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DELEGAÇÃO DE PODERES ÓNUS DA PROVA TESTEMUNHAS

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Tribunal da Relação de Évora Processo nº 1071/18.9T8EVR-A.1 Relator: MÁRIO BRANCO COELHO Sessão: 11 Abril 2019

Votação: UNANIMIDADE

CONTRATO DE TRABALHO PODER DISCIPLINAR

DELEGAÇÃO DE PODERES ÓNUS DA PROVA TESTEMUNHAS

Sumário

1. O poder disciplinar pode ser exercido por pessoa diversa do empregador, seja um superior hierárquico com funções disciplinares, seja outra pessoa com poderes de representação para o efeito.

2. Arguindo o trabalhador a falta de poderes de representação do autor do procedimento disciplinar, este pode fazer a prova dos seus poderes, em prazo razoável, sob pena de a declaração não produzir efeitos.

3. Em sede de procedimento disciplinar com intenção de despedimento, não cabe à empregadora o ónus de prova da verdade material dos factos

constantes da respectiva nota de culpa, pois o juízo quanto à existência de justa causa será feito pelo Tribunal e de acordo com a prova efectuada no âmbito do processo judicial.

4. A faculdade de ampliação do limite legal de testemunhas – art. 511.º n.º 4 do Código de Processo Civil – deve ser utilizada com parcimónia e apenas quando for justificada por uma especial dificuldade associada à natureza e extensão dos temas da prova.

Texto Integral

Acordam os Juízes da Secção Social do Tribunal da Relação de Évora: No Juízo do Trabalho de Évora, G… impugnou a decisão de despedimento decretada por P… e, após a realização da audiência de partes, esta ofereceu o respectivo articulado motivador e juntou o procedimento disciplinar.

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Na contestação, o trabalhador alegou duas nulidades cometidas no procedimento disciplinar: a 1.ª, por falta de legitimidade da pessoa que determinou a sua instauração; a 2.ª, por violação do direito de defesa e do princípio do contraditório, relacionada com a recusa de audição de parte das testemunhas por si arroladas.

Deduziu, ainda, reconvenção e no seu requerimento probatório arrolou 26 testemunhas, pedindo a admissão das mesmas para além do limite legal, nos termos do art. 511.º n.º 4 do Código de Processo Civil.

Após resposta da empregadora, realizou-se audiência prévia e nela foi proferido despacho julgando improcedentes ambas as nulidades invocadas pelo trabalhador e indeferindo o arrolamento de 26 testemunhas.

No mesmo despacho, foi identificado o objecto do litígio, enunciados os temas da prova e determinada a realização de diversas diligências probatórias com vista à instrução e julgamento da causa.

O trabalhador recorre na parte relativa às nulidades por si arguidas e ao indeferimento da inquirição de testemunhas para além do limite legal, concluindo:

1. O despacho a fls (?) de 11 de Setembro de 2018 está, salvo o devido

respeito, eivado de erros na apreciação das excepções alegadas pelo A., que se consubstanciariam em nulidades insanáveis e consequentemente na ilicitude do despedimento do A..

2. O despacho a fls (?) que decide também, pelo indeferimento de parte prova testemunhal requerida pelo A., decide-o, sem uma apreciação casuística

adequada, sendo por isso ilegal.

3. O A., aqui recorrente, não pode, por isso, conformar-se com as decisões proferidas no despacho a fls (?), e porquanto, impõe-se ao Venerando Tribunal de Recurso, a reapreciação das decisões proferida pelo Tribunal recorrido. 4. A primeira crítica que o Recorrente faz ao despacho a fls (?) deriva, desde logo, de o Tribunal recorrido ter conhecido da improcedência da excepção de nulidade do processo disciplinar por consequente falta de legitimidade de quem o instaurou, nomeadamente, o Senhor J….

5. Apenas a Ré seria a detentora do exercício do poder disciplinar, dado que a sua “delegação genérica” no terceiro deste poder não se demonstra suficiente, sendo que para tanto, deveria constar do regulamento interno da entidade patronal – cfr. o preceituado no Acórdão do STJ de 29.09.99, in CJ, Ano VII, Tomo II, Pág. 255.

