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AVALIAÇÃO DE TIPOLOGIA HABITACIONAL FLEXÍVEL O caso dos conjuntos habitacionais Lagoinha A e Cunha B, no Brasil

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Academic year: 2021

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Michelli Garrido Silvestre y Luiz Reynaldo de Azevedo Cardoso I São Paulo, Brasil

AVALIAÇÃO DE TIPOLOGIA HABITACIONAL FLEXÍVEL

O caso dos conjuntos habitacionais Lagoinha “A” e Cunha “B”, no Brasil

1. Introdução

Cada vez mais o conceito de qualidade vem sendo associado à satisfação do usuário e atendimento às suas necessidades e, nesse sentido, torna-se fundamental a opinião dos moradores na avaliação da qualidade das habitações. Assim, as profundas alterações das características das famílias nas últimas décadas exige uma nova reflexão sobre a utilização dos espaços ao longo do tempo, demandando habitações com espaços em quantidades e dimensões diferenciadas1.

No Brasil, a Avaliação Pós-ocupação (APO) tem sido aplicada desde a década de 60 como mecanismo de retroalimentação de processos de controle de qualidade e de desenvolvimento de projetos habitacionais voltados ao atendimento da população de baixa renda em larga escala. Essas pesquisas têm demonstrado a insatisfação dos usuários com diversos aspectos das edificações, tais como o tamanho da casa, a adequação dos cômodos e a falta de privacidade. Além disso, quase sempre os projetos adotados nestes programas têm tipologias extre-mamente restritivas quanto ao uso2.

A repetição dos problemas ao longo dos anos, no entanto, tem demonstrado que as informações e sugestões de melhorias registradas nestas avaliações não são devidamente consideradas na realização de novos empreendimentos de habitação de interesse social (HIS)3. Dessa

for-ma, a falta de sintonia entre o projeto e as necessidades dos usuários acaba por comprometer a relação ambiente-usuário e, em decorrência, o morador tende naturalmente a modificar o ambiente, adaptando-o à sua proposta4, o que, na maioria dos casos, impacta negativamente

na funcionalidade e na habitabilidade das construções.

Assim, diversos pesquisadores concordam que é necessário desenvolver processos que levem à melhoria do desempenho funcional das ha-bitações visando à satisfação e ao atendimento das necessidades dos moradores. Eles defendem a importância da elaboração de projetos de habitações flexíveis, tanto na ocupação inicial como ao longo de sua utilização, permitindo ampliações e modificações sem danos ao conforto ambiental e à qualidade espacial da habitação.

No entanto, Roméro e Ornstein reconhecem que a fase de projeto não tem sido tratada com a devida importância na construção civil brasi-leira e que há um grande desconhecimento, por parte dos profissionais, do que ocorre no ambiente construído no decorrer do uso, tanto no que se refere ao desempenho físico quanto à satisfação e atendimento às necessidades do usuário5.

1 PALHARES, S. R. (2001). Variantes de modificação em habitação popular: do espaço planejado ao espaço vivido. Dissertação de Mestrado, Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais.

2 BRANDÃO, D. Q. (2011). Disposições técnicas e diretrizes para projeto de habitações sociais evolutivas. Revista Ambiente Construído. Porto Alegre, v. 11, n. 2, p. 73-96. 3 BONATTO, F. S.; MIRON, L. I. G.; FORMOSO, C. T. (2011). Avaliação de empreendimentos habitacionais de interesse social com base na hierarquia de valor percebido pelo usuário. Revista Ambiente Construído. Porto Alegre, v. 11, n. 1, p. 67-83, jan./mar.

4 MARROQUIM, F. M. G.; BARBIRATO, G. M. (2007). Flexibilidade Espacial em Projetos de Habitações de Interesse Social. Anais do IV Congresso Acadêmico da UFAL, Maceió, Universidade Federal de Alagoas.

