 13 da Lei 9.807/99).” (Trecho do acórdão n. proferido pelo Rel. Leandro Paulsen –Ap,Crim.5007224-61.2015.4.04.7005\PR.

(28)

28 Em outras palavras a colaboração premiada só garantirá a obtenção do benefício legal da redução da pena, por exemplo, se as informações prestadas pelo delator forem relevantes e imprescindíveis para o esclarecimento do caso penal e/ou para o desmantelamento da organização criminosa.

(29)

29 3 A (IN) CONSTITUCIONALIDADE DA COLABORAÇÃO PREMIADA VERSUS EFICÁCIA NO COMBATE À CRIMINALIDADE

A colaboração premiada passou a fazer parte da legislação penal com a finalidade de possibilitar que o Estado-jurisdição pudesse ter resultados mais eficazes, em relação a delitos que segundo nosso ordenamento penal são considerados graves, como os o art. 8.º, parágrafo único da Lei n.º 8.072/90, do art. 6.º da Lei n.º 9.034/95, do § 5.º do art. 1.º da Lei n.º 9.613/98, do art. 14 da Lei n.º 9.807/99 e dos §§ 2.º e 3.º do art. 32 da Lei n.º 10.409/2002 que permitem a utilização do instituto e tem sido muito utilizada no âmbito processual.

A colaboração premiada, com o advento da Lei n.º 12.850/2013, sobre o crime organizado, teve uma disciplina legal mais completa do que nos ordenamento jurídicos anteriores, visto os artigos. 4º ao 7º dispõe sobre os requisitos para a validade do acordo e os benefícios que o investigado obterá em caso de colaborar com a investigação e o procedimento a ser adotado para a formalização do acordo.

Todavia, discute-se se a sua aplicabilidade pode ser considerada constitucional ou não e se os acordos realizados tem auxiliado para o combate à criminalidade.

3.1 A (In) Constitucionalidade da renúncia do corréu ao direito ao silencio como requisito básico da obtenção do benefício legal

A obtenção de provas por meio da colaboração premiada tem sido objeto de ampla discussão doutrinária acerca da (in)constitucionalidade, ou seja, se os direitos e garantias fundamentais de liberdade estão sendo violados em decorrência da aplicação do instituto jurídico.

Priscila Carine de Jesus Santos, Paulo Afonso Ribeiro Daher Junior e outros (2018) a partir de uma reflexão crítica com relação ao art. 4º da Lei n.º 12.850/13, afirmam que há

“[...] inúmeras irregularidades na formulação dos acordos de delação que compõem a lei, isso porque os dispositivos preveem a renúncia

(30)

30 aos direitos e garantias constitucionais, [...]. Assinalam que o parágrafo 14, do referido artigo refere que: “nos depoimentos que prestar, o colaborador renunciará, na presença de seu defensor, ao direito ao silêncio e estará sujeito ao compromisso de dizer a verdade” (BRASIL, 2013)”.

A primeira vista parece que esse artigo viola a Constituição Federal e o Pacto de São José da Costa Rica, visto que exige que o colaborador renuncie a um direito fundamental que é o direito ao silencio e da não auto incriminação. Ou seja o direito ao silêncio “[...] permite ao acusado o direito em permanecer em silencio e não produzir provas contra si mesmo, para que não dê ensejo a uma autoincriminação” e assim, não lhe prejudique em outras fases processuais (SANTOS; DAHER JUNIOR, 2018).

A colaboração premiada criada com a finalidade de ser um instrumento hábil e eficaz no combate à criminalidade, pode, nos termos do art. 4º da Lei n.º 12.850/2013, ser negociada sem a presença do Juiz, ou seja, basta para a realização do acordo apenas a presença do colaborador, do seu advogado, do delegado de polícia e/ou do Ministério Público.