6. Mesmo que assim não se entenda, deveria a R. ter juntado ao procedimento disciplinar ab initio o instrumento que demonstrasse a delegação, tratando-se esta de uma delegação casuística, os poderes para dar início ao processo

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disciplinar.

7. A “Procuração”, datada de 01/10/2017, foi junta tardiamente, após a resposta à nota de culpa pelo A., resultando da mesma, uma delegação genérica de poderes.

8. A delegação do exercício do poder disciplinar deve respeitar a forma escrita, de molde a evitar possíveis desentendimentos e incompatibilidades nesse exercício, com prejuízo claro para o trabalhador – cfr. Código de

Trabalho Anotado e Comentado, por Hélder Quintas e Paula Quintas, Pág. 643. 9. Não tendo J… poderes para o exercício do procedimento disciplinar, muito menos teria para a respectiva nomeação dos Instrutores (356.º, n.º 1 do CT). 10. Inexistindo uma delegação no Senhor J…, apenas a R. teria legitimidade para proceder à nomeação dos Instrutores.

11. Inquinado o processo disciplinar, deveria ter sido o mesmo, declarado nulo por nulidade insanável e, em consequência, ter sido decretada a ilicitude do despedimento.

12. É do nosso entendimento, que a preterição das formalidades na condução do procedimento constitui uma irregularidade passível de afectar a validade do procedimento disciplinar e, por essa via, a validade do próprio

despedimento.

13. A segunda crítica que o Recorrente faz ao despacho a fls (?) deriva, de o Tribunal recorrido ter conhecido da improcedência da excepção de nulidade do processo disciplinar por violação, na fase instrutória, dos direitos de defesa e do princípio do contraditório do A., tendo sido violado o disposto no artigo 126.º, n.º 1 do CT, e na alínea a) do n.º 1 do artigo 129.º do CT (violação de forma grave, de um direito fundamental do trabalhador).

14. Na resposta à nota de culpa o A. requereu a audição de 18 testemunhas por considerar, para o efeito, que os respectivos depoimentos eram essenciais ao apuramento dos factos em questão, justificando-o, o que foi indeferido pela R.

15. Constata-se que a R., tendo actuado de boa-fé, não teria colocado os sucessivos entraves formais, ao exercício pleno do contraditório pelo A.

16. Era indispensável à R., adoptar uma postura participativa, leal e de boa-fé, a qual se impõe em face da natureza essencial dos direitos que se pretendem assegurar com a promoção de diligências probatórias requeridas pelo

trabalhador – cfr. “O Procedimento Disciplinar Laboral”, ob. cit., Págs. 156 e seguintes.

17. Atentando contra o princípio supra identificado, a decisão de “colaboração da R.”, bastou-se pela comunicação com um dia útil de permeio às

testemunhas da data de inquirição.

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A., apesar de o mesmo ter fundamentado o seu pedido.

19. Sendo apenas comunicado ao A., que iriam ser inquiridas 10 testemunhas, nunca solicitando ao mesmo que indicasse as que pretendia que fossem

ouvidas.

20. Só na data, hora e lugar de inquirição, sem que o A. tivesse uma opção de escolha, foi dada ao mesmo, sob pressão, essa eleição!

21. Sendo que, posto o facto de o trabalhador ter requerido a inquirição de mais de dez testemunhas, a entidade empregadora teria que lhe devolver a oportunidade de escolher quais as testemunhas cujo depoimento pretendia prescindir com vista a assegurar o respeito por este limite máximo – cfr. “O Procedimento Disciplinar Laboral”, ob. cit., Págs. 156 e seguintes.

22. As formalidades na condução do procedimento, in casu, a falta das mesmas, constituem uma irregularidade passível de afectar a validade do procedimento disciplinar e, por essa via, a validade do próprio despedimento. 23. A terceira e última crítica que o Recorrente faz ao despacho a fls (?)

deriva, de o Tribunal recorrido ter indeferido o número de testemunhas arroladas pelo A. atendendo ao disposto no artigo 511.º, n.º 4 do CPC,

reduzindo, consequentemente, o seu número para 10 testemunhas, a escolher e a indicar pelo A.