5 ROMÉRO, M. A.; ORNSTEIN, S. W. (2003). Avaliação Pós Ocupação. Métodos e Técnicas Aplicados à Habitação Social. Porto Alegre: Coleção Habitare/FINEP/ANTAC, v. 1. 293 p.

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Nesse contexto, Bonatto et al. consideram que são necessárias mudanças na cultura e no processo de projeto, sendo que as avaliações pós-ocupação se tornam uma possibilidade para que se possa aprender e retroalimentar futuros projetos6. Assim, verifica-se a necessidade

de se aprofundar os estudos nesse sentido, buscando compreender melhor essa realidade.

Este artigo apresenta parte dos resultados de uma avaliação pós-ocupação realizada em conjuntos habitacionais do Estado de São Paulo, Brasil, no âmbito de uma dissertação de mestrado7. O objetivo deste documento é analisar a implantação de uma tipologia habitacional

ado-tada pelo órgão local de provisão habitacional, a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano do Estado de São Paulo (CDHU), em dois empreendimentos de HIS. Assim, a pesquisa aqui apresentada se justifica pela possibilidade de contribuição para o aprimoramento de normas, manuais e bancos de dados para retroalimentação de projetos de empreendimentos de HIS no Brasil e em outros países. 2. Metodologia da pesquisa

Para a realização desta pesquisa foram selecionados os conjuntos habitacionais Cunha “B” e Lagoinha “A”, ambos promovidos pela CDHU na região do Vale do Paraíba, no leste do Estado de São Paulo, Brasil. Os dois empreendimentos foram construídos em sistema de mutirão e todas as unidades seguem a tipologia TG23A da CDHU, apresentada no capítulo 3.

O estudo foi iniciado com a pesquisa de documentos e projetos referentes aos empreendimentos e com a definição e pré-teste das ferramentas de pesquisa em campo. Em seguida foram realizadas entrevistas com profissionais envolvidos na execução dos empreendimentos e com os usuários dos imóveis, sendo aplicada a técnica de Walkthrough, que consiste em caminhar pelos ambientes na companhia de um morador para avaliá-los técnica e funcionalmente.

Foram avaliadas aquelas casas em que havia moradores dispostos a responder a pesquisa no momento da visita, obtendo-se uma amostra superior a 40% das unidades nos dois empreendimentos.

O Conjunto Habitacional Cunha “B”, localizado no município de Cunha, foi entregue em 2005 e é composto por 21 unidades habitacionais (fig. 1), das quais 10 foram avaliadas e identificadas pelas siglas CNH01 a CNH10.

Já o Conjunto Habitacional Lagoinha “A” está situado no município de Lagoinha e foi entregue em 2002 com 34 unidades habitacionais (fig. 2), sendo que 14 delas foram avaliadas e nomeadas de LGN01 a LGN14.

3. Tipologia habitacional

A CDHU é uma empresa do Governo Estadual vinculada à Secretaria da Habitação que tem a função de executar programas habitacionais voltados à população com renda entre 1 e 10 salários mínimos em todo o Estado8.

Tendo em vista a facilitação das contratações, da fiscalização das obras e do controle de desempenho das edificações, a CDHU adota projetos padrão de unidades habitacionais, as chamadas tipologias habitacionais. Estas tipologias são elaboradas visando atender às neces-sidades básicas das famílias e hoje já são concebidas considerando a possibilidade de ampliações e melhorias realizadas pelos usuários. Neste estudo analisamos a tipologia TG23A da CDHU, constituída de unidades unifamiliares térreas e geminadas. As casas são entregues na versão inicial, que apresenta 42,71 m² de área construída e conta com sala, cozinha, dois dormitórios, um banheiro e uma área de serviço coberta. O projeto original da tipologia prevê a possibilidade de construção de um terceiro dormitório (fig. 3).

4. Resultados

A média de moradores nas casas visitadas é semelhante nos dois empreendimentos, tendo sido registrados 3,5 e 3,6 habitantes por unidade em Cunha e Lagoinha, respectivamente. Verificou-se, também, que a maioria das famílias, 70% em Cunha e 79% em Lagoinha, moram na casa desde a entrega.

