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CONTRIBUIÇÃO PARA O RECONHECIMENTO DA ARQUITETURA EM MADEIRA NA CIDADE DE RESERVA PR

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Academic year: 2021

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CONTRIBUIÇÃO PARA O RECONHECIMENTO DA ARQUITETURA EM MADEIRA NA CIDADE DE RESERVA – PR

Márcio Henrique Botão¹, Gabriela Kratsch Sgarbossa²

1 Graduando em Arquitetura e Urbanismo, CESCAGE, Reserva; e-mail: marciobotao@gmail.com ² Mestre em Gestão Urbana, CESCAGE, Ponta Grossa, e-mail: arq.gsgarbossa@gmail.com

Resumo: Durante a colonização do denominado “Paraná Tradicional” a arquitetura de madeira foi de fundamental importância, pois permitiu a construção de inúmeras cidades utilizando uma técnica específica e atingindo resultados formais que dificilmente são encontrados em outras regiões do Brasil. Deste modo, o objetivo deste trabalho é apresentar as características de uma edificação com esta técnica localizada na cidade de Reserva, PR, justificando a relevância de sua preservação. A pesquisa se caracteriza por ser um estudo de caso, por meio de abordagem qualitativa, e utilizando de meios exploratórios como a pesquisa bibliográfica e documental, aliadas ao levantamento em campo foi possível identificar as principais particularidades existentes no exemplo escolhido. Tendo em vista a sua permanência ao longo dos anos, bem como sua marca na paisagem urbana do município em questão, concluiu-se que é de extrema importância que haja o reconhecimento desta arquitetura como objeto digno de preservação.

Palavras-chaves: Casa de araucária; Tábua e mata-junta; Patrimônio cultural 1 INTRODUÇÃO

Ao analisarmos a história da arquitetura brasileira, compreendemos que foi desenvolvida em várias fases, absorvendo diversas influências que refletem em caracteristas próprias de cada região, adotando diversos materiais e métodos construtivos. No caso do estado do Paraná, compreendemos que as construções em madeira, utilizando o sistema tábua e mata-junta possuem enorme relevância na paisagem. Embora seja pouco valorizada pela população e no meio acadêmico, sabe-se que este modelo auxiliou no desenvolvimento do Estado e está atrelada aos povos que aqui buscaram terras para ser seu lar e originários de diversos lugares, sendo o encontro destes povos um fator primordial para o desenvolvimento de uma arquitetura típica paranaense.

A madeira é um dos principais materiais construtivos utilizados ao longo da história da humanidade, seja como arcabouço estrutural ou como vedação, das construções mais primitivas até as mais sofisticadas. No caso do estado do Paraná, o material foi largamente utilizado no período entre 1870 a 1970, especialmente na região denominada como “Paraná Tradicional”, associado à diversos ciclos econômicos e fluxos migratórios, estando especialmente associada aos imigrantes alemães e eslavos, que já utilizavam este material na Europa (LAROCCA JUNIOR; LAROCCA; LIMA, 2008).

No caso do município de Reserva, a utilização de tábuas de araucária na construção civil toma características ainda mais marcantes, devido ao fato de que uma de suas bases econômicas ser a exploração e o beneficiamento de madeira (IPARDES, 2020). Contudo, com o avanço econômico, outros materiais começaram a ser incorporados às edificações, contribuindo para a gradativa diminuição das

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tradicionais casas de madeira na paisagem, e para a percepção equivocada de que essa tipologia construtiva é fragil.

Isso se deve a falta de normalização e padrão na produção da madeira, o que permitiu que o mesmo fosse produzido de forma incorreta, ocasionando peças com problemas estruturais ou de estabilidade. Isto contribui para a percepção de que esses problemas são próprios do material orgânico, enquanto outros materiais, como o cimento e o aço, foram desenvolvidos em unidades industriais de grande porte, contribuindo para o desenvolvimento de normas técnicas e padronização do uso (HILGENBERG NETO, 2012).

Isto contribui para o desuso e abandono deste material. Enquanto há uma padronização e uma produção correta do cimento ou metal, a madeira, é produzida de acordo com conhecimentos empíricos dos encarregados e proprietários de serrarias. Deste modo, a madeira passa a ser entendida como um produto inferior aos demais utilizados na construção civil, contribuindo para o estigma de que é um material frágil e voltado às classes mais populares (IMAGUIRE JR; IMAGUIRE, 2011).