24. In casu, o A. poderia arrolar até 20 testemunhas, dado que o mesmo apresentou a sua Contestação e Reconvenção – cfr. fls (?), arrolando as suas testemunhas (26) no final deste articulado – ao abrigo do preceituado no artigo 511.º, n.º 1 e 2 do CPC.

25. As 26 testemunhas arroladas pelo A. são todas essenciais para a boa decisão da causa.

26. A maior parte das testemunhas detém um conhecimento directo sobre os factos, o que é essencial para a descoberta da verdade.

27. Para além do mais, é imprescindível o seu depoimento, dado que as testemunhas arroladas pelo A. estão relacionadas com os factos que são imputados, para que, consequentemente, se possa fazer prova de eventuais danos.

28. É intrínseco ao Tribunal e a todas as pessoas, sejam ou não partes na causa, o princípio da cooperação, preceituado no artigo 417.º, n.º 1 do CPC. 29. Pelo supra exposto, o despacho ora recorrido, a fls (?), por ilegal, deverá ser revogado e substituído por outro que declare a procedência da nulidade do processo disciplinar por falta de legitimidade de quem instaurou, dado que pertencia à gerência da R., e, consequentemente, seja decretada a ilicitude do despedimento, com todas as consequências legais;

Sem prescindir,

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artigos 126.º, n.º 1 e 129.º do CT, pelo que, deverá ser revogado e substituído por outro que declare a procedência da invocada excepção de nulidade do processo disciplinar por violação, na fase instrutória, dos direitos de defesa e do princípio do contraditório do A., trabalhador, e que consequentemente, inquina a validade do procedimento disciplinar e a licitude do despedimento; Sem prescindir,

31. A decisão do Tribunal a quo de indeferir a requerida inquirição de

testemunhas, além do limite legal de 10, é ilegal, por violação do artigo 511.º, n.º 4 do Código de Processo Civil (ex vi artigo 1.º, do Código do Processo do Trabalho) e artigo 20.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, pelo que deverá ser revogada e substituída por outra que admita a requerida inquirição de testemunhas além do limite legal de 10, com as demais consequências legais.

A resposta sustenta a manutenção do decidido.

Subindo os autos em separado a esta Relação, o Ministério Público produziu parecer no sentido da confirmação do decidido.

Através do sistema informático de suporte à actividade dos tribunais – Citius –

procedeu-se à consulta por via electrónica do processo principal, que corre seus termos no tribunal recorrido, como permitido pelo art. 15.º n.º

2 al. b) da Portaria 280/2013, de 26 de Agosto, na sua redacção actual, introduzida pela Portaria 267/2018, de 20 de Setembro (Regulamenta a tramitação electrónica dos processos nos tribunais judiciais).

Dispensados os vistos, cumpre-nos decidir.

A matéria de facto relevante para a decisão – documentada no processo principal e no apenso remetido a esta Relação – é a seguinte:

1. Em 07.02.2018 J…, Director Coordenador de Recursos Humanos da Ré, nomeou dois instrutores do processo disciplinar a instaurar ao A., com vista ao seu despedimento;

2. Em 28.02.2018, através de ofício assinado por J…, foi enviada ao A. a nota de culpa elaborada pelo instrutor;

3. Em 16.03.2018 o A. respondeu à nota de culpa, onde invocou a

ilegitimidade para o exercício do processo disciplinar por inexistência de poderes delegados comprovados através de documento, que deveria ter sido junto ao processo disciplinar e a si comunicado;

4. Por despacho de 26.03.2018, o instrutor do procedimento disciplinar juntou procuração datada de 01.10.2017, pela qual os gerentes da Ré concederam, entre outros, a J… e a F…, cada um por si só, os poderes para em nome da sociedade, além do mais, celebrar contratos individuais de trabalho ou