Diante da ineficácia dos meios tradicionais para extrair a confissão do investigado, bem como da ilicitude da prova colhida com violação do direito constitucional ao silêncio, a colaboração premiada surge como uma técnica especial de investigação, tendo como “[...] objetivo primordial dos órgãos responsáveis pela investigação e condução do processo” (SANTOS; DAHER JUNIOR, 2018).

Neste cenário, Santos e Daher Junior, (2018, p.13) asseguram que:

[...] Para isto, utilizam de toda as manobras que estiverem a sua disposição para obtê-la, obrigando indiretamente o investigado a confessar e prestar informações que sejam interessantes às investigações, sob o pretexto de colaborar com a Justiça.

Nesse contexto, passa-se a questionar se, sob o pretexto de oferecer uma vantagem ou prêmio ao suspeito, não se estaria praticando um violência psicológica contra ele, com a finalidade de obter informações que, de outro modo, dificilmente seriam licitamente obtidas. Isso pode ser agravado nos casos em que a negociação se dá com um suspeito e/ou investigado preso cautelarmente.

(31)

31 Cezar Roberto Bitencourt (2014) ao referir-se sobre a delação premiada na “lava jato” afirma que:

[...] prende-se para desgastar, subjugar, ameaçar e forçar a “colaboração premiada! Aliás, a própria autoridade repressora reconhece, oficialmente, em seu parecer, que esse é o objetivo maior das prisões e tem sido exitoso: arrancar a confissão e forçar a “delação! Retornamos à Idade Média, quando às ordálias e a tortura também tinham objetivo de arrancar a confissão, e também eram cem por cento exitosas! Só falta a tortura fisicamente, por que psicologicamente já está correndo!

Ou seja, nas considerações do referido o autor há uma volta ao sistema inquisitivo, violando as garantias constitucionais, entre elas, o direito ao silêncio e a presunção da inocência. Neste aspecto a colaboração premiada apresenta-se como um instituto eivado de inconstitucionalidade ao permitir que o investigado renuncie ao seu direito fundamental ao silêncio e de não produzir provas contra si mesmo.

Importa reconhecer que ao produzir provas contra si mesmo, como resultado de um acordo de colaboração premiada, o investigado está renunciando a um direito fundamental, em que pese uma das características básicas dos direitos fundamentais seja a irrenunciabilidade. Desta forma, segundo Bitencourt (2014) o instituto da colaboração premiada é inconstitucional, porque para receber os benefícios do instituto, ele abre mão dos seus direitos, atribuindo a si mesmo uma conduta criminosa e delatando terceiros.

Para Aury Lopes Júnior (2015) a colaboração premiada tem como requisito a voluntariedade da confissão, todavia se o acordo “[...] é firmado sob coação fere a autonomia da vontade, além de violar garantias fundamentais como o direito ao silencio”.

Para Santos e Daher Júnior (2018) sempre que o investigado é pressionado para proceder a confissão e aceitar o acordo, se está diante de uma arbitrariedade dos órgãos encarregados da investigação, que invalida a colaboração premiada por violar a Constituição.

(32)

32 Verifica-se que a maioria dos doutrinadores, entre eles Brito (2017) alegam que a utilização da colaboração premiada ofende a garantia do direito ao silêncio e da não autoincriminação, uma vez que o contexto jurídico induz o réu admitir a sua culpa, delatar coautores e negociar a sua pena, como “moeda de troca”. Tudo isso porque o delator se encontra em posição desvantajosa diante do acusador e, nesse sentido Rossetto (apud BRITO, 2017, p.59) destaca que

[...] o acusado, por vezes, não tendo como se defender diretamente dos fatos que lhe acusam, acaba não só por confessar, mas também por irrogar a terceiros a participação no crime, como forma de atenuar sua situação ou mesmo na esperança de se livrar da inculpação.

Assim, a colaboração premiada tem sido vista como um instituto inquisitorial, no qual as garantias penais e processuais não são respeitadas, e nesse sentido Luigi Ferrajoli (2010, p.561) ressalta que, “[...] há ausência de nexo retributivo entre pena e delito, já que a medida da pena será fixada conforme a conduta processual do réu e não com base na gravidade do crime”.