6 BONATTO, F. S.; MIRON, L. I. G.; FORMOSO, C. T. (2011) Avaliação de empreendimentos habitacionais de interesse social com base na hierarquia de valor percebido pelo usuário. Revista Ambiente Construído. Porto Alegre, v. 11, n. 1, p. 67-83.

7 Este artigo foi adaptado de: SILVESTRE, M. G.; CARDOSO, L. R. A. (2013) Avaliação de tipologia habitacional da CDHU executada com diferentes sistemas construtivos. Anais do V Encontro Latino-americano de Edificações e Comunidades Sustentáveis, Curitiba, Universidade Federal do Paraná.

8 SILVA, P. M. Gerenciamento de Obras Construídas por Mutirão: Estudos de Caso de Empreendimentos no Vale do Paraíba – SP. 2012. Dissertação de Mestrado, Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. 2012.

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Fig. 1 - Casas entregues em Cunha (acervo ABCP)

Fig. 3 – Planta da tipologia TG23A com opção de 3 dormitórios (CDHU)

Fig. 2 – Casas entregues em Lagoinha (acervo ABCP)

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Fig. 5 – Cozinha nova na LGN14

Fig. 7 – Itens modificados pelos usuários

Fig. 6 – Área de serviço integrada à varanda com forno a lenha na CNH09

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Em Cunha, 70% dos entrevistados considera que a casa foi entregue incompleta, enquanto em Lagoinha 60% dos entrevistados fizeram essa afirmação. Nos dois casos, o resultado se deve ao fato de as casas terem sido entregues sem o acabamento completo e sem muros e portões. Ainda assim, todos os moradores entrevistados consideram que a casa entregue atende às necessidades da família.

Grande parte dos entrevistados, 90% em Cunha e 50% em Lagoinha, relata a ocorrência de algum tipo de problema construtivo ou patolo-gia nas casas. Os principais problemas encontrados foram entupimento das instalações hidráulicas, sobrecarga nas instalações elétricas e presença de trincas e infiltração nas paredes.

Com relação à tipologia adotada, a TG23A da CDHU, a principal reclamação dos moradores se deve ao fato de não haver uma sepa-ração física entre a cozinha e a sala. De modo geral, é possível afirmar que a cozinha é incompatível com os padrões culturais da região, que mantém a tradição do preparo artesanal das refeições. Assim, a grande maioria das famílias executou algum tipo de divisão entre estes ambientes (fig. 4) ou fez uma cozinha nova (fig. 5).

Outra reclamação recorrente foi pelo fato de as casas serem geminadas, o que, de acordo com os moradores, reduz a privacidade da fa-mília uma vez que é possível ouvir o que se passa na casa vizinha, principalmente nas casas de Cunha que não possuem laje de cobertura. Observou-se, ainda, principalmente em Cunha, as tradições de cozinhar em fogões a lenha e de torrar e moer o café em casa, atividades realizadas em espaços abertos e cobertos que também funcionam como área de serviço e área de lazer (fig. 6).

Todas as casas visitadas sofreram modificações na sala, cozinha, dormitórios e área de serviço, sendo que algumas ainda alteraram o ba-nheiro, garagem e quintal. A figura 7, a seguir, apresenta as porcentagens dos itens modificados em cada empreendimento:

O projeto da tipologia TG23A, que já previa ampliações, facilitou muito a realização destas, pois a localização e as dimensões das am-pliações são quase que intuitivas. Além do terceiro dormitório, muitas famílias aproveitaram o espaço entre o muro de divisa e a parede do dormitório 1 para construir uma nova cozinha através da construção de uma parede para fechamento do ambiente. Também é comum a ampliação da cobertura da área de serviço, chegando, em alguns casos, até o fundo do lote.