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acordos de cessação dos mesmos, bem como decidir da aplicação de sanções disciplinares;

5. Tendo na resposta à nota de culpa o A. requerido a inquirição de 21 testemunhas, no mesmo despacho de 26.03.2018 o instrutor designou o dia 03.04.2018, às 10.00 hs., para inquirição das mesmas;

6. Este despacho foi comunicado ao mandatário do trabalhador por correio electrónico remetido em 27.03.2018;

7. Em requerimento de 02.04.2018, o mandatário do trabalhador requereu o reagendamento da data de inquirição das testemunhas, por exiguidade do tempo decorrido entre as datas da notificação e da inquirição agendada e interposição do período da Páscoa, requerendo que a data lhe fosse

comunicada com 8 dias de antecedência;

8. Em despacho da mesma data, o instrutor reagendou a inquirição para o dia 13.04.2018, às 10.00 hs., consignando que deveria ser o trabalhador a fazer comparecer as testemunhas;

9. Em requerimento de 11.04.2018, o mandatário do trabalhador requereu nova data para inquirição das testemunhas e que a empregadora convocasse as testemunhas seus trabalhadores;

10. Em despacho da mesma data, o instrutor manteve a data já agendada, comunicou à empregadora para fazer comparecer as testemunhas seus

trabalhadores e consignou que não seriam ouvidas mais que 10 testemunhas; 11. No dia 13.04.2018, o trabalhador apresentou requerimento indicando as 10 testemunhas que pretendia fossem inquiridas, tendo a inquirição das mesmas decorrido nessa data;

12. Após relatório do instrutor, a empregadora comunicou ao trabalhador a decisão de despedimento, lavrada por F…, Director de Compensação e Administração de Recursos Humanos;

13. Na sua contestação/reconvenção, o trabalhador arrolou 26 testemunhas e formulou o seguinte requerimento: “A inquirição destas testemunhas é

absolutamente essencial tendo em conta a extensão e a natureza dos factos supra alegados, pelo que requer-se seja admitida a inquirição para além do limite legal, nos termos do artigo 511.º, n.º 4 do Código de Processo Civil (ex vi artigo 1.º, do Código do Processo do Trabalho).”

14. No despacho recorrido, para além do indeferimento da inquirição de 26 testemunhas, foi ordenada a notificação do trabalhador “para, em 10 dias, indicar as testemunhas que pretende ver inquiridas, sendo que se nada disser serão consideradas as 10 primeiras”;

15. Nessa sequência, o trabalhador apresentou um requerimento indicando as 10 testemunhas que pretendia ver inquiridas, mencionando que o fazia “sem prejuízo do recurso entretanto apresentado”;

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16. Nesta sequência, foi proferido despacho para o trabalhador esclarecer se as 10 testemunhas indicadas diziam “respeito à matéria da contestação, da reconvenção ou de ambas”;

17. Apresentou então o trabalhador novo requerimento, reorganizando o respectivo rol de testemunhas, sendo 10 para a matéria da contestação e 10 para a matéria de reconvenção;

18. Foi então proferido despacho admitindo este rol. APLICANDO O DIREITO

Da nulidade do procedimento disciplinar

De acordo com o art. 329.º n.º 4 do Código do Trabalho, o poder disciplinar pode ser exercido directamente pelo empregador, ou por superior hierárquico do trabalhador, nos termos estabelecidos por aquele. Ou seja, a lei admite expressamente a possibilidade do poder disciplinar ser exercido por pessoa diversa do empregador, seja um superior hierárquico com funções

disciplinares, seja outra pessoa com poderes de representação para o efeito, nos termos gerais dos arts. 258.º e segs. do Código Civil.[1][2]

No caso, o poder disciplinar foi exercido por funcionário da Ré, com funções de direcção de recursos humanos, e com poderes de representação da

empregadora para proceder à cessação de contratos de trabalho e decidir da aplicação de sanções disciplinares, conforme procuração datada de

01.10.2017.