Na cidade analisada o problema do desaparecimento de construções em madeira está acentuado, para tal conclusão basta um passeio pela cidade, onde é possível ver o desaparecimento destes imóveis, além disso, a falta de cuidado com aqueles que ainda estão em uso é perceptível. Entretanto, apesar da importância histórica que esta tipologia arquitetônica detém no estado do Paraná, são poucos os edifícios que possuem reconhecimento como patrimônio cultural, sendo apenas 11 imóveis em um universo de 169, sendo raras as políticas públicas que valorizem esses bens (SGARBOSSA, 2020).

Assim, é necessário considerar que a arquitetura em madeira foi de fundamental importância para o desenvolvimento do estado, possibilitando a construção de inúmeras cidades, desde o início dos fluxos migratórios europeus, em meados do século XIX até meados do século XX. Tendo em vista as características únicas das construções produzidas no interior do estado, concebidas pela união do gênio criativo do imigrante e do caboclo, é indispensável a análise deste modelo arquitetônico, com vistas a subsdiar sua preservação, em um estudo de caso desenvolvido na cidade de Reserva.

Com isto em vista, o objetivo deste artigo é apresentar as principais caacterísitcas construtivas e formais encontradas no Casarão dos Gunha, localizado na cidade de Reserva, Pr. Esse exemplar foi escolhido devido à sua presença marcante na paisagem urbana deste munícipio, por ter sido palco de inúmeras manifestações sociais ao longo de sua existência, mantendo suas características quase inalteradas. Em paralelo, devido à sua importância para o desenvolvimento do município em questão, serão apresentadas justificativas para a sua preservação. 2 MATERIAIS E MÉTODOS

Para desenvolvimento deste trabalho, adotou-se uma metodologia que se caracteriza por sua abordagem qualitativa, visando a compilação de dados que demonstrem as principais particularidades da arquitetura em madeira, especialmente relacionada à técnica denominada tábua e mata-junta. Seu caráter é essencialmente exploratório, utilizando o procedimento técnico do estudo de caso. Inicialmente, foi realizada a pesquisa teórica, em fontes bibliográficas, afim de constituir uma fundamentação teórica, referente às temáticas associadas à arquitetura em madeira e seu reconhecimento como patrimônio cultural.

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Posteriormente, foi selecionado um exemplar que se adequasse às propriedades das edificações em estudo afim de compreender a tipologia e os elementos que a compõem. A escolha foi baseada na importância que a edificação detém na paisagem, e por ser uma das únicas edificações em madeira na região central da cidade, praticamente inalterada desde a década de 1940. Esta etapa foi desenvolvida com base em pesquisa em fontes bibliográficas e documentais, associadas à levantamentos de campo. Deste modo, foi possível analisar a relevância deste método construtivo na região de Reserva-Pr.

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

3.1 ARQUITETURA EM MADEIRA NO PARANÁ

O Estado do Paraná, em grande parte de seu território, possui uma arquitetura muito especifica e facilmente reconhecida, tendo a madeira como o principal material utilizado (ZANI, 2003). Desta forma, o referido Estado, possui uma arquitetura vernacular facilmente identificável, que é caracterizada por ser o produto do desenvolvimento de um determinado povo, adotando materiais disponíveis na natureza e tendo características mais rústicas, sendo mais frequente em áreas rurais (TEIXEIRA, 2017).

Ainda sobre o conceito de arquitetura vernacular ou popular, sabe-se que é aquela realizada sem arquitetos ou conhecimentos eruditos, associadas à conhecimentos empíricos transmitidos de geração em geração, utilizando materiais tradicionais do local onde se inserem. No Brasil, as construções consideradas como populares possuem uma grande variedade de soluções, devido à grande dimensão territorial e a grande diversidade cultural existente, sendo responsáveis pela configuração de inúmeras cidades brasileiras (BATISTA, 2011).

Assim, este método de construir está relacionada com a população local e toda uma questão de elementos, sejam étnicos, culturais ou tecnológicos. Desta forma, é possível observar nas construções tradicionais paranaense, um encontro com as definições acima mencionadas, pois, é uma arquitetura que não dependeu de correntes estilísticas e tampouco de arquitetos ou de projetos prévios. Dependiam, apenas dos esforços de seus construtores e seus conhecimentos, além do material farto que estava a sua disposição.