Além disso, segundo Ferrajoli (2010, p.561) “[...] a prática da negociação e do escambo entre confissão e delação de um lado e impunidade ou redução de pena de outro sempre foi um tentação recorrente da história do direito penal, seja de legislação e mais ainda da jurisdição[...]”.

Cabe ainda mencionar que a colaboração premiada tem sido utilizada como uma política criminal que busca dar resposta a sociedade no que diz respeito à segurança pública, justificando-se a utilização do instituto como controle penal e um meio de garantir o êxito das investigações criminais, especialmente nos crimes praticados por organizações criminosas. Ou seja, no dizer de Brito (2017, p.86) “Em matéria de delação premiada, sob o pálio da eficiência, a decisão penal busca o maior benefício ao menor custo, ou seja, a mais rápida resposta penal ao menor esforço investigativo” [...].

Portanto parece que a questão fundamental está em verificar se há proporcionalidade entre os aspectos negativos da colaboração premiada frente direito constitucional brasileiro e os aspectos positivos decorrentes de sua eficácia no combate à criminalidade.

(33)

33 3.2 A (In)eficácia da Colaboração Premiada na comprovação do crimes e sua respectiva autoria, a partir da análise de decisões proferidas pelos Tribunais

A colaboração premiada, na atualidade, constitui-se como parte de uma nova política criminal adotada pelo Estado brasileiro, considerando-se uma justiça negocial, em razão da Lei n.º 12.850/13, e vem se consolidando com decisões dos Tribunais Superiores. Ficou conhecida pela sociedade com o surgimento da Operação Lava Jato, na qual foram realizados acordos com grandes empresários do ramo da construção civil.

Para melhor compreender o instituto e verificar a sua eficácia, colaciona-se a seguir algumas decisões relativas a delação/colaboração premiada e a sua aplicação no âmbito do processo penal como causa de diminuição de pena e resolução do crime/delito. A primeira a ser analisada refere-se ao julgamento do HC 99736/DF, em 27 de Abril de 2010, sob a relatoria do Ministro Ayres Britto, in verbis:

HABEAS CORPUS. SENTENÇA CONDENATÓRIA. DELAÇÃO PREMIADA. CAUSA ESPECIAL DE DIMINUIÇÃO DE PENA RECONHECIDA PELO JUÍZO. PERCENTUAL DE REDUÇÃO. FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA.

[...] 3. Na concreta situação dos autos, o magistrado não examinou o relevo da colaboração do paciente com a investigação policial e com o equacionamento jurídico do processo-crime. Exame, esse, que se faz necessário para determinar o percentual de redução da reprimenda. Noutros termos: apesar da extrema gravidade da conduta protagonizada pelo acionante, o fato é que as instâncias ordinárias não se valeram de tais fundamentos para embasar a escolha do percentual de 1/3 de redução da pena. 4. A partir do momento em que o Direito admite a figura da delação premiada (art. 14 da Lei 9.807/99) como causa de diminuição de pena e como forma de buscar a eficácia do processo criminal, reconhece que o delator assume uma postura sobremodo incomum: afastar-se do próprio instinto de conservação ou autoacobertamento, tanto individual quanto familiar, sujeito que fica a retaliações de toda ordem. Daí porque, ao negar ao delator o exame do grau da relevância de sua colaboração ou mesmo criar outros injustificados embaraços para lhe sonegar a sanção premial da causa de diminuição da pena, o Estado-juiz assume perante ele conduta desleal.[...]. 5. Ordem parcialmente concedida para o fim de determinar que o Juízo processante aplique esse ou aquele percentual de redução, mas de forma fundamentada.