A lei não exige que os poderes de representação estejam documentados, ab initio, no procedimento disciplinar – aliás, o Recorrente nem se dá ao cuidado de mencionar qual a norma que estabeleceria tal exigência – sendo para todos os efeitos aplicável a regra constante do art. 260.º do Código Civil, podendo o trabalhador exigir ao autor do procedimento disciplinar a prova dos seus poderes, em prazo razoável, sob pena de a declaração não produzir efeitos[3], e ainda obter cópia do documento concedendo os poderes de representação. Note-se, ainda, que a instauração e prossecução do processo disciplinar é um acto de mera administração[4], e que a emissão de uma declaração negocial – como é a comunicação de despedimento – gera uma obrigação vinculante para a sociedade sempre que produzida por um seu representante ou por ela

ratificada.

Assim, face à arguição pelo trabalhador na resposta à nota de culpa da falta de representação da empregadora por parte da pessoa que deu início ao

procedimento disciplinar, a atitude que se impunha era a comprovação desses poderes – como foi feito.

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de invalidade do procedimento disciplinar constantes do art. 382.º n.º 2 do Código do Trabalho, bem se decidiu pela improcedência desta arguição de nulidade.

Quanto à segunda arguição de nulidade, por violação do direito de defesa e do princípio do contraditório, para além de um dos argumentos invocados pelo trabalhador não ter suporte fáctico – ao contrário do que afirmou, o instrutor do procedimento disciplinar deferiu o pedido de reagendamento formulado em 02.04.2018, e não era obrigado a proceder a novo adiamento da diligência designada para o dia 13 desse mês, tanto mais que assistia ao trabalhador o dever de assegurar a comparência das testemunhas por si indicadas (art. 356.º n.º 4 do Código do Trabalho) – também se anota que o empregador não tinha o dever de ouvir mais de 10 testemunhas (n.º 3 do mesmo artigo).

Ciente dessa limitação, o trabalhador aceitou-a e no próprio dia 13.04.2018 indicou, sem qualquer ressalva, quais as 10 testemunhas que pretendia fossem inquiridas, tendo a respectiva inquirição decorrido nessa data, pelo que a

questão se encontra ultrapassada.

De todo o modo, importa recordar que no procedimento disciplinar com

intenção de despedimento, não cabe à empregadora o ónus de fazer prova da verdade material dos factos constantes da respectiva nota de culpa – a lei exige, unicamente, a realização das diligências probatórias requeridas na resposta à nota de culpa (art. 356.º n.º 1), pois aqui está em causa o exercício do direito de defesa do trabalhador. O procedimento disciplinar laboral não se destina a apurar, imparcial e objectivamente, uma verdade material – visa fundamentar uma decisão de parte, que é a decisão disciplinar. O seu

objectivo é o de sustentar uma convicção do empregador – titular do poder de disciplina – que pode ter-se formado antes dele, e que se exprimirá pela

decisão de aplicar, ou não, certa sanção. Esta decisão é uma reacção de um contraente contra outro, que ficará sujeita ao escrutínio judicial se houver litígio.[5]

Logo, o art. 382.º n.º 2 do Código do Trabalho não comina com a nulidade do procedimento disciplinar com intenção despedimento, em caso da

empregadora não realizar qualquer diligência probatória dos factos constantes da sua nota de culpa.

Isto serve para dizer que, não tendo a entidade empregadora, em sede de procedimento disciplinar, o ónus de prova da verdade material dos factos constantes da nota de culpa, também o trabalhador não tem o ónus de

efectuar a contra-prova de todos os factos ali constantes, pelo menos em sede de procedimento disciplinar.

É um processo de parte, dirigido e decidido por um dos interessados na sua decisão, pelo que “não cabe ao tribunal apreciar se a decisão do despedimento

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é, ou não, sustentada e justificada perante a prova que foi (ou não foi)

produzida no procedimento disciplinar. O juízo quanto à existência ou não de justa causa para o despedimento apenas será feito pelo Tribunal perante e de acordo com a prova que seja oferecida e efectuada no âmbito do processo judicial e de acordo com as normas processuais próprias deste.”[6]

Assim, quer porque foi respeitada a limitação do art. 356.º n.º 3 do Código do Trabalho, quer porque o trabalhador aceitou essa limitação, quer porque não era a ele que assistia o ónus de prova dos factos constantes da nota de culpa, nem estando obrigado a efectuar a contra-prova, em sede de procedimento disciplinar, de todos os factos ali constantes, resta apenas concluir que não foi cometida a nulidade imputada.