Algumas destas edificações podem receber o caráter de erudição, devido à qualidade de sua concepção, estrutural ou espacial, ou por marcarem e serem produto de momentos históricos importantes. No caso das casas de araucária, seu desenvolvimento ocorre ligada aos diversos movimentos migratórios que ocorreram a partir de meados do século XIX, refletindo a criatividade e a capacidade de adaptação dos europeus e asiáticos a seu novo meio. Ao chegar no território, essa população detinha a possibilidade de construir com pedras, barro ou madeira, contudo o último se mostrou o material mais versátil e maleável (BATISTA, 2011).

O modo de construir no Paraná, majoritariamente, foi utilizando a madeira como principal elemento. Larocca Junior, Larocca, Lima (2008), dizem que, embora haja elementos em madeira em outras localidades, como na Amazônia, por exemplo, foi no Paraná que a madeira foi mais utilizada, dizendo, inclusive, que no Sul é que estava o centro da arquitetura popular que utilizou esse material de construção. Além disso, no Paraná esses edifícios possuem características singuares, associadas às práticas construtivas dos diferentes grupos de imigrantes que aqui chegaram. Portanto, é plenamente justificável falar de uma arquitetura paranaense de madeira.

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Nisso, observa-se uma diversidade destas obras populares, desde as casas eslavas, dos imigrantes ucranianos, poloneses e alemães, até as casas caboclas, daquela população que aqui estava antes destas levas de imigrantes. Larocca Junior, Larocca, Lima (2008), demontram de forma resumida, uma linha do tempo e os diversos estilos da arquitetura paranaense. Com as contribuições dos diversos povos que aqui chegavam, pode-se observar as contribuições de cada um nas formas e acabamentos destas edificações, bem como observar as mudanças no interior das residências.

Inicialmente, os caboclos da região construíam com as tábuas rústicas na vertical, o que influenciou a prática dos imigrantes eslavos e alemães, que originalmente utilizavam troncos rústicos na horizontal e o sistema enxaimel, respectivamente (LAROCCA JUNIOR; LAROCCA; LIMA, 2008). Assim, do encontro de povos diversos com os materiais que abundavam estas terras, foi possível desenvolver um modo construtivo característico. Observa-se as trocas de conhecimentos que houveram na região, dos jesuítas para os caboclos, dos caboclos para o europeu, e com isso, desenvolveu-se o que hoje compreendemos como a arquitetura popular em madeira no Paraná.

Existem diversas tipologias formais presentes na arquitetura de tábua e mata-juntas no estado, diferenciadas pela origem de seu construtor, se estão localizadas em áreas urbanas ou rurais, e pela data de sua construção. Deste modo, as edificações próximas ao norte do estado, que possuem uma imigração mais recente, possuem características diferentes daquelas executadas daquelas que se localizam na região sul e centro-oriental. Dentro de cada região, esta arquitetura também possui formas e tipologias diferenciadas, neste sentido, Imaguire Jr. e Imaguire (2011) desenvolvem classificação em cinco categorias para as edificações presentes em Curitiba, sintetizadas no quadro abaixo.

Tabela 1 - Classificação das tipologias de casas de madeira.

TIPO IMAGEM CARACTERÍSTICA

1 Denominada luso-brasileira. Possui telhado em

duas águas, voltado para a rua, sendo que o acesso se localiza na mesma fachada. Pode ter a ocorrência de varanda frontal e lambrequins.

2 Denominada casa da imigração. Possui telhado em

duas águas, mas voltado para as divisas laterais. O acesso se dá por uma pequena varanda na lateral da casa, havendo o aproveitamento do sótão.

3 Denominada casa com chanfro. Possui telhado em

duas águas, voltado para as divisas laterais, mas a cumeeira apresenta chanfro em 45°. O acesso ocorre por uma varanda frontal.

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4 Denominada de 4 águas. Possui telhado em quatro águas, podendo possuir varanda em sua extensão. Mais comum em casas pequenas construídas em série.

5 Denominada modernista. Ocorrência a partir da

segunda metade do século XX, influenciado pela arquitetura erudita modernista. Possuem pés direitos menores, telhados menos inclinados e adoção de elementos metálicos como esquadrias e colunas.

Fonte: IMAGUIRE JR; IMAGUIRE, 2011. Adaptado.

Apesar desta classificação ter sido elaborada para edificações presentes na região de Curitiba, entendemos que suas influências ultrapassam a região do primeiro planalto, sendo possível identificar residências e outras edificações com características semelhantes mesmo na região dos Campos Gerais e no sul do estado. Entretanto, cada localidade apresenta particularidades, devido à origem de seus construtores, implantação no sítio e ainda pela necessidade do usuário, demonstrando a riqueza de soluções encontradas na arquitetura em madeira no estado.