(34)

34 (STF - HC: 99736 DF, Relator: Min. AYRES BRITTO, Data de Julgamento: 27/04/2010, Primeira Turma, Data de Publicação: DJe-091 DIVULG 20-05-2010 PUBLIC 21-05-2010 EMENT VOL-02402-04 PP-00849).

Constata-se que, nesse julgamento o objetivo foi utilizar a delação/colaboração premiada como causa da diminuição da pena e demonstrar que o delator assume um papel fundamental para elucidar crimes que sem a sua colaboração não teria resultado positivo, no entanto no juízo de primeiro grau “[...] o magistrado não examinou o relevo da colaboração do paciente com a investigação policial e com o equacionamento jurídico do processo-crime” (STF, 2010).

Evidencia-se, portanto que houve violação do direito do delator, pois não lhe foi concedido pelo magistrado de primeiro grau o prêmio por suas informações. Tendo no entanto, ferido as garantias do devido processo legal do delator e assim ocorrendo a (in)constitucionalidade da delação premiada referida.

A seguir analisa-se o Habeas Corpus n.º 90.962/2017, impetrado, em causa própria, por Paulo Sérgio Mendonça Monteiro, que foi condenado com incurso no artigo 12, e art.14, caput, c/c o art. 18, IV, todos da Lei n.º 6.368/1976, que busca a redução da pena por ter colaborado espontaneamente com Justiça, conforme se vê:

EMENTA HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. FIXAÇÃO DA PENA-BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL. INCIDÊNCIA DA ATENUANTE. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA PREVISTA NO ART. 33, § 4º, DA LEI Nº 11.343/2006. REITERAÇÃO DE

PEDIDO. DELAÇÃO PREMIADA. AUSÊNCIA DE

CARACTERIZAÇÃO DO BENEFÍCIO. REVOLVIMENTO DA PROVA. VIA INADEQUADA. IMPOSSIBILIDADE. ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E DENEGADA. 1 - Não há como conhecer pedidos de redução da pena-base, reconhecimento da confissão espontânea, bem como de aplicação da causa especial de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei nº 11.343/2006, pois se tratam de mera reiteração do pedido deduzido no HC nº 88.636/SP. 2. O instituto da delação premiada consiste em ato do acusado que, admitindo a participação no delito, fornece às autoridades informações eficazes, capazes de contribuir para a resolução do crime. Todavia, apesar de o paciente haver confessado sua participação no crime, contando em detalhes toda a atividade criminosa e incriminando seus comparsas não há nenhuma informação nos autos que ateste o uso de tais informações para fundamentar a condenação dos outros envolvidos, pois a materialidade, as autorias e

(35)

35 o desmantelamento do grupo criminoso se deram, principalmente pelas interceptações telefônicas legalmente autorizadas e pelos depoimentos das testemunhas e dos policiais federais. 3. Para se chegar à conclusão pretendida pelo paciente seria necessário o revolvimento aprofundado das provas constantes dos autos, procedimento que, sabidamente, é vedado na estreita via do habeas corpus. 4. Habeas corpus parcialmente conhecido e, nessa extensão, denegado. (HC 90.962/SP).

Segundo o voto do Ministro do Superior Tribunal de Justiça Harold Rodrigues não houve o reconhecimento da confissão espontânea para aplicação de causa especial de diminuição de pena, porque já havia sido reconhecida em outro HC, de relatoria do próprio Ministro.

Verifica-se, portanto, que não foi aproveitado em favor do réu o instituto da colaboração premiada (conhecida como delação premiada em 2007), em que pese ele tenha confessado “[...] em detalhes toda atividade criminosa e incriminando seus comparsas”, sob o argumento de que tais informações não foram utilizadas para fundamentar a condenação dos outros envolvidos.

Diante das decisões dos Tribunais conclui-se que o Estado tem o dever de combater à criminalidade, tornando mais eficaz os instrumentos investigativos mas porem, a negociação com o colaborador não pode de forma alguma ferir os princípios e garantias fundamentais constitucionais que asseguram a liberalidade do réu em escolher se deseja colaborar ou não com as autoridades policiais e ministeriais. Assim, garantido a segurança jurídica para o investigado e da mesma forma para sociedade.