Nesta parte, improcede o recurso.

Da inquirição de testemunhas para além do limite legal

Observando, a título meramente introdutório, que a regra de irrecorribilidade constante do art. 511.º n.º 4 do Código de Processo Civil se aplica ao despacho que admite a ampliação do limite legal de testemunhas, e não ao despacho que indefira essa ampliação, dado o seu carácter de exclusão de meios de prova[7] – arts. 630.º n.º 2, in fine, e 644.º n.º 2 al. d) do Código de Processo Civil – o trabalhador decidiu arrolar 26 testemunhas, por considerar a sua inquirição “ absolutamente essencial tendo em conta a extensão e a natureza dos factos supra alegados.”

Para além de se apontar que a referida norma do art. 511.º n.º 4 do Código de Processo Civil não parece ser aplicável em processo do trabalho, pois este tem regras especiais quanto à limitação de testemunhas[8], nomeadamente as constantes dos arts. 64.º e 65.º do Código de Processo do Trabalho, delas não constando a excepção que o trabalhador invoca, dir-se-á, de todo o modo, que os autos não apresentam a complexidade que o Recorrente lhe pretende imputar.

O articulado motivador do empregador possui 27 artigos, suportado por um rol de apenas sete testemunhas, enquanto a contestação do trabalhador se alonga por 277 artigos, com 64 dedicados às duas excepções de nulidade, 122 à impugnação da justa causa e 91 à reconvenção. O grau de dificuldade das matérias em discussão não é elevado e, em bom rigor, o trabalhador nem se dá ao cuidado de detalhar em que medida a extensão e a natureza dos temas da prova é tal que justifique o tratamento excepcional que pretende.

Apontando, ainda, que o art. 511.º n.º 4 do Código de Processo Civil deve ser utilizado com parcimónia e apenas quando se justificar o afastamento da regra geral limitadora do número de testemunhas, face a uma especial dificuldade

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associada à natureza e extensão dos temas da prova – requisito este que não se vislumbra, de todo, nos autos – resta confirmar, também neste ponto, a decisão recorrida.

DECISÃO

Destarte, nega-se provimento ao recurso e confirma-se a decisão recorrida. Custas pelo Recorrente.

Évora, 11 de Abril de 2019

Mário Branco Coelho (relator) Paula do Paço

Emília Ramos Costa

[1] Cfr. o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.06.2009 (Proc. 08S3617), publicado em www.dgsi.pt.

[2] Exprimindo opinião concordante, vide Pedro Romano Martinez e outros autores, Código do Trabalho Anotado, 8.ª ed., pág. 881.

[3] Neste sentido, vide o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 21.03.2012 (Proc. 161/09.3TTVLG.P1.S1), na mesma base de dados. [4] Neste sentido se pronunciou o Acórdão da Relação de Guimarães de 20.04.2017 (Proc. 2535/14.9T8GMR-B.G1), disponível na mesma base de dados.

[5] Assim se decidiu no Acórdão da Relação do Porto de 14.03.2016 (Proc. 1097/15.4T8VLG-A.P1), igualmente em www.dgsi.pt.

[6] Ainda o mencionado Acórdão da Relação do Porto de 14.03.2016.

[7] Neste sentido, Lebre de Freitas, in Código de Processo Civil Anotado, vol. II, 3.ª ed., págs. 386/387.

[8] Diogo Ravara e Viriato Reis, in Reforma do Processo Civil e do Processo do Trabalho, e-book do CEJ O Novo Processo Civil – Impactos do Novo CCP no Processo do Trabalho, Junho de 2014, pág. 88.

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