3.2 O CASARÃO DOS GUNHA

Durante muitas décadas, na paisagem urbana do município em questão, havia uma harmonia em relação as construções existentes, sendo repetidas as formas, tipos construtivos e técnicas, além dos materiais, diferenciando-se apenas em dimensões. Contudo, hoje em dia, isto não é mais visto, devido ao fato de que novo materiais e novos estilos arquitetônicos foram incorporados.

Algumas obras destas décadas passadas ainda resistem ao tempo, entre elas está um casarão de madeira, construído na década de 1940. Esta edificação é conhecida na cidade por Casarão dos Gunha, devido ao sobrenome dos atuais proprietários. A referida construção foi construída por um imigrante originário do então Império Austríaco, o senhor Reinhard Juppe. Com isso, pode-se perceber a influência da imigração na arquitetura vernacular regional, que se adaptou aos materiais e condicionantes do estado paranaense.

De acordo com a imagem abaixo (figura 01), percebe-se a tipologia da obra, sendo um chalé eslavo de madeira, elevado do solo, possuindo janelas tipo guilhotina, portas de madeira e telhas de madeira, denominadas “tabuinhas”, muito comuns no interior paranaense no início da sua imigração devido à pouca oferta de olarias que produzissem telhas cerâmicas. Devido às suas particularidades, podemos incluí-la no “tipo 1” da classificação de Imaguire Jr e Imaguire (2011), pois possui telhado em duas águas, alinhado ao traçado da rua, com acesso por essa fachada.

Apesar de não possuir lambrequins e varanda, assim como um beiral de grande profundidade, é visível a deflexão do plano da cobertura voltado para dentro do terreno, uma característica comum a essas edificações. Nota-se pelas janelas presentes no oitão que o sótão é do tipo habitável, sendo que sua particularidade encontra-se na presença de uma porta na fachada lateral, justificada por essa edificação possuir uso comercial e se localizar em um terreno de esquina.

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Figura 1 - Vista do Casarão à direita, por volta de 1940.

Fonte: Acervo pessoal.

Pela imagem acima, nota-se as características arquitetônicas do imóvel e a diferenciação com outros nas imediações, desde as dimensões até as formas e acabamentos. Em relação à forma percebe-se um alongamento da parte posterior, com forro inclinado e pé direito mais baixo em relação ao espaço anterior. Neste comparativo conclui-se a perceber duas tipologias de casas em madeira, o chalé e a casa cabocla, esta segunda, de acordo com Larocca Junior; Larocca; Lima (2008) é aquela sem ornamento nenhum, sem varanda ou cor. Possuindo cumeeira paralela a fachada principal, do modo que pode ser visto na segunda casa a direita, na imagem acima.

Convém observar que houve uma grande troca cultural entre os caboclos e os imigrantes, pois, absorveu-se as características da casa Cabocla, sendo a independência da estrutura e o afastamento do assoalho em relação ao solo, assim como o aproveitamento dos sótãos e as varandas são contribuição europeia (LAROCCA JUNIOR; LAROCCA; LIMA, 2008).

Os usos neste Casarão mantiveram-se praticamente inalterados com o passar do tempo, sendo comércio e residência, em um mesmo imóvel, característica presente até os dias de hoje na cidade e em muitas outras municipalidades brasileiras. A parte posterior do imóvel, juntamente com o sótão, é onde localiza-se a residência dos proprietários, estando este uso inalterado até a atualidade

Na parte frontal da edificação localiza-se a área comercial. Esta parte serviu como um tradicional bar/bodega e um clube, conhecido e frequentado pela população. Este clube era ponto de encontro daqueles aficionados por dança, além de que, este era o único lugar na cidade que reunia pessoas para recreação deste modo. É lembrado ainda por muitos moradores devido a este uso, um salão de baile, aberto aos domingos para danças ao som de bandas locais ao vivo, isto reunia a população em torno deste imóvel, o que o tornava um espaço de uso público desde seu início, jamais sendo um lugar privativo.

Hoje em dia, onde funcionava este salão, são salas comerciais para locação, estando totalmente modificado o seu uso atual daquele que mais foi marcante para

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a população reservense. Em relação às suas alterações, as mais marcantes se localizam na fachada principal, tendo suas portas de madeira alteradas para vitrines, na fachada lateral, são evidentes a troca das esquadrias de madeira tipo guillhotina para janelas em ferro, incluindo a alteração do número de aberturas no sótão. Porém, sua volumetria e presença marcante na paisagem permanecem, demonstrando a sua importância para a população local.