(36)

36 CONCLUSÃO

A presente monografia foi realizada com o objetivo de aprofundar o estudo sobre o instituto jurídico da colaboração premiada, a partir da regulação trazida pela Lei n.º 12.850/2013, que dispõe sobre os mecanismos penais e processuais penais a serem empregados no combate à criminalidade, especialmente ao crime organizado, sua eficácia e seus impactos sobre os direitos e garantias fundamentais de liberdade.

As hipóteses inicialmente levantadas consistiram no reconhecimento de que a colaboração premiada resulta na renúncia do direito constitucional ao silêncio e por consequência na violação do princípio de “Nemo tenetur se detegere”, ou seja, de que o réu não pode ser compelido a produzir prova contra si mesmo, bem como no reconhecimento de que a colaboração premiada tem sido um valioso instrumento na atividade de persecução penal, especialmente para possibilitar a elucidação e punição dos integrantes das organizações criminosas, como ocorre na “operação Lava Jato”.

Ao abordar a temática do primeiro capítulo, no qual foram estudados os direitos e garantias fundamentais de liberdade, especialmente a garantia do devido processo legal, o direito ao contraditório e a ampla defesa e o direito ao silêncio, pode-se constatar que a colaboração premiada pode vir a ser aplicada de forma a violar a voluntariedade prevista como requisito legal no artigo 4º da Lei n.º 12.850/2013. E, por consequência, submeter o investigado à violência psicológica, ofendendo a garantia do devido processo legal e o direito à ampla defesa, com aniquilação do direito ao silêncio.

(37)

37 Ou seja, o Estado estaria retrocedendo ao modelo investigatório inquisitório, no qual as informações do autor do crime são essenciais ao êxito da investigação e da repressão penal.

No segundo capítulo, o objeto do estudo foi a configuração legal da colaboração premiada introduzida no sistema jurídico brasileiro, de forma mais sistemática, pela Lei 12.850/2013. Nesse sentido, buscou-se estabelecer uma definição legal do instituto da colaboração premiada, seus requisitos e a sua relevância no combate à criminalidade, especialmente os crime cometidos por organizações criminosas.

Nesse aspecto, é reconhecido que o modelo tradicional de investigação não é apto pra enfrentar a estrutura econômica e tecnológica das organizações criminosas, sendo necessário relativizar os direitos e garantias fundamentais de liberdade em prol da defesa do direito fundamental social de segurança pública, tal como ocorre com adoção dos institutos jurídicos da interceptação telefônica e de dados, da quebra do sigilo bancário, entre outras introduzidas por legislações infraconstitucionais.

Por último, no terceiro capítulo, foi analisada a posição doutrinária e jurisprudencial acerca do reconhecimento ou não da colaboração premiada como um mecanismo de violação do direito fundamental ao silêncio e do princípio do “nemo tenetur se detegere”, sendo que, na sua maioria, os doutrinadores reconhecem a violação desses direitos pela utilização do instituto da colaboração premiada. Por outro lado, as decisões judiciais tem evidenciado que a colaboração premiada é um mecanismo eficaz como meio de obtenção de prova das circunstâncias do crime organizado e da sua respectiva autoria e que, se for observado o procedimento legal, especialmente no que se refere à voluntariedade da colaboração, não haverá violação aos preceitos constitucionais.

Enfim, é possível afirmar que a colaboração premiada é um instrumento eficaz para a obtenção de provas que incriminam as organizações criminosas, mas a sua validade dependerá da demonstração, no caso concreto, da voluntariedade do colaborador.

(38)

38 REFERÊNCIAS

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CARVALHO, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de. Garantias do contraditório e da ampla defesa. In: CARVALHO, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de. Processo penal

(39)

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