Observou-se, ainda, a tendência dos moradores em ocupar todo o lote com construções e coberturas, o que, em muitos casos, comprometeu a funcionalidade de alguns ambientes, reduzindo a ventilação e iluminação naturais, principalmente na sala e na própria cozinha. Também foram realizadas ampliações verticais em algumas casas, o que também comprometeu a iluminação e ventilação de alguns ambientes, além de representar um risco à durabilidade e à resistência da estrutura.

De modo geral, as avaliações dos moradores com relação à iluminação e ventilação foram boas. A avaliação técnica, no entanto, considerou que a iluminação era inadequada em 70% das casas visitadas em Cunha e em 50% das casas visitadas em Lagoinha. Já a avaliação técnica da ventilação resultou em valores melhores, sendo que 90% das casas de Cunha e 86% das casas de Lagoinha foram consideradas adequadas. Quando questionados se têm a intenção de realizar mais modificações, 60% dos moradores de Cunha e 50% dos moradores de Lagoinha afirmaram que sim, sendo que o item mais desejado por eles é a construção de um cômodo novo.

Para os moradores, o maior benefício das modificações realizadas ou intencionadas é a ampliação da casa, seguida pela melhoria da apa-rência da residência e pelo aumento da segurança. A melhoria das condições de saúde, a valorização do imóvel e o aumento do conforto da família também foram citados.

5. Considerações finais

Este estudo analisou a tipologia habitacional TG23A da CDHU a partir de diversos parâmetros, como a satisfação dos usuários, utilização dos espaços e realização de modificações. Durante as entrevistas, os moradores mostraram insatisfação com alguns aspectos funcionais das casas, mas a avaliação geral foi favorável. Apesar da área construída reduzida, a tipologia apresenta um grande potencial para a realiza-ção de ampliações, permitindo a adequarealiza-ção das unidades habitacionais às necessidades das famílias.

Com relação às modificações promovidas pelos usuários, o estudo mostrou padrões de comportamento muito semelhantes e independentes do sistema construtivo utilizado, evidenciando a necessidade e o desejo de aumentar o espaço, a segurança, a privacidade e o conforto da família. Também foi possível comprovar, neste estudo, que a realização de ampliações sem orientação e sem um projeto pode gerar problemas fun-cionais e estruturais difíceis de serem solucionados. Por essa razão, se defende a adoção de tipologias flexíveis, que considerem as diferentes necessidades das famílias e permitam a manutenção da qualidade da habitação quando realizadas modificações.

Assim, entende-se que é de fundamental importância a realização de pesquisas que levantem as necessidades e hábitos das famílias para a concepção de tipologias habitacionais voltadas à população de baixa renda, sendo que mais estudos são necessários para se chegar a opções ainda mais satisfatórias.

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Agradecimentos

À Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP), à engenheira Patrícia Mendes Silva e ao arquiteto Carlos Chaves pelas informações fornecidas.

Michelli Garrido Silvestre michelli_silvestre@holtmail.com

Engenheira civil formada pela Escola de Engenharia Mauá e mestranda em Engenharia de Construção Civil e Urbana pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Atua na área de Edificações da Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP) realizando ações voltadas ao desenvolvimento, disseminação e aprimoramento de sistemas construtivos para edificações. Desenvolve cartilhas, manuais e ferramentas voltadas à capacitação de mão-deobra e profissionais da construção civil e ministra palestras e cursos sobre alvenaria estrutural com blocos de concreto.

Luiz Reynaldo de Azevedo Cardoso luiz.cardoso@poli.usp.br

Engenheiro civil pela Escola Politécnica da USP, tem mestrado e doutorado em Engenharia de Construção Civil e Urbana pela mesma escola. Atualmente é Professor Doutor e pesquisador da Escola Politécnica da USP, no Departamento de Engenharia de Construção Civil e leciona também na Faculdade de Arquitetura Belas Artes. Exerce atividade profissional e de pesquisa nas seguintes áreas: planejamento, custos e gerenciamento da construção; habitação e infraestrutura urbana; prospecção tecnológica e cadeia produtiva da construção civil.

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