Figura 2 – Vista do Casarão atualmente.

Fonte: BOTÃO, 2018.

3.3 NECESSIDADE DE RECONHECIMENTO

Embora a arquitetura de madeira tenha uma grande importância no contexto paranaense, já que no início da colonização no interior, esse era o método construtivo mais utilizado, marcando a construção das cidades utilizando diversos métodos construtivos em edificações de inúmeras funções, essas tipologias ainda são pouco valorizadas no campo patrimonial. Em nível estadual existem 11 imóveis de madeira tombados, sendo 4 edifícios religiosos, 1 arquibancada, 1 estação ferroviária e 5 residências (SCSC, 2019). Considerando que 169 bens fazem parte deste universo, é notável a ausência de políticas públicas específicas para esses edifícios.

Para suprir essa necessidade de reconhecimento, os próprios municípios desenvolver suas leis relacionadas ao patrimônio, visando a preservação de exemplares de relevância local. Cidades como Curitiba, Maringá, União da Vitória e São Mateus do Sul possuem exemplares de arquitetura em madeira tombados, no entanto, no município de Reserva não existem leis voltadas patrimônio cultural, dificultando que a população identifique a importância destes bens.

No entanto, esse problema não é relacionado apenas a esse município, sendo percebido em boa parte do cone-sul latino-americano. Sendo um território ocupado essencialmente por imigrantes europeus, existe a busca pelo afastamento do que é antigo, que representa períodos de dificuldades e pobreza, havendo uma aproximação evidente com aquilo que representa a novidade, mesmo que isso signifique a perda da própria identidade (WAISMAN, 2013).

A busca pelo novo fez com que os sinais do passado fossem perdidos, assim como a manutenção da natureza, pois ambos são vistos como algo atrasado e, portanto, devem ser eliminados. Isso ocorre especialmente nas cidades de urbanização mais recente, nas quais a população não enxerga valor cultural nos seus

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bens devido à falta de idade das edificações (ZANIRATTO, 2009). Este foi o caso da cidade reservense, com a busca pela modernidade, o passado foi gradativamente apagado.

Mesmo sendo uma cidade relativamente nova em relação as mais próximas, como Ponta Grossa e Tibagi, fundadas em meados do século XIX, em Reserva, município desmembrado de Tibagi em 1921, também existe uma arquitetura a ser preservada, especialmente aquela denominada de arquitetura menor, mencionada na Carta de Veneza (1964), pois muitas destas obras foram de caráter especial e que demonstravam algum valor a população.

Em contrapartida, as casas de madeira, mesmo sendo construídas em espécies vegetais nobres, como a araucária, abundantemente utilizadas na região de Curitiba, Campos Gerais e no Vale do Iguaçu, e a peroba-rosa, de aplicação intensa no norte do estado, deixaram de ser bem aceitas pela população em geral, por serem identificadas como próprias de um grupo social menos favorecido. Nem mesmo sua forte exploração econômica como produto de exportação, na qual a economia do estado foi fortemente baseada até a década de 1970, protegeu o material desta percepção.

De tal maneira que atualmente, a população não vê sentido na preservação destes edifícios. Alguns por considerá-los como parte de um passado que deve ser esquecido. Outros, pelas possibilidades de ganhos financeiros de terrenos de grandes dimensões localizadas em áreas relativamente nobres nas cidades. Contribuindo assim, gradativamente para o desaparecimento tanto dos exemplares ainda existentes quanto para a perca das técnicas necessárias para a construção e manutenção destas singelas moradias.

Neste sentido, a preservação de edificações como o Casarão dos Gunha se faz vital para o entendimento que esta tipologia arquitetônica influenciou grandemente para o desenvolvimento da cidade de Reserva, sendo testemunha de acontecimentos importantes e palco de momentos de divertimento e lazer da população local. Em paralelo, contribui para que haja um maior entendimento na população em relação ao patrimônio, que não é composto apenas por grandes monumentos, mas também por bens feitos pelo povo e para o povo.

4 CONCLUSÃO

A arquitetura de madeira, especialmente a técnica denominada tábua e mata-junta foi de fundamental importância para a construção das cidades paranaenses, especialmente aquelas localizadas no que compreendemos como “Paraná Tradicional”. Ao construírem suas habitações, edifícios escolares, igrejas e comércios, os colonos pioneiros não apenas buscaram atender seu conforto e necessidades, mas também marcaram a paisagem por meio de características arquitetônicas muito singulares, bastante evidentes até meados da década de 1970.

Em muitas localidades, como é o caso de Reserva, as tábuas de araucária foram, durante muito tempo, o único material disponível para a construção civil, e, apesar de ser uma madeira muito nobre, com a viabilidade de outros materiais, passou a ser associada à classes mais populares. Isto, associado à percepção de que o material orgânico possui menor durabilidade em relação à materiais industrializados contribuiu para o progressivo desaparecimento destas edificações e suas técnicas de construção ao longo do tempo.

Em contrapartida, apesar da grande relevância desta arquitetura para a construção da cultura do estado, as políticas públicas voltadas para a sua valorização

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e preservação ainda são escassas, sendo poucos os edifícios em madeira que são tutelados em nível estadual. Mais escassos ainda são os municípios que visam a valorização deste patrimônio em escala local. Esse é o caso de Reserva, que não possui nenhuma legislação que objetive o reconhecimento e a proteção destes bens.

Deste modo, a preservação de uma edificação como o Casarão dos Gunha se faz necessária, não apenas por suas qualidades formais e técnicas, mas principalmente por demonstrar um método construtivo em processo de desaparecimento. Em paralelo, sua condição de testemunha e palco da história reservense, também a fazem um exemplar especial para essa localidade, pois presenciou tanto o desenvolvimento da cidade, quanto eventos e acontecimentos importantes dentro de suas próprias paredes.

REFERÊNCIAS

BATISTA, Fábio Domingos. A casa de madeira: um saber popular. Curitiba: Instituto ArquiBrasil, 2011.

CARTA DE VENEZA. II Congresso Internacional de Arquitetos e Técnicos dos Monumentos Históricos, ICOMOS - Conselho Internacional de Monumentos e Sítios Históricos. 1964.

HILGENBERG NETO, M. F. Estruturas da madeira da UFPR. 2012. Departamento de Engenharia Civil. UFPR. Curitiba. 2012.

IMAGUIRE JR, Key; IMAGUIRE, Marialba Rocha Gaspar. A casa de Araucária. Curitiba: Instituto ArquiBrasil, 2011.

IPARDES. Caderno Estatístico do Município de Reserva. Disponível em: http://www.ipardes.gov.br/cadernos/MontaCadPdf1.php?Municipio=84320&btOk= ok. Acesso em 17 de maio de 2020.

LAROCCA JUNIOR, Joel; LAROCCA, Pier Luigi; LIMA, Clarissa Almeida. A Casa Eslavo-Paranaense. Ponta Grossa: Editora Larocca Associados, 2008.

SECRETARIA DE COMUNICAÇÃO SOCIAL E CULTURA. Tombamento Estadual e a Relação de Bens Tombados. Curitiba. Disponível em: http://www.patrimoniocultural.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteud o=249. Acesso em 02 dez. 2019.

SGARBOSSA, Gabriela Kratsch.A casa de araucárica nos Campos Gerais: emergência no reconhecimento de uma cultura arquitetônica. In: Anais 2º Seminário Arquitetura Vernácula. Anais...Belo Horizonte(MG) Escola de Arquitetura da UFMG - Belo Horizonte - Minas Gerais - Brasil, 2020. Disponível em:

<https//www.even3.com.br/anais/2arqvernacula/175464-A-CASA-DE-

ARAUCARIA-NOS-CAMPOS-GERAIS--EMERGENCIA-DO-RECONHECIMENTO-DE-UMA-CULTURA-ARQUITETONICA>. Acesso em:

17/05/2020

TEIXEIRA, Rubenilson Brazão. Arquitetura vernacular. Em busca de uma definição. Arquitextos, São Paulo, ano 17, n. 201.01, Vitruvius, fev. 2017

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<https://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/17.201/6431>.

WAISMAN, Marina. O interior da história: historiografia arquitetônica para uso de latino-americanos. São Paulo: Editora Perspectiva, 2013.

ZANI, Antonio Carlos. Arquitetura em Madeira. São Paulo: Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2003.

ZANIRATO, Silvia Helena. O patrimônio cultural em cidades novas. Leituras da política patrimonial paranaense. II Encontro Cidades Novas - A construção de políticas patrimoniais: mostra de ações preservacionistas de Londrina, Região Norte do Paraná e Sul do País. Londrina. vol. 01, n 01, p. 01 - 19. 2009.

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